OS KURÂ-BAKAIRI: BREVE HISTÓRICO DAS
RELAÇÕES INTERÉTNICAS
Edir Pina de Barros
1996
Os Bakairi atuais situam como seu berço mítico um Salto, por eles denominado
Sawâpa 1 , localizado pouco abaixo da confluência do rio Verde com o Paranatinga, o qual
de tempos em tempos visitam.. Na região localizada entre esse Salto (Cachoeira dos Índios)
e um outro de menor porte, rio acima, segundo os seus próprios relatos, viveram os Bakairi
primordiais. Neste último afirmam ter existido até poucos anos atrás, uma inscrição
entalhada em pedra, hoje praticamente destruída. Ela é tida como "pegadas de Kwamóty” 2 ,
ser mítico e antropomorfo - que teria sido gerado através de relações sexuais entre a filha do
jatobá e Semino, o morcego - avô dos gêmeos demiurgos Xixi e Nunâ.
Trata-se, provavelmente, dos mesmos petrógrifos reproduzidos por Steinen (1940:
336), que também obteve dos Bakairi, há mais de um século, informações de que eles
seriam todos originários do "Salto", situado, porém, pouco acima da confluência dos
referidos rios (1942: 124; 1940: 502).3
Xixi e Nunâ, orientados por Kwamóty, ordenaram o universo Bakairi, física e
socialmente, ensinando a eles as regras da convivência e repassando a eles bens culturais
que antes pertenciam a animais. Canalizaram os rios e tomaram o sol do urubu-rei, pondo-o
em seu curso. Depois de façanhas várias, ascenderam ao sol e à lua, onde foram residir
emprestando seus nomes a esses astros.
A primeira geração vivia na região do Sawâpa que, tal como o Murena para os
Kamayurá, constitui o centro do universo (AGOSTINHO, 1974: 16). Mas à medida que a
população foi aumentando, surgiram os fuxicos, resultando em cismas e rupturas no seio da
sociedade. Agastado com tão grande desafeto Kwamóty desencadeou um cataclismo.
Apenas dois pares de irmãos se salvaram em uma canoa de casca de jatobá. Do
intercasamento entre eles a sociedade se recriou. Mas o mesmo se repete à medida que a
população foi aumentando: "fuxicos" e cismas resultaram novamente em cisões, partindo
cada qual com os seus parentes, fundando estabelecimentos na região mítica de origem.
1
2
Uma espécie de bananeira nativa e de pequeno porte.
Equivalente a Kwamutí dos Yawalapití e Mehináku
Esta geração também foi morta pelo fogo, desta vez por causa da ira de um pai cujos
filhos não observaram os preceitos rituais relativos ao Sadyry, o rito de "furação de orelhas"
dos adolescentes do sexo masculino. Segundo as narrativas míticas ele teria convidado todos
os Bakairi e, em meio ao rito, quando todos se encontravam exaustos, ateou fogo neles.
Novamente apenas dois casais de irmãos sobreviveram por haverem sido retirados por uma
mulher que também morreu. A partir deles a sociedade é recriada e as rupturas têm lugar
nela. Desta geração os Bakairi atuais consideram-se descendentes.
Sawâpa é segundo eles, o ponto a partir do qual se dispersaram, vivenciando a
experiência da diáspora.
1. A DIÁSPORA E O TERRITÓRIO HISTÓRICO
Segundo os mitos de origem, Xixi e Nunâ, sob a orientação de seu avô Kwamóty,
canalizaram os rios, após quebrar três potes de água pertencentes à mítica sucuri Oxobi, os
quais se encontravam na região onde hoje ficam as cabeceiras do Kuluene, do Paranatinga e
do Kulisehu. Xixi teria canalizado o Pakuera ("Rio das Pombas" ou Paranatinga) desde as
suas cabeceiras até o Sawâpa, assim como todos os seus afluentes. A partir daí teria
ordenado às pombas que o levassem adiante. Nunâ, inconstante e trapalhão, canalizou as
cabeceiras do Nahukulo (Kuluene) e Kuriezehu (Kulisehu), ficando o seu trabalho
incompleto porque um enorme jaú o engolira. Iniciou também a canalização do Arinos,
formando o Iamârâry (Rio Novo) e o Nakuiayelo (Santana).4
É essa região, demarcada pelo mito, que os Bakairi historicamente ocuparam e
Sawâpa o ponto a partir do qual se dispersaram, vivenciando a experiência da diáspora.
Segundo a história oral, a guerra era uma constante. Guerreavam com os Munduruku
- que os denominavam Mureufâtes (STEINEN, 1940: 499) - com os Nambikwara, os
Tapayuna, os Bororo, os Suyá, os Paresi, os Kayapó (Kaiahó) e "Canoeiros". Estes eram
muito temidos porque "comiam" os seus adversários vencidos em guerra.
São raras as referências sobre relações amistosas com outros povos indígenas em
tempos mais remotos; guerras ocorriam até mesmo entre os grupos Bakairi geográfica e
3
Vide também SCHMIDT,1947:18; OBERG, 1953:69; BARROS,1977:3 a 5; 1987: 78; 1990:5
A versão coletada por Steinen é estruturalmente semelhante à por mim obtida. Nela Kame (Nunâ) teria iniciado
a canalização do Ronuro e do Kulisehu (1940: 482 -483).
4
2
socialmente distantes. Como me dizia um excelente mestre, hoje já falecido, "falavam a
mesma língua, mas a saudação deles era a flecha".
Os mais temidos de todos os inimigos, outrora, eram os Kayabi, por eles
classificados em duas categorias: Otonoli e Turi.5Os primeiros viviam na região do
Sawâpa e os segundos vinham de mais longe para atacá-los e usavam uma pintura facial
preta de traço contínuo, que ia das extremidades da boca até a base das orelhas, tendo dos
dois lados uma série de pontos paralelos. Trata-se, provavelmente, dos Kayabi do Rio Verde
e do Rio dos Peixes, respectivamente.
Discórdias internas, somadas às guerras com os Kayabi são os fatores que eles
mesmos apontam para explicar a partida de vários grupos, cada qual formado por parentes,
do Sawâpa para o Alto Xingu. Afirmam ainda que estes, após se fixarem, sempre visitavam
os que ficaram no Salto. Iam, segundo os mais idosos, em busca de material lítico para fazer
machados de pedra (ârirâga) e de um tipo específico de contas naturais, miúdas e brancas,
coletadas no leito rochoso do rio, com as quais faziam kasero - fios de contas, usados por
ambos os sexos - que eram passados pela perfuração do septo nasal e dos lóbulos das
orelhas, de onde pendiam sobre os ombros.
Segundo Steinen, a parcela que migrou para o Alto Xingu teria percorrido um
caminho que levava do Salto à aldeia dos Aueto, no Kulisehu e que, por conseguinte, devia
passar pelo Ronuro ou suas nascentes e pelo Batovi (1940:498), o que é compatível com as
informações prestadas pelos próprios Bakairi atuais.
Outra parcela, segundo a história oral, subiu o Paranatinga, através de deslocamentos
sucessivos, indo estabelecer-se em seu vale. Apenas uma parte deles teria alcançado as
cabeceiras do Arinos. Eles perderam o contato com os que foram para o Xingu devido à
presença dos Kayabi que transitavam na região que os separava.. Daí a diferenciação entre
aos Bakairi Orientais e Ocidentais, respectivamente, na classificação de Steinen, por eles
denominado Apalagady ou Dr. Carlos.
À época de Steinen, fins do século passado, os Bakairi das cabeceiras do Arinos e do
Paranatinga - que mantinham entre si uma rede de prestações sociais, inclusive rituais -
5
É interessante notar que Capistrano de Abreu registrou, em fins do século passado, Turi, o "pai das bexigas", que
vivia também no Salto; o texto sugere que seja uma entidade sobrenatural (1976: 188).
3
apenas davam notícias de que os antigos viviam às margens de um grande rio, passando o
Paranatinga e caminhando contra o sol (1942:124).
Quanto à época da dispersão a partir do Sawâpa, supôs esse autor que ela teria
ocorrido em um período anterior a 1750 porque, nessa década os Bakairi já se encontravam
na região que separa as nascentes do Arinos, do Cuiabá e do Paranatinga.6 (1940 : 497). Mas
essa é uma questão que permanecerá em aberto até que futuras pesquisas nos campos da
etnohistória e da arqueologia sejam desenvolvidas, assim como a possibilidade de
migrações, que sua história insinua, no sentido norte / sul, através do Tapajós, em tempos
muito mais remotos.
Os que viviam nos afluentes do Xingu permaneceram desconhecidos até que as
expedições de Steinen, em 1884 e 1887 exploraram a região, onde foram localizados outros
povos indígenas de que até então não se tinha, também, conhecimento. Já os Bakairi
Ocidentais, dispersos na região das cabeceiras do Arinos e no vale do Paranatinga ou Telles
Pires, foram, muito antes, alcançados pelos karaíwa que vinham de igâwynu âeto, do "lado
aonde vem as friagens", que em nosso sistema de referências equivale ao sul, em busca das
lendárias minas de Martírios e de indígenas para a escravização.
Os Bakairi que vivem hoje nas cabeceiras do Arinos (Santana) reivindicam para si a
condição de "verdadeiros Bakairi", alegando haverem sido os seus antepassados os
primeiros a "ganhar" esse nome. Daí poder-se inferir que eles foram os primeiros a ser
alcançados pelos karaíwa. Os dados historiográficos também apontam nessa direção, como
se verá mais adiante.
Da região historicamente por eles ocupada, cenário de suas migrações e de seus
estabelecimentos, restaram-lhes apenas as duas Áreas Indígenas referidas. Mas, por onde
quer que passaram, imprimiram no espaço a sua marca, tais como nomes de acidentes
geográficos, de localidades, de rios e riachos que se encontram vivos em suas memórias
(vide BARROS, 1992: 492-494). Eles atestam, inquestionavelmente, a ocupação desse
território, marcada pela alta mobilidade e pela dispersão.
Os dados contidos nas fontes escritas só vêm confirmar esse fato. Somando as fontes
orais e escritas, no que diz respeito aos antigos estabelecimentos, que ora se complementam,
6
O autor inferiu esse dado a partir de cálculos genealógicos.
4
ora coincidem, mas jamais se contradizem, pode-se inferir os movimentos desse povo no
espaço e no tempo (vide BARROS,1992: 58 - 65).
Os dados existentes sobre a população e número de residências por estabelecimento,
registrados por cronistas e expedicionários, acrescentam ao fator dispersão, outras
informações relativas às formas de ocupação do espaço : estabelecimentos pequenos,
contendo de três a sete unidades residenciais e uma população média de 43 indivíduos.
Como expressam os próprios Bakairi, era uma "pelotinha" aqui, outra ali, outra acolá.
2. "MANSOS" E "INDEPENDENTES"
Dispersos, os Bakairi sofreram, com a chegada dos karaíwa, experiências distintas,
na forma, no tempo e no espaço. Os Ocidentais, dada a sua localização geográfica, foram os
primeiros a ser por eles alcançados. Os seus descendentes afirmam que seus antepassados
eram "independentes" até a passagem de Apalagady (Steinen). E que jamais foram
"amansados", como os Panâ (Xavante) pois sempre foram "mansos por natureza". Dos
inimigos apenas se defendiam, no caso de outros povos indígenas. Mas rememoram, com
orgulho, as suas táticas de guerra. "Bravos" eram os Kayabi, os Kayapó, seus inimigos por
excelência.
Ainda que suas lembranças sejam marcadas, aqui e ali, por ataques de karaíwa que
vinham em busca das lendárias minas de Martírios, comentam que foram eles próprios, os
Bakairi, que buscaram, no passado, manter relações amistosas com os karaíwa porque
possuíam armas de fogo, das quais necessitavam para se defender,sobretudo, dos Kaiaby.
Esses guerreiros incansáveis andavam muito longe para atacar os seus antepassados. Dizem
que até pouco tempo se faziam presentes na Área Indígena Bakairi, onde, além de atacar,
"tiravam" produtos de suas roças. Mas, pelo que tudo indica, trata-se de uma parcela dos
Xavante que se expandiu para essa região, em fins da década de 40 deste século, fazendo-se
presentes também nos estabelecimentos rurais, "nus, famintos e desesperados", segundo
informações obtidas entre os regionais.
Dizem que seus antepassados é que tiveram interesse em manter relações com os
karaíwa - ou os "cuiabanos", como a eles se referem, quando não estrangeiros, ainda que
cientes de suas diferenciações internas 7 - para obter não só armas de fogo, como machados
7
Sobre identidades e sub-identidades constituídas no bojo das relações interétnicas, vide BARROS, 1977.
