Reúso Não Potável de Água Aspectos de Saúde e Padrões de Qualidade Rafael K.X. Bastos Universidade Federal de Viçosa Departamento de Engenharia Civil Reúso - possibilidades Irrigação irrestrita - produtos ingeridos crus (frutas, hortaliças) Grupo de risco - consumidores, agricultores, público em geral. restrita - produtos não ingeridos crús, processados comercialmente / industrialmente (ex.: cereais, fibras, grãos), silvicultura. Grupos de risco - trabalhadores, agricultores, público em geral. Forrageiras (pastagens) Grupo de risco - consumidores de produtos animais , agricultores, público em geral. Reúso - possibilidades Reúso urbano - campos de esportes, parques e jardins, limpeza de logradouros, reuso predial. Grupos de risco - público usuário, trabalhadores, público em geral. Piscicultura Grupos de risco - consumidores, trabalhadores Reúso industrial Grupos de risco - trabalhadores Recarga de aqüíferos Grupos de risco - consumidores, trabalhadores Reúso controlado utilização segura do ponto de vista sanitário, sustentável do ponto de vista ambiental e otimizado do ponto de vista econômico Potencial e limitações Vantagens: - reciclagem de nutrientes - controle de poluição - economia de insumos - economia de água Limitações: - efeitos no solo e plantas (agrícola) - toxicidade (agrícola e piscícola) - contaminação lençol - parâmetros físico-químicos (industrial) - aspectos sanitários Potencial e limitações Microrganismo Densidade Escherichia coli 106-108 /100 mL Salmonellae spp. 102-103 /100 mL Cistos de Giardia sp. 102-104 / L Oocistos de Cryptosporidium spp. 101-102 / L Ovos de helmintos 101-103 / L Vírus 102-105 / L Risco de transmissão de doenças Risco à saúde ⇔ regulamentação Risco aceitável (ou não) ⇔ padrão microbiológico ⇔ grau de tratamento Avaliação de risco Tratamento de esgotos Processo de tratamento Processo secundários convencionais + decantação secundária Precipitação química Precipitação química + Filtração terciária Biofiltros Reatores anaeróbios Lagoas de estabilização Desinfecção Precipitação química + Filtração terciária + desinfecção Bactérias Eficiência típica de remoção (log 10) Vírus Protozoários Helmintos 0-2 0-1 0-1 0-2 1-2 0-1 0-1 1-3 1-2 1-2 1-3 1-3 0-2 0-1 1-6 2-6 0-1 0-1 1-4 1-4 0-1 0-1 1-4 0-3 0-2 0-1 1-3 0-1 2-6 1-4 1-4 1-3 Risco à saúde – aspectos conceituais Risco (real) ¾ probabilidade de ocorrência de um efeito (indesejável) ¾ exposição ⇔ efeito (doença) Risco atribuível: proporção de um dano à saúde entre os indivíduos expostos devida a um determinado fator de risco (irrigação com esgotos) Perigo (Risco potencial) ¾ característica intrínseca de uma substância ou de uma situação. ¾ algo (agente patogênico) que pode vir a causar efeitos adversos à saúde (risco) Riscos Reais x Riscos Potenciais Águas residuárias Tratamento Uso Grau de exposição susceptibilidade imunidade Risco potencial Agente etiológico Resistência Ambiente Sobrevivência Latência Hospedeiro Dose infectante Patogenicidade (grupos de risco) Doença ⇒ Risco Real Avaliação de risco (metodologia) caracterização e estimativa, quantitativa ou qualitativa, de potenciais efeitos adversos à saúde devido à exposição de indivíduos e populações a fatores de risco (i) identificação do perigo; (ii) avaliação da dose-resposta ( potencial que tem o agente de causar reposta em diversos níveis de exposição: estudos experimentais ou epidemiológicos ) (iii) avaliação da exposição ( caracterização da população exposta, definição da(s) rota(s), quantidade e duração da exposição ) (iv) caracterização do risco (modelos matemáticos ⇒ risco de determinado agravo resultante da ingestão de determinado volume de água contendo uma quantidade conhecida do agente por unidade de volume para uma ou mais exposições) Estabelecimento