Anuário da Produção
Acadêmica Docente
Vol. III, Nº. 5, Ano 2009
Inês Regina Waitz
Centro Universitário Anhanguera
unidade Pirassununga
[email protected]
Magda Patrícia C. Arantes
Centro Universitário Anhanguera
unidade Leme
[email protected]
POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ENSINO
SUPERIOR: O PROCESSO DE DEMOCRATIZAÇÃO
DO ACESSO1
RESUMO
Este artigo apresenta a trajetória do ensino superior no Brasil no período
iniciado após o “estado novo” até a década de 90, focalizando as principais
políticas públicas adotadas nesse período. Assim, o trabalho resgata o
processo de democratização do acesso ao ensino superior, a influência do
Banco Mundial nesse processo e as mudanças ocorridas após a aprovação da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
Palavras-Chave: ensino superior; políticas públicas; reformas; legislação.
ABSTRACT
This article presents the history of higher education in Brazil in the period
beginning after the “new state” until the 90s, focusing on major public
policies adopted during this period. Thus, the study review the process of
democratizing access to higher education, the influence of the World Bank in
this process and the changes following the adoption of the Law of Directives
and Bases of Education.
Keywords: higher education; public policies; reforms; legislation.
Anhanguera Educacional S.A.
Correspondência/Contato
Alameda Maria Tereza, 2000
Valinhos, São Paulo
CEP 13.278-181
[email protected]
Coordenação
Instituto de Pesquisas Aplicadas e
Desenvolvimento Educacional - IPADE
Informe Técnico
Recebido em: 22/08/2009
Avaliado em: 01/02/2010
Publicação: 21 de abril de 2010
1 Material da 2ª. aula da Disciplina Legislação e Políticas do Ensino Superior,
ministrada no Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Didática e Metodologia do
Ensino Superior – Programa Permanente de Capacitação Docente. Valinhos, SP:
Anhanguera Educacional, 2009.
251
252
Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
1.
INTRODUÇÃO
Em decorrência da industrialização e urbanização, surge, na década de 30, pela primeira
vez no Brasil uma ação planejada visando à organização nacional da educação. As
Reformas Educacionais, surgidas na década de 30, como a do “Manifesto aos pioneiros da
Educação Nova”, iniciaram uma luta ideológica que culminou em um projeto de Lei das
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1948. Conhecer as medidas educacionais
adotadas desde o início do século é fundamental para a compreensão da estrutura que se
tem nos dias atuais.
Com relação ao ensino superior, destacamos a reforma assinada de Francisco
Campos, titular dos Ministérios da Educação e Saúde, representada no Estatuto das
Universidades Brasileiras (11/04/1931), que tem como modelo a Universidade do Rio de
Janeiro. São as primeiras diretrizes direcionadas à educação superior que abrem as
perspectivas para se pensar em Universidade no Brasil2. Merece destaque nesse período,
pelo grau de diferenciação, a Universidade de São Paulo, criada em 1934; a Universidade
do Distrito Federal, de estrutura arrojada, criada, em 1935, por Anísio Teixeira, Secretário
da Educação, mas que teve curta duração, já que foi extinta, em 1939, ao incorporar-se à
Universidade do Brasil.
Devido ao processo de industrialização, o ensino profissionalizante foi foco dos
governantes nesse período. A partir das “Leis Orgânicas” de Gustavo Capanema,
ministro do Estado Novo, cria-se o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)
e Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC). Nessa época, também é
regulamentado o curso de formação de professores, com diretrizes nacionais, trazendo
consigo certo otimismo referente à valorização da carreira docente, que de fato não se
concretiza.
Após 1945, a legislação universitária reflete o processo de redemocratização do
país, apesar de a organização do país permanecer a mesma: ensino médio dividido em
ensino propedêutico (para as elites) e ensino profissional (para a classe trabalhadora).
Dessa forma, de maneira discriminatória, já se definia quem seria conduzido ao ensino
superior.
