26/01/2015
“O Impacto da Crise Grega e o Contágio no Brasil: O Plano de Mudança.”
O principal “driver” da semana, que deve continuar movimentando os mercados ao longo dos próximos
dias, será sem dúvida nenhuma, os reflexos da vitória do Partido de esquerda “radical” Syriza na
eleição presidencial na Grécia. Lembranças do período pré-Lula de 2002, quando o “medo” de calote da
dívida interna e alterações profundas nas regras de propriedade como exemplo, fomentaram a
valorização rápida do dólar ante o real, que chegou a romper em um dia, a barreira de R$ 4,0/US$ no
spot !!??.
O caso de uma eventual saída da Grécia do euro poderia até servir como comparação à crise cambial
brasileira de 2002 apenas na ótica do “medo” mas com proporções potenciais mais robustas, pois a
interrupção do programa de austeridade fiscal, a suspensão compulsória e unilateral de pagamentos da
dívida e a renegociação forçada com os credores, teriam efeitos imediatos para acionar a corrida de
aversão ao risco, realimentando a aceleração do dólar, do ouro e o recuo dos preços das commodities e
das bolsas internacionais. Um cenário ruim para a Zona do Euro, sobretudo os principais credores da
dívida grega, o sistema bancário alemão, mas sobretudo para as economias emergentes como
Brasil, que sofreriam desvalorizações adicionais de suas moedas.
Em princípio, o líder do Syriza, Alex Tsipras, sinaliza que “não partirá para o confronto, mas sim
para uma mudança”, propondo um novo plano de ajuste fiscal e de sustentabilidade da dívida pública
grega. Entretanto, o que será “essa mudança, o novo plano”? Deve-se ressaltar que o líder da
Syriza afirma que ocorrerá um choque , mas, apenas “não catastrófico” (!!). Como será a reação dos
credores e dos ativos no mercado financeiro internacional?
As incertezas ainda são predominantes, pois o fato concreto é a rejeição à negociação com a Troika.
26/01/2015
(i)
Consideramos no mínimo “estranho”, o acordo de coalização com partidos independentes
contrários à Troika, pois não incluiu o apoio de um partido do centro;
(ii)
Avaliamos que o novo governo tentará negociar o cancelamento da metade da
dívida grega de 240 bilhões de euros (quase US$ 280 bilhões), alongar o vencimento
dos papéis e reduzir o custo dessa dívida, o que permitiria maior folga fiscal no
caixa de curto prazo. O Governo sinaliza que não deseja negociar com a Troika , mas
diretamente com os governos da Zona do Euro;
(iii)
Fluxo de financiamento grego: Para 2015, as necessidades de financiamento da Grécia
rondam o patamar de 28 bilhões de euros e de 30 bilhões até março de 2016. Cerca de
18 bilhões seriam cobertos de fundos pelo FMI e parceiros europeus, e assim, o
financiamento via mercado rondaria a faixa de 12 bilhões de euros. O estoque da
dívida com a Alemanha seria da ordem de 60 bilhões de euros e com a França, mais 40
bilhões de euros.
(iv)
Deve-se ressaltar que o governo de coalização na Grécia garante a maioria parlamentar,
mas não a estabilidade financeira, pois tende a elevar a probabilidade de aprovação de
projetos que revertam o acordo fiscal com a Troika;
(v)
Efeito político na Zona do Euro: devemos ressaltar que no final deste ano serão realizadas
eleições na Espanha e o resultado da eleição grega deverá fortalecer as correntes
políticas espanholas contrárias à austeridade, da mesma forma que em Portugal e na
França.
Nos próximos dias, esperamos aumento da volatilidade, mas a ação firme e consistente do
Banco Central Europeu (BCE) na compra de ativos, anunciada recentemente, evitaria o pânico
e sobretudo um impacto significativo na economia do euro ao longo do tempo. Com esse conjunto de
incertezas, o mais prudente é fazer o hedge, portanto, maior demanda sobre o dólar, ouro, títulos
norte-americanos e mais desova na Bolsa ! De qualquer forma, o viés para o euro ante o dólar continua
sendo negativo.
No cenário de curtíssimo prazo ainda trabalhamos que a saída da Grécia da Zona do Euro
seria o movimento menos provável ( maior probabilidade de manutenção da Grécia no euro),
mas será crucial nos próximos dias, a “amenização” do discurso do partido Syriza, com manutenção do
cumprimento do pagamento do serviço da dívida e o cumprimento das metas fiscais (pode até mesmo
reduzir, cancelar parte da dívida), pois em caso contrário, o BCE pode interromper a liquidez à
economia grega. Uma das saídas do novo governo grego (Syriza) seria implementar reformas
estruturais para evitar cortes adicionais de pensões e salários.
O problema fiscal da economia grega é a sua capacidade de geração de receita - que é uma das
menores da Europa - e sobretudo o seu grau de competitividade. Hoje, a arrecadação tributária grega
seria inferior a 35% do PIB. O governo conseguiu fazer algumas reformas estruturais a partir de 2012,
sobretudo do ajuste de salários à produtividade, mas os efeitos ainda são limitados para reduzir preços
e custos, pois o grau de produtividade da economia grega, um dos piores da Zona do Euro, limita a
taxa de crescimento das exportações.
Nos próximos dias, avaliamos que será crucial no conteúdo do novo plano fiscal do governo
do partido Syriza: (i) manutenção do cumprimento das metas fiscais ( superávit de 4,5% do PIB); (ii)
De forma paralela, os parceiros , os governos europeus devem sancionar um alívio do estoque da dívida
e evitar o confronto do governo com o resto do financiamento via mercado.
