O UNIVERSO LÚDICO DAS ADIVINHAS NA LITERATURA INFANTIL MARIA APARECIDA VALENTIM AFONSO (UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA). Resumo Esta comunicação propõe compartilhar a análise feita na dissertação de mestrado, apresentada em novembro de 2006, na UFPB, cujo estudo destaca as brincadeiras com a linguagem, especificamente, as adivinhas, no livro de literatura infantil “Brincando adivinhas”, de Gomes (2003). O objetivo é analisar as características das adivinhas apresentadas, a união entre imagem e texto, o seu processo de decifração, bem como a aproximação do texto com a linguagem poética. Destaca– se também, na análise, a união de várias linguagens: do circo, da música, da poesia, da cultura popular, da ilustração e da palavra escrita cujo objetivo é ajudar o leitor e leitora, através da ludicidade, a compreender mais amplamente a adivinha trazendo para essa brincadeira seu conhecimento de mundo e a imaginação. Defende–se, assim, a sua importância na sala de aula, através da literatura infantil, gênero que traz para suas páginas a riqueza e a variedade de brincadeiras com a linguagem, oriundas da cultura popular, permitindo o seu acesso a um número maior de crianças na escola. Tendo por base a perspectiva dos Estudos Culturais, dialoga–se sobre aspectos relacionados à literatura infantil, à criança e a textos específicos como as adivinhas, apoiando–se em pressupostos teóricos de autores como Fernandes, Bachelard, Lajolo, Zilbermann, Ostrower e Brougère. Palavras-chave: Adivinhas, Literatura infantil, Brincadeiras. Introdução O objetivo dessa comunicação é compartilhar a análise feita na dissertação de mestrado, cujo estudo destaca as brincadeiras com a linguagem, especificamente, as adivinhas, no livro de literatura infantil Brincando adivinhas, de Gomes (2003). O objetivo é analisar as características das adivinhas apresentadas, a união entre imagem e texto, o seu processo de decifração, bem como a aproximação do texto com a linguagem poética. Estamos, nesse estudo, imbuídos do intuito de trazer à tona a importância das brincadeiras tradicionais, principalmente as adivinhas no universo da literatura infantil, destacando sobretudo a presença do gênero na sala de aula, a partir das últimas décadas. Defendemos, assim, a sua importância na sala de aula, através da literatura infantil, gênero que traz para suas páginas a riqueza e a variedade de brincadeiras com a linguagem, oriundas da cultura popular, permitindo o seu acesso a um número maior de crianças na escola. Essa análise constitui importante desafio e oportunidade para perceber a influência da transmissão oral das brincadeiras populares para refletirmos sobre o escasseamento dos espaços dedicados para o brincar das crianças, quer nas metrópoles, quer nas pequenas cidades. Através dessa análise é possível identificar a memória transmitida pelos adultos e o reconhecimento da literatura infantil, na atualidade, como portadora de uma linguagem que possibilita às crianças o acesso a uma diversidade de manifestações populares, o que de certa forma resguarda a tradição e o conhecimento popular das brincadeiras com a linguagem. Pretendemos trazer para nossa reflexão a união de várias linguagens: do circo, da música, da poesia, da cultura popular, da ilustração e da palavra escrita, cujo objetivo é ajudar o leitor e a leitora, através da ludicidade, a compreender mais amplamente a adivinha, trazendo para essa brincadeira seu conhecimento de mundo e a imaginação. Temos, assim, no universo da cultura popular e das brincadeiras com a linguagem, a transmissão de saberes a uma nova geração, auxiliando no processo de aculturação e construção de novas abordagens e estudos sobre a temática na literatura infantil. Resumo da história Em uma pequena cidade do interior a "vendedora de maçãs meladas" comenta com as crianças que vai chegar à cidade uma nova atração