MÍDIA E SEXUALIDADE: ARTICULANDO PROPOSTAS PEDAGÓGICAS PARA UMA EDUCAÇÃO INFANTIL EMANCIPATÓRIA Juliana Costa Muller1 Ana Paula Knaul2 Resumo: A cada dia novas informações são apresentadas as crianças e a partir delas significações são constituídas e apresentadas em seus diferentes espaços de convivência. Desta forma, vivenciando situações contemporâneas de uma infância conectada com as mídias, este artigo derivado de um projeto de estágio - vem apresentar relatos de experiências pedagógicas realizadas no contexto da educação infantil, sendo este, repleto de falas advindas da mídia com a presença marcante dos estereótipos representados nas vivências infantis. O estágio aqui referido se desenvolveu no primeiro semestre de 2010, em uma instituição municipal localizada em São José/SC, com crianças de 4 à 6 anos. A partir das observações objetivou-se estabelecer ações pedagógicas que levassem as crianças a refletir sobre os esteriótipos e questões de sexualidade que apresentavam, criando assim, momentos de ressignificações sobre suas falas, como por exemplo: ―essa brincadeira é de menina‖, ‖menino é mais rápido que menina‖, ―namorar é andar de mão dada‖, ―namorar é que nem na tv e na internet‖. Portanto, estratégias didáticas e mediações constantes fizeram-se presentes nestas práticas, proporcionando assim, momentos que objetivaram uma formação para a emancipação integral das crianças. Palavras-chave: Mídia. Sexualidade. Educação infantil. Proposta pedagógica. O cenário da infância na cultura digital Na contemporaneidade multiplicam-se constantemente as possibilidades de comunicação entre a comunidade social, tendo em vista, o desenvolvimento acelerado no qual encontram-se as Tecnologias da informação e comunicação (TIC). Jenkins (2009) denomina esse período de transformações como sendo uma cultura da convergência, na qual os meios de comunicação se entrelaçam e se difundem em um movimento simbiótico, no intuito de disseminarem a informação de forma rápida e avançada. Imersa a esta realidade, está a criança, ―sujeito social, de direitos, um ser completo em si mesmo, que pensa, se expressa por meio de múltiplas linguagens, que produz cultura e é produzido numa cultura‖ (ROCHA; OSTETTO, 2008, p.2). Esta criança, participa de vivências num ambiente 1 Mestranda em Educação na Universidade Federal de Santa Catarina / UFSC, linha de Educação e Comunicação (2012/2). Pós-Graduada em Design Instrucional em EAD pela Faculdade de Administração, Ciências, Educação e Letras / FACEL. Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário Municipal de São José / USJ (2011), com habilitação em Educação Infantil, Anos Iniciais e Educação de Jovens e Adultos / EJA. 2 Mestranda em Educação na Universidade Federal de Santa Catarina / UFSC, linha de Educação e Comunicação (2013/2). Pós-Graduada em Design Instrucional em EAD pela Faculdade de Administração, Ciências, Educação e Letras / FACEL. Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário Municipal de São José / USJ (2011), com habilitação em Educação Infantil, Anos Iniciais e Educação de Jovens e Adultos / EJA. 1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X sexualizado, de transformações constantes, em contato com os meios de comunicação que refletem em suas representações e que contribuem na constituição de conhecimentos, valores, comportamentos, linguagens etc (NUNES, 1987). As transformações constantes nas tecnologias de produção, no design de objetos, na comunicação mais extensiva ou intensiva entre sociedades (...) tornam instáveis as identidades fixadas em repertórios de bens exclusivos de uma comunidade ética ou nacional (CANCLINI, 2006, p.30-31). Desta forma, é possível compreender a criança, como um ser que perpassa por um processo de construção constante da própria identidade. Esta marcada por uma interculturalidade, como assim aborda Canclini (2006), que compreende diferentes etnias, costumes, comportamentos, sendo estes retalhos culturais, que tornam cada vez mais inconstante o estabelecimento de uma identidade fixa. Ao analisar essa realidade presente nas vivências da infância, é possível compreender que são diversas as formas de se construir conhecimento. Santaella (2010) caracteriza essas construções como, aprendizagem ubíqua, que pode ocorrer a qualquer momento, em qualquer lugar, devido