ESTIMATIVAS OPERACIONAIS DE EVAPOTRANSPIRAÇÃO REGIONAL
Benedita Celia Marcelino1 & Paulo Rodolfo Leopoldo2
1Docente do Departamento de Meteorologia – FMET/UFPel – Pelotas/RS - Brasil.
2Docente do Departamento de Engenharia Rural – FCA/UNESP – Botucatu/SP – Brasil.
ABSTRACT
The evapotranspiration of a region is limited by the water availability, and the temperature variation
and umidity of the overpassing air have influence on the potential evapotranspiration. Such
interactions are taken into account in the MORTON’S complementary relation model (1983a). The
model provides the real evapotranspiration is estimated its effects on the temperature and air umidity
going around the region, that are the data used in the potential evapotranspiration estimates without
coefficient local calibration. The Morton’s model was applied in this research trying only to
investigate its validity to regional evapotranspiration estimate in regions different from São Paulo. The
routine climatological observations needed to estimate areal evapotranspiration were temperature, air
humidity, insolation, latitude, altitude and long-term average annual precipitation. The complementary
relation model showed quite promissing results in the different regions of São Paulo.
1. INTRODUÇÃO
Um grande número de fórmulas tem sido proposto para se estimar evaporação e
evapotranspiração a várias superfícies ,mas esses modelos são derivados de dados
micrometeorológicos e fornecem somente valores pontuais de evapotranspiração. Além disso, não
levam em consideração as condições atmosféricas de larga escala, que influem na evapotranspiração
do ambiente. As condições de temperatura e umidade do ar, que está ultrapassando uma região, têm
importância fundamental na evaporação do solo e transpiração das plantas. Quando a
evapotranspiração de uma região é limitada pela disponibilidade de umidade, as alterações que
ocorrem na temperatura e umidade do ar que está ultrapassando refletem na evapotranspiração
potencial. Tais interações foram levadas em conta por BOUCHET (1963), formulando a hipótese, que,
variações na evapotranspiração potencial e regional, devido à variações no fornecimento de umidade
regional, são complementares. A idéia do caráter complementar de evapotranspiração potencial e
regional, iniciada por Bouchet, resultou em uma série de trabalhos por MORTON (1965, 1969, 1971,
1975, 1983a). O conceito de relação complementar foi, progressivamente, através desses trabalhos,
formulado em um modelo, o qual estima evapotranspiração regional, um produto de processos
complexos climáticos, de vegetação e umidade do solo, a partir de seus efeitos sobre as observações
climatológicas. A nova formulação do modelo fornece estimativas operacionais de evapotranspiração
regional a partir de observações climatológicas de rotina, sem otimização local de coeficientes.
2. METODOLOGIA
Para a realização desta pesquisa foram selecionadas vinte estações hidrometeorológicas. A
escolha dessas estações deve-se ao fato das séries de dados não apresentarem nenhuma falha de dados,
e também , porque esses locais representam regiões distintas do Estado de São Paulo. As estações
pertencem às redes de estações de superfícies do DAEE - Departamento de Águas e Energia Elétrica e CESP - Companhia Energética do Estado de São Paulo. O período escolhido para a pesquisa foi de
1980 à 1993, devido a disponibilidade no IPMET - Instituto de Pesquisas Meteorológicas - e melhor
qualidade dos dados. São dados diários de temperatura do ar (ºC), temperaturas do ponto de orvalho
(ºC), insolação (horas/dia), pressão atmosférica média diária (mb), precipitação diária (mm) e médias
anuais de precipitação para um período de 30 anos.
Para estimar a evapotranspiração potencial e real de área foi usado o programa computacional
WREVAP, desenvolvido por MORTON et al (1985). O programa WREVAP é fundamentado no
conceito de uma relação complementar entre evapotranspiração potencial e real, e tem três opções:
modelo CRAE (relação complementar de evapotranspiração de área), modelo CRWE (relação
complementar de evaporação em superfície saturada) e modelo CRLE (relação complementar de
evaporação em lago). A opção do programa WREVAP utilizada nesta pesquisa foi o modelo CRAE.