5
de ferro e outros bens que não produziam. Fazem eles referências às viagens que os
"antigos" faziam à Cuiabá e Diamantino, muito antes da chegada de Apalagady (Steinen) ,
com esse objetivo. Nebulosas são as lembranças com relação à convivência de uma parcela
dos seus com os Paresi, nas proximidades de Diamantino, em uma mesma localidade.
Comentam que seus "avós" mantinham contatos com os karaíwa tanto nos
estabelecimentos rurais quanto em transações com viajantes para obter esses bens, que eram
doados ou trocados por seus artefatos e alguns de seus produtos de roça.
Primeiro, dizem, foram obrigados a migrar para igâwynu âeto, o "lado de onde vem
as friagens", por pressão dos Kayabi. Mas desse lado vieram os karaíwa, com suas armas de
fogo. Porém, segundo os seus relatos, nunca fizeram guerra com eles. Mantinham relações
amistosas.
Segundo a história oral, tem-se, ainda, que os Bakairi das Cabeceiras do Arinos e do
vale do Paranatinga, mantinham entre si uma rede de prestações sociais que se fragilizaram
depois da passagem de Steinen. Trocavam entre si bens materiais, casavam-se entre si,
apoiavam-se mutuamente. Existiam vários grupos locais.
E foi como "mansos", "tímidos" e "hospitaleiros" que eles entraram para a nossa
história. Isso se deve, em parte, aos princípios que norteiam a ética desse povo. Eles, ainda
hoje, consideram de "bom tom" tratar bem os que os visitam, os que não os atacam
frontalmente e, em casos extremos, algumas pessoas ou grupos humanos podem ser
incluídos, metaforicamente, no universo dos "parentes". Por outro lado, há que se considerar
as condições objetivas de vida: premidos, sobretudo, pelas pressões dos Kayabi, pode-se
inferir - e os dados permitem isso - que eles se aliaram aos karaíwa para sobreviver aos
ataques desse povo inimigo.
Do longo período que vai das primeiras décadas do século XVIII até o início do
século XIX, existem relativamente poucas referências sobre os Bakairi. 8
O etnônimo Bakairi foi registrado pela primeira vez por Antonio Pires de Campos,
preador de indígenas para a escravização, nas primeiras décadas do século XVIII. Segundo
ele, os Aripocones, os Apocones, os Itapocones, entre outros, que viviam na região da
confluência do Manso com o rio Cuiabá, ...chegavam com as suas bandeiras a fazer mal ao
8
Posso dizer que, ainda que incompleto, realizei um levantamento exaustivo nas fontes e acervos, principalmente
os situados em Cuiabá.
6
gentio Bacayris...(CAMPOS, 1862:448). Trata-se, provavelmente, de subgrupos Bororo que
aí viviam (os Bóku Mogorége). A presença de Waccayris também foi assinalada nas Minas
de Mato Grosso, no vale do Guaporé (TORRES, 1738 e 1738-a). Não há nada que permita
dizer que eles aí outrora habitaram. Caso esse etnônimo corresponda aos Bakairi, o que
considero praticamente certo, trata-se então de indivíduos preados e aí tornados escravos.
Os Bakairi constam, entre outros povos indígenas, em um pedido de autorização
para o empreendimento de uma bandeira contra os Tapuias (LEMOS, 175l).9 Outras fontes
indicam que eles ocupavam, em 1771, ambas as margens do Paranatinga (DUARTE et alii,
1771 e 1771-a).
Até o final do século XVIII, a região habitada pelos Bakairi Ocidentais havia sido
apenas alvo de bandeiras à caça de ouro e de indígenas para a escravização. A navegação
pelo Arinos fora proibida nas primeiras décadas desse século, assim como a exploração das
minas de ouro associadas ao diamante por ser considerada a atividade extrativista do
diamante privativa à Coroa. Por essa razão mineradores foram expulsos e suas feitorias
queimadas (SÁ, 1975:44-45). As atenções dos dirigentes da Capitania, no decorrer desse
século, se voltavam para a fronteira oeste, conquistada aos espanhóis e aos indígenas, o que
os levou a desenvolver uma "estratégia de fronteira" que incluía uma política de fixação da
população no vale do Guaporé.
No final daquele século a Província enfrentava sérias dificuldades de autosustentação e reordenação de suas forças produtivas devido ao declínio crítico da mineração,
que ainda assim, representava peso significativo na balança de exportação. A população,
depauperada, voltou-se para as atividades de subsistência e os comerciantes locais, que mais
se beneficiaram durante esse largo período de tempo, passaram a desenvolver a agricultura e
a pecuária extensiva. O contrabando de fronteira exacerbou-se. Essa crise econômica e
social, somada ao esvaziamento da política de ocupação enquanto estratégia de fronteira 10,
então definida pelos Tratados Internacionais, levou à liberação das minas de ouro e
diamante, em 1805, na região de Diamantino. Para ela migraram levas de mineradores de
Vila Bela, Cuiabá e Poconé, irradiando-se em suas adjacências, pontilhadas de lavras.
9
Os outros citados são: Apiaká, "Curupijas", "Cabaíbas", "Serranos" , "Iutingas" e "Coqueiros". Possivelmente
"Coqueiros" sejam Bakairi, pois em Santana teria existido um grupo local denominado Kokere ("coqueiros").
10
Sobre essa questão vide VOLPATO,1987; MEIRELLES,1986 e BANDEIRA,1988.
7
Intensificou-se a navegação pelo Arinos, ao Pará, sendo que os Bakairi que viviam nas suas
cabeceiras já forneciam aos viajantes, a essa época, alguma farinha (PRUDÊNCIO,
1854:9). Prosperaram a lavoura e a pecuária, atividades subsidiárias à mineração.
Diamantino é que viria a exercer papel preponderante na vida dos Bakairi Ocidentais.
Segundo Aires de Casal - cujos registros datam de 1817 e que os situou na região do
rio das Mortes - os Bakairi, por seu aspecto e comportamento, eram considerados hordas de
Paresi. Não haviam, até então, praticado nenhum mal aos cristãos (CASAL, 1945: 303).
De Diamantino partiam expedições à busca de Martírios. Uma delas, chefiada por
Padre Lopes, em 1820, alcançou um estabelecimento Bakairi, ocasião em que muitos deles
perderam a vida, inclusive o avô de Reginaldo que, em 1884, era o "capitão" do Rio Novo
(STEINEN, 1942: 124). Os Bakairi, hoje, fazem referências a um grupo de homens armados
que, à procura dessas minas, atacou um de seus antigos estabelecimentos. Dizem que seus
moradores foram apanhados de surpresa, durante a noite e que muitos se embrenharam nas
matas, ficando para trás os velhos. Estes morreram e, entre eles, o avô de Izanrã, ou seja, do
"capitão" Reginaldo. Esse estabelecimento localizava-se pouco abaixo do lugar onde o
ribeirão Beija-Flor deságua no Paranatinga e seu nome era Mâryenagueho.
Steinen acrescenta ainda que a essa época os Bakairi foram convertidos à religião
cristã (1942: 124). Essa generalização é questionável, como os dados atestarão. Em outra
fonte, comenta ele que os Bakairi mansos estariam domesticados há perto de 60 annos 11 .
Como ele escreveu tal passagem na década de oitenta do século passado, pode-se concluir
que sua afirmação remete ao ano de 1820, aproximadamente.
Segundo o relatório do primeiro Diretor Geral dos Índios da Província de Mato
Grosso, eles já se faziam presentes em Cuiabá, em 1847 - deslocamento este custeado por
uma proprietária rural - em busca de armas de fogo e ferramentas. Na classificação que esse
Diretor estabeleceu para os povos indígenas até então conhecidos, eles foram qualificados
como independentes, ainda que mantendo relações com os neobrasileiros. Sua proposta foi
de manter relações de amizade com os Bakairi, ofertar-lhes brindes, pois considerou que
eles poderiam vir a ser úteis ao estabelecimento de relações com outros povos indígenas
hostis, dentre eles os Kayabi, seus temidos e velhos inimigos.
11
Essa informação foi obtida pelo Jornal O Expectador junto à Sociedade de Geographia do Rio de Janeiro
(Sessão de 3 de dezembro de 1884) e publicada no ano seguinte, no dia 5 de março, na folha 1, coluna 40 ( O
Expectador, Ano 2, nº.73).
8
Sobre os Bakairi, comentou esse diretor que:
A nação dos Bacahiriz supõem-se constar de duzentos indivíduos, repartidos
em diversos grupos. Habitão as cabeceiras do Paranatinga e a parte
superior do Arinos. São de índole eminentemente pacífica e athé tímida, pois
a fuga he o único meio que recorrem para subtrahir-se aos ataques de seos
inimigos Nambiquaras, Tapanhunas e Cajabis. Sustentão-se da caça, pesca
e dos productos de sua lavoura: cultivam milho, mandioca, batatas, caráz,
favas, feijão e cana. Seos instrumentos aratórios são de pedras e madeira de
cerne. A sua indústria consiste em fazer redes de tralha, de linha d'algodão
e de tucum,peneiras e balaios. Muito pouco elles entendem o nosso idioma,
entretanto procuram as vezes nossos moradores, particularmente a Snrª. D.
Querobina Pereira de Coelho, abastada proprietária de Serra a Cima que
os acolhe bem, brinda-os e forma favorável juízo da facilidade de sua
catechese. Tudo o que se sabe dos Cajabis he que são bravios indômitos, e
habitão a margem do Paranatinga a cima do Salto. São inimigos dos
Bacahiriz (FERREIRA, 1905 :87)12
Nos anos seguintes intensificou-se a presença deles em Cuiabá, aonde iam sempre a
pequenos grupos, em busca de ferramentas e armas de fogo
13
com as quais passaram a se
defender dos Kayabi e outros inimigos. Faziam-se presentes também em Diamantino, onde,
segundo Steinen, foi realizado o primeiro batismo de um deles (1940:497). Em 1849 aí
comercializavam bonitos artefatos (CASTELNAU,1949:178). Dada a sua presença, assim
como a de Paresi, nessa vila
14
, o Diretor Geral dos Índios passa a remeter recursos ao
Delegado de Polícia dela, visando prepará-los para um futuro aldeamento (VIEIRA, 1855:
69). Esse Delegado, em um documento encaminhado ao Presidente da Província, considerou
a necessidade de catequizar os indígenas, principalmente os Kayabi, os Paresi e os Bakairi
pela utilidade que teriam à agricultura e ao comércio. Registrou ele que, apesar de
estabelecerem relações com os moradores de Diamantino, mantinham seus bárbaros
costumes, razão pela qual dever-se-ia levar a eles o Santo Evangelho de nossa Religião,
como é dever rigoroso do Estado, particularmente aos Bakairi, que já tinham, algumas vezes
alugado seus serviços nas fábricas de Quebó, D. Feliciana e (...) Água Fria. Estes
estabeleciam-se ora às margens do Arinos, ora de seus afluentes, ora às margens do
Paranatinga, São Manoel ou Azevedo. Eles eram atacados por povos indígenas inimigos
12
Esse e outros relatórios foram analisados em BARROS ,1989.
13
VIEIRA,1852:17-V; 1853:26; 1856-a:74; LEVERGER,1853:s/p; PENNA,1862: 119; OLIVEIRA,1858:98-v.
14
VIEIRA,1854:57-v; 1854-a:59-v;1855:69-v; 1856:70.
9
(em 1853 foram vários os ataques) que habitavam o rio dos Peixes e seus afluentes. Esses
ataques eram feitos à noite, de surpresa e suas plantações eram destruídas. Por isso algumas
famílias desceram o Arinos, indo estabelecer-se pouco abaixo do porto em que se abriu
varadouro às canoas para Cuiabá. Apesar de já possuírem armas de fogo, recentemente
adquiridas, sua população vinha diminuindo devido a essas investidas, razão pela qual
reclamavam o apoio do Delegado de Polícia de Diamantino contra seus inimigos. Eles
fabricavam tecidos de algodão, peneiras e louças para uso culinário de melhor consistência e
duração que a nossa (PRUDÊNCIO, 1904:9).
Havia, pois, interesses mútuos em jogo: de um lado esses Bakairi, premidos pelas
circunstâncias, buscavam o apoio dos karaíwa para sobreviver; de outro, o interesse dos
dirigentes da Província em se apropriar de sua força de trabalho e, sobretudo, tê-los como
aliados contra os povos indígenas hostis à sua presença, tática esta recorrente no processo de
colonização portuguesa.
Essas condições favoreceram a criação de um "aldeamento" próximo a Diamantino,
no rio Preto, afluente do Arinos, em 1863 (RODRIGUES, 1880, anexo 2: CARVALHO,
1863). Nesse "aldeamento" viveram alguns Bakairi e Paresi. Mas ele não subsistiu ao
declínio dos serviços da Diretoria Geral, ocasionado pela crise gerada pela Guerra do
Paraguai, quando todas as atenções do Império e da Província se voltaram para a defesa
militar da fronteira oeste.