ao fato de serem mediadas pelo uso das TIC. De acordo com as vivências das crianças na cultura digital, pode-se perceber que a mídia incorpora um forte papel na constituição de sentidos e significados, construindo assim a necessidade de estudá-la. Estudamos a mídia porque nos preocupamos com seu poder: nós o tememos, o execramos, o adoramos. O poder de definição de incitação, de iluminação, de sedução, de julgamento. Estudamos a mídia pela necessidade de compreender quão poderosa ela é em nossa vida cotidiana, na estruturação da experiência, tanto sobre a superfície como nas profundezas. E queremos utilizar esse poder para o bem, não para o mal (SILVERSTONE, 2005, p. 264). A sociedade contemporânea se organiza por meio das mídias, assim como já nos dizia Silverstone (2005), ela é uma grande mediadora entre sujeito e cultura. Esta relação aponta para fragmentações em relação ao trabalho educativo das crianças mesmo que em muitos momentos busquem mostrar sua junção, que nem sempre é percebida pelos adultos: Os sentidos culturais das sociedades contemporâneas se organizam cada vez mais a partir das mídias, que sendo parte da cultura exercem papel de grandes mediadoras entre os sujeitos e a cultura mais ampla, modificando as interações coletivas. Nessas interações, verificamos diversas fragmentações em relação ao trabalho educativo com crianças, como razão-emoção, jogo-trabalho, ciência-imaginação, e embora as crianças, teimosamente, insistem em mostrar sua junção, nem sempre ela é percebida pelos adultos. (FANTIN, 2006, p. 25). A educação e os discursos escolares vão se separando da cultura, a cultura parece que se dá pelo ―saber-fazer‖ e a educação pelo ―saber-usar-refletir, instrumentalizar‖: ―No entanto, ainda que 2 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X a escola possa ensinar o saber-fazer visando superar tal dicotomia, se os sentidos desses saberes não forem apreendidos, isso não será suficiente‖. (FANTIN, 2006, p. 26). Eis assim, a necessidade de uma visão crítica a respeito da mídia, um desafio apresentado pela sociedade contemporânea ao meio escolar: Embora saibamos que nem sempre a demanda da sociedade é a mesma da escola, o papel que as mídias têm desempenhado na sociedade da informação, da comunicação, do espetáculo e, consequentemente, na formação dos sujeitos deve ser discutido na escola. Por mais que fale que as atuais gerações de crianças e jovens cresceram com a TV, com o vídeo, com o controle remoto, e embora apenas uma minoria possua computador e internet (nos países periféricos), e por mais que se pergunte o que isso significa, o entendimento a respeito das mudanças propiciadas pelas mídias e pelas redes ainda está longe de ser suficientemente problematizado na escola. (FANTIN, 2006, p. 26). De acordo com esta realidade e necessidade de problematização no meio escolar, pode-se ainda completar a disseminação das informações pelas TIC‘s, os paradigmas e estereótipos relacionados à sexualidade humana e aos modelos sociais foram se incorporando nas atitudes da comunidade social e representados em suas manifestações cotidianas. No intuito de compreender melhor a respeito desses padrões, Azibeiro e Morin apresentam o conceito de paradigmas, citados em Melo e Pocovi (2002, p. 29): Chamamos paradigmas às estruturas de pensamento que, de modo quase que inconsciente comandam nosso modo de ser, de olhar, de viver, de fazer, de falar sobre as coisas e sobre nós mesmos. São os nossos sistemas mentais, que filtram toda a informação que recebemos: ignoramos, censuramos, rejeitamos, desintegramos o que não queremos saber. Não os entendemos como modelos, rígidos e acabados, mas como horizontes, que se ampliam e se modificam a cada passo dado, ou teias de significados, sempre se retecendo e rearticulando. A presença da mídia como um meio da massa permite a disseminação de padrões constituídos pela comunidade social, como por exemplo o padrão de beleza idealizados por meio de representações estéticas, modelando formas de condutas ideais a serem incorporadas. Nesse sentido é importante ressaltar que ―muitas vezes‖, ou então dizer, ―quase sempre‖, os paradigmas são incorporados pelos indivíduos, sem nem ao menos saberem, o porquê foram constituídos e o que compreendem na matriz de sua concepção. Esses modelos, engendram consequências que