Nesse trabalho, busca-se olhar a trajetória do ensino superior, a partir da época
denominada pós “estado novo” até a década de 90, apontando as principais políticas
públicas adotadas. Esse resgate proporcionará uma reflexão sobre o processo de
2
O Decreto 19.850 cria o Conselho Nacional de Educação, o Decreto 19.851 contém normas gerais para a organização das
universidades, e o Decreto 19.852 legisla especificamente para a Universidade do Rio de janeiro.
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democratização do acesso ao ensino superior, a influência do Banco Mundial nesse
processo, e as mudanças ocorridas após a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação.
2.
O CAMINHO PERCORRIDO ATÉ A DEMOCRATIZAÇÃO PÓS-VARGAS
Segundo Guiraldelli Junior (2008), o período que se seguiu ao “Estado Novo” conviveu
com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e com certa organização do ensino
herdada pelo autoritarismo deixado pelo regime ditatorial de Vargas.
O período que se inicia em 1945 reflete o clima de afirmação democrática que
invadiu o mundo no ambiente do pós- guerra. Nesse contexto, a Constituição de 1946,
promulgada durante o governo Dutra, possuía os ideais de igualdade, liberdade e
solidariedade e proclamava a educação como direito de todos, além de dar competência à
União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional. Porém, a organização
educacional permaneceu a mesma e a legislação manteve o capítulo da educação e da
cultura referido na Constituição de 1934:
•
ensino primário para todos e gratuito nas escolas públicas;
•
obrigatoriedade de oferta do ensino primário gratuito por parte de
empresas com mais de cem empregados;
•
ingresso no magistério através de concurso de provas e títulos;
•
responsabilidade educativa compartilhada pela família e pela escola,
podendo haver oferta pública e privada em todos os níveis de ensino;
•
oferta obrigatória de ensino religioso, embora fosse facultativa para os
alunos.
Tal conjuntura propiciou a mudança nos canais de ascensão social. Até a década
de 1950, a ascensão ocorria através da “reprodução do pequeno capital” e/ou abertura de
um negócio. Após essa data, abrem-se canais no “topo das burocracias públicas e
privadas”, onde diplomas escolares passam a constituir critério para a posse do cargo.
Assim, segundo Stephanou e Bastos (2006, p. 312), os cursos superiores passam a ser
buscados como estratégia de ascensão social.
Nessa época ocorre a federalização de muitas universidades estaduais, com
exceção da USP, que permanece estadual. A “federalização” foi responsável pela
ampliação do ensino superior gratuito e pela criação das universidades federais que hoje
existem no país. Inclusive no segmento militar, com a criação do Instituto Tecnológico de
Aeronáutica (ITA) em 1947, que significou uma inovação acadêmica, seguindo os padrões
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Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
dos EUA. O modelo do ITA influenciou na modernização do ensino superior no Brasil,
principalmente na criação da Universidade de Brasília.
Também merecem destaque: a Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(1948), que após dois anos passa a chamar-se Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul, que, segundo Morosini (2005), foi a primeira universidade marista3 no
mundo; e a Universidade de Brasília (UnB)4 que concretiza o projeto de universidade
como instituição de pesquisa e centro cultural, concebido por Darcy Ribeiro e sintetizado
em seu livro Universidade necessária. Essa última seria uma universidade que objetivava
manter junto ao humanismo e a livre criação cultural a ciência e a tecnologia modernas e
manter junto ao governo uma reserva de especialistas altamente qualificados. A
Universidade de Brasília foi criada com o intuito de atender à necessidade de formar para
burocracia governamental de especialistas bem qualificados, além de servir como modelo,
abrangendo mais áreas do conhecimento que pudessem influenciar nos rumos das
universidades do país.
Devido à necessidade de modernização das universidades e o estímulo à
formação do docente-pesquisador foram criadas neste período: a Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC) e as agências governamentais Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (Capes).