Nesta pesquisa os dados de entrada no programa, para o modelo CRAE, foram médias mensais de
temperatura do ar (ºC), temperatura do ponto de orvalho (ºC), insolação (horas/dia), altitude da estação
(m), latitude da estação (graus) e média anual de precipitação (período 30 anos). As saídas foram:
evapotranspiração potencial mensal e evapotranspiração real de área (regional) mensal em milímetros,
e radiação líquida mensal em milímetros de evaporação equivalente. Estes resultados foram obtidos
para as 20 estações meteorológicas selecionadas, para o período de 14 anos
3. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS E CONCLUSÕES
O Modelo Relação Complementar de MORTON (1983 a) de estimativa de evapotranspiração
real de área foi aplicado às diferentes regiões do Estado de São Paulo, utilizando dados de 20 estações
meteorológicas distribuídas pelo Estado. Nesta pesquisa as estimativas de evapotranspiração potencial
(ETP), evapotranspiração real de área (ETR) e radiação líquida (RL) pelo modelo de Morton, e
precipitação (P), utilizadas, foram de totais médios anuais do período de dados selecionado.
O Estado de São Paulo, situado na região tropical do Hemisfério Sul, apresenta uma
diversidade climática bastante significativa. Na costa do Estado, uma zona estreita de clima tropical
quente e úmido, que se confunde com o clima das partes mais elevadas das serras da Mantiqueira
(Campos do Jordão) e do Mar, do tipo temperado chuvoso, e que se estende, também, ao Planalto
Paulista. Na parte ocidental do Estado, nas fronteiras com Minas Gerais e Mato Grosso do Sul,
predomina um clima de savanas (SCHRÖDER, 1956), e na maior parte da zona de declive do planalto,
isto é, na principal zona agrícola, predomina um clima de inverno seco. Devido a esta diversidade de
climas, as estações foram agrupadas para as diferentes regiões, afim de facilitar a análise dos
resultados obtidos. A distribuição regional das médias anuais para o período selecionado, de
precipitação (P), juntamente com a evapotranspiração potencial (ETP), evapotranspiração real de área
(ETR) e radiação líquida (RL) pelo modelo de Morton, é apresentada nas Figuras. 1, 2, 3 e 4. A
distribuição de precipitação (Figura. 1), mostra que ela é mais abundante do lado leste e nordeste das
regiões das serras da Mantiqueira e do Mar. As maiores precipitações anuais médias ocorrem em
Biritiba Mirim (estação da região da Serra do Mar), Campos do Jordão e Caconde (Serra da
Mantiqueira). O valor médio da precipitação encontrado nestes três locais é de cerca de l850 mm,
neste período de dados. Depois têm as estações de Mococa e Mogi-guaçu, com um valor médio de
cerca de 1430 mm.
Na região mais central do Planalto Paulista, e na região próxima à fronteira com o Estado do
Paraná, foram selecionadas as seguintes estações meteorológicas: Pradópolis, Ibitinga, Barra Bonita,
Capivara, Botucatu, Piraju e Salto Grande. A distribuição de precipitação anual média nesses locais é
razoavelmente uniforme (Figura. 1), atingindo um valor médio de cerca de 1440 mm, sendo que as
estações de Botucatu e Piraju apresentam valores anuais mais altos, localizadas, respectivamente, na
extensa Serra de Botucatu e, aproximadamente na mesma latitude, próxima ao limite do Estado do
Paraná na Serra da Fartura.
Na região noroeste do Estado, as estações de Água Vermelha, Votuporanga, Ilha Solteira,
Urubupunga e Promissão, e na região sudoeste, próximo a fronteira com o Paraná, a estação de Pontal,
apresentam precipitações anuais médias menores, atingindo um valor médio para a região de cerca de
1280 mm. A área mais chuvosa se estende num sentido noroeste-sudeste, na parte leste do Estado,
onde a precipitação anual média chega cerca de 1850 mm. De um modo geral a precipitação diminui
lentamente para oeste e de forma bastante uniforme, chegando no extremo oeste com um valor inferior
a 1200 mm (Figura. 1). Embora a série de dados seja de poucos anos, para uma climatologia da
precipitação para a região, os resultados obtidos estão consistentes com os trabalhos de SCHRÖDER
(1956), SUGAHARA (1991) e FUNARI (1983).
A distribuição da radiação líquida anual média para o Estado de São Paulo (Figura. 2) mostra
que a energia radiante líquida aumenta de leste para oeste. O menor valor é observado em Biritiba
Mirim, e os valores mais altos à noroeste do Estado, evidenciando-se um gradiente bastante
significativo no sentido sudeste-noroeste. Tais parâmetros são analisados, porque, o conhecimento da
distribuição regional da precipitação anual média e da radiação líquida anual média, é de grande
importância na análise, uma vez que a evapotranspiração potencial depende da disponibilidade de
energia radiante líquida, uma função do fornecimento de energia radiante líquida disponível, e a
evapotranspiração real de área depende da disponibilidade de água, uma função da precipitação e/ou
irrigação.