remetem à constrangimentos, ao consumo abusivo, dentre outros. Gastaldo (2009, p. 355), caracteriza as produções midiáticas e seus reflexos: Os produtos veiculados pela mídia utilizam linguagens e articulam significados e determinados referentes, criando representações que, ao serem veiculadas para a sociedade, tomada como ―massa‖, ressaltam alguns significados, ocultam outros, incorporam significados correntes em alguns grupos e os ampliam para toda a sociedade, entre outras operações, nas quais se manifesta potencial de veiculação de ideologia através da mídia, ―naturalizando‖ representações sociais e operando no sentido da manutenção de uma dada relação de forças no interior de uma sociedade. (GASTALDO, 2009, p. 355). 3 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X Partindo desse pressuposto, Paulo Freire (2000), afirma: ―a educação como prática da liberdade é um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade‖. É nesse enfoque que as vertentes pedagógicas da Educação Sexual colocadas por Nunes (1996), estão postuladas, no sentido de conhecer a realidade e compreender as formas com que foram se constituindo os paradigmas. Dentre as vertentes pedagógicas trazidas por Nunes (1996), encontram-se: a médicobiologista (compreende discussões a respeito da reprodução sexual, fragmentando o estudo da sexualidade); a normativo-institucional (aborda regras de moral e conduta sexual estabelecidas pela igreja católica, gerando a repressão sexual); a terapêutico-descompressiva (onde o sexo é compreendido como técnica, produtividade e consumo desenfreado, incorporado pela contribuição da mídia para este enfoque capitalista). Essas perspectivas abarcam todas as especificidades presentes em diferentes períodos da história com relação a sexualidade humana, desde o tempo primitivo, perpassando pelo desenvolvimento do capitalismo, e das transformações nos modos de produção, com os avanços tecnológicos contribuindo na constituição do ser humano. Dentre as perspectivas citadas por Nunes (1996), a mídia participa ativamente no processo de disseminação de valores e comportamentos à comunidade de massa, contribuindo para as incorporações de padrões, conforme coloca Melo e Pocovi (2002, p. 33) a respeito da vertente terapêutico-descompressiva: Naturaliza-se o sexo como mercadoria, uma vez que ele se apresenta mecânico, deserotizado. É uma aparente liberalização e descompressão das práticas sexuais. A mídia é utilizada como uma das maiores formadoras de valores éticos sexuais. Todos são considerados como tendo a mesma história e a mesma necessidade. O conhecimento sobre a sexualidade tende a ser superficial e vazio, não a considerando como uma construção sócio-histórico-cultural. Nesse sentido, é necessário salientar a importância da presença de mediações para que sejam críticas, criativas, reflexivas e dialógicas a partir das recepções atribuídas pelas crianças, dentro de seus diferentes contextos. É preciso pensar na Educação Sexual a partir de um paradigma emancipatório, que engendra-se com o seguinte princípio: [...] todos os seres humanos inserem-se no mundo mediante seus corpos sexuados, mundo que é uma construção sociopolítica, histórica e cultural de seres humanos, dialeticamente vistos como seres únicos e parte da sociedade ao mesmo tempo, produtores e produzidos nas e pelas relações sociais, mesmo que a maioria aparentemente assim não se perceba (MELO e POCOVI, 2002, p. 37). Desse modo é possível construir uma concepção emancipatória para a educação sexual, pensando em uma formação integral do educando no ambiente escolar, buscando amparar as 4 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X práticas pedagógicas em reflexões constantes com os educandos de modo crítico e participativo, como assim coloca Melo e Pocovi (2002, p. 38): [...] é uma busca da reconstrução consciente e participativa de um saber amplo e universal sobre a dimensão humana da sexualidade, sem distinção de qualquer ordem, e essa reconstrução deve começar dentro de cada um, espraiando-se para o coletivo. Não pode ser apenas uma reprodução acrítica do que está posto na sociedade. Devemos buscar o despertar da consciência crítica, possibilitando aos indivíduos escolherem seus caminhos sem amarras, sem medos, e com conhecimento de sua importância nas diversas relações sociais. É pensando nesta perspectiva emancipatória, que este artigo apresenta a seguir os nuances de uma trajetória traçada em uma instituição de educação infantil, no qual buscou-se promover ações pedagógicas amparadas por de uma práxis libertadora, considerando como ponto de partida o olhar das crianças pequenas sobre o seu entorno, percebendo em suas manifestações com seus pares. Da teoria à prática ―[...] em que medida as informações estão sendo trabalhadas na escola a fim de contribuir para a interpretação do mundo?