Em 1879, Frei Conrado Mari requer autorização para catequizar os Bakairi que
viviam às margens do Paranatinga, sendo apoiado tanto pelo Diretor Geral quanto pelo
Presidente da Província (RODRIGUES,1879:s/d; PEDROSA,1879 : 222), pela facilidade
que oferecia a sua índole pacífica e pela necessidade de doutrinar esses índios e
administrar-lhes o sacramento do baptismo (PEDROSA, 1879:222). Dois meses depois ele
retornou para Cuiabá, atendendo ordens de seu superior. A sua partida foi lamentada pelos
administradores, tanto pela falta de missionários e de recursos para a catequese, quanto pelo
interesse que tinham em utilizar os Bakairi em todo auxílio quando deles carecermos contra
outras tribus bellicosas. Mas sua passagem não foi considerada sem proveito, pois além de
haver realizado batismos, logo se apresentou ao Presidente da Província um de seus chefes,
acompanhado de mais três ajudantes, pedindo o posto de capitão para melhor governar a
sua gente, o que lhe foi concedido (PEDROSA, 1879: 223-224).
10
A essa época a Companhia Associação Minerológica Matogrossense , fundada em
1878, havia obtido junto ao governo imperial, autorização (decreto 7.489, de 1879) para
explorar, por três anos, ouro e outros minerais nas terras situadas entre a Serra Azul e o rio
Arinos, até a foz do São Manoel, afluente do Paranatinga. Não obteve ela, porém, os
resultados esperados nas duas sondagens realizadas (MARACAJU, 1880: 66-67). Essa
Companhia, assim como a Cia. de Mineração de Mato Grosso, criada em 1851, fracassaram
pela dificuldade de mão-de-bra, pelas más condições de transporte e pelo pouco capital
(ALEIXO, 1980: 35).
Como os dados apontam, os Bakairi das cabeceiras do Arinos foram os primeiros a
manter relações com os karaíwa, razão pela qual seus descendentes reivindicam a
"condição" de "verdadeiros Bakairi", por terem sido os primeiros a "ganhar" esse nome.
Em 1882, o líder do grupo local das cabeceiras do Arinos, "capitão" Reginaldo, com
quem Steinen esteve, dirigiu-se ao Presidente da Província, acompanhado de doze homens
adultos que viviam às margens do Paranatinga. Comentou o presidente que:
Aquelle cacique já se acha semi-civilizado, por ter sido criado por um
negociante português que residia na Vila de Diamantino e deo-lhe as noções
de 1ªs. letras que ainda conserva, pois que previnio de sua vinda à cidade
por um bilhete escripto de próprio punho (ALENCASTRO, 1882 :33).
Segundo Magalhães, esse "capitão" também lhe revelara conhecimentos práticos da
língua francesa, que aprendera com um oficial do exército que, abandonando a carreira
militar, internou-se nessa região, terminando por conviver com esses Bakairi (das cabeceiras
do Arinos) durante vinte anos (1953:46).
Steinen, em 1884, esteve no estabelecimento liderado por Reginaldo que, segundo
esse autor, tinha o seu poder aumentado por insígnias e armas de fogo fornecidas pelo
governo mato - grossense. Comentou ele que:...o povinho levava uma vida idílica. Tratava
do gado, da lavoura, ia à caça, plantava mandioca, feijão, milho, arroz, algum fumo e
açúcar. Eram civilizados, apesar das orelhas e do septo nasal furados (1942:126).
A população desse estabelecimento, situado às margens do rio Novo, somava 55
indivíduos, sendo 16 homens, 19 mulheres e 20 crianças. Todos entendiam o mínimo de
português (Id. Ibid.).
Quanto aos Bakairi que viviam às margens do Paranatinga, a 17 km. abaixo do
Ribeirão das Piavas, afluente do primeiro, somavam eles 23 indivíduos (destes nove
11
encontravam-se ausentes e sua volta não era mais esperada) e havia sete unidades
residenciais, duas de construção mais recente, e dois chiqueiros para porcos. Aí viviam mais
oito indivíduos: um seringueiro boliviano, um brasileiro casado com uma mulher paraguaia
com um filho, duas mulheres Kayabi e duas Paresi, estas quatro casadas com Bakairi.
Plantavam mandioca, feijão, batata doce, cana-de-açúcar, com que faziam rapadura que
forneciam à Fazenda Córrego Fundo (STEINEN, 1942:150). Anos antes, em 1896,
aproximadamente, esse grupo fora atingido por uma epidemia de sarampo, a qual ocasionara
muitos óbitos (Id.Ibid: 146). Esse estabelecimento fora fundado nos últimos tempos,
situando-se antes um pouco mais a montante devido à perseguição de um homem chamado
Correa, que percorria a região em busca de ouro (STEINEN, 1940: 497).
Esse grupo local já se encontrava sob o controle de um Diretor de Índios que,
segundo os Bakairi atuais, se estabelecia junto à confluência do São Manoel com o
Paranatinga. Era liderado pelo "capitão" Felipe (Kuriehe, para os Bakairi), instalado no
lugar de Caetano que fora deposto pelo governo de Mato Grosso. Em razão disso todos
haviam se tornado o mais independentes possível (Idem, 1942: 126). Trabalhavam na
pecuária extensiva que, de modo lento, porém definitivo, se expandira para as terras por eles
ocupadas. Comentou Steinen que:
À grande semelhança da vida externa e interna dos moradores
brasileiros, decorre a existência dos Bakairi que moram nas suas
proximidades. Todos são batizados - eles mesmos não sabem porque, a
não ser que seja para receberem um bonito nome brasileiro, cuja
pronúncia muitas vezes lhes causa sérias dificuldades - e alguns deles
também arranham o idioma culto do Brasil (1942 : 42).
A essa época existia um pequeno contingente Bakairi no rio Preto, afluente do
Arinos, representante de um antigo aldeamento (idem, 1940: 497-498), provavelmente
aquele criado pela Diretoria Geral dos Índios, em 1863.
As minas da região de Diamantino já se encontravam praticamente esgotadas e a
produção agrícola limitava-se ao consumo interno. No início dessa década, a exploração da
borracha havia sido iniciada por um importante comerciante de Diamantino (MARACAJU,
1880: 64). Ela se expandiu, em 1887, na região norte, inclusive na micro-bacia do Juruena e
seus formadores, do Arinos e do Telles Pires ou Paranatinga. Com os seringueiros foram
introduzidos vírus de várias doenças que tantos estragos causaram às populações indígenas,
12
inclusive a Bakairi. Eles também passaram a explorar o "ouro negro". Segundo informações
obtidas, eles se deslocavam em direção ao Beija-Flor, indo até mesmo à região do Sawâpa.
Inicialmente eles trabalhavam por conta própria, pois Steinen encontrou-se com um
grupo de nove homens que, em 1887, dirigia-se para Cuiabá, onde iria vender 22 arrobas de
borracha (1940: 42). Steinen não esteve nesse ano entre os Bakairi do Rio Novo (Santana),
mas sabe-se que existiam ali dois estabelecimentos e que o governo da Província aguardava
a chegada de crianças em Cuiabá, onde iriam aprender o ofício de carpinteiro e o de ferreiro
(RAMOS FERREIRA, 1887).
Enquanto os Bakairi do Paranatinga foram aliciados pelas expedições de Steinen e
por inúmeras outras que as seguiram, os de Santana passaram a sofrer, paulatinamente,
pressões por parte de seringueiros, seringalistas e seus capatazes (REGO, 1888). Devido às
violências contra eles praticadas, buscaram apoio junto ao Presidente da Província, em
1888, perante o qual reivindicaram soluções para o problema. Em função disso ele resolveu
que ficariam reservados aos Bakairi os seringais da seguinte região:
...em todas as vertentes do Arinos, desde o Estivado até o Quilombo, e seus
respectivos cursos, e dahi pela margem do rio Verde até à sua confluência
com o Paranatinga, ficando livre aos mencionados moradores e quaesquer
outros que queiram dedicar-se à extracção da borracha os seringaes da
margem direita do mesmo rio Verde assim como o Valle do Beija-Flor, a
partir do ponto indicado e de todos os seus afluentes...( REGO, 1888-a :3).
Assim, o Vale do Beija-Flor, onde existiram estabelecimentos Bakairi, foi destinado
aos seringueiros regionais. Contudo, em 1915, registrou-se a existência de um pequeno
contingente em um dos seus afluentes, o ribeirão Cabeceira do Chapadão (PYRINEUS DE
SOUZA, 19l6 :69).
A competição pela mão-de-obra dos Bakairi levou o dirigente do Estado a instruir a
Diretoria Geral dos Índios no sentido de que fosse vedada a residência de estranhos entre
aqueles que viviam no Rio Novo e que recorresse às autoridades policiais, se necessário
fosse. Buscava-se com isso evitar que fossem induzidos a abandonar os seus hábitos
pacíficos (MURTINHO, 1893).
Apenas em 1905, quando a atividade da borracha já se encontrava em franco
declínio, dada à concorrência da produção asiática no mercado internacional, é que o
Governo Estadual resolveu atender aos apelos do "Capitão" Reginaldo, líder do Rio Novo,
13
criando a reserva e demarcando-a. Mas isso não impediu que cedo os seus limites fossem
violados e as suas terras invadidas.
Na área contígua a ela, estabeleceu-se Joaquim Ferro, na Fazenda Rio Novo,
entreposto de seringal - cuja sede ficava a aproximadamente 05 km. do estabelecimento
Bakairi - que se utilizava de parte das terras a eles destinadas para criar parte de seu rebanho
bovino. E Joaquim Ferro, além de seringalista, era o Subdelegado do Distrito onde se
encontra ainda hoje engastada a Área Indígena Santana. Ele aliciava os homens Bakairi para
o trabalho, utilizando-os como guardas nos seringais, para prevenir ou evitar ataques de
índios (FERRO, 1910).
Dentro da Área Indígena Santana instalou-se Hermenegildo Correa Galvão, à
margem direita do Rio Novo. Morel, que aí esteve à busca de notícias sobre o destino do
Coronel Fawcett e seu filho, a ele se referiu como:
...um homem que exerceu poderosa influência nos destinos do Estado, sendo
considerado um dos chefes políticos sertanejos dono de um verdadeiro
exército de paisanos (...) Conheci o senhor feudal do Rio Novo, Coronel
Hermenegildo Galvão, título pomposo com o qual ele gosta de ser
tratado...(MOREL, 1944: 57).
Os Bakairi viviam sob o seu controle, submetidos a todos os tipos de violência.
Segundo relatos dos próprios Bakairi, muitos foram mortos no pátio do estabelecimento e
todos foram proibidos de falar a sua própria língua : "Falem em português, que eu quero
entender!".
Pyrineus de Souza, quando esteve nessa Área, em 1915, registrou:
Este grupo é muito curioso porque representa naquella área o papel de
gente civilizada, ao passo que os seus vizinhos civilizados adoptaram contra
elles os costumes selvagens, arrebatando-lhes o gado e os cavalos sob a
ameaça de lhe tomar ainda as suas terras! O "Capitão" Reginaldo já mais
de uma vez palmilhou o sertão e surgiu em Cuiabá para reclamar contra o
esbulho de que eram victimas (19l6: 47).
Existia nessa época um outro estabelecimento, às margens do córrego Pilões.
A história destes Bakairi, tanto na primeira, quanto na segunda fase da borracha, é
um capítulo da história do extrativismo em Mato Grosso.
14
3. OS BAKAIRI ORIENTAIS
Os Bakairi que se estabeleceram no Alto Xingu, após um período de tensos
ajustamentos
15
mantinham, a época da chegada de Steinen, múltiplas relações com os
demais povos que aí viviam, marcadas por intercâmbios sociais e cerimoniais (STEINEN,
1940 e 1942).
A passagem de Steinen pelo Xingu constituiu um marco através do qual eles
periodizam a sua história: "antes" e "depois" de Apalagady, ou seja, de Steinen ou Dr.
Carlos. O início de um novo e longo tempo marcado pela morte, pelo aviltamento, por
perdas territoriais, o "tempo da escuridão".
Os descendentes dos Bakairi alto-xingüanos trazem vivos em suas memórias os
conteúdos das narrativas feitas por seus "avós". Dizem que com a chegada de Steinen e sua
equipe, todos foram tomados de um sentimento de medo, de horror, razão pela qual a
maioria se refugiou nas matas. Nem todos voltaram para as suas residências durante a
presença desses alienígenas, o que leva a supor que a população Bakairi nessa região
sobrepujava à estimativa feita por Steinen. Todavia outros retornaram ao perceber que o pior
não acontecia e que havia entre os karaíwa gente cuja língua podiam entender. Tratava-se
dos Bakairi do Paranatinga que foram intérpretes, guias, remadores, construtores das canoas
de casca de jatobá, tão apropriadas, por sua leveza, às correntosas e encachoeiradas águas
dos rios percorridos. Eles pensaram que estes fossem igualmente karaíwa pelas roupas,
pelas "tralhas" e pelas armas de fogo que portavam. Dentre esses Bakairi destaca-se na
história posterior, Antoninho, a quem Steinen repetidamente se refere em suas obras, o
Kuikare, na língua materna. Devido a um acidente ocorrido no decorrer desses
empreendimentos, ele ficara aleijado de uma perna (mancava).