para o circo. As crianças ficaram entusiasmadas com a notícia e não precisaram esperar muito. De repente! O silêncio foi geral. Aparece Pai Francisco com sua companheira Flor do Dia. Ele, no meio da roda, com sua viola, e ela, com seu pandeiro todo enfeitado, começam a tocar, a cantar e a fazer adivinhas para o povo daquele lugar. Andando pelas ruas da pequena cidade, os dois dirigem as brincadeiras. E a alegria é geral. Da criança ao adulto todos participam da brincadeira e dão muitas risadas. De acordo com Fernandes (1979, p. 279), as adivinhas constituem "enigmas verbais que representam o objeto por meio de analogias, mas cujo mútuo concurso o delimita suficientemente". Saraiva (1998, p. 2) comenta que as adivinhas "são textos verbais breves que implicam um jogo de pergunta e resposta, sendo que está clara, está contida naquela de modo cifrado, velado ou inesperado". Esses textos, geralmente breves, definem um objeto ou ser, capturando as qualidades, forma, usando metáforas, tornando, assim, a decifração mais difícil de ser realizada. Quanto mais difícil a adivinha, mais exige a perícia do adivinhador, requerendo para sua decifração o conhecimento lingüístico, cultural e do mundo. As adivinhas caracterizam-se por expressarem uma pergunta, mesmo que não apresentem a representação clara da pergunta. A intenção é testar, questionar e pedir uma resposta. Podem iniciar com: O que é, o que é? ou ir diretamente a questões pontuais sobre o objeto, o ser que deseja questionar. Ex: "É água e não vem do mar. Na terra não nasceu. Do céu ela não caiu. Todo mundo já lambeu". As adivinhas constituem textos importantes para as crianças, pois permitem a aproximação com a linguagem poética, rimas etc. É uma linguagem elaborada que possibilita ao leitor uma viagem por diversos espaços e tempos onde foram produzidos. Permite à criança adentrar no universo das palavras, significados, contextos culturais diversos, pois reporta a épocas anteriores, desse modo conduzindo o decifrador para uma compreensão mais ampla do tempo e da linguagem empregada em diferentes regiões. As adivinhas fazem parte de uma herança cultural e dessa forma representam o passado onde está sua origem, com marcas orais de costumes e modos de vida que dão pistas sobre nossa origem. O universo do livro O livro Brincando Adivinhas é rico de elementos que se reportam ao universo infantil. A autora busca referências para o livro nos elementos da cultura popular, como adivinhas e brincadeiras infantis. Promove uma intertextualidade entre elementos do circo, das cantigas, das histórias populares, tendo como pano de fundo a criança com suas brincadeiras. As brincadeiras inseridas pelo narrador na história revelam pouco a pouco o espaço da cultura em nossa vida, seja na sua produção, no entretenimento ou na afetividade. E o circo invade a cidade, através da figura de Pai Francisco, personagem central da narrativa e nome de uma cantiga de roda, referência nas brincadeiras das crianças. Nessa dimensão do brincar, à medida que as atrações Pai Francisco e Flor do Dia vão cantando e tocando, carregam adultos e crianças para uma viagem, para uma outra dimensão. Os adultos, mesmo um pouco afastados, ouvem, param para assistir, sorriem e participam. Enquanto caminham pelas ruas da pequena cidade, Pai Francisco e Flor do Dia conquistam todos aqueles que os ouvem. A melodia das cantigas e das adivinhas penetra no âmago da memória do adulto e o conquista, fazendo-o recordar de sua infância, trazendo à tona a dimensão brincalhona, as alegrias e emoções daqueles tempos. As crianças, por sua vez, são atraídas pelas cores, musicalidade, curiosidade e o inusitado que figuras como Flor do Dia, a mulher das pernas de pau e Pai Francisco, cantador e tocador, provocam. Anexo 1- A vendedora de maçãs Versos e rimas, adivinhas cantadas e faladas, o fato é que Flor do Dia e Pai Francisco são