de padrão de qualidade de efluentes (i) a ausência de riscos potenciais, caracterizada pela ausência de organismos e, ou, indicadores e patogênicos no efluente; (ii) a medida (da ausência) de riscos em excesso ou riscos atribuíveis à prática de reúso dentre uma população exposta; (iii) a aplicação da metodologia de Avaliação de Risco e a definição de níveis de risco aceitáveis, ou seja, a estimativa da concentração de patógenos no efluente correspondente ao nível de risco aceitável (ex. 10-4, significando que considera-se aceitável um caso anual de infecção em cada 10.000 pessoas dentre uma população exposta ao fator de risco – a utilização de esgotos). Estabelecimento de padrão de qualidade de efluentes (iii) aplicação da metodologia de AR IDA = NENO ou NICENO FI IDA: Ingestão diária aceitável NENO: nível de efeito não observado NICENO: nível inferior com efeitos negativos observados FI: fator de incerteza VMP = IDA x pc x P C VMP: valor máximo permitido pc = peso corporal (60Kg para adulto) P = fração de IDA proveniente da água potável (0,1) C = consumo diário de água (2L para adultos) Aplicação da metodologia de AR Abastecimento de água • EUA: risco anual de infecção de 1:10.000 (10-4) para os diversos organismos patogênicos (uma infecção em cada 10.000 habitantes). • Reino Unido: Cryptosporidium ≤ 10 oocistos/100 L ⇒ risco de infecção anual de 10-1 (uma infecção em cada 10 habitantes) Reúso • irrigação com efluentes contendo 1 vírus/ 40 L (ASANO e SAKAJI, 1990; ASANO et al, 1992) consumo de hortaliças ⇒ risco 10-4 a 10 -9 (C= 10 mL/dia) irrigação de campos de golfe ⇒ risco 10 -2 a 10 -5 (C=1 mL/dia; manuseio de bolas de golfe, 2 dias/semana) • consumo de hortaliças irrigadas com efluentes contendo ≤ 103 CF/100 mL ⇒ risco de infecções virais de 10-5 a 10 -7 e de cólera de 10 -9 (SHUVAL et al, 1997). Estabelecimento de padrão de qualidade de efluentes (ii) medida de risco real ¾serviço de vigilância epidemiológica bem estruturado ¾ desenvolvimento de complexos estudos epidemiológicos ⇒ delimitação de populações expostas e não-expostas ao fator de risco ⇒ identificação dos casos atribuíveis a utilização de esgotos. (i)ausência de riscos potenciais ¾ menos defensável do ponto de vista epidemiológico ¾ dificuldades das abordagens anteriores ⇒ relevância, com margem de segurança (“risco nulo”) Normas e critérios de qualidade de efluentes para irrigação (inclusive usos urbanos) Evolução histórica Califórnia (EUA): - 1933: proibição de vegetais consumidos crus - 1968: efluentes filtrados, oxidados e desinfetados. produtos comestíveis (crus): 2,2 CF/100 ml. OMS: - 1971: irrigação irrestrita: efluentes após completa estabilização biológica, seguida de cloração rigorosa, 100 CF/100 ml. - 1989: “Engelberg” - recomendações em bases epidemiológicas. Irrigação irrestrita: 1.000 CF/100 ml 1 ovo helminto/litro Diretrizes da OMS (1989) Categoria Tipo de Irrigação e Cultura A Culturas a serem consumidas cruas, campos de esporte, parques e jardins* B Culturas processadas industrialmente, cereais, forragens, pastagens, árvores C Irrigação localizada de plantas da categoria B na ausência de riscos para os agricultores e público em geral Grupos de Risco Agricultores, consumidores, público em geral Agricultores Não aplicável Nematóides Intestinais (Ovos/L) <1 <1 Não aplicável (*) Para parques e jardins onde o acesso de público : 200 CF/100 ml. Coliformes Fecais (org./100mL) Processo de Tratamento < 103 Lagoas de estabilização em série, ou tratamento equivalente em termos de remoção de patogênicos 105 Lagoas de estabilização com 8-10 dias de tempo de detenção ou remoção equivalente helmintos e coliformes fecais Não aplicável Pré-tratamento de acordo com o método de irrigação, no mínimo sedimentação primária