1 Universidade Federal do Pampa Raquel Einloft Kleinübing GESTANTES E PUÉRPERAS SOROPOSITIVAS PARA O HIV: COMO ESTÃO VIVENCIANDO A NÃO AMAMENTAÇÃO Trabalho de Conclusão de Curso URUGUAIANA 2010 2 RAQUEL EINLOFT KLEINÜBING GESTANTES E PUÉRPERAS SOROPOSITIVAS PARA O HIV: COMO ESTÃO VIVENCIANDO A NÃO AMAMENTAÇÃO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de enfermagem, para a obtenção do título de Bacharel em enfermagem da Universidade Federal do Pampa. Orientadora: Lipinski. Uruguaiana 2010 Profª. Ms. Jussara Mendes 3 FOLHA DE APROVAÇÃO 4 Dedico o meu Trabalho de Conclusão de Curso à Deus. És meu caminho, minha vida, minha inspiração, obrigada por tudo! “Deus Pai Todo poderoso, rogai por nós.” 5 AGRADECIMENTOS À Deus, fonte inesgotável de inspiração, de amor, Pai e amigo de todas as horas. Amo você. Aos meus amados pais, Paulo e Izabel, obrigada por estarem ao meu lado em todas as fases da minha vida. Agradeço a Deus por ter me enviado vocês. Amo vocês muito, mais do que tudo. Aos meus queridos irmãos, Ricardo e Aline, amores da minha vida, meus irmãos e acima de tudo, meus amigos fiéis de todas as horas. Amo vocês. Obrigada por tudo. À professora orientadora Jussara Mendes Lipinski, pela dedicação e compreensão que ajudaram-me muito a conquistar mais essa etapa da minha vida profissional. À amiga e irmã querida Fabiani Weiss Pereira, pela atenção, apoio e carinho em todos os momentos. Obrigada por estar do meu lado sempre quando precisei de ti. Te amo muito. Ao meu noivo, Sérgio Vicente Jaureguy Montano, companheiro e amigo querido que Deus colocou em meu caminho para completar a minha vida. Obrigada pelo incentivo a sempre continuar meus estudos e pelo apoio incondicional de todas as horas. Te amo e te amarei para sempre. Às minhas amigas queridas que Deus colocou em minha trajetória acadêmica, e que quero ao meu lado para todo o sempre: Carla Cibele Silveira da Costa, Naiana Oliveira dos Santos e Marieli Barcelos Ramires. À todos aqueles que me apoiaram e me incentivaram a nunca desistir de lutar. Obrigada a todos. 6 A neve e as tempestades matam as flores, mas nada podem contra as sementes. Kahlil Gibran 7 RESUMO A transmissão vertical do Human Immunodeficiency Virus (HIV) representa a forma mais comum de contaminação perinatal. Dados epidemiológicos do ano de 2006 informam que 85% de casos de infecção perinatal aconteceram através da transmissão vertical, o que poderia ser evitado com medidas que permitissem, a partir do esclarecimento das formas de contágio de mãe para filho, promover a profilaxia adequada, mediante o acompanhamento por uma equipe de profissionais que atendesse às expectativas das mulheres confirmadamente infectadas. Assim este estudo exploratório descritivo com abordagem qualitativa teve por objetivo conhecer como gestantes e puérperas soropositivas para o vírus HIV estão vivenciando ou vivenciaram a orientação de não amamentar. Participaram do estudo, gestantes e puérperas soropositivas para HIV em acompanhamento no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) e que procuraram por atendimento no mês de abril de 2010. Após a aprovação do Comitê de Ética da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) os dados coletados por meio de entrevista semi estruturada, foram submetidos à análise temática proposta por Minayo. Os dados, então, foram adaptados em duas categorias, que mencionam a dificuldade de enfrentamento que as mães soropositivas para o vírus HIV encontram na não amamentação e o gesto de amor que as mesmas consideram presente, no fato de não praticar o aleitamento materno. Pode-se concluir, a partir dos achados desse estudo, que a dificuldade existente em não amamentar está ligada a diversos fatores biológicos e psicossociais. E juntamente a esses fatores, há a presença, como evidenciado nas falas das entrevistadas, do preconceito e julgamentos a cerca da conduta dessas mães (não amamentar), bem como os sentimentos desencadeados por essa inibição, determinam a grande dificuldade de enfrentamento dessa questão. O ato de não amamentar é encarado por essas mulheres como sendo o gesto de amor ofertado aos filhos, já que evitam a transmissão vertical puerperal. Pode ser constatado nos relatos contidos nas entrevistas, dentre outras questões, que a possibilidade de gerar e ver crescer um bebê saudável e possivelmente livre do HIV, traz a essas mulheres sentimentos de felicidade por ter evitado a possível contaminação do filho, demonstrando, por ele, um gesto de amor, de zelo. Percebeu-se que a mulher na condição de gestante ou puérpera acometida pelo HIV, identifica na inibição da lactação a revelação da condição de estar doente, sendo assim as gestantes e puérperas soropositivas necessitam de um apoio maior para que possam aderir a orientação de não amamentar. Acredita-se que o assunto abordado seja de grande impacto nas opiniões da sociedade, pois existem diversos sentimentos que surgem em diferentes intensidades quando trata-se da gestação, e os mesmos tornam-se ainda mias intensos quando estão co-relacionados a presença do HIV. Considera-se de grande valia que novos estudos sejam realizados, abordando a problemática da não amamentação e sua relação com a contaminação perinatal. Descritores: Enfermagem, Aleitamento Materno, HIV 8 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................9 2 REVISÃO DE LITERATURA ..........................................................................................12 3 METODOLOGIA ...............................................................................................................19 3.1 Tipo de estudo .................................................................................................................19 3.2 Local de realização do estudo ..........................................................................................19 3.3 Período de realização do estudo .......................................................................................19 3.4 População ..........................................................................................................................20 3.5 Amostra .............................................................................................................................20 3.6 Critérios de inclusão e exclusão ........................................................................................20 3.6.1 Inclusão ..........................................................................................................................20 3.6.2 Exclusão .........................................................................................................................20 3.7 Método de coleta de dados ...............................................................................................20 3.8 Método de análise dos dados ............................................................................................21 3.9 Considerações éticas do estudo .........................................................................................22 4 ANÁLISE DOS RESULTADOS ........................................................................................23 4.1 Dificuldade de enfrentamento da condição da não amamentação ....................................23 4.2 Gesto de amor pelo filho (a) .............................................................................................29 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................................32 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................34 APÊNDICES ............................................................................................................................38 Apêndice A ..............................................................................................................................39 Apêndice B ...............................................................................................................................40 Apêndice C ...............................................................................................................................41 ANEXOS .................................................................................................................................42 Anexo 1 ....................................................................................................................................43 