Após a passagem de Steinen, estabeleceu-se o "pomo da discórdia", pois nem todos
tiveram acesso igual aos bens introduzidos. Com os exploradores vieram o "catarrão"
(tuberculose) e outras doenças. E como essas expedições haviam sido assessoradas por
Bakairi, os demais povos alto-xingüanos passaram a acusá-los de feitiçaria.
15
Os Bakairi constam como invasores do Alto Xingu - figurando entre os primeiros, ao lado dos Waurá, Awetí "onde atacavam indistintamente todas as tribos" (VILLAS BOAS & VILLAS BOAS, 1979: 24 -25).
15
Contam que seus antepassados, pressionados por essas acusações e desejosos de
obter machados de ferro, passaram a se deslocar para o Paranatinga juntamente com
Antoninho que, acompanhado por outros, ia ao Xingu visitá-los.
Depois muitas outras expedições foram aos seus estabelecimentos, sempre guiadas
pelos que viviam no Paranatinga. Segundo os idosos, os Bakairi tiveram notícias de que os
que não servissem para o trabalho seriam mortos e que, por essa razão, muitos deles,
desesperados, ter-se-iam suicidado. Muitos outros, em grupos, migraram para o
estabelecimento liderado por Kuikare (Antoninho), no Paranatinga. Com o passar do tempo
foram fazendo as suas próprias roças e fundaram novos estabelecimentos.
Dispersos viviam os Bakairi nessa região, quando Noronha demarcou a Área
Indígena e fundou o Posto, em 1920. Com este conheceram o trabalho forçado e a mudança
compulsória para as terras que lhes foram destinadas. Muitos, até então, haviam morrido,
seja por doenças, seja por encontro, no decorrer das migrações, com inimigos que imputam
ser os Pâna (Xavante) que, segundo os Bakairi, em fins do século passado já se faziam
presentes na região. Os Kayapó também mataram muitos de seus "avós", assim como os
Otonoli . Estes, provavelmente, foram forçados a deslocamentos devido à atividade
extrativista da borracha, realizada nas terras que habitavam. Os sobreviventes misturaramse. Antes, contam eles, existiam os Memuluiwa, os Parua, os Iguêti, etc. Foram proibidos
de praticar o kado pelos missionários da South American Indian Mission, que se
estabeleceram na Área Bakairi na década de 20 deste século, e pelos encarregados do Posto,
que deles "só queriam mesmo o suor".16
Das inúmeras expedições realizadas ao Xingu, ao Telles Pires, ao Kuluene, para
reconhecimento geográfico, os Bakairi participaram. E vários registros foram feitos por
alguns participantes delas. Somam-se a elas outras, como a de Max Schmidt, cujo interesse
se voltava para o campo da ciência. Recuperei algumas informações elucidativas do
processo vivido por esses Bakairi denominados Orientais ou "bravos", em oposição aos
Ocidentais, por Steinen.
Steinen esteve em sete estabelecimentos e, de acordo com as suas informações,
existiria mais um que não visitara. Quatro situavam-se às margens do Tamitotoala
(Tâmitodoalo: tâmitodo, um tipo de gavião e alo, rio), por ele rebatizado Batovi, em
16
Sobre a ação missionária, vide BARROS, 1977.
16
homenagem ao então Presidente da Província e outros quatro às margens do Kulisehu
(Kuriezehu), ambos afluentes do Xingu.
Steinen registrou, para os sete estabelecimentos visitados, uma população total de
326 habitantes. Seus moradores mantinham entre si uma extensa e intensa rede de trocas
sociais e cerimoniais
17
. Desconheciam os animais domésticos, anzóis e alimentavam-se
sobretudo de derivados de mandioca brava, da pesca, da caça e da coleta. Existiam homens
Kustenau e Nahukwá casados com mulheres Bakairi.
A população média dos grupos locais, inferida a partir dos dados apresentados por
Steinen, era da ordem de 46 indivíduos( STEINEN, 1940; 1942). Porém, segundo os
Bakairi, existiam outros grupos por ele não visitados, situados entre os dois rios acima
referidos: Urakêdo, Auiá, Muikuru, Kâpyby. Levando -se em conta essa média
populacional e a existência de mais seis grupos - somou-se a esses cinco aquele não visitado
por Steinen - pode-se inferir que a população era de cerca de 700 indivíduos, ou seja, maior
que o dobro daquela por ele estimada.
Em 1886, os Bakairi do Paranatinga estiveram no Batovi e, quando retornaram,
fizeram-se acompanhar por alguns daqueles que aí viviam (SCHMIDT, 1942:270). Após a
segunda expedição as visitas mútuas se intensificaram.
Em 1890 o governador de Mato Grosso, Antonio Maria Coelho, nomeou o então
diretor dos Bakairi do Paranatinga, José Confúcio Pereira, diretor também daqueles que
viviam no Alto Xingu. Os objetivos dessa nomeação foram por ele claramente colocados:
atraí-los para pontos mais próximos, favorecendo a catequese; iniciá-los na pecuária e
agricultura; conquistar para o trabalho essa região tão rica e ainda em grande parte
desconhecida e improdutiva, assim como mão-de-obra para a indústria da borracha e
outros productos similares cuja exploração possa concorrer para a riqueza pública e
particular (COELHO,1890).
A partir de então passa-se a desenvolver um esforço sistemático para atrair à região
do Paranatinga não só os Bakairi, mas outros povos alto-xingüanos. Foi com esse objetivo
que o Governador do Estado, Antonio Correa da Costa, estendeu os poderes de Antoninho,
17
Quando Steinen chegava em um estabelecimento, seus moradores já haviam sido avisados por aqueles
anteriormente visitados. Relações também existiam entre aqueles que viviam às margens dos dois rios pois, segundo
registros seus, os Bakairi do Batovi eram amigos e parentes de Tamayua (1940: 77). Este era o líder do primeiro
grupo local, no Kulisehu, denominado Maigéri, segundo esse mesmo autor.
17
então "capitão" dos que viviam no Paranatinga, a todos os Bakairi alto-xingüanos e
fortaleceu o seu poder através de armas e insígnias (SCHMIDT, 1947:18). Ele havia se
casado com Rosa Bororo Cibae Modojebado 18 que conhecera em Thereza Cristina, quando
aí esteve com Steinen. Ela era viúva e tinha um filho que levara consigo para o Paranatinga,
conhecido entre os Bakairi como José Coroado ou José Roque Coroado.
Os Bakairi do Paranatinga encontravam-se localizados à sua margem esquerda, a 18
km. do córrego do Tatu, afluente do Antoninho (Mezaikiru). Essa mudança de local, em
1889, deveu-se à morte do "capitão" Felipe e de seu enteado na fracassada expedição de
Telles Pires, que tinha por objetivo explorar esse rio e alcançar o Pará através do Tapajós.
Quando os Bakairi tomaram conhecimento dessas mortes, queimaram as suas casas e
mudaram-se para esse novo local (SCHMIDT, 1947: 17-18)19.
Quando Hermann Meyer esteve no Alto Xingu, nos anos de 1896 e 1899, Antoninho
e seu enteado haviam ido mais vezes visitar os Bakairi que ali viviam. Alguns deles
migraram para o Paranatinga, ampliando a população desse grupo local para 60 pessoas
(SCHMIDT, 1947:19). Karl E. Ranke, que acompanhara Meyer em 1896, registrou que os
Bakairi do Kulisehu haviam ido ao Paranatinga e, juntamente com alguns daqueles que ali
residiam, estiveram em Rosário Oeste. Nessa vila, um deles adquiriu blenorragia oftálmica.
Ao retornar para o Kulisehu, contaminado, ocasionou uma epidemia. Todos adoeceram,
alguns morreram e outros perderam os olhos ou ficaram com leucoma (RANKE, 1898:
130).
Em 1897 existiam no estabelecimento do Paranatinga, sete residências, além de mais
uma construção. Nele viviam vinte e nove pessoas adultas, de ambos os sexos, e muitas
crianças, que recebiam visitas constantes daqueles que viviam no Batovi e no Kulisehu
(CASTRO, 1938 : 114). A caminho do Xingu, próximo ao córrego dos Anjos, a expedição
dirigida por Paula de Castro encontrou dez Bakairi (8 homens, 1 mulher e 1 criança) que se
dirigiam ao Paranatinga. Moravam no terceiro grupo local do Batoví (Id.Ibid.).
18
Sobre Rosa Bororo e seu papel na história de seu povo, vide VIERTLER, 1982: 52.
19
O Ministro da Marinha solicitou notícias dessa expedição ao Governador do Estado, que se dirigiu ao diretor
dos Bakairi do Paranatinga e ao "capitão" Reginaldo, determinando que fossem organizadas expedições de busca
para se esclarecer o destino que ela tivera (cfe. COELHO, 1890-a e 1890- b). Foi em sua homenagem que esse rio
passou a ser denominado Telles Pires, a partir de seu curso médio.
18
Quando Max Schmidt esteve no Kulisehu, em 1901, onde Steinen registrou quatro
estabelecimentos, existiam somente dois : Maigéri e Maimaiêti , este também denominado
Murika. Entre o Kulisehu e o Batoví, segundo ele, existia mais um, denominado Boduku.
Em Maigéri, que no tempo de Steinen contava com duas grandes casas de parentelas, além
de uma casa de festas, existiam então mais quatro unidades residenciais, deduzindo o autor
que a população havia aumentado. A população de Maimaiêti era de pouco mais que 45
pessoas; a de Boduku ele não informa. Sabe-se apenas que 34 Bakairi di Kulisehu haviam-se
mudado para o Paranatinga. Comentou ele que os que lá permaneceram mantinham a sua
organização social e econômica, seus costumes e suas artes (1947: 24-26). Não usavam
armas de fogo e anzóis; possuíam, todavia, machados de ferro e outros artigos que obtinham
através dos Bakairi do Paranatinga. Com estes haviam também obtido mudas de mandioca
mansa, que plantavam em suas roças próximas aos seus estabelecimentos. Os que foram se
somar ao grupo de Antoninho, no Paranatinga, viviam totalmente dependentes dele, do
ponto de vista econômico. Esse "capitão" possuía, segundo registro de Schmidt, boas e
várias armas de fogo que utilizava, ocasionalmente, contra alguns Bakairi insubordinados.
Essa pequena força militar, comentou ele, era importante para a segurança na travessia da
região entre o Paranatinga e o Alto Xingu, na qual transitavam os Kayabi, que os atacavam.
José Coroado, filho de Rosa Bororo e enteado desse "capitão", havia se casado com
uma mulher do segundo grupo do Kulisehu (Iguêti), que levou consigo para o Paranatinga.
As relações com os moradores do primeiro grupo estavam abaladas porque Coroado havia
se comportado indevidamente com a mulheres. Ele tinha a seu serviço vários Bakairi
oriundos do Alto Xingu, o que limitava o poder de Antoninho e gerava conflitos entre
ambos (SCHMIDT, 1947: 21-22).
Em 1915, quando Pyrineus de Souza, da Comissão Rondon, esteve na região
realizando um levantamento do Rio São Manoel, existiam quatro estabelecimentos no
Paranatinga, todos situados abaixo das Barras do São Manoel e do Caiapó: (1) liderado por
Antoninho, à margem esquerda, no mesmo local anteriormente referido, com sete unidades
residenciais; (2) liderado pelo "capitão" Coroado, que resultou de uma fissão do grupo
liderado por Antoninho e onde morreu Rosa Bororo, em 1913; contava com três unidades
residenciais e se situava a 13 km. do Paranatinga, à margem direita, perto do Ribeirão Azul;
(3) liderado por Gabriel, destemido vaqueiro e domador, composto por cinco homens, onze
19
mulheres e nove crianças que, segundo os Bakairi, situava-se à margem direita do
Paranatinga, próximo ao local onde nele deságua o Pindoba ou Kuá; (4) liderado por Kauto,
situado à margem esquerda e a oito km. abaixo do de Antoninho, com três unidades
residenciais. Kauto havia migrado do Alto Xingu, acompanhado por 180 Bakairi, em 1913.
Segundo esse autor, poucos deles sobreviveram a uma epidemia de gripe ocorrida logo após
a sua chegada ao Paranatinga (PYRINEUS DE SOUZA, 1916: 64-65).