A distribuição regional da evapotranspiração potencial (ETP), apresentada na Figura 3, mostra que a
ETP tem uma distribuição regional semelhante à radiação líquida, existindo um gradiente de leste para
oeste, atingindo os maiores valores no extremo noroeste, e menor valor na região de Biritiba Mirim,
devido à nebulosidade que é um fator muito importante na variação de insolação. Porque, de um modo
geral, a insolação é menor onde chove mais, devido à alta nebulosidade. Na região leste do Estado,
segundo FUNARI (1983), a influência da orografia adicionada à existência da nebulosidade de origem
frontal é marcante, e responsável pela insolação baixa. Já, do lado oeste, em virtude da baixa
nebulosidade, a insolação é mais elevada. No caso da evapotranspiração real de área (ETR) anual
média, apresentada na Figura. 4, não se observa um gradiente significativo como nos demais
parâmetros. Mas, no sentido sudeste e noroeste, de Botucatu a Promissão, existe um aumento de ETR.
Nas regiões de Paraibuna, Piraju, Pontal e Promissão são observados os valores mais altos de ETR. A
distribuição regional de ETR não apresenta um gradiente significativo para leste, onde ocorre grande
disponibilidade de água devido as precipitações abundantes, mesmo no inverno, porque a radiação
líquida diminui com a nebulosidade quase sempre presente e o ar, por causa dos ventos úmidos, está
sempre próximo à saturação (MARCELINO, 1997). De um modo geral, observou-se que ETR tem
distribuição regional razoavelmente uniforme, principalmente na região mais central do planalto. Isto
está coerente com o modelo teórico de Morton, o qual fornece estimativas de evapotranspiração de
uma grande área, obtida através de suas interações com a temperatura e umidade do ar circulando, nas
condições meteorológicas reinantes.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOUCHET, R.J. Evapotranspiration reèlle et potentielle, signification climàtique. Int.Assoc. Sci.
Hydrol., Gentbrugge, Belgium, publ. v.62, p. 134-42, 1963.
FUNARI, F.L. Insolação, radiação solar global e radiação líquida no Brasil. São Paulo, 1983, 126p.
Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo)
MARCELINO, B.C. Estimativas de Evapotranspiração Regional pelo Modelo de Morton e Aplicação
no Cálculo de Balanço Hídrico, para o Estado de São Paulo, Botucatu, 1997. 129p., Tese
(Doutorado em Agronomia), Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual
Paulista.
MORTON, F.I. Potential evaporation and river basin evaporation. Journal Hydraul. Div., Proc. Am.
Soc. Civ. Eng., v.91, n.HY6, p.67-97, 1965.
MORTON, F.I. Potential evaporation as a manifestation of regional evaporation. Water Resources
Research, v.5, n.6, p.1244-55, 1969.
MORTON, F.I. Catchment evaporation and potential evaporation - further development of a
climatologic relationship. Journal of Hydrology, v.12, p.81-9, 1971.
MORTON, F.I. Estimating Evaporation and Transpiration from Climatological Observations. Journal
of Applied Meteorology, v.14, n.4, p.488-97, 1975.
MORTON, F.I. Operational estimatives of areal evapotranspiration and their significance to the
science and practice of hydrology. Journal of Hydrology, v.66, p.1-76, 1983a.
MORTON, F.I., RICARD, F., FOGARASI, S. Operational estimates of areal evapotranspiration and
lake evaporation - Program WREVAP. National Hydrology Research Institute, Inlan Waters
Directorate, Ottawa, Canada, NHRI PAPER, n. 24, 1985.
SCHRÖDER, R. Distribuição e Curso Anual das Precipitações no Estado de São Paulo.
BRAGANTIA-Boletim Técnico do Instituto Agronômico do Estado de São Paulo, v.15, n.18,
p.193-49, Agosto,1956.
SUGAHARA, S. Flutuações interanuais, sazonais e intrasazonais da precipitação no Estado de São
Paulo. São Paulo, 1991. 145p., Tese, (Doutorado em Meteorologia), Instituto Astronômico e
Geofísico da Universidade de São Paulo).
Figura 1 - Médias anuais de precipitação, em mm, para o período de 1980 a 1993(MARCELINO,.1997)
Figura 2 - Médias anuais de radiação líquida, em mm de evaporação equivalente, para o período de 1980 a 1993
(MARCELINO, 1997).
Figura 3 - Médias anuais de evapotranspiração potencial, em mm, para o período de 1980 a 1993
(MARCELINO,1997).
Figura 4 - Médias anuais de evapotranspiração real de área, em mm, para o período de 1980 a 1993
(MARCELINO, 1997).
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