Anexo 2 ....................................................................................................................................44 9 1 INTRODUÇÃO A transmissão vertical do Human Immunodeficiency Virus (HIV) representa a forma mais comum de contaminação perinatal, pois como afirma Botelho (2008, p. 35) Sua taxa de transmissão pode chegar a 20% , ou seja, a cada 100 crianças nascidas de mães infectadas, 20 podem tornar-se HIV+. Com ações de prevenção, no entanto, a transmissão pode reduzir-se para menos de 1%. Dados epidemiológicos do ano de 2006 informam 85% de casos de infecção perinatal através da transmissão vertical, o que poderia ser evitado com medidas que permitissem, a partir do esclarecimento das formas de contágio de mãe para filho, promover a profilaxia adequada, mediante o acompanhamento por uma equipe de profissionais que atendesse às expectativas das mulheres confirmadamente infectadas, culminando em uma maior abrangência de gestantes e crianças. Dados recentes do Ministério da Saúde comprovam que o percentual total de gestantes infectadas era de 1,8% o que justifica os altos índices de recém natos infectados, pois como refere o Boletim Epidemiológico do MS (2008), o número de crianças com idade inferior a cinco anos infectados é de 31 por 100.000 habitantes no de Brasil. Já no Rio Grande do Sul, esta proporção é de 12 por 100.000 habitantes. Como acadêmica de enfermagem envolvida no cuidado, sempre tive a preocupação com mulheres e crianças que apresentavam resultado positivo para o vírus HIV. A partir da busca de conhecimentos mais aprofundados sobre a infecção e dados relativos a transmissão vertical, a preocupação aumentou, o que determinou maior interesse acerca dessa problemática, na tentativa de compreender o contexto em que essas mulheres e crianças estão inseridas, os anseios, dúvidas e medos que as cercam em relação à transmissão vertical, assim como a questão da não amamentação. Embora sem ter vivenciado contato direto com puérperas soropositivas para HIV sempre me preocupou como seria, para elas, receber um diagnóstico, quais seus sentimentos em relação a gestação, já que a condição de gestante faz despertar uma série de outros sentimentos e expectativas, como a mulher enfrenta o fato de existir a possibilidade de contaminação do bebê e a impossibilidade real de amamentar. 10 Acredito que como conduta primordial do enfermeiro frente a essa problemática, deve ser o aconselhamento embasado em conhecimentos oriundos de capacitação e sensibilidade humana, para saber ouvir e orientar com informações adequadas e comportamento que promova a aproximação e laços de confiança entre paciente e profissional. Nessa perspectiva, tem-se a afirmação de Amatuzzi (1990), onde refere que ouvir vem antes de falar, ou seja, o fato de escutar realmente o que o outro ser fala, representa um imenso crescimento, remetendo-nos ao mundo e aos outros, em termos de relacionamento interpessoal, de comunicação. Já a relação do falar não contribui na mesma proporção, pois compreende a roupagem da palavra, como ela é referida aos outros. Amatuzzi (1990) relata ainda que o verdadeiro ouvir consiste em entender o que as pessoas dizem, e não apenas aquilo que elas falam, sendo essa a disposição de ouvir realmente, pois consiste em entender o significado pleno, o que culmina por produzir um contato entre as pessoas, levando ao enriquecimento pessoal. Se não houver o enriquecimento através do contato, significa que não ouve plena comunicação, portanto não existiu o ouvir realmente. Essa forma de pensar e agir, exposta pelo autor, pode ser aplicada ao relacionamento entre os sujeitos do cuidado, ou seja, o profissional enfermeiro(a) deve propor-se a ouvir as mulheres soropositivas, promovendo uma aproximação e vínculo real, que permita um momento de troca efetivo. Essa comunicação deve-se fazer presente em todos os momentos da assistência, e o profissional necessita estar atento para as manifestações subjetivas das palavras produzidas pelas gestantes, para saber interpretá-las em seu pleno significado, possibilitando uma relação positiva entre ambos. Assim se reforça a necessidade da escuta comprometida como uma das características essenciais na atenção ao binômio mãe e bebê quando se pensa em atenção integral. A idéia de atenção integral à mulher no pré-natal surgiu a partir do Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento (PHPN) no ano de 2000, pois como afirma Serruya, Cecatti e Lago (2004) a falta de atenção e percepção da mulher como sujeito, com direitos reprodutivos, aliado à falta de conhecimento e desrespeito à esses direitos, por parte dos profissionais de saúde, refletiam a precária assistência direcionada a mulher antes do PHPN. Essa conclusão levou o Ministério da Saúde a desenvolver, em junho de 2000, o PHPN, que visa a incorporação de elementos como o respeito aos direitos de reprodução e a humanização dos serviços de saúde. O enfermeiro, como um dos profissionais que compõe a equipe multiprofissional de saúde tem papel fundamental na orientação e adesão das gestantes e puérperas no tratamento com a terapia antiretroviral, bem como nas medidas que devem ser adotadas após o 11 nascimento da criança, como a inibição da lactação. Pois como afirma Vaz e Barros (2000, p.1 e 2) Com as crescentes taxas de infecção pelo HIV na população feminina em idade fértil podemos observar um aumento correspondente de infecções congênitas. A enfermeira obstetra deve, portanto, estar atualizada para a participação e desenvolvimento de programas de assistência pré-natal às gestantes portadoras do HIV. De uma maneira geral, o enfermeiro, mesmo sem possuir uma especialização em saúde materno-infantil, deve estar preparado para oferecer uma assistência adequada à paciente e ao recém nascido. A atuação do enfermeiro é essencial, já que o contato com as gestantes se faz em maior intensidade e freqüência, como por exemplo, durante as consultas do pré-natal onde são oferecidas informações e orientações importantes para o desfecho favorável do processo gravídico-puerperal, além da requisição de exames fundamentais para a detecção precoce de doenças, dentre as quais o anti HIV. A testagem para esse vírus exige do enfermeiro competência técnica científica e humanística para realização de aconselhamento, onde possa esclarecer dúvidas, amenizar anseios, tornando este momento um espaço de troca entre profissional e paciente, para que a mulher sinta-se acolhida e protegida, independentemente do resultado do teste. A chegada do resultado e a revelação do diagnóstico, principalmente quando positivo, consistem em um momento delicado, onde a gestante pode se mostrar frágil e tensa, necessitando que o profissional possa escutá-la e para isso deve haver a interação entre ambos, estando o enfermeiro disponível para oferecer seu apoio e compreensão. (BRASIL, 2007) Assim, o aconselhamento pós teste, é um dispositivo essencial para esclarecer dúvidas, ofertar as orientações referente aos procedimentos e cuidados que a puérpera soropositiva será submetida antes, durante e após o parto. Dada a importância da temática e os riscos da transmissão vertical do HIV, este estudo tem como objetivo geral: Conhecer como gestantes e puérperas soropositivas para o vírus HIV estão vivenciando ou vivenciaram a orientação de não amamentar. 