Segundo Schmidt, viviam com Kauto nesse estabelecimento, em 1927, não mais que
nove homens, com suas mulheres e filhos. Os demais haviam-se mudado para outros
estabelecimentos situados no Paranatinga (1947: 27). Informaram-me os Bakairi que quase
todos aqueles que haviam acompanhado Kauto, morreram consumidos por epidemias,
confirmando o que fora registrado por Pyrineus de Souza.
Em meados de 1920 foi criado o Posto Indígena e realizada a primeira demarcação
das terras da atual Área Indígena Bakairi, por Ramiro Noronha, da Comissão Rondon, que
depois se dirigiu, para o Kulisehu. À sua comitiva foram incorporados sete Bakairi (entre
eles, Antoninho) e quatro Nahukwá que aí se encontravam. Subindo esse rio, em setembro
de 1920, encontraram eles um porto e três quilômetros adentro, três casas Bakairi. Nelas
viviam cerca de 50 pessoas, que estavam se preparando para migrar para o Paranatinga. Seu
nome era Maieri (NORONHA, 1952).
Cientes desse fato, os dirigentes do S.P.I. passaram a se empenhar para atrair para o
Posto Indígena recém-fundado esses derradeiros Bakairi que permaneciam no Alto Xingu.
E, para isso, recorreram aos que já viviam sob a sua tutela. Dos 50 registrados
em setembro de 1920, apenas 18 ainda lá se encontravam no início de 1923 (NEVES, 1923).
Estes eram esperados pelos funcionários do Posto, que adquiriram roupas na Fazenda
Laranjal (Orlando, Irmãos & Cia., comerciantes, aviadores em Cuiabá e seringalistas) para
vesti-los. Elas foram pagas com os produtos do trabalho dos Bakairi por eles controlados.
Eles chegaram ao Posto no dia 23 de junho de 1923 (NEVES, 1923-a). A partir de então não
se registra mais a presença de Bakairi no Alto Xingu, o que levou Darcy Ribeiro a
considerá-los extintos (1970: 236).
Segundo relatos dos mais idosos, os que chegavam tinham seus cabelos cortados
como os de soldados do exército e seus corpos cobertos com fortes roupas de brim
grosseiro. Logo eram incorporados às atividades desenvolvidas sob o controle dos
20
funcionários do Posto e de seus capatazes. Eu mesma tive a oportunidade de ver, no Museu
do Índio (FUNAI / Rio de Janeiro), fotos de vários deles, nessas condições descritas.
Estavam vestidos com uniformes listrados, lembrando roupas de presidiários.
Vários foram os fatores que concorreram para a ocorrência dessas migrações.
Destacamos abaixo os seguintes:
(a) as epidemias que se alastraram no Alto Xingu, pelas quais os Bakairi passaram a
ser acusados pelos demais povos que aí viviam como culpados e / ou feiticeiros , o que
gerou um clima de tensão muito grande;
(b) a intermediação feita pelos Bakairi que viviam no Paranatinga, os quais foram
fortemente armados pelos dirigentes de Mato Grosso, armas estas que possibilitaram, por
sua vez, a defesa contra os Kayabi que transitavam na região entre o Parantinga e o Alto
Xingu;
(c) a dependência dos bens que não produziam (Steinen introduziu, entre outros, o
machado de ferro) que eram colocados à disposição dos Bakairi do Paranatinga pelo
Governo (Provincial
e depois Estadual) que tinha interesse nas terras alto- xingüanas e na mão-de-obra para a
lavoura, a pecuária e a extração da borracha;
(d) como colocou Schmidt, nos idos de 1901:
É natural que expedições como as realizadas ao Xingu também apresentem
os seus inconvenientes na história da região. Assim originou-se um estado
de coisas muito tenso entre os bacairis residentes na maioria no alto
Coliseu, e as tribos situadas um pouco mais abaixo, pois estas invejavam
àqueles por lhes ter cabido a maior parte dos tesouros trazidos pelos
europeus, cuja posse dava aos bacairís maior realce. Parece que a inveja é
que motivou o assassínio por parte dos bacairis de Maigéri do chefe
Tamaiaua... (SCHMIDT, 1942: 271)20
Atualmente a maior parte da população que vive na Área Indígena Bakairi é
descendente dos que migraram do Alto Xingu, região que hoje faz parte de sua história e de
seu imaginário.
4. O LONGO ECLIPSE
20
Líder do primeiro grupo local do Kulisehu (Maigéri), que Steinen grafou Tamayaua(STEINEN, 1940: 77).
21
Circunscritos a espaços delimitados, cercados por karaíwa, os Bakairi das Áreas
Indígenas Santana e Bakairi, passaram por experiências diferentes na forma, mas não no
conteúdo. Enquanto os primeiros ficaram submetidos ao jugo dos seringalistas e de seus
capatazes, os segundos foram submetidos a violências pelos próprios agentes do órgão tutor
e missionários que aí muito cedo se fizeram presentes. Em Santana o Posto Indígena foi
implantado em 1965 e na Área Bakairi, em 1920. Em ambas as situações eles foram
aviltados e brutalizados pelos karaíwa, com a diferença que nesta última as ações foram
permeadas pelo discurso pretensamente humanitário da política indigenista oficial.
Iniciou-se para todos eles um novo tempo, que classificam como o "tempo da
escuridão", por analogia ao início dos inícios, qualificando assim as estranhas formas de
vida a que
foram condenados. Um tempo em que passaram a conhecer o trabalho
compulsório, a perda do direito de ir e vir e de exercer o seu modo particular de vida. O
malfadado encontro das onças com as emas, da lua com o sol - o longo eclipse - trouxe, em
seu bojo, experiências inusitadas para os Bakairi alto-xingüanos. Confrontando as fontes
orais e escritas, podem-se entrever as experiências sofridas.
Várias foram as denominações do Posto Indígena inaugurado na Área Bakairi, em
14 de julho de 1920: Bacaerys, Bacairí, Simões Lopes, Bakairi e, atualmente, Pakuera (rio
Paranatinga), por solicitação dos próprios indígenas. Em seus primeiros anos de existência
ele foi referido também por "Posto de Atração", fazendo jus aos seus objetivos iniciais: um
centro de atração e distribuição de ferramentas agrícolas aos Bacairí do Vale do Xingu
(MAGALHÃES, 1953:46). Buscava-se igualmente exercer controle sobre o grupo liderado
por Antoninho, cujo território e estabelecimento foram deixados fora da Área demarcada.
O Posto constituiu importante ponto de apoio para as expedições exploradoras da
região norte mato-grossense. A partir de sua fundação os Bakairi passaram a produzir,
compulsoriamente, alimentos para o sustento da própria unidade administrativa, dos
expedicionários e dos representantes de outros povos indígenas alto-xingüanos, que nele
vinham à busca de "brindes". Foram eles os tropeiros que perfaziam a rota Posto - Cuiabá Posto. As tropas levavam para essa capital os seus próprios artefatos e dos alto-xingüanos,
obtidos nas trocas por "brindes", para serem comercializados, assim como também
correspondências e mercadorias. Elas retornavam, meses depois, trazendo correspondências,
mercadorias e "brindes" que se destinavam à atração dos alto-xingüanos. Como tropeiros
22
trabalharam eles igualmente na abertura de outras frentes de atuação do órgão tutor,
destinadas à atração de outros povos indígenas. A título de exemplo, registram-se os
seguintes Postos: Pedro Dantas, José Bezerra, Alípio Bezerra, Pyrineus de Souza, Major
Libânio Coloizorecê, Kulisehu e Batoví (hoje Marechal Rondon).
O Posto situava-se à margem esquerda do ribeirão Vermelho, afluente do
Paranatinga. Em 1922 já contava com uma escola que atendia a 16 alunos do sexo
masculino, sendo que outro tanto não tinha acesso a ela por falta de equipamentos (NEVES,
1922 : Filme 213, fotograma 234)21 . Em 1927 vários já se faziam presentes em Cuiabá,
onde estudavam, inclusive alguns vindos do Alto Xingu (SCHMIDT, 1947). Isso explica o
fato de não haver hoje, entre os Bakairi dessa Área, com exceção de algumas pessoas muito
idosas, analfabetos.
Os homens trabalhavam nas "roças do Posto", além de fazerem as suas próprias.
Foram eles submetidos a uma disciplina e jornada de trabalho rígidas, sob os olhos
vigilantes dos funcionários do S.P.I.. Os homens eram deslocados para os lugares onde
trabalhavam na segunda-feira, de onde voltavam aos sábados. Começavam a trabalhar ao
nascer do sol e paravam quando ele se punha, observando apenas um pequeno intervalo para
o almoço. Plantavam arroz, milho, mandioca, banana e, em menor escala, café, além de
fruteiras e hortas (cebola, couve, tomate).
Em 1922, fugindo da violência dos seringalistas e de seus capatazes, um grupo
liderado pelo "capitão" Roberto, de Santana, migrou para essa Área, fixando-se à margem
direita do Vermelho. Schmidt, em 1927, registrou esse estabelecimento, que contava com
11 unidades residenciais, sendo que apenas três delas encontravam-se ocupadas (1947: 31).
Esses Bakairi também foram engajados nas atividades do Posto.
O Capitão Vicente de Paula T.F.Vasconcelos, que chefiou uma expedição de
reconhecimento ao Ronuro em 1925, percorreu as "roças do Posto", segundo ele, feitas e
mantidas pelos Bakairi, sob a orientação de um diarista da Inspetoria Regional do S.P.I..
Elas eram três: (1) localizada à beira de um afluente do Vermelho, onde cultivava-se arroz;
(2) uma segunda, que estava sendo preparada e (3) outra mais antiga, denominada Roça da
Serra , onde se plantava cana-de-açúcar, que era transformada em açúcar de barro (mascavo)
21
Daqui para frente, os documentos microfilmados serão referidos da seguinte forma: autor, data, F no lugar de
filme e f no lugar de fotograma, para facilitar as citações.
23
e rapadura. Um engenho de ferro havia sido recentemente ali montado. Descreveu o
Capitão:
Dois rapazinhos bacairis lidavam com os bois que o moviam, fazendo a
substituição da cana moída, transportavam a garapa para um grande tacho
de cobre colocado sobre inflamada fornalha armada sob espaçoso rancho.
Aí, munidas de grandes colheres de pau e escumadeiras, ocupavam-se duas
índias com a preparação do melado que, em seguida, colocado em formas,
transformavam-se em rapaduras. (...) Além deste rancho, vimos mais dois
servindo de tulha e outro de moradia ao administrador e sua família. Neste
último havia um compartimento onde acabavam de ser instaladas três
grandes formas de cedro, destinadas à confecção do açúcar (...) esperando o
encarregado do Posto um rendimento de mais de oito arrobas de cada uma
(VASCONCELOS, 1945: 30).
Os produtos desses roçados concorriam para o sustento dos indígenas que vinham do
Alto Xingu, em busca de "brindes". Esse movimento era significativo. No quadro 01, a
seguir, apresento apenas uma pequena amostra dele, levantada a partir de dois documentos.
Os Nahukwá, os Waurá e os Mehináku eram os que mais se faziam presentes. Esse
movimento, somado ao das expedições exploradoras, explicam, em parte, a depopulação de
78,3% no Alto Xingu entre fins do século passado e 1952, em conseqüência de surtos
epidêmicos (GALVÃO & SIMÕES, 1966: 43). Outros não conseguiam ir ao Posto, devido a
investidas de inimigos, tais como os Juruna que, atacados pelos Kamayurá, tiveram que
retroceder (NEVES, 1923-a, F.213, fs. 0136 a 0144).
Esse movimento ocorreu até 1946 (AGOSTINHO, 1971: 356) . Mas em 1976,
quando cheguei pela primeira vez na Área, aí encontrei 09 Kalapálo e um pequeno grupo
deles também nela esteve em 1987. Dizem os Bakairi que algumas visitas de altoxingüanos, volta e meia, eles sempre receberam. Uma Kalapálo aí viveu durante uns anos
com seu filho. Ela casou-se com um Nambikwara e foi viver com ele no Guaporé.. Hoje os
Bakairi mantêm relações mais significativas com os povos alto-xinguanos.
Desde o início os Bakairi ficaram revoltados com a atenção dispensada a esses
indígenas e vários documentos registram esse fato. Diz um deles:
Os Bacahyris ficaram revoltados com esses presentes que se faz
a esses índios; o Antoninho encute na idéia delles que tudo o que
vem é só para os Bacahyris, mas mas eu agrado todos, procuro
desfazer esses maus conselhos do Antoninho (Kuikare, N.A.)
(NEVES, 1922: F. 213, f. 238).