Com a volta de Getúlio ao poder (1950-1954), dá-se a federalização de muitas
universidades estaduais, medida adotada para que o Conselho Federal de educação
exercesse maior controle sobre as instituições. Outras medidas foram adotadas para a
equivalência dos cursos profissionais a secundário, para que fosse possível a progressão
no sistema educacional, sendo tais medidas ampliadas na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB) de 1961. Tais medidas foram adotadas devido ao número de
trabalhadores que aumentava consideravelmente, porém sem qualificação.
Contudo, o período foi promissor para a expansão do ensino médio e,
consequentemente, o aumento de demanda pelo ensino superior.
3
Religioso da Congregação dos Maristas, consagrada ao ensino, e fundada, em 1817, por Marcellin Champagnat (17891840), eclesiástico francês.
4 Conforme Sguissardi (2004) a busca de um modelo integrado que garantisse a associação do ensino com a pesquisa e uma
coordenação das atividades de todas as unidades básicas e profissionais, ante o fracasso ou decadência do experimento da
USP, retomou fôlego com a criação da Universidade de Brasília – UnB –, por iniciativa de Darcy Ribeiro. Anísio Teixeira
saudou-a como uma verdadeira “estrutura integrada”, “inovações em início de implantação”, quando a experiência até
então, segundo ele, era “a da escola superior independente e auto-suficiente, governada pela oligarquia de professores e de
tempo parcial”.
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3.
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A DITADURA MILITAR
Desde a redemocratização do país em 1946 é retomada a luta dos “pioneiros da educação
nova”. Em 1948 é apresentado pelo ministro Clemente Mariani um anteprojeto da LDB à
Câmara dos Deputados que segundo Hilsdorf (2002, p.110) era de orientação liberal e
descentralizadora. Por ter sofrido grande oposição, liderada por Gustavo Capanema, que
defendia o controle da educação pela União, o projeto foi “engavetado” e só retomado em
meados da década seguinte com a apresentação de substitutivos por Carlos Lacerda, sob
orientação privatista. O processo de aprovação desta Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDBEN) foi longo e conflituoso, só sendo aprovada (Lei nº. 4.024), em
20 de Dezembro de 1961.
A LDBEN, em linhas gerais, não alterou as disposições relativas às questões do
ensino vigentes. Restringiu-se a delimitar que a fixação dos currículos mínimos e a
duração dos cursos caberiam ao Conselho Federal de Educação – CFE. Assim, a
autonomia obtida pelas Universidades foi limitada pelas atribuições do CFE, que tinha
poder muito grande, decidindo sobre o funcionamento das instituições de ensino
superior, públicas ou privadas e sobre o reconhecimento das universidades, podendo,
inclusive, nestas intervir.
Porém, a LDBEN de 1961 delegou às universidades a normalização sobre
concursos, distribuição dos docentes segundo o tipo de disciplinas e cursos a serem
atendidos, pois entendia que caberia aos estatutos destas universidades desenvolver o
assunto, atendendo às peculiaridades de cada órgão.
Ressalta-se que a política educacional superior constituiu o período de 1945-64
como uma fase de construção do próximo período, que se instaura com a reforma
universitária de 1968. Neste período, atuaram educadores do porte de Anísio Teixeira,
Fernando Azevedo, Lourenço Filho, Carneiro Leão, Paulo Freire, entre outros que
deixaram seus nomes na história da educação por suas realizações.
Com o Golpe militar de 1964, muitos educadores passaram a ser perseguidos em
função de posicionamentos ideológicos. Todas as iniciativas do período anterior foram
desativadas. O Decreto-Lei 477 calou professores e alunos e a bandeira da Reforma
Universitária, defendida pelo Movimento Estudantil foi incorporada pelo Estado, mas de
maneira desvirtuada.
A Ditadura Militar durou 21 anos, do golpe que depôs João Goulart (Jango), de
31 de março de 1964, à eleição indireta de Tancredo Neves e José Sarney, em janeiro de
1985. Em termos educacionais, o período foi marcado pela repressão, privatização do
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Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
ensino, exclusão dos setores mais pobres do ensino elementar de boa qualidade,
institucionalização do ensino profissionalizante na rede pública regular (sem qualquer
arranjo prévio para tal), divulgação de uma pedagogia calcada em técnicas e tentativas
variadas de desmobilização do magistério através de abundante e confusa legislação
educacional. (MELO; SANTOS; ANDRADE, 2009, p.18-19).