‖. (FANTIN, 2006, p. 27). No intuito de articular as discussões teóricas à realidade que envolve a infância na contemporaneidade, o presente artigo deriva-se de um projeto de estágio realizado em uma Instituição de Educação Infantil, no qual buscou-se observar as vivências das crianças de 4 à 6 anos. Com isso, foi lançada uma observação atenta para as crianças, de modo a perceber as questões que se faziam presentes nessas cotidianidades, para que estas corroborassem na constituição de ações pedagógicas emancipatórias, conforme Freire (1996) coloca: [...] ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção. Quando entro em uma sala de aula devo estar sendo aberto a indagações, à curiosidade, às perguntas dos alunos, a suas inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tenho – a de ensinar e não de transferir conhecimento. (FREIRE, 1996, p. 47). Durante o período de observação às práticas realizadas pela professora da classe, as crianças foram mostrando alguns direcionamentos para constituir uma ação docente, pois afinal, é É preciso considerar o educando como ser de ideias e pensamentos próprios, que participa de diferentes contextos sociais, que necessitam ser considerados (ROCHA, 1999). Assim que termina a história Ronan, é o primeiro a desenhar, e começar a pintar o seu dinossauro e diz: Menina é muito devagar pra desenhar. Menino é mais rápido. (Relato do dia 06/04/2010). [...] durante as brincadeiras com as crianças e momentos de conversas, perguntamos as crianças quais seus brinquedos preferidos [...] os meninos falaram que gostavam de carro de brinquedo, de caminhão, de andar de bicicleta, de luta. As meninas 5 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X gostavam de brincar de boneca, de mamãe e filhinha, de esconde-esconde, de ouvir histórias e de brincar no parque (Relato do dia 13/04/2010). Começou-se a perceber uma presença muito explícita da demarcação dos sexos, os estereótipos presentes e determinantes na constituição das relações das crianças com seus pares, tanto nas brincadeiras, como em seus comportamentos e nesse sentido sabe-se que ―os brinquedos e materiais utilizados pelas crianças influenciam, decisivamente, na maneira como interagem e como brincam entre si‖ (RUBIN, 1985 apud SAGER E SPERB, 1998). A curiosidade das crianças, que possuem entre cinco e seis anos, estava também em formar ―casaizinhos‖ de namorados. Em alguns casos há a presença dos ―triângulos amorosos‖, fato que resultava em briga com os amigos. Desta forma, Sager e Sperb (1998) afirmam que: ―O gênero das crianças e o contexto na qual brincam têm grande importância na maneira como elas entram em conflito‖. Durante as brincadeiras de roda atrás da professora auxiliar Juliana, percebeu-se uma briga entre Igor e Gabriel. Nesse momento a professora auxiliar Juliana os separou e perguntou o que estava ocorrendo. Igor respondeu dizendo que estava batendo em Gabriel, porque ele queria brincar com Monica. Com isso, Igor não aceita que Monica brinque com eles e diz: Ela só quer brincar de neném, o papai é o Gabriel, a mamãe é ela e o neném sou eu. Igor se mostra furioso batendo o pé e diz: - Não quero ser o neném, ser o neném é muito chato. Igor também não aceita que Gabriel deixe de brincar com ele para brincar com Monica. (Relato dia 13/04/2010). Andrade (2003) faz referência ao Professor Edvaldo Souza Couto, afirmando que muitas vezes nós agimos como se pudéssemos separar o corpo da mente, não nos dando conta de que estes caminham juntos, em constante aprendizado nas relações estabelecidas. Esta relação se faz presente na interação com o próximo, nas relações amorosas, de amizade e familiar. Este modelo pode estar concretizado também por meio dos meios de comunicação como: televisão, livros, internet, a mídia em um contexto geral. Durante