Diretrizes da OMS Modelo teórico e evidências epidemiológicas Alto risco: helmintos Médio risco: bactérias e protozoários Baixo risco: vírus Lagoas de estabilização ≤ 103 CF/100 mL: indicador da remoção de bactérias e vírus < 1 ovo helminto/L (nematóides intestinais humanos): indicador da remoção de organismos sedimentáveis (outros helmintos, protozoários) (??) Normas da EPA (1992) Tipo de Irrigação e Cultura Culturas alimentícias não processadas comercialmente (1) Irrigação superficial ou por aspersão de qualquer cultura, incluindo culturas a serem consumidas cruas Culturas alimentícias processadas comercialmente (1) Irrigação superficial de pomares e vinhedos Culturas não alimentícias Pastagens para rebanhos de leite (5) , forrageiras, cereais, fibras e grãos Irrigação , campos de esporte, parques, jardins e cemitérios Processo de Tratamento Qualidade do efluente Secundário + filtração + desinfecção DB0 ≤ 10 mg/L Turbidez ≤ 2 UNT (2) Cloro residual ≥ 1mg/L (3) Coliformes fecais ND Organismos patogênicos ND Secundário + desinfecção (4) DB0 ≤ 30 mg/L SS ≤ 30 mg/L Cloro residual ≥ 1mg/L3) Coliformes fecais ≤ 200/100 mL (4) Secundário + desinfecção DB0 ≤ 30 mg/L SS ≤ 30 mg/L Cloro residual ≥ 1mg/L Coliformes fecais ≤ 200/100 mL Secundário + filtração + desinfecção DB0 ≤ 10 mg/L Turbidez ≤ 2 UNT (2) Cloro residual ≥ 1mg/L Coliformes fecais ND Organismos patogênicos ND EUA (Califórnia) Tipos de Uso Nível de Tratamento Coliformes Totais secundário Ausente Irrigação de pastos para animais produtores de leite, áreas verdes(2); viveiro de plantas ornamentais e fazendas de grama; lagos paisagísticos; sistemas de combate a incêndio; água de refrigeração industrial ou comercial, sem formação de aerossóis; alimentação de caldeiras; compactação de solos; lavagem de ruas, calçadas e áreas externas. secundário + desinfecção <23 coliformes totais /100ml Irrigação superficial de culturas alimentícias; acesso restrito a lagoa paisagísticos. secundário + desinfeção < 2,2 coliformes totais /100 ml Irrigação de culturas alimentícias (3) e áreas paisagísticas(4); lagos recreacionais irrestritos; descarga em toaletes e mictórios; água de processo industrial; fontes decorativas; lavanderias comerciais; produtores de neve; sistema de combate a incêndio estrutural; sistemas de refrigeração industriais ou comerciais com formação de aerossóis. Secundário + coagulação + clarificação (5) + filtração + desinfecção < 2,2 coliformes totais /100 ml Irrigação de forragens, fibras e culturas de sementes; pomares e vinhas (1) ; culturas alimentícias processadas, descarga em toaletes. Normas e critérios de qualidade de efluentes para irrigação México Irrigação CF /100 mL Restrita 103 ( 103 – 104 ) ≤ 5 ( ≤ 0,1 -1,0 ) Irrestrita 103 (103 ) ≤ 1 ( ≤ 0,1 -1,0 ) Norma atual Proposta de revisão Ovos helmintos/L África do Sul Uso Nível de tratamento CF/100 mL Forragens, sementes, árvores, parques não recreacionais, viveiros (de acesso restrito) Primário e secundário 1000 Culturas não ingeridas cruas, flores, pomares e vinhas, parques, campos esportivos, e gramados escolares (de acesso restrito) Primário, secundário e terciário, sistema de lagoas de estabilização. 1000 Pasto para animais de leite, campos esportivos, gramados escolares (de acesso irrestrito) Primário, secundário e terciário Culturas ingeridas cruas, gramados, viveiros, gramados escolares, parques recreacionais (de acesso irrestrito) Avançado (padrão de qualidade de água potável) ND Arábia Saudita (irrigação irrestrita) Parâmetro * VMP Parâmetro VMP DBO 10,0 Fluor 2,0 SST 10,0 Ferro 5,0 Coliformes/100mL 2,2 Chumbo 0,1 Turbidez (uT) 1,0 Lítio 0,07 Alumínio 5,0 Manganês 0,2 Arsênico 0,1 Mercúrio 0,001 Berílio 0,1 Molibdênio 0,01 Boro 0,5 Níquel 0,02 Cádmio O,01 Nitrato 10,0 Cloreto 