A Lei nº. 5.540/68, “Lei da Reforma Universitária”, baseada nos estudos do
Relatório Atcon (Rudolph Atcon, teórico norte-americano) e no Relatório Meira Matos
(coronel da escola superior de Guerra), foi aprovada de cima para baixo. Segundo Aranha
(1996, p.214), essa reforma acabou com a cátedra5, unificou o vestibular que passou a ser
classificatório, aglutinou as faculdades em universidade (para obter uma maior
produtividade com a concentração de recursos), criou o sistema de créditos, permitindo a
matrícula por disciplina, além de, a nomeação dos reitores e diretores de unidade (esta
agora dividida em departamentos) dispensar a necessidade de ser do corpo docente da
universidade, podendo ser qualquer pessoa de prestígio da vida pública ou empresarial.
A reforma também fragmenta as Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras,
resultando na criação das Faculdades ou Centros de Educação, estruturando as
universidades brasileiras em quatro modelos básicos: a) a agregação dos departamentos
em alguns poucos centros; b) a reunião dos departamentos em número maior de
institutos, faculdades ou escolas; c) a ligação dos departamentos diretamente à
administração superior, sem instâncias intermediárias; e d) a superposição dos centros às
faculdades, aos institutos e às escolas. (CUNHA, 2000, p. 182)
As mudanças no ensino superior brasileiro foram muitas e rápidas nos anos 60,
influindo até na localização geográfica das instituições. Enquanto as faculdades públicas,
situadas nos pontos centrais das cidades, foram transferidas para os campi no subúrbio –
com o intuito de apaziguar a militância política dos estudantes; as faculdades particulares
faziam exatamente o inverso. Porém, mesmo com tantas mudanças no ensino superior
brasileiro na década de 60, persiste a seletividade, em decorrência da dualidade do
ensino, onde a elite bem preparada ocupa as vagas nas melhores universidades, restando
às faculdades privadas de baixo nível para os mais pobres.
Dessa forma, a política educacional dos governos militares permitiu a criação dos
Departamentos Universitários e, sobretudo, a criação de uma “Universidade Aberta”.
Preservam-se as poucas e boas Universidades Públicas e escancarava outras instituições
de categoria inferior para a massa estudantil. Os diplomas de ensino superior eram
5
Cargo de professor universitário, titular em determinada disciplina.
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atribuídos, muitas vezes, apenas para “cicatrizar” a dolorosa ferida de uma sociedade
desigual.
Na fase de redemocratização da sociedade brasileira, a modernização do ensino
superior já se processava, modernização essa que foi desvendada pós-68 e se caracteriza
pela busca da formação da força de trabalho de nível universitário com vistas a, de um
lado, atender o capital monopolista e, por outro lado, aplacar os anseios de uma
mobilidade social das camadas médias.
Em maio de 1971, na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, o
Ministro Jarbas Passarinho, do Ministério da Educação e Cultura, convida um grupo
representante de diferentes estâncias educacionais de todo o Brasil a participar do “Curso
de Especialização sobre o ensino de 1º e 2º graus”. A finalidade foi elaborar o ante-projeto
da lei de reforma do ensino, a qual redundou na Lei 5.692/71, também conhecida como
“Reforma Passarinho” – vista como a segunda LDB do Brasil. Essa Lei regulamenta o
ensino de primeiro e segundo graus, que, entre outras determinações, amplia a
obrigatoriedade escolar de quatro anos para oito anos, aglutina o antigo primário com o
ginasial, suprimindo o exame de admissão e criando a escola profissionalizante.
Assim, pode-se dizer que na ditadura militar a educação sofreu duas grandes
reformas, em 1968 e 1971, precedidas por alguns acordos MEC-Usaid (Ministério da
Educação e Cultura e United States Agency for International Development) pelo qual o Brasil
receberia apoio técnico e financeiro para implementar as reformas, atrelando o sistema
educacional brasileiro ao modelo econômico estabelecido pelos americanos.
