passo a passo – era mal-assombrado. Havia quem fizesse o sinal da cruz antes de entrar no capão. Piero se benzeu e guiou “Falúa” para entrar na grota. Estava escuro lá dentro. Olhou para um lado, olhou para o outro. Não viu nada. Pensou: bobagem. Fantasma coisa nenhuma. Chegou à casa do ferreiro, deu o recado e voltou, deixando o animal. Veio matando passarinhos e espantando lagarto, com as pelotadas do seu bodoque. Quando chegou no trecho mal-assombrado, lembrou-se que o ferreiro ainda não o alcançara no caminho. *** Vitório terminou o serviço que estava fazendo, foi ao córrego e se lavou. Trocou sua roupa suja por outra limpa; meteu a ferramenta e o avental de couro dentro do alforje e pôs-se a cavalo resmungando uma blasfêmia. Nada o supliciava mais do que essa estranha postura do corpo. Viajava o tempo todo seguro ao cabeçote do arreio. Sentia esquisita sensação de pavor toda vez que o animal tomava as rédeas e se largava de trote, porque não sabia como detê-lo. Por isso, ao chegar à entrada do capão malassombrado, fez o sinal da cruz e sentiu grande alívio ao ver que “Falúa” mudava do trote para o passo. – Porca-miséria! – falou Vitório, dirigindo-se ao cabeçote do arreio. – Até que enfim posso largar-te. *** Quando a besta chegou à fazenda a todo galope, largando coices no ar, bufando, sem ninguém na sela, Lessandro passou as mãos na cabeça. – Que terá acontecido, meu Deus? “Falúa” é o animal mais manso da fazenda... Pediu a um camarada que a pegasse e fosse nela de volta, para ver o que houvera. O camarada correu, cercou de cá, cercou de lá, mas a besta não o deixava chegar perto. Pinoteava e dava coice que fazia medo. O jeito foi deixá-la de mão e ir ao pasto pegar outro animal. Já estavam pondo arreios noutro burro, quando Vitório apontou na curva da estrada. Capengando, trazia o alforje enfiado na cabeça, pendendo-lhe uma bolsa nas costas, outra sobre o peito. No rosto pálido sobressaía mancha azulada na face esquerda. Ao vê-lo de perto e sentindo-lhe o olhar de censura, como se a ele, Lessandro, coubesse a culpa de seu infortúnio, meu marido pôs-se a rir, o que levou Vitório a despejar uma torrente de impropérios. Lessandro tirou-lhe o alforje e levou-o para dentro de casa. – Sente-se e descanse. Vitório sentou. Eu chegava da cozinha logo em seguida, com café quentinho. Lessandro despejou no café um pouco de cachaça e o ferreiro bebeu. – Agora, conte-nos o que houve. Vitório olhou em volta, desconfiado. Havia muita gente ali. Com exceção de Piero, que ainda não chegara, a família estava toda em volta, além dos criados. Num lugar 78