12 2 REVISÃO DE LITERATURA A transmissão materno-infantil, ou seja, a contaminação do feto pelo vírus HIV, oriundo de prévia soropositividade materna, é uma das maiores responsáveis pelo diagnóstico positivo de crianças em todo o mundo, sendo assim, segundo Bellini (2008), essa preocupante realidade provém de um significativo aumento nas infecções maternas pelo HIV e, consequentemente, há a preocupação com o possível contato do feto com o vírus, vindo a desenvolver a soropositividade. Os dados percentuais gerais referentes às formas de transmissão vertical do HIV demonstram que Cerca de 35% dessa transmissão ocorre durante a gestação, 65% ocorre no periparto e há um risco acrescido de transmissão através da amamentação entre 7% e 22% por exposição (mamada), entretanto, a administração da Zidovudina (AZT) na gestação e o uso de AZT no parto e no recém-nascido , reduz a taxa de transmissão vertical para 8,3% (BRASIL, 2007, p. 12). A infecção da criança pelo vírus pode ocorrer em várias fases da gestação, ou seja, durante a gestação, parto e após o parto, no aleitamento materno (VAZ e BARROS, 2000). Essa transmissão dá-se devido à uma série de fatores que estão presentes desde o prénatal, no qual constitui um momento importante para a detecção precoce do HIV, pois é através dessas consultas que o profissional fará as orientações adequadas sobre os cuidados com a gestação, bem como a requisição de exames fundamentais, dentre eles, o Anti-HIV, constituindo uma forma importante de prevenção à transmissão perinatal do HIV, pois como preconiza o Ministério da Saúde (2007, p. 15) Como uma das estratégias para qualificar e ampliar o acesso ao diagnóstico do HIV, particularmente para gestantes no pré-natal e maternidades, o PN-DST/AIDS está incluindo a implantação do teste rápido para o diagnóstico. A utilização desses testes permite que, no momento da consulta seja realizado o teste, o aconselhamento e o diagnóstico em menos de 30 minutos, desde que realizado por profissionais de saúde devidamente capacitados. 13 Essa conduta permite que medidas sejam tomadas com antecedência, evitando a contaminação do feto, que seria inevitável se não houvesse intervenções profiláticas adequadas. Nas situações em que o rastreamento e diagnóstico confirmatório da soropositividade não forem realizados durante a gestação, por motivos de não adesão ao pré- natal, ou mesmo a não requisição do teste Anti-HIV pelo profissional de saúde, o teste rápido para a detecção do vírus deve ser oferecido às gestantes nessa situação, pois segundo Brasil (2007, p. 60) “na entrada da parturiente na maternidade deve ser oferecido o teste rápido para o HIV para todas as gestantes que não tenham realizado investigação no pré-natal ou cujo resultado não esteja disponível”. Durante o pré-natal, toda gestante tem o direito e o dever de realizar o teste anti-HIV. Quanto mais precoce o diagnóstico da infecção pelo HIV na gestante, maiores são as chances de evitar a transmissão para o bebê, pois O conhecimento do status sorológico da infecção pelo HIV e a precocidade do diagnóstico torna possível a adoção de medidas que possibilitem a interrupção da cadeia de transmissão, além de permitir uma atenção adequada às gestantes infectadas (BRASIL, 2009, p.20). Uma vez detectado a soropositividade da mãe, essa gestante passa a ser considerada de alto risco, à medida que possui considerável chance de transmitir o vírus ao feto, além de exigir dos profissionais um acompanhamento mais apurado, pois necessitará do apoio e compreensão no momento do diagnóstico, além do adequado acompanhamento puerperal. Segundo Vaz e Barros (2000), o aumento no número de mulheres que tornam-se soropositivas durante a idade reprodutiva reflete uma maior preocupação em relação às gestantes HIV na assistência pré-natal, não somente devido ao desenvolvimento do feto e aos riscos que a gestação nessas condições implica, mas também no que diz respeito às questões de cunho psicológico, social e familiar. Juntamente a essa conduta, tem-se a realização do aconselhamento pré e pós-teste. Essa intervenção permite que sejam realizadas as orientações necessárias, além de ofertar à gestante o apoio no momento do diagnóstico, o qual consiste uma etapa desafiadora à mulher, no caso do resultado positivo, pois há a junção de uma série de sentimentos, e a condição de gestante faz aflorar sensações como medo de contaminar o bebê, devido a todas as alterações 14 psicológicas que essa etapa provoca à gestante. Afirmam Vinhas et. al. (2004), que o fato de estar grávida e também soropositiva, traz a mulher diversas modificações no âmbito psicológico, e essas mudanças ocorrem devido ao fato de entenderem que a contaminação pelo vírus HIV não possui cura até o presente momento, e essa condição leva a uma maior expectativa em relação a transmissão ao filho. Portanto, nessas condições, faz-se necessário que o apoio e a orientação sejam os componentes principais do aconselhamento, pois ajudará a gestante a entender e enfrentar as situações conflituosas que a condição da soropositividade exprime, culminando no auxílio da gestante à adesão tanto ao teste, na situação de aconselhamento pré-teste, quanto às medidas de prevenção, na situação de aconselhamento pós- teste (BRASIL, 2006). Segundo o Ministério da Saúde (2007) a interação e o vínculo entre a gestante e o profissional que está realizando a assistência, são os pilares fundamentais para que o aconselhamento seja eficaz, sendo assim, deve partir do profissional o estímulo da escuta acerca dos anseios e possíveis dúvidas da paciente. Nessa linha de raciocínio, é imprescindível a conduta acolhedora entre profissional e paciente, uma vez que o bom relacionamento entre ambos permitirá um acompanhamento baseado na confiança, fazendo com que as orientações e condições propostas pelo profissional atuante nas consultas, sejam melhor aceitas pela gestante. O diálogo permite que a interação entre os sujeitos, profissional e gestante, ofertando um momento de trocas de conhecimentos, proporcionando ao profissional conhecer melhor o contexto ao qual a mulher soropositiva está inserida, bem como, apontará o caminho adequado a ser traçado no seguimento do tratamento e prevenção da transmissão vertical do HIV, pois como afirma o Ministério da Saúde (2007, p. 18) “A integralidade, subjetividade e compreensão dos diversos contextos de vulnerabilidades são elementos fundamentais para a abordagem de redução de riscos”. As orientações das gestantes durante o pré-natal constituem medidas que podem tornar inviável a transmissão, desde que haja a devida atenção, comprometimento e dedicação do profissional que está prestando a assistência direta à paciente, para que sejam esclarecidas dúvidas sobre as formas de transmissão, promovendo o entendimento, e assim, a consequente adesão às medidas profiláticas da transmissão vertical, como afirma Ortigão (1995) devido ao fato de não existirem tratamentos ou vacinas que sejam eficazes contra a contaminação pelo HIV, a profilaxia faz-se a melhor alternativa contra a transmissão do vírus ao feto, sendo fundamental conhecer os mecanismos de transmissão do HIV. 15 As intervenções preconizadas pelo Programa Nacional de DST e Aids, atualmente, para reduzir a transmissão vertical do HIV são O uso de anti-retrovirais a partir da 14ª semana de gestação, com possibilidade de indicação de AZT ou terapia anti-retroviral tríplice; utilização de AZT injetável durante o trabalho de parto; realização de parto cesário eletivo em gestantes com cargas virais elevadas ou desconhecidas, ou por indicação obstétrica; AZT oral para o recém-nascido exposto, do nascimento até 42 dias de vida e inibição de lactação associada ao fornecimento de fórmula infantil até os seis meses de idade (BRASIL, 2007, p.13). Das formas de contágio do feto pelo HIV, como já descrito anteriormente, a intraplacentária, ou seja, durante a gestação, ocorre a partir de trocas entre a mãe e o feto. Esse mecanismo de transmissão, ainda pouco conhecido, é a de menor incidência quando comparada à forma de infecção no peri-parto, sendo considerável as chances de não haver contaminação do feto, quando adotadas medidas profiláticas adequadas e adesão da gestante ao pré-natal, ao tratamento e recomendações do profissional (BRASIL, 2007). A transmissão peri-parto, ou seja, durante o trabalho de parto ou no parto propriamente dito, ocorre devido ao contato do feto com secreções cérvico-vaginais ou com sangue oriundo de microfissuras cutâneas da mãe (ORTIGÃO, 1995), no momento em que se dá o rompimento das membranas amnióticas e o recém nascido passa a ter contato direto com a mãe, pois afirma o Ministério da Saúde (2009, p. 45) que O tempo de ruptura das membranas amnióticas está associado ao risco de transmissão vertical: quanto maior o tempo de ruptura maior será o risco de transmissão do HIV, particularmente quando superior a 4 horas. Fatores associados ao trabalho de parto interferem diretamente no risco de transmissão. A contratilidade uterina desencadeia microtransfusões placentárias, levando ao maior contato do feto com o sangue materno. Em decorrência disso, a maior duração do trabalho de parto está associada com maior risco de transmissão vertical do HIV. Segundo o Ministério da Saúde (2007), essa forma é descrita como a maior responsável pela transmissão vertical, estando