Assim, os dispositivos legais instaurados pelos militares buscaram por um lado a
continuidade de um processo de modernização do ensino superior calcado na
“racionalidade e eficiência” capitalista e, por outro, manter o controle autoritário das
universidades como forma de resguardar essa tendência modernizante. Jacob (1997)
ressalta que através de decretos, as universidades têm seus estatutos modificados e são
reestruturadas, seguindo o modelo empresarial taylorista, cujas principais finalidades
deveriam ser o rendimento e a eficácia. Foi imposta uma legislação ditatorial que golpeou
os direitos fundamentais da população e instituiu a repressão, usando o aparato policial
militar.
Outro grande impacto para educação em decorrência do Golpe, foi a
reestruturação da representação estudantil, com a “extinção” da UNE, evitando a
organização dos estudantes nacionalmente, “permitindo” a atuação dos Diretórios
Acadêmicos (DA’s) e dos Diretórios Centrais dos Estudantes (DCE’s), mas só no âmbito
dos curso e das universidades, respectivamente, sem exercerem ação política, tidas como
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Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
subversivas. Ainda para manter sobre controle a juventude brasileira são instituídas,
segundo Aranha (1996, p. 211), disciplinas de caráter ideológico e manipulador, no caso
do ensino superior a disciplina EPB (Estudos de Problemas Brasileiros).
Conforme assinala Guazzelli (2004) os governos militares que se instalaram nos
anos de 1960 e 1970 se constituíram na única solução possível para as classes dominantes
da América Latina e para o imperialismo norte-americano. As burguesias renunciaram a
projetos próprios de capitalismo e se conformaram com a posição de sócios menores do
imperialismo. As novas condições ditadas pelo capitalismo internacional não admitiam
concessões e atos de rebeldia. Nesse sentido, optou-se por uma orientação econômica de
acordo com os interesses do capital monopólico norte-americano, sendo que os regimes
militares que se instalaram tiveram alguns compromissos básicos: desnacionalização da
economia; desmantelamento do capitalismo de Estado; acentuada redução das obrigações
do Estado quanto ao bem-estar social; promoção da concentração de capital; orientação
pró-monopólica do setor agrário; e a pauperização da classe operária. Essas mediadas,
guardadas as peculiaridades de cada caso, caracterizaram a nova etapa do capitalismo
latino-americano.
Nota-se que a partir desta década houve um processo de privatização do ensino
no país, caracterizando a educação enquanto um grande negócio, desresponsabilizando o
Estado de seu dever, destinando verba pública para a iniciativa privada. Tal
posicionamento tem continuidade nas décadas seguintes.
4.
A DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO AO ENSINO SUPERIOR E A INFLUÊNCIA DE
CAPITAL ESTRANGEIRO
A ditadura chega ao fim em 1985, mas deixa como legado as condições materiais e
ideológicas necessárias para a continuidade e aprofundamento de nossa inserção
subordinada e dependente no capitalismo internacional em todas as esferas, inclusive a
educação em todos os seus níveis, entre eles o superior. Por outro lado, nunca na história
do país foram abertas tantas universidades particulares como nos anos 80 e 90. Expansão
impulsionada pelas políticas de isenção fiscal para os empresários da educação.
É nesse contexto que nasce a Constituição de 1988, promulgada no dia 5 de
outubro, durante o governo do então presidente José Sarney. A sétima Constituição
adotada no país6, chamada de “Cidadã” por Ulysses Guimarães, assegurou garantias
sociais, como a responsabilidade dos agentes públicos por má administração,
6
As anteriores são as de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967.
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preocupação com direitos individuais, garantia de saúde e de seguridade social a todos os
brasileiros, igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, liberdade de
aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, valorização do
ensino e garantia do padrão de qualidade.