280 Selênio 0,02 Cromo 0,1 Zinco 4,0 Cobalto 0,05 Óleos e Graxas Ausente Cobre 0,4 Fenol 0,002 Cianeto O,05 PH 6,0 – 8,4 mg/L , exceto quando especificado em contrário Usos urbanos Japão Parâmetro Descarga toaletes Irrigação áreas verdes Lagos e Fontes Ornamentais Meio Ambiente (características estéticas) Meio Ambiente (contato público limitado) E.coli/100mL ≤ 10 ND ND - - Cloro residual combinado (mg/L) Mantido >0,4 - - - Aparência NO NO NO - - Coliformes totais/100mL - - - < 1000 < 50 Turbidez (uT) - - < 10 < 10 <5 DBO (mg/L) - - < 10 < 10 <3 Odor NO NO NO NO NO pH 5,8 – 8,6 5,8 – 8,6 5,8 – 8,6 5,8 – 8,6 5,8 – 8,6 Cor (mgPt/L) - - - < 40 < 10 Irrigação e Usos urbanos Aplicação Critérios de qualidade EUA (Flórida) Nível de Tratamento Áreasb de acesso restrito e usos industriais 200 CF/100mL ml SST - 20 mg/L DBO - 20 mg/L Secundário + desinfeção Áreas com acesso ao públicoc; culturas alimentíciasd; descarga em toaletese; represamentos recreacionaisf; sistema de combate a incêndio; propósitos estéticos; controle de lixo. CF ND SST - 5 mg/L DBO - 20 mg/L Secundário + filtração + desinfeção Observação b Fazendas de grama, florestas, pastos, bosques, culturas forrageiras, fibras e grãos, e áreas similares. Áreas verdes residenciais, campos de golfe, cemitérios, parques, áreas paisagísticas, passeios, e áreas similares. d Permitido para culturas a serem cozidas, descascadas, ou processadas térmicamente antes do consumo. e Permitido em áreas residenciais sem acesso a sistema de abastecimento por poço, proibido em residências familiares. f Para contato primário com mais de 50% de imersão, em represas por exemplo, o critério de qualidade da água deve atender aos padrão microbiológico de potabilidade. c Usos urbanos EUA (Texas) Uso Compactação de Solos, controle de pó em estradas, lavagem de ruas Padrão de qualidade DBO< 20mg/l < 800 CF/100 ml Playground e gramados de hotéis e áreas de acesso amplo DBO < 5mg/l < 75 CF/100 ml 3 uT Cloro residual ≥ 1mg/l Irrigação de parques públicos, campos de golfe, futebol, cemitérios DBO< 20 mg/l <75 CF/100 ml Irrigação de florestas e áreas de acesso restritivo DBO < 20 mg/l < 800 CF/100 ml Cloro residual ≥ 1mg/l nitrato < 10mg/l Piscicultura (OMS, 1989) ≤ 103 CF/100 mL no tanque de piscicultura ou ∼104 CF/100 mL no afluente ao tanque de piscicultura e ausência de ovos de helmintos (trematóides). Comentários finais Utilização de esgotos sanitários no Brasil Necessidade, oportunidade ou realidade ? ¾ Quase ausência de tratamento de esgotos Qualidade das águas de irrigação. Qualidade de produtos agrícolas comercializados. Padrão epidemiológico-sanitário do país ¾ Disponibilidade e custo da água Necessidade, oportunidade ou realidade Vácuo político, institucional e legal • Parâmetros e critérios de qualidade • Critérios de projeto, código de boas práticas • Procedimentos de licenciamento, monitoramento e fiscalização • “importação” de parâmetros de qualidade • Reúso não controlado [ Iniciativas estaduais e municipais ] Necessidade, oportunidade ou realidade • Continuidade pesquisas ¾ Demonstração viabilidade ¾ Subsídio regulamentação PROSAB – importante etapa demonstrativa • Regulamentação ¾ PR reúso: GT → consulta pública ¾ Padrões de qualidade ¾Riscos aceitáveis ⇒ grau de tratamento ¾Riscos reais x Riscos potenciais (“risco nulo”) ¾Factibilidade técnico-econômica Regulamentação ⇒ reuso controlado x indiscriminado Edital 3 Tema 2 PUC-PR; UFBA; UFCE; UFES; UFMG; UFPE; UFRJ; UFRN; UFRS; UFSC; UFT; UFV; UNB; UNICAMP; USP. Edital 3 Tema 2 PUC-PR; UFBA; UFCE; UFES; UFMG; UFPE; UFRJ; UFRN; UFRS; UFSC; UFT; UFV; UNB; UNICAMP; USP. Edital 3 Tema 2 Irrigação de hortaliças Edital 3 Tema 2 Piscicultura (Tilápia do Nilo) Edital 3 Tema 2 Irrigação de forrageiras e alimentação animal