presente em 65% dos casos. A transmissão oriunda do pós-parto deve-se a prática do aleitamento materno, desaconselhada pelo Ministério da Saúde (2007), que refere uma parcela de contaminação infantil entre 7% e 22%. A transmissão vertical puerperal, ou seja, devido à amamentação, exprime diversas faces de uma realidade que parece triste para uma parcela de mulheres 16 infectadas, pois o fato de não poder oferecer o alimento ao filho, quando o mesmo chora de fome, pode trazer à mulher sensações e sentimentos desagradáveis, como por exemplo, fracasso como figura de mãe, punição pela soropositividade para o vírus HIV, tristeza, angústia, negação da condição de não amamentar, não aceitação do diagnóstico positivo, e constrangimento perante a família, vizinhos e amigos, pois a puérpera, muitas vezes, esconde a medicação dada ao filho, bem como omite e/ou mente às pessoas sobre a impossibilidade de amamentar, o que dificulta o tratamento (BELLINI, 2008). Os sentimentos vivenciados por estas mulheres-mães são os mais diversos, juntamente com as idealizações e mitos presentes no fato de amamentar, como se esse poder conferido a elas simbolizasse a única forma de vínculo com seu filho, pois não se trata apenas da doença em si, ou seja, fatores físicos, mas também inclui fatores sociais, econômicos e culturais, e mães soropositivas para o vírus HIV e que não amamentam seus filhos são, muitas vezes, questionadas pela sociedade quanto ao fato de terem contraído o HIV, considerando essa realidade como sendo fruto de uma vida promíscua, percebendo a soropositividade para o HIV como um castigo (MORENO; REA; FILIPE, 2006). Esta visão que a as pessoas referem faz com que as gestantes e puérperas encontrem na não amamentação, um perdão para o castigo que julgam ser a infecção pelo HIV, como se a proteção ofertada ao filho (não amamentá-lo), de alguma forma, também fosse sua própria proteção, ela beneficia-se ao proteger a criança, pois passa a ter a chance de ser aceita e, de alguma forma, “perdoada” pela sociedade, que considerará sua atitude como positiva (MORENO, REA, FILIPE, 2006). Os benefícios do aleitamento materno são inúmeros, sendo o leite fonte de subsídios alimentares indispensáveis aos primeiros meses de vida do recém-nascido, essa concepção não é contestada e sim incentivada, pois à medida que os estudos nessa área avançam, e as propriedades do leite materno vêm sendo descobertas e mais conhecidas, pois o mesmo deve ser o alimento exclusivo até os seis meses de idade do lactente, devido a sua superioridade comparada a outras formas de alimentação, o que contribui para a diminuição da morbimortalidade infantil, principalmente através do auxilio na redução de doenças infecciosas, especialmente a diarréia (BRASIL, 1995). À medida que são aprofundadas as pesquisas e examinadas as particularidades metabólicas e nutricionais da criança, entre os benefícios concedidos ao recém nascido podese destacar a diminuição dos fenômenos alérgicos, proteção contra infecções, melhor digestibilidade, além do estreitamento do vínculo do binômio mãe-filho (BRASIL, 1995). 17 Além de beneficiar a criança, a prática de amamentar pode promover diversos benefícios à mãe, além do momento de interação e carinho com o bebê, também são verificados a diminuição de chances de desenvolver câncer de mama, recuperação mais rápida do peso pré-gestacional, diminuição de sangramento pós-parto (BRASIL, 1995). Em contrapartida, com todo o incentivo ao aleitamento, têm-se a outra face da realidade, a existência de mães soropositivas para o vírus HIV que são impossibilitadas e desaconselhadas a amamentar, essa condição refere-se à presença de riscos de contágio do bebê pelo vírus HIV. Com o aumento de infectividade de mulheres em idade reprodutiva, consequentemente, o índice de crianças também se torna elevado, por isso é fundamental que haja o esclarecimento da forma de contágio através do aleitamento, tanto para preservar a prática da amamentação, quanto para desenvolver métodos de controle da disseminação da infecção. Como medidas de profilaxia à transmissão vertical preconiza-se que a prática do aleitamento cruzado não deve ser permitida, bem como a mãe HIV positiva não deve doar seu leite ao banco de leite. Nos casos em que o leite materno é fator de sobrevivência ao recém nato, o leite deverá então, passar por um adequado processo de pasteurização, com aquecimento a 62,5ºC por 30 minutos, e esse tratamento térmico é capaz de inativar 100% das partículas de HIV presentes no leite, e passíveis de infectar o recém nascido (BRASIL,1995). Segundo Ministério da Saúde (2009, p. 137) “É terminantemente contra-indicado o aleitamento cruzado (amamentação da criança por outra nutriz), alimentação mista (leite humano e fórmula infantil) e uso de leite humano com pasteurização domiciliar”. Assim é orientada e instituída a inibição farmacológica e a não farmacológica. A inibição farmacológica deve ser realizada utilizando-se Cabergolina, e sua administração deve ser efetivada imediatamente após o parto, com a dosagem de 1mg via oral, em dose única, ou seja, dois comprimidos de 0,5 mg via oral. Sua indicação se dá por motivos de efetividade, comodidade posológica, bem como a menor incidência de efeitos colaterais, e esse medicamento deve ser utilizado antes do período de alta hospitalar da paciente. Já a inibição não farmacológica é realizada através da compressão das mamas com uma atadura, devendo ser realizada com cautela, pois há risco de comprometimento dos movimentos respiratórios, levando ao desconforto, e conseqüente não adesão à medida indicada, além disso, em regiões de clima quente, há a ocorrência de abscessos mamários, o que dificulta ainda mais a utilização da faixa. O período de enfaixamento é preconizado em dez dias, iniciando imediatamente após o parto, não devendo a mama ser manipulada, ou estimulada (BRASIL, 2009). 18 O enfermeiro que acompanha as mulheres em situação de inibição da lactação deve estar atento, pois a inibição tanto farmacológica quanto a não farmacológica pode ser igualmente dolorosa, física e emocionalmente para a puérpera que desejava amamentar. Frente ao conhecimento destas dificuldades este estudo justifica-se pelo interesse em conhecer como as mulheres soropositivas para o HIV têm vivenciado estas recomendações, com vistas à promoção da saúde. 19 3 METODOLOGIA 3.1 Tipo de estudo Tratou-se de um estudo qualitativo, sendo esse tipo de abordagem a melhor opção para a investigação de grupos focalizados, de vivências sociais sob o ponto de vista dos atores. O método qualitativo possui fundamentação teórica, permitindo, além do aprofundamento em questões sociais referentes a grupos pouco conhecidos, oferece também, subsídios para a construção de novas abordagens, conceitos e hipóteses durante a investigação (MINAYO, 2007). O estudo foi do tipo exploratório descritivo, na qual o mesmo visa o desenvolvimento, o esclarecimento e a modificação de conceitos e idéias existentes, para que possam ser realizadas abordagens e estudos futuros, proporcionando ao pesquisador uma maior compreensão acerca do assunto para a formulação de hipóteses para posteriores pesquisas (exploratório) possibilitando ainda descrever as informações e conhecimentos apreendidos (descritivo) (GIL, 1999). 3.2 Local de realização do estudo O estudo foi realizado no município de Uruguaiana, Rio Grande do Sul, no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA), onde em 1995 o Serviço de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) iniciou as suas atividades implantando um centro que proporciona à população testagem anti-HIV gratuita, bem como oferece também atividades como a prática de educação em saúde. (PARRAGA; BENITES, 2005). Porém, o CTA do município, encontra-se em processo de reestruturação, não oferecendo a testagem anti-HIV momentaneamente, retornando a suas atividades no mês de março do ano de 2010. 3.3 Período de realização do estudo O estudo foi realizado no período de março a julho de 2010 sendo que a coleta de dados foi realizada no mês de abril. 20 3.4 População Atualmente são atendidas no CTA 447 mulheres (entre não gestante, gestantes e puérperas). 3.5 Amostra Foram convidadas a participar do estudo as puérperas e gestantes que já vivenciaram o período puerperal sem amamentar devido à soropositividade para o vírus HIV, que compareceram ao CTA para atendimento nas segundas e quartas-feiras no período da tarde do mês de abril. O total de seis sujeitos aceitaram participar do estudo, aderindo a entrevista. 