Essa Constituição, por sua natureza, exigiu uma nova lei para a educação, de
autoria do Senador Darcy Ribeiro, com a colaboração do Senador Marco Maciel, dando
origem ao projeto da atual LDB nº 9.394/96. Essa Lei, considerada uma revolução na
educação brasileira, após 25 anos de vigência da 5.692/71, busca o pleno desenvolvimento
da pessoa humana e visa a mobilizar toda a sociedade brasileira acompanhada de uma
clara vontade política de mudar. Na discussão do projeto de lei no Senado, até chegar aos
91 artigos aprovados, defendeu-se ardorosamente o fortalecimento da descentralização e a
democratização do espaço escolar.
O Quadro 1 apresenta, de forma esquematizada, a organização do ensino nas
disposições das outras leis de diretrizes e bases da educação nacional.
Quadro 1 – Leis da educação nacional.
Lei 4.024/61
Duração
Lei 5.692/71
Duração
Lei 9.394/96
• Ensino Primário
4 anos
8 anos
• Educação Básica:
• Ciclo Ginasial do
Ensino Médio
4 anos
• Ensino de
Primeiro Grau
• Ciclo Colegial do
Ensino Médio
4 anos
• Ensino de
Segundo Grau
3 a 4 anos
- Educação
Infantil
Variável
- Ensino
Fundamental
9 anos7
- Ensino Médio
• Ensino Superior
Variável
• Ensino Superior
Variável
Duração
• Educação Superior
3 anos
Variável
Obs.:
Obs.:
Obs.:
A passagem do Primário para o
Ginasial era feita através de uma
prova de acesso: o Exame de
Admissão.
Os ciclos Ginasial e Colegial
eram divididos em Ramos de
Ensino, a saber: Secundário,
Comercial, Industrial, Agrícola,
Norma e outros.
Com a junção dos antigos
Primário e Ginasial,
desapareceu o Exame de
Admissão.
A duração normal do 2º grau era
de 3 anos. Ultrapassava, no
entanto, este limite quando se
tratava de Curso
Profissionalizante.
O Ensino de 1º grau e 2º grau
tinham uma carga horária
mínima anual de 720 horas e o
ano letivo a duração mínima de
180 dias.
Os níveis da educação Escolar
passam a ser dois: educação básica e
educação superior.
A educação de jovens e adultos, a
educação profissional e a educação
especial são modalidades de
educação.
A educação básica, nos níveis
fundamental e médio, passam a ter a
carga horária mínima de 800 horas
anuais, distribuídas em 200 dias
letivos anuais, no mínimo.
7 A Lei 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei no 9.394, dispondo sobre a duração
de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.
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Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
Na perspectiva de implementar tais ajustes proposto pela nova LDB, o então
Ministro da Educação do Governo de FHC, Paulo Renato de Souza, pronunciou-se no ano
de 1996, sobre os três pilares de sua política para reforma Universitária, que trazem em si
as recomendações do Banco Mundial8, sendo eles: 1) Avaliação Institucional e Exame
Nacional de Cursos (Provão); 2) Autonomia Universitária; e 3) Melhoria do Ensino,
através do Programa de Gratificação e estímulo à Docência/GED). Pilares estes que
apontam para a consolidação do projeto neoliberal que tem a sua maior expressão nas
propostas apresentadas para “autonomia universitária”, que em resumo consolidam a
intenção de privatização da universidade pública brasileira, descomprometendo o Estado
com o seu financiamento.
Portanto, há de se perceber que o projeto de reforma do estado brasileiro faz
parte de um projeto mundial do neoliberalismo9, que pretende introduzir nas funções
públicas os valores e critérios do mercado, disseminando a idéia de que todos devem
pagar pelo que recebem. Por outro lado, através dessas reformas, o ensino superior ficou
mais acessível à população como um todo, amenizando a elitização que percorreu toda a
história da educação neste país.
5.