as novas atrações do circo que chegou à cidade. Seja pela aparência exótica, seja pela música que cantam ou pelas adivinhas que dizem, os dois juntos são parceiros e levam a alegria para os moradores daquela pequena cidade. O corpo da menina da perna de pau é coberto com um vestido rodado e bordado. Na parte superior do vestido, uma estrela, marca do circo no qual trabalha, ganha destaque. Este desenho também é recorrente no chapéu de Pai Francisco. A roupa de Pai Francisco salta aos olhos das crianças, com uma capa em retalhos quadriculados bem colorida, tornando-o singular naquele lugar. Uma peruca com cabelo apenas do lado e um nariz que não passa despercebido. Quem o vê, de longe, o reconhece como "a atração". Entre olhares curiosos, sorrisos, movimentos, danças, silêncios, perguntas, respostas, aplausos e emoção, Pai Francisco e Flor do Dia percorrem as ruelas da cidade conclamando as pessoas para acordarem para a sua dimensão criança. A proposta era que todos pudessem retomar a infância adormecida dentro de cada um. Caminhando em busca das infâncias perdidas nas esquinas das ruas, nas calçadas, cada pedestre ou dona de casa que ouve a cantiga busca no seu interior, em suas lembranças, a tentativa de compreender as adivinhas. Nessa caminhada, Pai Francisco e Flor do Dia atraem a todos. As crianças que os seguem e os adultos que os ouvem da janela de suas casas também são tocados pela alegria dos artistas. Crianças e adultos têm olhos que vibram; o sorriso invade o rosto e o coração bate mais rápido, acompanhando com atenção os movimentos, as cantigas e as adivinhas feitas por eles. O livro apresenta a união de várias linguagens, possibilidade que a literatura infantil oferece, construindo cenários onde leitores mais atentos podem perceber sons, cores, movimentos, cheiros, dando vida à narrativa. É a fusão das linguagens do circo, da música, da poesia, da cultura popular, da ilustração, da palavra escrita que busca construir significados para a vida de cada leitor. A relação da música, das adivinhas, dos artistas com o ambiente e as pessoas da cidade permite a interação entre adultos e crianças de todas as idades, expressas nas relações sociais e afetivas diversas. As reações são inusitadas e espontâneas, a participação é grande e de diferentes formas. São palavras, aplausos, sorrisos, movimentos corporais, olhares e até mesmo o acompanhamento dos artistas durante todo o trajeto pela cidade. Construir cenários narrando histórias Ao fazer uma análise das imagens do livro Brincando Adivinhas, me certifico cada vez mais de que o livro de literatura infantil é uma obra de arte, merecendo, portanto, cuidados para a percepção de sua beleza, construção e elaboração. Ostrower (1987, p.23) entende que "o conteúdo expressivo das obras de arte não se articula de maneira verbal, através das palavras, e sim, de maneira formal, através das formas. São sempre as formas que se tornam expressivas". A articulação das leituras do texto escrito e das imagens promove a percepção mais ampla da literatura infantil, constituindo um aspecto fundamental para sua compreensão. Anexo 2- Flor do Dia e Pai Francisco com as crianças A ilustração é um dado importante nesse livro. Em página inteira, elas ajudam a aumentar as figuras tornando-as mais vivas e cheias de cor. Bachelard (1988, p.112) considera que "a cor é a maior das seduções sensíveis, um convite certo ao devaneio, às viagens para regiões anteriores à linguagem". Para o autor, o fato de reviver um sonho, rememorar o passado, revela uma visão primordialmente colorida do universo, pois a "infância vê o Mundo Ilustrado, o Mundo com suas cores primeiras, suas cores verdadeiras". Nesse livro, as cores são um convite para a busca da memória, trazendo, assim, a realidade. Cores claras inundam de luz e vida a cidade e as páginas do livro em tons alegres e vibrantes como as brincadeiras das