3.6 Critérios de inclusão e exclusão 3.6.1 Inclusão: Ser gestante ou puérpera soropositiva para o HIV, já tendo vivenciado a orientação de não amamentar em decorrência do HIV. 3.6.2 Exclusão: Ser gestante ou puérpera soropositiva para o HIV sem nunca ter vivenciado a não amamentação. 3.7 Método de coleta de dados Foram realizadas entrevistas, que compreendem um guia visando entender as idéias do entrevistado, contendo poucas questões, não devendo, portanto, servir como obstáculo durante 21 a entrevista, prevendo todas as situações durante o trabalho de campo, pois questões irão surgir ao longo dos questionamentos e o roteiro de entrevista de atuar frente a essas emergências, dando continuidade aos assuntos (MINAYO, 2007). As mesmas foram semi-estruturadas, ou seja, o roteiro da entrevista funcionou apenas como tópicos de lembretes, podendo ser utilizado pelo entrevistador ao longo da conversa. Esse roteiro deve ser flexível, à medida que possibilite a adição de novos temas, considerados relevantes, trazidos pelo entrevistado (MINAYO, 2007). As entrevistas foram gravadas em aparelho MP3 e após seu término foram transcritas. Há a exceção dos sujeitos que não permitiram a gravação da mesma, nesse caso, as entrevistas foram transcritas de acordo com as falas. Não foram utilizadas imagens dos sujeitos da pesquisa. Durante o período de coleta, caso fosse necessário os contato dos sujeitos com a pesquisadora foi fornecido o telefone fixo institucional, bem como o número do telefone móvel da pesquisadora responsável, no qual os sujeitos poderiam realizar chamadas à cobrar, identificando-se. 3.8 Método de análise dos dados O método utilizado para análise dos dados foi a Análise Temática, que segundo Minayo (2007, p. 316) “consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem uma comunicação, cuja presença ou freqüência signifiquem alguma coisa para o objeto analítico visado”. Este tipo de análise se divide em etapas conforme descrito a seguir: Primeira etapa Pré-análise: quando se dá a escolha dos documentos a serem analisados, na retomada dos objetivos iniciais da pesquisa. A pré-análise pode ser decomposta nas seguintes tarefas: a) Leitura flutuante do conjunto de comunicações, em que o pesquisador toma contato direto com o material de campo, deixando-se impregnar por seu conteúdo. b) Constituição do corpus, termo que diz respeito ao universo estudado em sua totalidade, deve responder a algumas normas de validade qualitativa: exaustividade, representatividade, homogeneidade, e pertinência. c) Formulação e reformulação de objetivos, processo que consiste na retomada da etapa exploratória, tendo como parâmetro a leitura exaustiva do material, as indagações iniciais; 22 neste momento a riqueza do material de campo não deve ser obscurecida pelo tecnicismo; por isso se fala em reformulação de hipóteses, o que significa a possibilidade de correção de rumos interpretativos ou abertura para novas indagações. Segunda Etapa: Exploração do material: consiste essencialmente em uma operação classificatória, que visa alcançar o núcleo de compreensão do texto nesta fase o investigador busca categorias que são expressões, ou palavras significativas, em função das quais o conteúdo de uma fala será organizado. A categorização, que consiste no processo de redução do texto a palavras e expressões significativas e a uma etapa delicada, não havendo segurança de que a escolha de categorias a priori leve a uma abordagem densa e rica. Terceira Etapa: Tratamento dos resultados obtidos e interpretação: aqui o analista propõe inferências e realiza interpretações, relacionando-as com o quadro teórico desenhado inicialmente ou abre outras pistas em torno de novas dimensões teóricas e interpretativas, sugeridas pela leitura do material (MINAYO, 2008). 3.9 Considerações éticas do estudo Para atender às normas regulamentadoras das pesquisas envolvendo seres humanos em consonância com o parecer do Conselho Nacional de Saúde (CNS)196/96, foi oferecido às mulheres um termo de consentimento livre e esclarecido (apêndice A), no qual foram informados os procedimentos de abordagem dos sujeitos, foram ainda informadas que a pesquisa oferecia risco mínimo, foi garantido anonimato dos sujeitos, assim como sua possibilidade de desistência do estudo em qualquer fase de realização dos trabalhos sem que isto implicasse em situações que viessem a comprometer seu atendimento na unidade de saúde. As informações foram utilizadas somente para fins acadêmicos. Os dados obtidos das entrevistas permanecerão em poder da pesquisadora responsável pelo prazo de cinco anos, decorrido este período o mesmo será incinerado. O presente projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa e somente foi executado após sua aprovação com parecer número 006 2010. 23 4 ANÁLISE DOS RESULTADOS A partir dos dados coletados foram estabelecidas duas categorias, elencadas seguindose as fases propostas pela análise temática de Minayo. 4.1 Dificuldade de enfrentamento da condição da não amamentação A inibição da lactação trata- se de uma conduta preconizada pelo Ministério da Saúde para evitar a transmissão vertical do HIV, pois o índice de contaminação materno-infantil eleva-se cerca de 25% em recém-nascidos de mães soropositivas para o vírus HIV que não realizaram a aplicação das medidas de profilaxia adequadas durante as fases do pré-natal, parto e puerpério, sendo essa taxa de infecção reduzida a parâmetros de 2%, quando aplicada tais medidas. A não amamentação proporciona que sejam evitados riscos entre 7% a 22% ocorridos devido à exposição do recém-nascido no momento da mamada, ou seja, quando a criança entra em contato com leite materno contaminado. Essa conduta está associada ao fornecimento de fórmula infantil até os seis meses de idade das crianças submetidas a tais métodos de inibição (BRASIL, 2007). Além dos fatores biológicos envolvidos na condição de amamentar, existem também os fatores psicossociais, ou seja, aqueles que envolvem a identidade materna existente nesse ato, e como a mulher-mãe enfrenta essa negação imposta pela presença da soropositividade para o vírus HIV. A perspectiva da soronegatividade do filho confronta-se com diversos dilemas existentes, os quais destacam-se os físicos, sociais e emocionais, pois a sociedade ainda faz-se rígida em relação a questões envolvendo mulheres soropositivas para o vírus HIV que decidem assumir uma gestação. Essas mulheres enfrentam um risco social denominado culpabilização, pelo fato das mesmas terem a possibilidade ou o risco de transmitir ao filho uma patologia grave e momentaneamente sem cura, trazendo ao filho as mesmas limitações aos quais são submetidas (BRAGA, 2009). Esse sentimento reflete a parcela existente de um possível preconceito, vivenciado e expressado nas falas a seguir: “(...) Aí mas aquilo assim te dói porque ficam te olhando com uma desconfiança sabe, aí tu fica naquela assim...e agora o que que vão fala...fico naquela...aí eu até tinha pensado em 24 dize que eu pudesse te hepatite né, que hepatite também a gente não pode amamenta, mas mesmo assim...tem a...tem gente que já te...que se afasta de ti também...”E6 “(...) Causa que muita gente às vez, se tu fala assim já te olha diferente, já te tratam diferente...é diferente...”E6 A presença de um possível pré-julgamento a cerca da impossibilidade que essas mulheres têm em amamentar gera um imenso desconforto como pode ser observado nos relatos acima, o que foi também evidenciado através da linguagem não-verbal durante as entrevistas. Segundo Silva et al. (2000) a expressão não verbal compreende as manifestações do ser humano, que não são expressas pela fala através das palavras, e sim os gestos, expressões faciais, bem como através da postura corporal apresentada pelo indivíduo ao relatar ou vivenciar determinada situação. As gestantes e puérperas mostravam-se desconfortáveis ao relatar sua experiência de não amamentação, pois a possibilidade da transmissão materno-infantil juntamente ao preconceito ainda presente denotam que, o fato de a mulher optar pela maternidade, na presença da soropositividade para o vírus HIV, é geralmente encarada como um ato de total irresponsabilidade e egoísmo por elas praticado (SANT’ANNA; SEIDL; GALINKIN, 2008). O relato a seguir, demonstra a grande preocupação com o pré-julgamento perante a condição de a gestante ou puérpera serem soropositiva para o vírus HIV, isso lhes coloca frente à possibilidade de discriminação de seus filhos. Essas situações, quando relacionadas à condição de não amamentar o filho, geram sentimentos que refletem o medo de que a sociedade tome conhecimento do diagnóstico da soropositividade para o vírus HIV que elas possuem devido à possibilidade de estigmatização e culpabilização das mesmas (BRAGA, 2009) “(...) eu converso às vez muito com a mãe...