uma atividade presenciamos duas falas que nos chamaram atenção: José dizendo que vai casar com Sara, e André, então, cita uma frase da propaganda que passa na televisão: ―- Peitinho você quase foi promovido‖. (Relato do dia 13/04/2010). Ao falar sobre o papel da mídia, percebe-se a necessidade de transparência da informação, sua representatividade social e cultural nos diferentes setores da sociedade ―[...] e o estabelecimento de políticas culturais que possam impulsionar outros tipos de produção midiática, favorecendo o desenvolvimento de alternativas aos mercados globalizados em função dos interesses públicos e dos processos educativos e formativos‖ (FANTIN, 2006, p. 27). 6 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X Nesse sentido, as práticas estiveram voltadas para a curiosidade da criança em experimentar algo ―diferente‖, sendo a partir de perguntas sobre ―o que é namorar‖ até brincadeiras com meninas e meninos, sem distinção. Dentre as respostas que foram obtidas a partir das indagações, Sara coloca: - ―namorar é andar de mão dada‖. E João enfatiza: - ―namorar é tirar a roupa, é ficar pelado‖, ―é que nem na tv e na internet, que coloca ‗GTA putaria‘ e aparece mulher pelada‖. Com esses relatos, pode-se perceber a contribuição das mediações presentes nas vivências de cada educando, cada um imerso por um contexto específico. Para Martín-Barbero (2008) as mediações - cotidianidade familiar, temporalidade social e competência cultural - são responsáveis pela produção de cultura, pois são a partir destas que engendram-se as recepções. Estas mediações estão ligadas as relações de interação geradas entre os indivíduos, com a influência dos dispositivos midiáticos na constituição ou na ressignificação do conceito atribuído. No intuito de promover um processo de ressignificação de conceitos, a primeira proposta realizada foi um teatro, de autoria do grupo de estágio, baseado no livro ―A princesa sabixona‖. Este teatro intitulado ―O reino encantado‖ - encenado pelo grupo - objetivou trabalhar o respeito às diferenças de gênero. A história apresentou o cotidiano de uma princesa chamada Clara, porém, diferente daquela presente nos contos infantis, pois essa, gostava de brincar de bola, de pipa, de carrinhos, de pega-pega, e também adorava vestir-se com a cor azul em seus trajes. Ela tinha um amigo chamado Pedro, com o qual se dava muito bem. Pedro era um pouco diferente dos meninos que a Clara conhecia, ele gostava de brincar de boneca, de mamãe e filhinho, ao contrário dos outros meninos do seu reino que só queriam brincar de carrinho. Ele, adorava usar a cor rosa em suas roupas. Quando essas características apresentaram-se na encenação durante o teatro, as crianças riram muito e comentavam: ―- Arram!!!!Di minino‖ ao ver a princesa com capa azul. ―- Mininha, mininha‖ ao ver o príncipe de capa rosa. ―- Ah... Essa é a minha favorita‖, ao ver a princesa brincando de carrinho.‖- Beija, beija, beija, vamo pessoal‖, no momento do casamento entre a princesa e o príncipe. Essa apresentação convidou as crianças a participarem da peça, bem como, iniciar um processo de reflexão a respeito das figuras esteriotipadas bem marcadas no grupo. Depois da história, as crianças construíram suas coroas e então foram convidadas a encenar com o príncipe e a princesa. Vestiram e brincaram com todos os brinquedos da peça, apesar do estranhamento e 7 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X algumas recusas iniciais que não fizeram desistir do objetivo estipulado, pois ―A ciência [...] longe de mecanizar o artista ou o profissional, arma a sua imaginação com os instrumentos e recursos necessários para os seus maiores vôos e audácias‖ (TEIXEIRA, 1977, p.51). Todo o processo de construção dos objetos para a história foi mediando, momentos de conversa sobre ―o porque de usar o rosa, o azul‖ foram estabelecidos para que os esteriótipos e as brigas pudessem ser trabalhadas de maneira a melhorar o convívio entre eles. Furlani (2008) afirma que a cultura estabelece brinquedos para meninas e meninos específicos e muitos pais, mães, professores e professoras acreditam que esta definição pode definir, por exemplo, a sexualidade futura da criança. Eis assim, a importância da mediação, do conversar, do olhar no olho, do sentir e de se aproximar daquele que em algumas