crianças. Assim, a análise mais atenta das imagens do livro contribui para uma compreensão mais ampla dos significados da relação entre ilustração/texto. As imagens do livro merecem destaque, uma vez que elas falam de um tempo, de saudades e memórias que, de certa forma, unem o cotidiano e a infância de muitos leitores. Nesse sentido, a imagem não é uma simples reprodução de um cenário, mas serve de suporte para a memória. Maffesoli (1995, p.117) entende que [...] a materialidade de um lugar é atravessada por um conjunto de imagens coletivas, que lhe dá sentido [...] o espaço e a imagem confortam-se um ao outro, aliás, menos por si mesmos, mas para suscitar, na dinâmica que assim eles criam, esse estar - junto que é a vida em sociedade. A referência ao universo cotidiano, comum em uma cidade do interior, pequena e pacata, completa a narrativa do livro e ajuda a compor o cenário para a narrativa. A vendedora de maçãs meladas está na rua, e em volta dela uma porção de crianças a ouvem. Crianças com bola na mão, sem camisa, descalças; outras, calçadas, bem vestidas e um cachorro. As crianças são livres, brincam de bola, correm pelas ruas em grupos ou sozinhas. Apesar de o ilustrador ser econômico nos traços dos rostos, ainda assim é possível perceber a expressão em relação ao que está acontecendo; expressão de alegria, de curiosidade e expectativa. Os objetos, casas, plantas, animais, adultos e crianças guardam relação com os modelos naturais, tanto na proporção do tamanho quanto na forma. Os personagens têm as pernas e os braços finos e pontiagudos ou com um afilamento nas extremidades. Essa é uma característica da ilustradora, uma vez que todas as crianças e adultos têm os mesmos traços, detalhes do desenho que dão unidade ao conjunto. A cor dos cabelos e o modo de vestir das crianças e adultos buscam referência na realidade, tornando possível, através deles, a identificação da raça, profissão, nível social. A presença de alguns animais, colocados no cenário pelo ilustrador, aproxima o texto e a realidade da cidade dos leitores. Exemplo: um gato no telhado, um passarinho em cima da casa, o cavalo, o burro, o leitãozinho nos braços do homem e o cachorro que atento parece assistir a apresentação de Pai Francisco. Todos os animais mostrados durante a narrativa chamam a atenção das crianças e servem para caracterizar o espaço no qual estão acontecendo os fatos. Zilberman (2003) enriquece essa idéia, ao afirmar que o cenário reforça a noção de uma corporificação mais nítida da utopia concebida pela autora. Por essas sugestões é possível identificar uma cidade pequena, do interior, próxima à zona rural. A cidade sem calçamento e trânsito de veículos, pois apenas é possível ver, no meio da rua e ao fundo, uma "charrete" puxada por cavalo e próxima da calçada e uma bicicleta, em modelo antigo. Na calçada, uma mulher com o bebê no colo, uma moradora voltando da padaria, um casal que caminha, além de casas pequenas, simples e a barbearia, cuja placa tem uma tesoura simbolizando o serviço que ali é prestado. Se as imagens do livro permitem a compreensão do espaço e as características dos personagens, o texto complementa as informações entremeando as brincadeiras com a linguagem, as adivinhas, com a possibilidade da descoberta. Lendo imagens e decifrando adivinhas O livro Brincando Adivinhas apresenta uma característica que permite à criança fazer a decifração das adivinhas através da ilustração. A leitura e a compreensão se processam não somente através da decodificação do código gráfico, mas na busca pela solução da adivinha, cuja resposta pode ser encontrada em algum aspecto da ilustração. As pistas das imagens podem conduzir o leitor, permitindo uma busca pelas experiências de mundo das crianças. Anexo 3- Flor do Dia tocando e cantando Pode ser frio e ser quente. Pode ser fraco e ser forte. Não sabe viver parado. Assoprar