24
Antoninho (Kuikare) negava-se a mudar para dentro da Área, permanecendo com o
seu grupo à margem esquerda do Paranatinga, no Mezaikuru
22
. Juntamente com o
"capitão" Roberto (que veio com um grupo de Santana,em 1922), elaborou e encaminhou
um documento por ele manuscrito, datado de 24 de maio de 1924, ao chefe da Inspetoria
Regional, no qual reivindicavam o direito de expulsar do Posto os funcionários que não
soubessem respeitá-los.Diz ele:
...faço sciente a espetoria de Cuiabá que está passando aqui no dito Posto.
Eu Capitão Antoninho e Capitão Roberto Joaquim dos Sancto e mais
pessoal fais esta chexa [ queixa?] que o empregado do Posto Bacahiris esta
maltratando sobre ropa que estão, jamais nunca sobra pano e toda couza
como sabão, fumo e todos que precisa não tem, mais é para Bacahiris até
chumbo elle mandou vir la da espetoria diz que era prara matar Bacahiriz.
O Indio Chingu tem de todos na mão delle. E assim fasso sciente o Governo
da espetoria se não tirar elle de aqui nois vamos imbora daqui, ficar o indio
Chingu no lugar, que o Sñr. Afoncio dis que o Posto é do Chingu, não é dos
Bacahiris, o Capitão Roberto não quer o Sñr. Afoncio aqui porque aqui não
cervi para estar no encargo, tem vindo faltura não tem pra nois, pesso o
Governo da espetoria uma orde que todos os empregados que vier aqui que
não cervi e não respeitar nois podemos tirar pra fora do Posto. E assim
receba recado do Capitão Antoninho e do Capitão Roberto Joaquim dos
Sancto (ass.)(ANTONINHO & SANCTO, 1924: F. 213, f. 250).
Descontentes, os Bakairi puseram-se a migrar para fora da Área, indo juntar-se a
Antoninho Kuikare (CRUZ, 1925: F.213, f. 250). Na tentativa de reverter o quadro, o
Inspetor Regional passou a enviar presentes destinados aos Bakairi e, especialmente a
Antoninho, invocando o nome de Rondon que este conhecera e respeitava
(ESTIGARRIBIA, 1926: F.213, f. 516). Recomendou também ao chefe de posto que a
desarmonia entre os Bakairi e os alto-xingüanos fosse evitada. Mas a situação foi se
tornando cada vez mais crítica, resultando, até mesmo, em destruição das casas de
funcionários ( Idem, 1926 - a: F.213, f. 520-521).
Em 1927 registrou Schmidt que os Bakairi se vestiam de forma européia e residiam
em casas construídas no estilo dos regionais. Eles não estavam contentes com o lugar em
que estavam se fixando, ao redor do Posto, porque não havia nas suas proximidades locais
apropriados para a lavoura, a água era de difícil acesso no tempo da seca, pois os ribeirões
22
Esse estabelecimento foi fundado em 1889 e ficou fora da Área demarcada em 1920.
25
próximos eram temporários (1947:32). Os Bakairi afirmam que somava-se a isso o fato de
ficarem longe do Paranatinga, razão pela qual tinham que caminhar muito para pescar.
Mas não só em torno do Posto viviam eles. Segundo as fontes orais e registros de
Max Schmidt havia vários outros grupos dispersos no interior da Área: (1) na embocadura
do Ribeirão Azul com o Paranatinga, do lado direito, com 04 unidades residenciais
(xinguanos); (2) um pouco mais abaixo desse lugar, uma unidade residencial; (3) dessa
localidade saía uma vereda que levava ao domicílio principal dos Bakairi que migraram do
Kulisehu, duas unidades residenciais bem grandes; (4) pouco mais rio abaixo havia alguns
domicílios, onde parte da população procedia de Maimaiêti (SCHMIDT, 1947, 30-31); (5)
no Bananal, afluente da margem esquerda do Paranatinga, dentro da Área; (6) nas
proximidades do ribeirão Paxola, margem direita (fontes orais). A estes se somava o grupo
de Antoninho, fora da Área demarcada em 1920 (Mezaikuru).
Em fins de 1928 o grupo oriundo de Santana, liderado pelo "capitão" Roberto, foi
expulso da Área pelos agentes do S.P.I., sob a alegação de que eram ladrões e matadores de
gado, o que intensificou a revolta dos Bakairi, principalmente do "capitão" Antoninho, seu
aliado. Este, após separar-se de Rosa Bororo, casou-se com uma mulher de Santana, com
quem teve filhos. Nessa época ocorreram vários atentados contra a vida de servidores do
Posto. Dois anos depois este foi mudado para as proximidades da confluência do Azul com
o Paranatinga, onde ainda hoje se situa. Em 1937 ele contava com 224 cabeças de gado, 76
suínos, 7 éguas e 11 animais de montaria (ARAÚJO, 1937: F. 213, f. 1276).
Segundo Petrullo, que lá esteve em 1931, muitos Bakairi haviam morrido: a febre
rapidamente diminuía a população, assim como a sífilis (PETRULLO, 1932: 128). Sabe-se
que algumas de suas mulheres eram tomadas como amantes pelos servidores do Posto e até
mesmo Inspetores, que circulavam de tempos em tempos as Áreas Indígenas,
contaminando-as.
Em 1942, os agentes do S.P.I. promoveram a mudança de todos os que viviam
dispersos, em vários grupos locais, para as proximidades do Posto, onde fundaram um único
aldeamento. Os Bakairi narram e os documentos confirmam que a construção de suas novas
residências eram feitas em lotes definidos (25 metros de frente), formando arruamentos,
obedecendo a uma planta (5 x 5 metros, 03 peças)(VITÓRIO, 1942: F.213, f. 1738; 1942-a:
F.213, f. 1767). Segundo os Bakairi informaram, o motivo alegado por eles foi a facilidade
26
que isso traria à educação escolar, ao tratamento da saúde. Todos estavam muito doentes,
com febre "palustre", sarampo e outras enfermidades que causaram muitas mortes.
O grupo do "capitão" Antoninho, já falecido, liderado por seu irmão mais novo,
Pirineu, foi obrigado a mudar-se para dentro da Área, nesse ano. Seus descendentes dizem
que estavam doentes e o grupo muito reduzido. Com relação a esse fato localizei o seguinte
documento:
...o sargento não tem cumprido o que combinou com o Sr. Inspetor Calmon,
prejudicando os planos (...) Chegando o sargento na Rancharia, conforme
combinou, em vez de esperar o Inspetor Calmon, pedio a opinião do Sr. José
Campos e este lhe disse que devia voltar e prender a mulher de Antoninho e
os demais e trazer aqui pª. o Posto, assim fez o sargento vindo com as
mulheres, crianças, etc...(VITÓRIO, 1942: F. 213, f. 1737).
O grupo que se encontrava à margem esquerda do Paranatinga, próximo ao ribeirão
Bananal, assim como aquele que se localizava próximo ao ribeirão Paxola, foram
igualmente forçados a migrar para o aldeamento ( Idem, 1942 -c: F. 213, f. 1682).
Nesse ano, 1942, foram construídos os prédios de alvenaria ainda hoje existentes: (1)
portentosa construção onde funcionava um "hospital", com vinte leitos, onde se atendia
também a regionais; (2) duas casas para funcionários; (3) escola; (4) casa para visitas; (5)
duas casas no Retiro Azul. Além destes, existia uma sede do Posto, construída em 1930 e
um "galpão" para depósito. As portas e portais, janelas, os tijolos e as telhas foram
fabricadas na Área, pelos Bakairi, sob o controle e orientação dos funcionários do S.P.I.
(VITÓRIO, 1942-b: F. 213, f. 1712).
Existiam então três "roças do posto": (1) no Bananal, onde se plantava mandioca,
arroz, milho e, inclusive, capim Jaraguá para a formação de pasto; (2) no Azul, onde foi
construído um retiro de gado e porcos, o Retiro Azul, no qual se plantava mandioca brava e
mansa, milho, feijão (Idem, 1942-a: F. 213, f. 1637) e (3) nas matas da margem direita do
Paranatinga. Retiros de gado também foram feitos na região do Ribeirão Caiapó ou
Kaiahoalo.
Nesses locais de trabalho, a presença dos Bakairi era controlada através de "livros de
ponto". Neles os homens permaneciam de segunda a sábado, quando retornavam, na hora do
almoço, para as suas famílias. As mulheres fabricavam farinha, "açúcar de barro" e
mantinham a limpeza nos prédios do Posto. As crianças, uniformizadas, estudavam na
escola e, quando desobedeciam à ordem imposta, eram obrigadas a arrancar ervas daninhas
27
espinhosas, de raízes fortes, com as próprias mãos, que sangravam. Tive notícias de que aí
teria existido um tipo de "pelourinho" ("tronco") para aplicação de castigos aos adultos.
Estes, e mesmo as crianças, eram trancafiados em quartos escuros, sozinhos. .
Embora os cálculos para a remuneração pelos serviços fossem feitos à base de
diárias, o que ocorria, de fato, era o pagamento em espécie, um sistema de barracão. Era,
como eles próprios dizem, o "tempo da escravidão", da "escuridão".
Foi instituída a figura de um só "capitão" para todo o aldeamento e criou-se um
Conselho de Índios, extraído de uma reunião coordenada pelo Inspetor Regional (
VITÓRIO, 1942-b: F. 213, f. 1718), que não vingou.
Os agentes do órgão tutor controlavam também as relações que eles estabeleciam
com os missionários da South American Indian Mission, que aí se encontravam desde os
últimos anos da década de 20 e que proibiam os Bakairi de realizar seus rituais.23 Eles,
devido a conflitos com agentes do S.P.I., foram estabelecer-se do outro lado do Vermelho,
nas terras conhecidas por Paxola, recém - conquistadas. Para esse local se dirigiam os
Bakairi, aos domingos, para ouvir "vitrola", na qual eram tocadas músicas em inglês. Para
tentar impedir esse movimento, introduziram os agentes do S.P.I., o futebol (VITÓRIO,
1942-b: F.213, fs. 1718 -1719).
O nível de interferência foi tanto que até mesmo alguns casamentos foram
arranjados pelos funcionários do Posto. Eles é que impunham, em muitos casos, nomes de
karaíwa que os Bakairi, desde o começo, foram obrigados a adotar. Uma senhora,
descendente de Antoninho, contou-me que seu nome era Ana e que o encarregado do Posto
o mudou porque já existiam outras Anas.
Desesperados, os Bakairi dessa Área optaram pela autodestruição, abortando os
filhos gerados e o infanticídio, exacerbando assim práticas antes apenas voltadas para o
controle demográfico. Para evitar isso, os servidores do S.P.I. estabeleceram um programa
de " incentivos" à manutenção da vida dos fetos e das crianças recém-nascidas, além de
assistência às gestantes e parturientes. Para cada criança que nascia, doava-se aos pais uma
novilha; a cada aniversário, até que completassem cinco anos, outra novilha e, a partir da
23
Não desenvolverei aqui essa questão. Sobre a ação missionária, vide BARROS, 1977.
28
posse de dez novilhas, um animal de montaria.
24
No entanto, estabeleceu-se, como regra,
que esses animais não poderiam ser consumidos ou vendidos, permanecendo, todos eles,
sob o controle do Posto. Em 1955 existiam nessa Área, cerca de 5.000 cabeças de gado e o
Posto participava nas Exposições Agropecuárias realizadas em Cuiabá. Mas os Bakairi não
usufruíam dessa riqueza - ainda que a eles coubesse tratar do gado - e eram acusados, tanto
pelos servidores do S.P.I., quanto pelos proprietários de terras da região, de serem "ladrões
de gado".
A orientação dada aos funcionários do Posto era a de transferir para outras Áreas
Indígenas, em especial para o Posto Alípio Bezerra, onde viviam os Kayabi e para o Batoví,
onde se processava a atração dos Xavante, aqueles que não se submetessem às suas
violências (MORAIS, 1944; COSTA, 1950 e 1950-a). Muitos deles foram expulsos, alguns
foram mortos pelos próprios agentes do S.P.I.. Outros foram mandados, com suas famílias,
para o Batoví, onde participaram, compulsoriamente, do processo de "pacificação" dos
Xavante. Em razão disso, vários nasceram nesse local.
Uma parcela desses Xavante migrou para a Área Bakairi. Segundo Maybury-Lewis,
eles fundaram aí um estabelecimento em 1955, meses após do de Batoví, o qual situava-se
próximo ao Posto (1984:53). No ano em que ele esteve aí pesquisando, 1962, os Xavante
somavam 175, enquanto que os Bakairi, 160 indivíduos. As relações que se estabeleceram
entre eles, antes conflituosas, eram já, nessa época, amistosas, ainda que marcadas pela
competição pela caça, cujos métodos adotados pelos Xavante eles desaprovavam, pelos
frutos das mangueiras e pelos demais alimentos por eles coletados.