vezes reproduz o que o adulto faz sem perceber seu envoltório e consequências. Mídia-educação como prática emancipatória Na contemporaneidade as crianças deparam-se com inúmeras possibilidades de acesso a informação cotidianamente, com isso, o papel do educador torna-se cada vez mais importante, em mediar essa bagagem de informações, no sentido de significá-las e ressignificá-las quando necessário (CHARLOT, 2005). Ao amparar-se na mídia-educação como concepção teórico-metodológica enraizada nas práticas constituídas neste Projeto de Estágio na Educação Infantil, é importante abordar sobre a sua definição como sendo este ―um campo interdisciplinar em construção, na fronteira entre a Educação, a Comunicação, a Cultura e a Arte, voltado à reflexão, à pesquisa e à intervenção no sentido da apropriação crítica e criativa das mídias e da construção de cidadania‖ (Carta de Florianópolis para Mídia-Educação, 2009). Desta forma, buscou-se desconstruir os pré-conceitos existentes com relação aos estereótipos, estes constituídos nas vivências sociais, e também, transmitidos pela mídia, no intuito de melhorar as relações entre as crianças com seus pares e com a comunidade social que envolve o seu contexto. Nesse contexto, torna-se essencial destacar o papel do mídia-educador no processo de formação da criança, em que este contribui no desenvolvimento de conhecimentos e aprendizagens no espaço escolar, pois ―O mídia-educador é fundamentalmente um mediador cultural entre as 8 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X culturas dos meios e as culturas dos meninos e a sua própria também, a cultura da escola e da tradição cultural‖(RIVOLTELLA, apud FANTIN, 2010). Pela perspectiva da mídia-educação, buscou-se construir ações pedagógicas que consideram a mídia como dispositivo de criação, de participação e de expressão social, como assim colocam Bévort e Belloni (2009) que percebem a mídia como ferramenta constitutiva dos processos de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, com o intuito de amparar a prática dos mídia-educadores no cenário da infância, Buckingham (2007) contribui afirmando que a educação precisa estar pautada em promover a provisão, proteção e participação da criança, inclusive em relação ao uso das mídias nas vivências da comunidade social. É necessário que a escola desenvolva ações pedagógicas no intuito de preparar a criança para a cultura digital, de modo a participar de modo ativo nas produções midiáticas, além de corroborar na seleção dos conteúdos que por ela são recepcionados. Portanto, espera-se que outras propostas sejam despertadas e que esse artigo seja encarado como o trabalho do beija-flor, que além de contemplar com sua beleza, visita diversas flores deixando um pouco de si e levando um pouco de cada um. Que novas inspirações possam emergir e que a educação infantil possa ser contemplada com mais propostas pedagógicas emancipatórias. Referências BÉVORT, Evelyne; BELLONI, Maria L.. 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In this way, experiencing contemporary situations of an infancy connected with the medias, this article - derivative of a project of period of training - is going to present accounts of pedagogical experiences carried out in 10 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X the context of the childlike education, being this, full of resulting speeches of the media with the outstanding presence of the stereotypes represented in the childlike experiences. The period of developed this project was in 2010, in a municipal institution located in Saint José/SC, with infants of 4 to the 6 years. From the observations planned be established pedagogical actions that led the infants it reflect about the stereotypes and questions of sexuality that presented, creating like this, moments of resignifications about his speaks, as by example: "That joke is of girl", "boy is more quick than girl", "court is walk of given hand", "court is that neither in the tv and in the internet". Therefore, the educational strategies and constant mediations did itself presents in these practical, providing moments that planned a formation for the integral emancipation of the infants. Keywords: Media. Sexuality. Childhood education. Pedagogical Proposals. 11 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X