COMO O BANCO MUNDIAL FEZ PARTE DAS REFORMAS EDUCACIONAIS
Criado em 1944, o grupo Banco Mundial, composto por vários organismos (BIRD, FMI e
outros), com vários países-membros, cuja participação nas votações é proporcional ao
aporte de capital, tinha como objetivo realizar empréstimos financeiros aos países em
desenvolvimento para reconstruir as economias devastadas pela guerra e financiar
empresas do setor privado.
Da década de 50 ao início dos anos 70, com o agravamento da dívida dos países
de terceiro mundo, houve um redirecionamento nas políticas do Banco, tendo-se voltado
às políticas de industrialização desses países, a fim de inseri-los no sistema comercial
internacional, com a tese de que a pobreza desapareceria com o crescimento econômico.
Na prática não aconteceu, houve na verdade um maior distanciamento entre países ricos e
pobres, e um aumento das desigualdades sociais, pois os lucros dos investimentos
ficavam concentrados nas mãos de uma minoria. O endividamento dos países do terceiro
mundo cresceu. Com isso, o BM assumiu, junto ao FMI, papel central na renegociação e
8
Os cinco países que definem as políticas do Banco Mundial são: EUA, Japão, Alemanha, França e Reino Unido. Os EUA
ocupam a presidência e possuem a maior parte dos recursos do Banco (SHIROMA et al., 2002)
9 Em geral, refere-se ao conjunto de idéias políticas e econômicas capitalistas que defende a não participação do estado na
economia. De acordo com esta doutrina, deve haver total liberdade de comércio (livre mercado), pois este princípio garante
o crescimento econômico e o desenvolvimento social do país.
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garantia dos pagamentos das dívidas externas, passando a impor condições para obtenção
de novos financiamentos.
As condições impostas para novos financiamentos referiam-se tanto aos projetos
financiados especificamente, quanto a programas de ajuste estrutural, atingindo as
políticas internas dos países, provocando, inclusive, mudanças nas suas legislações. Daí
decorre as muitas mudanças no sistema educacional brasileiro, influenciadas pelo Banco
Mundial.
6.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A aprovação da Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394/1996), em 1996, depois de oito anos
de intenso debate, constituiu-se em um marco histórico importante na educação brasileira,
uma vez que reestruturou a educação escolar, reformulando os diferentes níveis e
modalidades da educação. Além disso, desencadeou um processo de implementação de
políticas e ações educacionais e de ampliação dos mecanismos de acesso aos cursos de
nível superior. Nesse contexto, criou os chamados cursos seqüenciais e os centros
universitários; instituiu a figura das universidades especializadas por campo do saber;
implantou Centros de Educação Tecnológica; substituiu o vestibular por processos
seletivos; flexibilizou os currículos; criou os cursos de tecnologia e os institutos superiores
de educação, entre outras alterações.
Passados dez anos de sua aprovação, a LDB ainda tem enormes desafios para
vencer, entre os quais se pode destacar: a ampliação do acesso e da garantia da
permanência dos estudantes na educação superior e o estabelecimento de mecanismos
efetivos de aferição e controle da qualidade. Porém, embora complementada por
diferentes mecanismos legais (leis, decretos, portarias, resoluções, pareceres), a LDB deve
ser tomada como um marco importante na configuração da educação brasileira.
Nesse sentido, falar sobre a democratização do acesso e a inclusão na educação
superior implica em estabelecer políticas que beneficiam variados atores sociais. A LDB
confirmou tendência de reforço à autonomia das universidades no tocante às formas de
acesso dos concluintes do ensino médio aos cursos superiores. Com essa autonomia,
observa-se que o processo de diversificação dos modelos de seleção nas IES intensifica-se;
entretanto, isso não significa o fim do processo de elitização e de seletividade social.10
10 Segundo dados do INEP, atualmente existem distintas formas de ingresso nas IES. Entre elas destacam-se: vestibular;
Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM); avaliação seriada no ensino médio; teste/prova/avaliação de conhecimentos;
avaliação de dados pessoais/profissionais; entrevista e exame curricular/do histórico escolar.
(http://www.educacaosuperior.inep.gov.br/formas_acesso.stm).