(gaguejos)...tenho medo, tentar esconder o máximo das minhas filhas pra um dia não jogarem na cara delas...às vezes eu fico pensando nisso...é que às vez corre boato, coisa assim né..e...tarem jogando na cara ...as criança não têm culpa... mas é que têm gente que são umas pessoa ignorante..e tratam às vez...e o erro do pai delas, elas pagarem...é isso que eu tenho medo...” E6 “Outra fonte de preocupação para as mulheres HIV+ grávidas ou puérperas refere-se ao fato de a não amamentação levantar suspeita sobre o seu status sorológico, expondo-as eventualmente à estigmatização social” (SANT’ANNA; SEIDL; GALINKIN, 2008, p. 108). 25 Pode ser observada nos relatos a seguir a dificuldade enfrentada por essas mulheres, no que diz respeito à necessidade de omissão da soropositividade, que está estreitamente correlacionada com a amamentação, pois as mesmas sentem-se “obrigadas” omitir o real motivo pelo qual são desaconselhadas a amamentar: “(...) Difícil...rsrsrs (risos)...por causa que a primeira vez...quando eu descobri eu tive aquele choque né, eu só pensava que eu não podia amamenta né... aí quando eu ganhei ela né, aí iam no quarto..ai por que tu não bota...tu não dá mamá? E eu bem assim...ah porque eu não tenho leite, e uma que ela, ela nasceu magrinha...aí eu tinha a desculpa que ela não pegava, uma que não tinha leite e outra que ela ia te que fica na neo..mas mesmo assim aí depois quando eu fui..não...elas me deram remédio lá pra seca meu peito, aí quando é....eu fui pra casa que encheu...” ...” E6 “(...) Já dessa aqui já foi diferente...claro que a gente sente meio assim por não pode amamenta, mas já, já não doeu tanto assim, mas...a gente fica assim, as pessoa perguntam por que que tu não amamenta, aí...eu bem assim, é que eu não tenho leite, e uma que eu tenho pouco seio, aí eu tenho a desculpa, aí bem assim...não é que não...não baixa o leite, já não, já não pude amamenta na primeira, na segunda já não deu também...” ...” E6 “(...) É aquilo assim sabe, às vez dói...por tu ta...tu não te o que fala pra pessoa...isso dói...aí...o brabo também é o leite em pó resseca também...mas...como se diz, a vida é assim...” E6 “(...) Aí eu até tinha pensado em dize que eu pudesse te hepatite né, que hepatite também a gente não pode amamenta, mas mesmo assim...tem a...tem gente que já te...que se afasta de ti também...” E6 Os sentimentos relatados pelas gestantes e puérperas refletem a grande dificuldade em enfrentar a condição de não amamentar seus filhos, o que evidencia-se também nos seguintes relatos: “(...) Pra mim foi difícil né, porque eu não sabia que tinha, fiquei sabendo no meu terceiro filho, das outras eu pude, a gravidez das outras não são...” E2 “... pra mim foi difícil não pode amamenta ela se vinha com as mão nos peito, tudo, e eu não pude amamenta...” E2 “(...) Pra mim têm sido muito difícil, por...porque desde que...desde pequena a gente brinca de boneca,a gente pensa assim, ai eu vou cresce, vo ter filho,vou dá mamá,vo troca, vo cuida...e aí quando eu descobri que tava com HIV...eu não acreditei, eu saí desnorteada, eu não sabia...eu pensei até em me atira na frente de um carro...e a primeira coisa que me veio 26 na cabeça era isso, porque é o contato que tu têm com o teu filho, é...o..é...é vida que tu ta dando pra ele...”E5 “(...) Tu não pode amamenta é a mesma...claro, tu vai te ele contigo, mas não é a mesma coisa, tu pode dá, transmiti vida pra ele, tu pode passa um pouquinho...fica, senti ele mais pertinho de ti...senti sabe...”E5 “(...) Ele sente a tua respiração melhor, sente até o batimento do teu coração melhor...acalma pra eles é melhor...pra mim é muito difícil, é muito triste...”E5 O sofrimento emocional desencadeado pela não amamentação proporciona um sentimento de dor, como relatado por algumas entrevistadas, pois se compreende como senso comum na sociedade, que o fato da mãe não ofertar o leite materno, pode denotar alguma alteração relacionada aquela mulher, seja de caráter pessoal, como falta de zelo, desamor, negligência, entre outros (BRAGA, 2009), ou de caráter patológico, ou seja, a impossibilidade de amamentar devido à alguma alteração orgânica, que a impeça de amamentar o filho, o que gera de alguma forma, a desconfiança entre as pessoas para com ela. No momento da descoberta da impossibilidade da amamentação, algumas vezes, a mulher sente-se como se sua maternidade fosse reduzida pela metade, como se de alguma maneira o seu papel de mãe fosse menos importante do que de outras que podem amamentar seus filhos, pois compreende-se a amamentação como sendo o simbolismo materno, ou seja, o ato de nutrir o filho possui, além de um determinismo biológico , o fator sociocultural condicionador (ALMEIDA; NOVAK, 2004), o que pode tornar difícil o enfrentamento da impossibilidade de estar coerente com o comportamento das demais mulheres/mães, o que pode gerar, algumas vezes, o sentimento de inferioridade perante outras mães que amamentam. Pode-se observar, nos relatos a seguir, a presença de tais sentimentos: “(...) Ás vez eu quero se tão forte sabe...mas às vez dói...Hunf (suspiro)...é como diz a minha mãe...Deus nada dá se a gente não pode suportar...mas é que às vez dói...Hunfffff (longo suspiro)...”E6 “(...) Eu chorava de raiva...do pai dela e na mesma hora eu chorava de raiva porque eu não podia dá... que aquilo me doía...”E6 “(...) Ás vez eu fico pensando, por que os outros podem amamenta e eu não posso...”E3 27 O sentimento de inferioridade retratado no relato acima remete a outra questão, que muitas vezes parece ser enfrentado por essas mulheres, denominado sentimento de impotência perante a contaminação pelo HIV, bem como às limitações por ela impostas, como a não amamentação, ou seja, o fato do filho procurar o seio da mãe referindo fome e a mesma não poder alimentá-lo, pode trazer, algumas vezes, sentimentos de angustia devido a impossibilidade de exercer uma ação solicitada pelo filho. Essas questões podem ser evidenciadas nos relatos a seguir: “(...) Ela procurava o seio pra pode mama e eu não podia dá...” E2 “(...) Da minha guriazinha eu não amamentei, mas desse bebezinho agora que eu tô esperando, eu queria amamenta, mas não posso...” E3 “(...) A experiência é ruim... a gente têm uma consideração com as criança pra pode não amamenta. É ruim...é ruim vê todas as mães amamentando, e a gente não pode...” E3 Sentimentos de tristeza e desespero também foram relatados pelas mulheres, refletindo a angústia existente, constituída pelo fato de as mesmas serem desaconselhadas a praticar o aleitamento de seus filhos, pois o fato de estar gestando um ser, e descobrir-se portadora do vírus HIV, desencadeia grandes mudanças de origem psicológicas, devido a compreenderam que a contaminação pelo HIV ainda não possui cura, o que provoca o aumento nas expectativas quanto a possível contaminação do filho, bem como traz sensações de medo, insegurança, angústia e diversos questionamentos (VINHAS et al., 2004), essas aflições mostram-se presentes também no que diz respeito ao sofrimento físico de tais mulheres, como conseqüência de tal inibição, é o que percebe-se nos relatos que seguem: “(...) Ai o pior triste dia das mães (bebê chora ao fundo), não podia amamenta...é triste, te leite e não pode dá...” E2 “(...) Horrível...é ruim a gente te uma criança que tu tanto espera nasce e tu não pode amamentar...pra mim é ruim...assim, quando eu descobri que eu 28 não podia amamentar me deu um desespero, eu entrei em depressão, ficava só deitada...” E4 Assim, ressalta-se a importância do entendimento acerca das questões psicobiológicas relacionadas à gestação mediante o diagnostico de contaminação pelo vírus do HIV, pois o difícil enfrentamento da não amamentação dá-se devido ao fato dessa vivência estar interligada à aspectos de origem clínica, bem como sociais e psicológicos, que podem desencadear o sofrimento e esse sentimento entrelaça-se ao fato de que o HIV trata-se de uma doença, até o momento, percebida como sinônimo de morte decretada, o que leva ao grande estigma a cerca da mesma (BRAGA, 2009). 