Dois anos antes da passagem desse etnólogo, uma forte epidemia de coqueluche
havia feito, na Área, muitas vítimas:
...a impedemia continua matando os índios. Até esta data morreu: 9
crianças da tribo Chavante, 9 crianças da tribo Bacaerí, 1 menino Xerente,
1 homem Bacaerí. E tem uns tantos hainda passando mal, de ambas as
tribos. (VANNI DE OLIVEIRA, 1960). 25
Comentam os Bakairi que nessa época enterravam um dos seus quase todos os dias.
24
Segundo consta no Boletim Administrativo do S.P.I., nº. 14, datado de 1943, tal programa foi estendido
também aos Bororo e Umutina, onde se procurou evitar tais práticas, da mesma forma.
25
Foram trazidos dois Xerente, que se casaram com mulheres Bakairi, para atuar como intérpretes na
"pacificação" dos Xavante, no Batovi.
29
Em 1961 um outro grupo de Santana migrou para esta Área, fugindo às violências
praticadas por seringalistas, principalmente os irmãos Spinelli, então proprietários da
Empresa Rio Novo. Também foram expulsos dela por funcionários do Posto, pelas mesmas
razões alegadas pelos seringalistas para justificar as violências contra eles praticadas: o
roubo de gado (VANNI DE OLIVEIRA, 1961). Sem alternativas, eles retornaram para
Santana, mas outros vieram e permaneceram alí escondidos, sob a proteção dos demais
Bakairi ( Idem, 1963: F. 215, fs. 1084 - 1085).
À época da passagem de Maybury-Lewis o Posto já se encontrava em decadência,
assim como o próprio Serviço de Proteção aos Índios. Eles passaram então, a buscar apoio
nos missionários protestantes e norte-americanos da South American Indian Mission que,
aproveitando-se da situação crítica por eles vivida, implantaram-se dentro do aldeamento,
onde construíram, na rua principal, uma igreja. Em 1967 ela foi derrubada e os missionários
se retiraram para o Posto Paraíso, criado no inteiror da Área Bakairi, para atender
exclusivamente aos Xavante. Passaram a atuar entre eles, assim como em Santana,
missionários do Summer Institute of Linguistics e, de maneira menos intensa, jesuítas.
Em 1974 os Xavante, que somavam então 180 indivíduos, se retiraram para o
Kuluene e o Posto Paraíso foi desativado. Hoje restam apenas vestígios dele e do
estabelecimento abandonado. Os Bakairi herdaram os prédios portentosos, porém vazios,
terras que sofreram uma intensa sangria, em termos de recursos naturais para eles valiosos.
Ficaram com as recordações desse longo período que eles qualificam como o "tempo da
escravidão", o "tempo da escuridão".
Quanto aos de Santana, o Posto Indígena foi instalado em 1965. Eles somavam 94
indivíduos, sendo 38 homens, 20 mulheres, 21 crianças do sexo masculino e 15 do sexo
feminino (MUNIZ, 1965: F.217, f.635). Ele funcionava como um entreposto de seringal. Os
Bakairi dessa Área foram submetidos, como se verá, a uma dupla servidão.
Para implantá-lo, os servidores do S.P.I. contraíram dívidas com a Empresa Rio
Novo, cuja sede situava-se a 5 km. do local em que construíram sua sede. Os Bakairi já
extraíam borracha, nessa época, no pequeno seringal existente dentro dessa Área, para os
irmãos Spinelli, proprietários da referida empresa, sendo que um deles representava uma das
forças políticas expoentes de Mato Grosso. Tal como os seringalistas, os agentes do S.P.I.
passaram a explorar os Bakairi nessa mesma atividade. Eles compravam borracha dos
30
indígenas e a vendiam para a Rio Novo por preços que superavam o dobro do valor a eles
pagos ( MUNIZ, 1956-a: F.217, f. 689; 1966-b: F. 217, fs. 704 - 705).
Eles também trabalhavam nas "roças do Posto". Plantavam arroz , banana, batata,
mandioca e cana-de-açúcar (MUNIZ, 1965-b: F. 217, fs. 605-606). Esses produtos eram
utilizados para pagar parte da dívida contraída pelos funcionários do Posto junto à Rio Novo
(MUNIZ, 1966 : F. 217, f. 677; 1966-b: F.217, fs.704 -705). Nessa empresa eles ainda
beneficiavam a cana, deixando para ela, como forma de pagamento, 70% do produto
(MUNIZ, 1966-a, F. 217, f. 668).
Revoltados, esses Bakairi passaram a reagir contra o encarregado do Posto que
solicitou aos seus superiores, autorização de transferir vários deles, para outros Postos,
alegando os seguintes motivos: palavrões desabonadores contra a sua pessoa; promessa de
lhe darem tiros e roubos, invocando por testemunhas um dos proprietários da Empresa e um
dos empregados dela (MUNIZ, 1966-c: F. 217, fs. 649-650). Mas a situação foi controlada
temporariamente, através de ameaças de transferências para outras Áreas, sobretudo as
habitadas por povos inimigos. Em 1967 a situação se tornara crítica: os Bakairi se
revoltaram contra a administração, que imputou a um deles a liderança desse movimento :
Este índio e sua turma vem procurando, por todos os meios, tirar do serviço do Posto todos
os índios que aqui trabalham (MUNIZ, 1967: F.217, f. 724).
Nesse mesmo ano o encarregado recebeu ordens para suspender a atividade
extrativista da borracha, pois o Banco da Amazônia somente estava comprando esse produto
já beneficiado, ficando, com isso, a de cocho desvalorizada (PEREIRA, 1967: F. 217, f.
721).
Mas a Empresa Rio Novo instalara em sua sede uma laminadora de borracha e
vários Bakairi passaram a trabalhar nela, como operários. Outros continuavam a extraí-la em
suas próprias terras, porém para essa Empresa. Isso resultou na falta de mão-de-obra nas
"roças do Posto", o que levou o encarregado a solicitar aos seus superiores o envio de
homens de Cuiabá para realizar colheitas. Acusou ele que:
...os índios não querem mais trabalhar, pois não tenho nada para venderlhes; estão todos trabalhando para a fazenda Rio Novo, pois lá estão
recebendo o que ganham e não querem mais trabalhar aqui para receber
depois (MUNIZ, 1969: F.217, f. 710).
Segundo depoimentos de um chefe de posto que trabalhou nessa Área entre os anos
de 1971 a 1973, ele teria encontrado os Bakairi escravizados pelos Spinelli. Seus capatazes
31
iam, armados, recrutar entre eles, a mão-de-obra de que necessitavam. Dentro da Área
morava ainda a família de Manoel Corrêa, filho adotivo do "Coronel" Hermenegildo
Galvão, que aí se instalara no início do século. Nesse local existia, segundo ele, a
prostituição e o alcoolismo. As filhas de Manoel aí fizeram um cabaré. Um Bakairi
terminou sendo morto nesse local. A Área Indígena, segundo o depoente, não era
considerada terra de índio, mas estrada de seringueiro. Nela os Spinelli criavam cerca de
600 cabeças de gado.
Para reverter esse quadro, comentou ele, passou a comprar, com seus próprios
recursos, a estiva ( sal, óleo, açúcar, etc.) e a adquirir a borracha dos Bakairi, que vendia
para a Rio Novo. Como se nota, ele, ainda que tomado de boas intenções, por falta de
transporte e de recursos, terminou por assumir o papel de intermediário da empresa. O Posto
Indígena Santana melhor seria então, caracterizado como um entreposto da atividade
extrativista da borracha. Como dizem os Bakairi tinha mais patrão que índio.
Comentou esse chefe de posto que:
Em Santana (...) teve uma ação destruidora mais constante, sempre houve
pinga, tiros, o que degrada o índio. Havia um tipo de imposição por parte
dos Spinelli e fazendeiro falem em português que eu quero entender! (...) Eu
acho até heróico eles resistirem tanto assim. Já era para terem perdido a
língua, já era pra terem virado peão mesmo! (gravado e transcrito).
De 1973 a janeiro de 1975 apenas uma atendente de enfermagem se fazia presente
na Área, totalmente dependente, porém, da Rio Novo, onde ficava, inclusive, o aparelho
rádio-transmissor através do qual se comunicava com Cuiabá. A vida dos Bakairi, segundo
informações dessa atendente, praticamente havia sido transferida para a Rio Novo,
permanecendo na Área os velhos e crianças. Ao perguntar eu mesma ao Delegado da 5ª.
D.R., em 1978, porque os Bakairi de Santana não contavam quase nunca com chefe de
posto e recursos da FUNAI, ele me respondeu que eles tinham assistência da Rio Novo:
escola, trabalho, remédios, etc. O que se estabeleceu, de fato, foi a subtutela.
Odenir Pinto de Oliveira, assumiu a chefia do posto no início de 1975 e aí
permaneceu até meados de 1977, quando passou a trabalhar no Projeto Xavante. Foram
inúmeras as suas tentativas no sentido de solucionar as invasões existentes na Área e, nos
documentos arquivados no posto, ele apontava a revolta dos Bakairi, que prometiam, até
32
mesmo, atear fogo nas sedes das fazendas que invadiam suas terras. Revolta esta
intensificada pela presença do gado, que destruía suas roças (PINTO DE OLIVEIRA, 1976).
Quando ele assumiu essa unidade administrativa, os Spinelli já haviam vendido a
Rio Novo para os irmãos Achilles e Humberto Simioni, paulistas, que nela introduziram a
pecuária intensiva, com recursos próprios e de forma bastante sofisticada. As 50 famílias,
inclusive 10 Bakairi, que aí residiam, foram expulsas, sendo que estas voltaram para a Área
Indígena Santana. Os chefes destas famílias passaram então a vender a sua mão-de-obra, a
exemplo dos demais, nas agropecuárias da região, cujos proprietários, lançando mão dos
incentivos fiscais da política desenvolvimentista brasileira para a ocupação do cerrado,
iniciaram o cultivo de arroz para, posteriormente, formar pastos. Os Bakairi, desta e da outra
Área, trabalhavam como diaristas ou empreiteiros nesses estabelecimentos, onde eram
empregados para erguer cercas, currais e outras atividades voltadas para o preparo da terra
para a mecanização. 26
Na tentativa de reverter esse quadro, o chefe de posto de Santana propôs a eles um
projeto: plantar 40 ha. de arroz, às margens do córrego Pilões e comercializar o produto em
Cuiabá. Os recursos seriam destinados, quando o montante permitisse, à compra de um
trator e implementos agrícolas, além da implantação de uma cooperativa (PINTO DE
OLIVEIRA, 1976-a).
Estimulados por esse Projeto e pelo desejo de possuir um caminhão, eles plantaram
35 ha. de arroz em "roças de toco". Mas, ante as dificuldades e a transferência desse chefe de
posto, esse sonho não sobreviveu. Passaram então a trabalhar, de forma mais intensa, como
peões de fazendeiros.
Nessa Área, apenas em 1973 foi implantada uma escola que permaneceu, até 1980,
funcionando de forma intermitente. Os Bakairi que sabiam ler e escrever tinham estudado na
escola da Empresa Rio Novo. Em fins da década de 70, o mercado de trabalho foi se
fechando, pois a infra-estrutura das agropecuárias da região já se encontrava implantada. Em
1980 ambas as Áreas foram incluídas na região de influência da BR-364, passando a contar
com recursos do Banco Mundial (POLONOROESTE). Novas formas de relacionamento
com os karaíwa foram estabelecidas e, ante a possibilidade de efetivação dos Projetos
26
Para maiores detalhes, vide BARROS, 1977.
33
Emancipacionistas, eles passaram a reivindicar formas mais justas de relacionamento, para
resistir à expropriação e questionar as desqualificações de que, secularmente, foram alvos.
Atualmente, registram-se diferenças entre os Bakairi de uma e outra Área, diferenças
essas que expressam modalidades de "ser Bakairi", resultantes de adaptações do mesmo
sistema social às situações historicamente constituídas. Mas todos se reconhecem como um
só povo, uma mesma humanidade, com origem e destino comuns após a morte.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E DOCUMENTAIS
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Barão de Maracaju Presidente da Província de Matto Grosso Abrio a 1ª. Sessão da
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Cuiabá, Typ. de Joaquim J,R,Calháo (também microfilme 02, documentos 035 a
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3. Fontes Manuscritas
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Província Albino de Carvalho, datado de 17 de novembro. Livro de Registro da
Correspondência Oficial entre a Presidência e as Comarcas Municipais, Párocos,
Bispos, Juízes de Paz, Director Geral dos Índios, Administrador do Correio e as
pessoas particulares da Província. Cuiabá, p.19, 1863.
COELHO, Antonio Maria - Ofício encaminhado à José Confúcio
Pereira
pelo
Governador do Estado de Mato Grosso, Antonio Maria Coelho, em 17 de junho.