é a sua sorte. Pela observação mais atenta da imagem é possível perceber que o cabelo de Flor do Dia e a fita do pandeiro estão em movimento. As pessoas com a mão na cabeça seguram o boné, a boina ou o chapéu sinalizando que ele poderá cair e, ainda, ao fundo árvores, com a copa inclinada, indicam a resposta da adivinha. Essa forma instigante de apresentar a adivinha aumenta a curiosidade, permitindo que as crianças descubram as respostas através das imagens. Procurá-las é um grande prazer e transforma o livro num verdadeiro brinquedo. Esta outra imagem também ressalta a característica da adivinha, propiciando a descoberta do leitor ou leitora. Anexo 4- A cozinheira e a resposta da adivinha Na água nasci, na água me criei. Se na água me jogarem Socorro!!! Morrerei. Nessa adivinha também é possível descobrir a resposta por meio das dicas da ilustração. Mas somente um leitor atento e que tenha noção de adivinhas é que perceberá a resposta. Pai Francisco e Flor do Dia, andando pelas ruas da cidade, param em frente a uma casa onde uma mulher está temperando a comida. A ação da mulher sugere a resposta. O livro apresenta uma característica que é comum aos contadores de história, de "causos" populares, que, ao fazer as adivinhas, não se preocupam com a resposta que o adivinhador dá. Para ele, interessa as tentativas, a brincadeira com as rimas e sonoridade das perguntas, o jogo e associação que as adivinhas permitem. Ele continua perguntando, mesmo que os ouvintes não consigam decifrar. As adivinhas nesse momento é um desafio, e o que as tornam provocativas é a dificuldade que os ouvintes encontram para responder. Por isso, os perguntadores as dificultam cada vez mais, criando uma lógica que só existe no universo da cultura popular. Outro aspecto que merece destaque é a constatação de que o livro não traz as respostas para as adivinhas. Às vezes, as sugere, e, para encontrá-las, é necessária a leitura das imagens. Quando as crianças começam a responder, Pai Francisco ou Flor do Dia iniciam uma música ou uma nova adivinha criando mais expectativa. Ligando uma pergunta à outra, a moça não perde tempo explicando ou conferindo as respostas. O que importa é a alegria e a participação de todos. E a literatura infantil? É importante destacar que o primeiro contato da criança com o mundo, os textos e a leitura acontece mediado pela voz do adulto. A audição de histórias, cantigas e brincadeiras com a linguagem aproxima as crianças das rimas e da melodia das palavras. Por sua vez, a recepção das imagens é um outro dado relevante que a criança é estimulada desde cedo a perceber. As cores e formas são apresentadas às crianças para que percebam o mundo e a cultura na qual estão inseridas. O livro ou a idéia de leitura, a partir do objeto livro, só mais tarde é apresentado às crianças pela escola. Sem dúvida, a intermediação da escola nos processos de leitura é determinante, uma vez que à medida que cresce, a criança se liberta do mediador e pode, ela mesma, ler com autonomia, escolhendo textos e livros. Assim, o reconhecimento da escola como espaço no qual as crianças entram em contato com uma diversidade de textos, linguagens e local para troca de experiências e brincadeiras é notável nas últimas décadas. A escola, hoje, é marcada também como espaço de encontro das crianças, uma vez que na sociedade contemporânea assistimos a diminuição dos espaços para o brincar coletivo. A redução de espaços sociais para brincadeiras é facilmente percebido nas grandes e médias cidades. Por outro lado, o medo, a violência, a diminuição das famílias e a consequente mudança nas relações sociais têm sido determinantes para a restrição das brincadeiras coletivas e livres. Nesse cenário, a escola é um dos espaços privilegiados para a ludicidade das brincadeiras da tradição popular, principalmente adivinhas. Desse modo, a literatura infantil vem se