29 4.2 Gesto de amor pelo filho (a) Segundo Lamounier, Moulin e Xavier (2004) o leite materno possui em sua composição diversos componentes nutritivos, além de uma complexidade de células, membranas e moléculas que atuam no organismo do recém-nascido conferindo a ele a proteção necessária para desenvolver-se saudavelmente, porém a condição de soropositividade para o vírus HIV determina à gestante e puérpera a negação da possibilidade de amamentar o filho, devido ao risco de transmissão vertical. A impossibilidade de exercer esta função materna de extrema importância pode ocasionar na mulher, muitas vezes, situações e vivências dolorosas, pois além da mesma ter que conviver com o diagnóstico de soropositividade para o vírus HIV, ainda possui chances de transmitir a doença ao filho. Essa condição desperta na mulher diversos sentimentos, dentre os quais destaca-se o de angústia, devido a limitação existente em amamentar, porém, a medida em que o filho vai sendo gerado, a gestação passa a simbolizar a possível valorização de si, já que o fato de dar a luz a uma criança traria a vida,o que contraria a idéia que existe acerca da soropositividade para o vírus HIV, ou seja, o imaginário de que a mesma determinava às gestantes e puérperas infectadas, a certeza da morte e consequente abandono do filho. O risco de transmissão vertical igualmente sofre mudança na maneira de ser encarada e compreendida pela gestante e puérpera infectada, devido ao nascimento do bebê, ao simbolismo e “status” que a maternidade confere (MOURA; PRAÇA, 2006 apud RUGGIERO, 2000). Em muitas situações, essas mulheres-mães acometidas pelo HIV acabam considerando a maternidade de um filho saudável como sendo sua razão para aderirem à terapia antiretroviral, pois desenvolvem força para resistirem às privações determinadas pela doença, bem como às manifestações da medicação no organismo. Para essas mulheres o uso dos medicamentos proporcionará a possibilidade de cuidar do filho, de vê-lo crescer e possivelmente o alcance da cura dessa patologia (MOURA; PRAÇA, 2006). As manifestações de amor e zelo pelo filho podem ser constatadas nos relatos a seguir, onde a entrevistada confere às filhas, sua razão e motivação para estar viva e realizar o tratamento com a terapia anti-retroviral, bem como aderir às orientações de profilaxia da transmissão vertical, como a não amamentação: 30 “(...) Eu vivo por elas...me levanto todos dias por elas...pra mim pode dá uma vida melhor pra elas... mas...se Deus quiser vai se, vai corre tudo bem...” E6 “(...) Se eu não tivesse feito coisa errada, assim sabe, te..que eu pensei em tira tudo eu não taria hoje gorda como eu to sabe...como eu digo pra mãe, acho que taria até morta já, porque eu não ia me cuidar, como eu me cuido, assim sabe...me alimento, sempre, faço meus exame direitinho, pra mim pode...com se diz...ãh...te força pra...vê elas grande né...” E6 No contexto do HIV, segundo os relatos coletados das participantes entrevistadas, a forma na qual as mães soropositivas podem demonstrar sua dedicação e amor para com os filhos, contrapõem-se à imagem idealizada, muitas vezes, pela maioria das pessoas, que entendem que a amamentação, além de representar um gesto de amor e afeição pelo filho, também é essencial para a formação biológica da criança, e fundamentalmente trata-se de uma ação preconizada para o desenvolvimento saudável do bebê, já que proporciona diversos benefícios tanto para a mãe quanto para o filho, o que torna-o reconhecido como a forma mais completa e indicada para alimentar o recém-nascido (LAMOUNIER; MOULIN; XAVIER, 2004), porém esse incentivo é vedado quando está relacionado à soropositividade da mãe para o vírus HIV, o que desperta nesta o desejo de proteger o filho, mesmo sem poder oferecer a ele o próprio leite. A possibilidade de gestar e ver nascer um bebê livre da patologia que tanto às preocupa e entristece, faz com que as mesmas sintam-se felizes ao pensar na possível e esperada soronegatividade do filho, fato que pode ser observado nos relatos a seguir: “(...) O importante pra mim é vê ele com saúde, sendo saudável, não tendo risco nenhum...só isso já me deixa feliz!” E1 “(...) Eu no meu pensar, é o único gesto de amor que eu posso prova para o meu bebê não amamentando, pra ele não corre risco nenhum...”E1 O gesto de amor e dedicação com o filho parece estar interligado ao fato de que as mães soropositivas sentem-se comprometidas em não transmitir o vírus ao bebê, parecendo encontrar na não-amamentação a forma de cumprir essa determinação, reforçando a compreensão de que, na condição de soropositividade para o vírus HIV, o gesto de amor que 31 pode ser ofertado, com intuito de preservação da saúde do filho, seria a inibição da lactação, como pode ser constatado no relato que segue: “(...) É um gesto de amor porque com a minha guriazinha, todos os exames que eu fiz, não, não teve nenhum poblema...aí então como eu não fiz com a minha primeira guriazinha, não quero fazer pra esse bebê...” E3 Entender os sentimentos que cercam a gestação no contexto do HIV é de extrema complexidade, pois a compreensão da expressão “gesto de amor”, ganha diversos significados em se tratando da subjetividade do verbo “amar”, no entanto, na situação da soropositividade essa expressão ganha o sentido de buscar ofertar satisfações, que podem ser de diferentes naturezas, como satisfazer tanto o filho em não contrair o HIV, quanto a sociedade que irá considerar como positiva a sua atitude de amor pelo filho, de preservação da saúde do bebê (NÓBREGA; FONTES; PAULA, 2005 apud DORON; PAROT, 1991). A pessoa ao receber o diagnóstico de uma patologia, até o momento incurável, perpassa um longo caminho até a possível aceitação da realidade apresentada à ela. Esse caminho é constituído por momentos como o de negação e de tristeza, sendo esses sentimentos vividos e acatados de diferentes formas por cada ser humano (SILVA et. al., 2008). Quando a descoberta da soropositividade se dá durante a gestação, a mulher tende a vivenciar momentos que vão do desespero até a sensação de morte anunciada, e esses sentimentos tornam-se conflituosos, chocando-se aos sentimentos provocados pela presença da gestação ou do filho (MORENO; REA; FILIPE, 2006). No entanto, segundo os relatos das participantes, a forma como as mesmas transformam esses sentimentos negativos em ações que visam beneficiar o filho são interpretadas por elas como sendo o gesto de amor a ser ofertado, a dedicação e preocupação materna com a saúde do filho, e esse gesto manifesta-se no ato de não amamentar. 32 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A amamentação corresponde a uma determinação cultural e socialmente préestabelecida, o que a torna um ato rodeado por ideologias que nascem e se consolidam nas condições reais e concretizadas da vida, pela formação do ser humano biologicamente e sua estruturação como indivíduo inserido na sociedade (ALMEIDA; NOVAK, 2004). O leite materno possui em sua composição natural, lactobacilos e bífidobactérias, que compõem os pró-bióticos, sendo também uma fonte rica de oligossacáridos, que são prébióticos que atuam no organismo do recém-nascido protegendo-o contra diversas patologias infecciosas ou não, e essa proteção perpassa todas as fases da vida. São inúmeros os benefícios proporcionados aos recém-nascidos que forem amamentados nos primeiros tempos de vida (NETO, 2006). Contrastando-se a todo esse incentivo que cerca a lactação, tem-se a presença de mulheres soropositivas para o vírus HIV que são desaconselhadas a amamentar. E essa inibição afeta diretamente a identidade social da mulher, ou seja, sua imagem como mãe dentro da sociedade. Essa situação conflitante desencadeada pela não-amamentação afeta, além da própria mulher, o filho, o que exigirá da mesma, o saber conviver com as possíveis cobranças e conflitos interiores provocados pela inibição da lactação, para poder avaliar os riscos e benefícios que a inibição dessa prática proporciona (MORENO; REA; FILIPE, 2006). Percebe-se que a mulher na condição