Catechese (Exercício 1888-1903) : Livro para o Registro da Correspondência do
Governo deste Estado com a Catechese, documento nº. 7, p. 12-v e 13, 1890.
--------- Ofício encaminhado ao Capitão Reginaldo pelo Governador do Estado de Mato
Grosso, Antonio Maria Coelho, datado de 1º. de setembro. Catechese (Exercício
1888 - 1903) : Livro para Correspondência do Governo deste Estado com a
Catechese, Documento 12, p. 14, 1890 - a.
--------- Ofício encaminhado pelo Governador do Estado de Mato Grosso, Antonio Maria
Coelho ao Diretor dos Índios Bacahiry Jo_e Confúcio Pereira, datado de 14 de maio.
Catechese ( Exercício 1888 -1903): Livro para Correspondência do Governo deste
Estado com a Catechese, Documento nº. 3, p. 11, 11-v e 12, 1890 - b.
DUARTE, João Batista et alii - Carta à Luiz Pinto de Souza Coutinho, datada de 30 de
março. Documentos Avulsos, Caixa 1771, 1771.
--------- Carta à Luiz Pinto de Souza Coutinho, datada de 13 de julho, Documentos
Avulsos, Caixa 1771, 1771-a.
FERRO, Joaquim - Correspondência dirigida ao Governador do
Estado
de
Mato
Grosso, Pedro Celestino Correa da Costa pelo Sub-Delegado da Rio Novo,
Joaquim Ferro, Documentos Avulsos, Caixa 1910, 1910.
MARACAJU, Barão de -
Relatório com que o Barão de Maracaju, Presidente da
Província de Matto Grosso Abrio a 1ª. Sessão da 23ª. Legislatura da respectiva
Assembléia no dia 1º. de Outubro de 1880, Cuiabá, 1880.
MURTINHO, Manoel José - Ofício encaminhado pelo Governador do Estado de Mato
Grosso ao Diretor Geral dos Índios, datado de 14 de maio. Catechese (Exercício
1888 a 1903): Livro para Registro da Correspondência do Governador deste
Estado com a Catechese, Documento nº.3, p. 30, 1893.
40
OLIVEIRA, João Baptista d' - Relatório do Estado da Catechese e Civilização dos Índios,
dirigido ao Presidente da Província de Mato Grosso Joaquim Raimundo de Lamare,
datado de 31 de Dezembro. Diretoria Geral dos Índios ( 1848 - 1860), p. 92 a 99-v,
1858.
PEDROSA, João José - Relatório com que o Exmº. Sr. Dr.João José Pedrosa Abrio a 2ª.
Sessão da 22ª. Legislatura da Respectiva Assembléia no dia 1º. de Outubro de 1879,
p. 214 a 224, 1879.
RAMOS FERREIRA, José Joaquim - Relatório que o Exmº. Sr. Vice -Presidente Dr. José
Joaquim Ferreira Devia Apresentar a Assembléia Legislativa Provincial de Matto
Grosso na 2ª, Sessão da 26ª. Legislatura no dia 1º. de Novembro de 1887, Cuiabá,
1887.
REGO, F. Raphael de Mello - Ofício do Presidente da Província F.R. de Mello Rego,
encaminhado ao Diretor Geral dos Índios, datado de 5 de outubro de 1888.
Catechese (Exercício 1888 a 1903) : Livro para Registro da Correspondência do
Governo deste Estado com a Catechese, Documento nº. 2, 2ª. Secção, p. 2-v e 3,
1888 - a.
RODRIGUES, Thomaz Miranda - Relatório sobre a Catechese e Civilização dos Índios
encaminhado ao Presidente da Província de Mato Grosso, João José Pedrosa,
datado de 23 de Agosto. Documentos Avulsos, Caixa 1879 (sem pag.), 1879.
VIEIRA, Henrique José - Relatório do Diretor Geral dos Índios ao Presidente da Província
de Mato Grosso Augusto de Leverger, datado de 28 de fevereiro. Diretoria Geral
dos Índios ( 1848 - 1860), p. 17 a 18-v, 1852.
---------
Relatando o Estado da Catechese e Civilização dos Índios ao Presidente da
Província de Mato Grosso Augusto de Leverger, datado de 28 de Fevereiro.
Diretoria Geral dos Índios (1848 - 1860), p. 25 a 27, 1853.
--------- Apresentando ao Exmº. Governo o Relatório do Estado da Catechese durante o Ano
de 1854 (Dirigido ao Presidente da Província de Mato Grosso Augusto de Leverger),
Diretoria Geral dos Índios (1848 - 1860), p. 55-v a 58, 1854.
--------- Ofício Acusando o recebimento dos Documentos de Despesa feitos por João
Baptista Prudêncio. Diretoria Geral dos Índios ( 1848 - 1860), p. 59-v, 1854-a.
41
--------- Relatório do Ocorrido durante o Anno de 1855. Diretoria Geral dos Índios (1848 1860),p. 68 a 69-v, 3 de Dezembro de 1855.
--------- Ofício Encaminhado ao Inspetor da Tesouraria da Província de Matto Grosso
Manoel José de Araújo, datado de 9 de Janeiro. Diretoria Geral dos Índios (1848 1860), p. 70 e 70-v, 1856.
--------- Apresentando ao Exmº. Sr. Presidente da Província o relatório do Estado da
Catechese durante o Anno de 1856, dirigido ao Presidente da Província de Matto
Grosso, Augusto de Leverger, em 20 de Novembro. Diretoria Geral dos Índios
(1848 -1860), p. 72-v a 75, 1856 - a.
b) Arquivo do Núcleo de Informação e Documentação HistóriaRegional - Universidade
Federal de Mato Grosso (NIDHR - UFMT)
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Roiz Torres a S.M. sobre Assuntos da Provedoria e sua Administração, datada de 30
de Junho de 1738. Cópia do Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa. Microficha
17, Documento 212 / Avulsos (Caixa 2, nº. 83), 1738.
--------- Carta ao Intendente e Provedor da Fazenda Manoel Roiz Torres a S.M. sobre
Assuntos da Provedoria e sua Administração, datada de 03 de setembro de 1738,
Microficha 19, Documento 214, Arquivo Ultramarino (Caixa 2, nº.87), 1738.
c) Arquivos dos Postos Indígenas Bakairi (Simões Lopes) e Santana
PINTO DE OLIVEIRA, Odenir - Ofício dirigido ao Delegado Regional da 5ª. D.Regional
da FUNAI, Rubens Pinho, datado de 15 de janeiro (Posto Indígena Santana), 1976.
VANNI DE OLIVEIRA, Pedro - Ofício nº. 4, de 9 de março de 1960, encaminhado ao
Chefe da I.R. - 6, Cuiabá (Arquivo do Posto Indígena Bakairi), 1960.
Ofício nº.23, s/d, encaminhado ao Inspetor Regional pelo Encarregado do Posto Indígena
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42
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de novembro, Filme 214, fotograma 1654, 1950.
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S.P.I. - I.R.-6, datado de 10 de
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CRUZ, Lício Cândido da - Relatório dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I. (I.R.-6) A. M.
Estigarribia, datado de 30 de Dezembro, Filme 213, fotograma 514, 1925.
ESTIGARRIBIA, Antonio Martins - Ofício nº. 27 dirigido ao Encarregado do Posto
Indígena Bacairi, Lício Cândido da Cruz, datado de 17 de Janeiro, Filme 213,
fotograma 516, 1926.
--------- Ofício nº. 58, dirigido ao Encarregado do Posto Indígena Bacairi, Lício Cândido da
Cruz, datado de 18 de maio, Filme 213, fotogramas 0520 e 0521, 1926 -a.
MORAIS, João Fonseca de - Relatório dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I. - I.R.-6 Sr.
Álvaro Duarte, datado de 12 de Novembro, Filme 214, fotogramas 199 e 200, 1944.
MUNIZ, João Viegas - Correspondência enviada ao Inspetor Regional do S.P.I., Hélio
Bucker, datada de 29 de março, Filme 217, fotogramas 631 a 635, 1956.
--------- Correspondência encaminhada ao Inspetor Regional do S.P.I., Hélio Bucker, datada
de 26 de Abril, Filme 217, fotograma 689, 1965 -a.
--------- Correspondência encaminhada ao Chefe da IR-6, datada de 24 de Junho, Filme 217,
fotogramas 605 e 606, 1965 -b.
--------- Aviso do Posto Indígena Santana, dirigido ao Chefe da Inspetoria Regional, datado
de 30 de Abril, Filme 217, fotograma 677, 1966.
43
--------- Correspondência encaminhada ao Chefe da I.R.- 6, pelo Encarregado do Posto
Indígena Santana, datado de 18 de Outubro, Filme 217, fotograma 668, 1966 -a.
--------- Correspondência dirigida ao Chefe da I.R. - 6, datada de 17 de Julho, Filme 217,
fotogramas 704 e 705, 1966 -b.
--------- Correspondência dirigida ao Chefe da I.R.- 6, Hélio Bucker, datada de 17 de Julho,
Filme 217, fotogramas 649 e 650, 1966 - c.
--------- Aviso do Posto Indígena Santana, datado de 31 de Julho, Filme 217, fotograma 683,
1966 - d.
--------- Correspondência enviada ao Chefe da Inspetoria Regional (I.R. - 6), datada de 19 de
Janeiro, Filme 217, fotograma 724, 1967.
--------- Ofício nº. 15, dirigido ao Chefe da Inspetoria Regional (I.R. - 6), Alberico Soares
Pereira, datado de 24 de Abril, Filme 217, fotograma 270, 1969.
NEVES, João de Souza - Relatório dirigido ao Chefe da I.R.- 6, Antonio M. Estigarribia,
datado de 12 de Dezembro, Filme 213, fotogramas 229 a 240, 1922.
--------- Relatório encaminhado ao Chefe da Inspetoria Regional (I.R. - 6), Antonio M.
Estigarribia, datado de 3 de Abril, Filme 213, fotogramas 253 a 256, 1923.
--------- Relatório dirigido à Ramiro Noronha, datado de 10 de Maio, Filme 213, fotogramas
136 a 144, 1923 - a.
--------- Relatório dirigido ao Inspetor Regional, Antonio M. Estigarribia, datado de 12 de
Maio, Filme 213, fotogramas 243 a 257, 1923 -b.
--------- Relatório dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I., Antonio M. Estigarribia, datado de
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VANNI DE OLIVEIRA, Pedro - Ofício nº.4, dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I., Jo_é
Batista Ferreira Filho, datado de 1º. de Abril, Filme 215, fotogramas 1084 e 1085,
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VITÓRIO, Álvaro Feitoza - Ofício nº. 15, dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I., datado de
8 de Julho, Filme 213, fotogramas 1737 a 1741, 1942.
--------- Ofício nº. 10, dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I., datado de 9 de Junho, Filme
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--------- Ofício nº. 16, dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I., datado de 29 de Julho, Filme
213, fotogramas 1712 a 1719, 1942 - b.
44
--------- Relatório encaminhado ao Coronel Vicente de Paula F. Vasconcelos, Diretor do
Serviço de Proteção aos Índios, Filme 213, fotograma 1737, 1942 - c.
--------- Ofício nº. 24, dirigido ao Inspetor Regional do S.P.I., datado de 29 de Setembro,
Filme 213, fotograma 1637, 1942-d.
b) Arquivo do Núcleo de Informação e Documentação Histórica
Regional da Universidade Federal de Mato Grosso.
PENNA, Herculano Ferreira - Relatório apresentado à Assembléia
Legislativa Provincial
de Mato Grosso pelo Exmº. Conselheiro Herculano Ferreira Penna em 3 de maio de
1862. Relatórios de Presidentes de Província de Mato Grosso ( 1835 - 1864),
Microfilme 01, documentos 001 a 034, 1862.
5. Jornais
O EXPECTADOR - Província de Mato Grosso, Ano 2, nº. 73, Cuiabá, 5 de Março de 1885,
folha 1, coluna 4 - Título : Sociedade de Geographia do Rio de Janeiro, Sessão de 3
de Dezembro de 1884 (Rolo 2, Jornais Diversos - 1877 a 1855 / Núcleo de
Documentação e Informação Histórica Regional da Universidade Federal de Mato
Grosso), 1885.
GAZETA OFFICIAL - Resolução Legislativa nº. 761, do Governador do Estado de Mato
grosso Francisco de Aquino Correa, datada de 26 de Junho de 1918, publicada em
27 de Junho de 1918, página 2, Cuiabá, 1818.
--------- Edital "Medição de Terras", por Ramiro Noronha, datado de 1º. de Maio de 1920,
publicado nessa data, p. 7 ( o manuscrito foi localizado no Setor de Documentação
Etnológica do Museu do Índio / FUNAI, Rio de Janeiro, Filme 216, fotograma
00170).
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os kurâ-bakairi: breve histórico das relações interétnicas