destacando, sobretudo por sua presença na sala de aula, nas últimas décadas, permitindo o seu acesso a um número maior de crianças na escola. Em tal perspectiva, o livro de literatura infantil se converte em instrumento de manutenção e divulgação de formas de brincar, como fornecedora de uma linguagem própria, a literária. A literatura infantil possibilita a inserção das crianças às brincadeiras populares de outros tempos sem abdicar se sua natureza literária, procurando assimilar princípios da arte, da imagem, do circo, da poesia, como o destacado no livro analisado. Kishimoto (2002, p.148) reitera essa idéia ao afirmar que "o brincar também contribui para a aprendizagem da linguagem. A utilização combinatória da linguagem funciona como instrumento de pensamento e ação". As brincadeiras tradicionais, como as adivinhas, fazem parte do patrimônio lúdico-cultural infantil e manifestam os valores, costumes, formas e pensamentos aprendidos na oralidade, que a literatura infantil traz para suas páginas, "contribuindo para preservar e perpetuar modelos de sentir, de pensar ou de agir tradicionais", como defende Fernandes (1979, p. 25). Por sua vez, a literatura infantil, por iniciar a criança no mundo literário, deve ser utilizada como instrumento para a sensibilização e contato com a arte, para a expansão do interesse de analisar o mundo e a cultura, sendo encarada, sempre, como portadora de uma pluralidade cultural, pois a mesma tem a capacidade de alegrar, divertir, emocionar as crianças, e ao mesmo tempo, apresentar de maneira lúdica as brincadeiras com a linguagem. Reitero que a presença da literatura infantil na sala de aula poderá se tornar referência para o professor, ao trazer para junto das crianças a ampliação das brincadeiras, o convívio com a linguagem literária e a criatividade dos autores. Por conseguinte, o encontro das crianças com as adivinhas nos livros de literatura infantil, constitui oportunidade para ampliar, transformar e enriquecer o referencial de brincadeiras trazido da sua experiência de vida. Penso que a literatura infantil poderá ainda contribuir para estimular as crianças a questionarem os fenômenos artísticos, colocando-as em situações que lhes permitam pensar, criticar e analisar as interações sociais, estimulando-as a questionarem os modos de brincar na sociedade atual, bem como o espaço e tempo oferecidos para as brincadeiras. Desse modo, considero que a literatura infantil apresenta-se não só como veículo de manifestação de cultura, mas também de sua divulgação, contribuindo para entreter, divertir, desenvolver a linguagem, a criatividade, a imaginação, ao mesmo tempo em que promove a cultura e contribui para o crescimento da arte abrindo caminhos para uma visão crítica sobre o espaço e tempo das brincadeiras na sociedade contemporânea. REFERÊNCIAS BACHELARD, Gaston. A poética do devaneio. São Paulo: Martins Fontes, 1988. BROUGÈRE, Gilles. A criança e a cultura lúdica. In: In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O brincar e suas teorias. São Paulo: Pioneira, 2002. FERNANDES, Florestan. Folclore e mudança social na cidade de São Paulo. Petrópolis: Vozes, 1979. GOMES, Lenice. Brincando adivinhas. São Paulo: Paulinas, 2003. Ilust. Elizabeth Teixeira. KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O brincar e suas teorias. São Paulo: Pioneira, 2002. LAJOLO, Marisa. Infância de papel e tinta. In: FREITAS, Marcos Cezar de. História social da infância no Brasil. São Paulo: Cortez, 2003. MAFESOLLI, Michel. A contemplação do mundo. Porto Alegre: Artes e ofícios, 1995. OSTROWER, Fayga. Universo da arte. Rio de Janeiro: Campus, 1987. ZILBERMAN, Regina. A literatura infantil na escola. São Paulo: Global, 2003. Anexo 2- A vendedora de maçãs ANEXOS Anexo 1- Flor do Dia e Pai Francisco com as crianças Anexo 3- Flor do Dia tocando e cantando Anexo 4- A cozinheira e a resposta da adivinha