de gestante ou puérpera acometida pelo HIV, identifica na inibição da lactação a revelação da condição de estar doente. Além disso, os métodos para a realização da inibição, como o enfaixamento das mamas, confirmam seu status sorológico e a sua impossibilidade de amamentar, impedindo que exerça sua determinação biológica e cultural, o que contribui para a dificuldade da aceitação e cumprimento dessa orientação. Frente a essa problemática, o incentivo encontrado por essas mulheres para a adesão tanto ao tratamento medicamentoso, quanto a não amamentação, parece ser a avaliação dos riscos e benefícios para o bebê (MORENO; REA; FILIPE, 2006). A importante decisão de aderir a não-amamentação denota, segundo os relatos das entrevistadas, o gesto de amor, de proteção, o instinto materno que leva essas mulheres a evitar que seu filho adquira uma patologia que parece designar tantos estigmas. Através das categorias elencadas e estudadas, pode-se compreender aos motivos que determinam a dificuldade de enfrentamento da condição de não amamentar o filho, bem como o entendimento que essas mulheres possuem acerca dessa inibição, que como constatado no 33 estudo, consiste para essas mulheres como sendo o gesto de amor ofertado aos filhos, já que evitando o aleitamento materno, estarão também evitando a transmissão vertical puerperal do HIV. A realização do presente trabalho acrescentou à pesquisadora enorme aprendizado, à medida que proporcionou momentos de intensa troca de vivências com as entrevistadas. Durante o período de coleta de dados, foi possível elencar pontos positivos, que ajudaram na realização das entrevistas, dentre os quais ressalta-se a interação pré-existente com as gestantes e puérperas, o que facilitou a aproximação e formação do vínculo de confiança para a coleta de informações. As dificuldades também permearam o processo de construção deste estudo e dentre elas pode-se destacar, a dificuldade de encontrar as entrevistadas no Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) para realizar as entrevistas, e este entrave parece estar atrelado ao preconceito, muitas vezes, existente, o que gera o possível medo entre as mulheres de que algum julgamento pudesse ocorrer por parte da pesquisadora. Também se ressalta a questão da temática como sendo, em parte, de difícil abordagem, no contexto em que as mulheres se encontram, pois em sua totalidade, os relatos foram de tristeza ao mencionar a impossibilidade de amamentar o filho. No entanto as mulheres que se disponibilizaram a participar contribuíram muito com suas considerações. Acredita-se que o assunto abordado como tema do estudo possa gerar grande impacto nas opiniões formadas pela sociedade, pois existem sentimentos que surgem com diferentes intensidades quando se trata do vírus HIV e suas manifestações, e esses sentimentos tornamse ainda mais intensos quando estão interligados a gestação mediante a possibilidade de contaminação do bebê. Considera-se de suma importância que novos estudos sejam realizados a cerca da problemática da não amamentação, e sua relação com a transmissão perinatal. 34 REFERÊNCIAS ALMEIDA, João Aprigio Guerra de; NOVAK, Franz. Reis. Amamentação: um híbrido natureza-cultura. 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Os dados serão coletados no período de abril de 2010, através de entrevista semi estruturada, que será gravada por voz, sendo solicitado o consentimento para gravação, mesmo aqueles sujeitos que não aceitarem a gravação, mas que aceitem participar do estudo poderão ser incluídos. Neste instrumento deixamos assegurada a liberdade de colaborar com o estudo ou de desistir da colaboração, a qualquer momento, sem que sua decisão incorra prejuízos de qualquer natureza. Reiteramos nosso compromisso com o seu anonimato, assim como ressaltamos que sua colaboração não acarretará ônus de qualquer natureza. Tanto eu, Raquel Einloft Kleinübing, pesquisadora, quanto a professora orientadora, Jussara Mendes Lipinski, colocamo-nos à disposição para esclarecimentos adicionais que se fizerem necessários em qualquer momento da realização do estudo, através das formas de contato que constam a seguir, acrescentando-se nesse termo, o telefone institucional para que os sujeitos possam entrar em contato se considerarem pertinente, salientando-se que os mesmos podem realizar chamadas à cobrar para o telefone móvel da pesquisadora responsável, identificandose previamente. __________________________ ___________________________ Raquel Einloft Kleinübing Jussara Mendes Lipinski (55- 81199818) (55- 81399400) Uruguaiana ____ / __________________ / ________ ______________________________ ___________________________ (Assinatura participante) (Nº identidade) Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e Esclarecido, deste sujeito de pesquisa para participação neste estudo. Uruguaiana ____ / __________________ / ________ ____________________________________________ (Assinatura da pesquisadora) Telefone institucional (Unipampa): (55) 3413-4321. 40 APÊNDICE B – Roteiro de entrevista Dados Gerais Data ___/___/___Idade:______ anos Estado Civil: ( ) Casada ( ) Solteira ( ) Outro Profissão: Você tem filhos:............... Quantos........... Você poderia ou gostaria de falar sobre a orientação de não poder amamentar seu bebê, como tem sido para você essa experiência. 41 APÊNDICE C – Carta de autorização da Secretaria de Saúde de Uruguaiana UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA CURSO DE ENFERMAGEM A SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE DE URUGUAIANA A/C Secretário de Saúde de Uruguaiana Sr. Luiz Augusto Fhurmann Schneider Solicitamos sua autorização para que a acadêmica Raquel Einloft Kleinübing, do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Pampa, realize entrevistas com gestantes e puérperas que freqüentam o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) no município de Uruguaiana. Essa proposta visa o desenvolvimento de um projeto de Trabalho de Conclusão de Curso, intitulado: Gestantes e puérperas soropositivas para o HIV: como estão vivenciando a não amamentação, cuja orientação está sob tutela da professora Jussara Mendes Lipinski. Cujo contato pode ser realizado pelo seguinte telefone 55 81399400 No aguardo de sua concordância, nos colocamos a sua inteira disposição para maiores esclarecimentos. Atenciosamente. ____________________________ Jussara Mendes Lipinski Orientadora ____________________________ Raquel Einloft Kleinübing Acadêmica __________________________________ LUIZ AUGUSTO FUHRMANN SCHNEIDER Secretário da Saúde 42 ANEXOS 43 ANEXO 1 – Carta de autorização do Comitê de Ética. 44 ANEXO 2- Termo de autorização de publicação nas bibliotecas da UNIPAMPA. TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE PUBLICAÇÃO NAS BIBLIOTECAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA Na qualidade de titular dos direitos de autor do trabalho, de acordo com a Lei nº 9610/98, eu Raquel Einloft Kleinübing, estado civil solteira, de nacionalidade brasileira, portador do CPF nº 014.200.400-65, área de concentração em ciências da saúde, com defesa realizada em 13 de julho de 2010, autorizo a Universidade Federal do Pampa, a disponibilizar o meu trabalho final de conclusão de curso Intitulado “Gestantes e puérperas soropositivas para o HIV: como estão vivenciando a não amamentação”, para fins de leitura, impressão ou Download, a título de divulgação da produção, a partir dessa data, sem qualquer ônus para a UNIPAMPA. Uruguaiana, 27 de julho de 2010 _________________________________ Informação de acesso ao documento Liberação para publicação: ( )Total ( )Parcial Em caso de publicação parcial, especifique o(s) arquivo(s) restrito(s): Arquivo(s) / Capítulo(s):_________________________________________________________ Em caso de restrição, indique o período:____________________________________________ Dados Complementares: Nome do orientador:_________________________________________________________ CPF:_________________________________________________________________________ Membro da Banca:_____________________________________________________________ CPF:_________________________________________________________________________ Membro da Banca:_____________________________________________________________ CPF:_________________________________________________________________________