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Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
O que se verifica, portanto, é que a democratização do acesso ao ensino superior,
ocorrida na última década, se deu essencialmente por meio do setor privado. Apesar de os
números parecerem expressivos, a universidade pública está distante de alcançar o
estágio de democratização do acesso no Brasil. Os matriculados em IES públicas são
poucos diante dos números totais da população, sua diversidade cultural e fortes
desigualdades sociais. Esse fato pode justificar as políticas direcionadas para os
segmentos menos favorecidos da sociedade e, sobretudo, para negros, índios e estudantes
provenientes das escolas públicas.
Desse modo, uma questão continua posta, apesar da autonomia de seleção e da
expansão da oferta: como tornar mais democrático o acesso e a permanência na educação
superior?
Em uma sociedade marcada pela heterogeneidade cultural e pela diferença de
classes, o que prevalece é a competição livre e aberta entre os desiguais. Nesse sentido, a
LDB não ocasionou qualquer ruptura com o padrão de seleção instituído que privilegia os
candidatos com maior capital econômico e cultural. A seleção continua baseada nas
aptidões e capacidades naturais que, historicamente, tem assegurado que a educação
superior, sobretudo os cursos de maior prestígio social, seja destinada a uma elite
econômica e culturalmente privilegiada.
É preciso reconhecer que a elevação da qualificação geral da população brasileira
constitui-se em aspecto essencial em uma sociedade e em uma economia baseada cada vez
mais na educação e no conhecimento. Por um lado, portanto, há o desafio de atender a
demandas econômicas e sociais heterogêneas por educação superior; de outro, a
necessidade de ampliar significativamente a produção de conhecimento que contribua
para o bem-estar coletivo e para a construção da sociedade futura.
Assim, as perspectivas de universalização da educação superior no Brasil
implicam, no momento, entre outros fatores, na retomada da discussão sobre a melhoria
da qualidade do ensino principalmente na educação básica, para consequentemente
melhorar a educação superior. Depois de alguns anos de aprovação da LDB (Lei nº
9.394/96), observa-se que ainda são enormes os desafios para uma efetiva democratização
da educação escolar no Brasil, incluindo a educação básica (educação infantil, ensino
fundamental e ensino médio) e a educação superior.
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Inês Regina Waitz, Magda Patrícia Caldeira Arantes
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REFERÊNCIAS
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STEPHANOU, Maria; BASTOS, Maria Helena C. Histórias e memórias da educação no Brasil.
v.III: Século XX. Rio de Janeiro: Vozes, 2005.
Inês Regina Waitz
Possui graduação em Letras (1993) e
mestrado em Teoria Literária (1997),
ambos pela Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho UNESP.
Também
cursou
Gestão
Educacional, pós-graduação lato-sensu
oferecido pelo Centro Universitário
Anhanguera, onde é professora titular. Também atua
como supervisora de avaliação externa de instituições e
de cursos. Tem experiência na área de Letras e
Educação, com ênfase em Literatura, Ensino e Avaliação,
atuando principalmente nos seguintes temas: literatura,
leitura, práticas educativas, avaliação do ensino
superior.
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Políticas públicas para o ensino superior: o processo de democratização do acesso
Magda Patrícia Caldeira Arantes
Possui graduação em Engenharia Elétrica
pela Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais (1983), mestrado (1988) e
doutorado (2003) em Engenharia Elétrica
pela
Universidade
Estadual
de
Campinas. Tem experiência na área de
Engenharia Elétrica e de Computação,
com ênfase em Teleinformática, atuando nos seguintes
temas: simulação de sistemas, estrutura crossbar,
qualidade
de
serviço,
microcontroladores,
microprogramação e encaminhamento de células. Possui
também experiência na área de Educação, atuando
principalmente nos temas: currículos (tecnologia,
engenharia, computação e informática), avaliação de
cursos, avaliação institucional e auto-avaliação.
Atualmente é professora titular do Centro Universitário
Anhanguera e Diretora de Avaliação Externa da
Anhanguera Educacional.
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