26/01/2015
Foco na quarta-feira (dia 28/jan/2015): A sinalização da Ata do Fed, com inflação ainda
reduzida e a ação de afrouxamento monetário do BCE devem aumentar as apostas de que o aumento
da taxa de juros do fedfund seja adiado, o que deve amenizar de forma pontual a pressão
negativa da crise grega sobre o mercado acionário.
Impacto no Brasil: Com a ressalva que consideramos o evento com menor probabilidade, o impacto
“drástico” da saída da economia grega da Zona do Euro sobre a economia brasileira seria decomposto
em diversos fatores:
(i)
Expectativas sobre o Setor Real: tende a pressionar para novas revisões para baixo da taxa
de crescimento real do PIB (com maior probabilidade de taxa negativa em 2015) e da taxa de
investimentos e para elevar as previsões da taxa de desemprego média anual em 2015 ante
2014. Hoje, o nosso cenário mais provável seria uma contração do PIB brasileiro em
termos reais de -0,11% em 2015. Com o efeito contágio sobre os emergentes de uma
crise robusta grega , essa taxa negativa seria de -0,24%.
(ii)
Taxa de Juros, Taxa de Câmbio (Expectativas sobre os Ativos Financeiros) e Fiscal:
apostas da taxa de câmbio na vizinhança de R$ 3,0/US$ até o final deste ano seriam reforçadas,
elevando também os níveis futuros de juros e potencialmente, a necessidade de aperto
monetário via Selic, superior a 13%. No exterior, aumento da demanda sobre o ouro e redução
dos yields sobre os títulos norte-americanos e alemães. Política Fiscal do Ministro Levy seria
levada a ser reforçada: em caso contrário, maior a Selic;
(iii)
Transmissão sobre a Inflação: Com a aceleração de 15% da taxa de câmbio no cenário de
saída da Grécia do euro, nosso modelo econométrico estima que a previsão do IPCA passaria
para o intervalo de 7% a 7,5% a.a. em 2015;
(iv)
Balança Comercial e de Transações Correntes: o potencial novo ciclo de aceleração do dólar
ante o real beneficiaria o ajuste externo brasileiro, com melhoria do saldo comercial, sobretudo
pela redução das importações e com impacto reduzido no curtíssimo prazo para aumentar as
exportações, conforme as previsões econométricas.
(v)
Fluxo Cambial: Reflexos potenciais negativos sobre expectativas de ingresso de recursos
externos, alimentando a saída de recursos para diversificação no exterior, sobretudo na
economia norte americana, não somente em treasuries;
Apêndice: Reformas Estruturais em curso na Grécia
Promoção da Competividade/Concorrência: As autoridades gregas possuem o compromisso de
resolver quase todas 329 recomendações da OCDE em relação à liberalização dos quatro sectores
turismo, comércio, materiais de construção e transformação de produtos alimentares com os benefícios
de uma maior eficiência e preços mais baixos. Muitas já foram adotadas e outros estão sendo
conduzidas no biênio 2014-2015 (a eliminação de taxas de publicidade, a remoção de restrições
excessivas. a liberalização dos preços e dos canais de distribuição e liberalização do comércio de
domingo).
Liberação dos aluguéis: as autoridades reduziram as restrições excessivas em comercial e
arrendamentos turísticos. Eles reduziram a duração mínima do contrato de locação comercial
(obrigatório só para os proprietários) mais de 16 anos a 3 anos, o que deve ajudar a limpar o mercado.
Para facilitar arrendamentos turísticos de curto prazo e reduzir a informalidade, reduziu as restrições
sobre a duração dos arrendamentos, para alinhar o quadro com as melhores práticas da União
Europeia.
26/01/2015
Liberalização dos transportes. As autoridades estão a tomar medidas para reduzir os custos
operacionais excessivos no transporte marítimo e aéreo, que são segmentos importantes do setor de
turismo. Reformas no setor marítimo incluem suspensão dos acordos trabalhistas setoriais, reforçando
simultaneamente a nível das empresas acordos para permitir uma maior concorrência (como foi feito
para outros setores em 2012). As medidas devem ser adotadas para reduzir os custos (limitação de
obrigações do setor público somente para a estação não-turística) e aumento da concorrência no
mercado interno pelas companhias aéreas.
Setor de Energia: reformas que visam reduzir os custos, melhorar a concorrência e eficiência, e
proporcionando melhores incentivos para o investimento. A empresa de transmissão de energia elétrica
empresa já foi dividida para ser privatizada. O mercado do gás está a ser liberalizado. A Grécia é um
dos países com um dos menores consumos per capita da União Europeia, indicando possibilidades de
aumento do consumo para reduzir custos e fornecer energia mais limpa.
Salário mínimo: consiste em um salário base , mas com adicionais de 10% para 3 anos de experiência
e de até 30 por cento para funcionários com 9 ou mais anos de experiência. Isso efetivamente traz o
salário mínimo dos funcionários gregos com pelo menos 9 anos de experiência a um nível que é maior
do que a maioria das outras economias comparadas. A remoção completa das licenças de vencimento,
pelo menos, para o desempregados de longa duração reduziria distorções, mas como uma etapa
transitória para sua remoção, em 2017, as autoridades estão cortando o subsídio de maturidade para
longo prazo.
Privatização: Desempenho na privatização continua a ficar aquém das expectativas. As receitas da
privatização atingiram um pouco mais 1 bilhão de euros em 2014, abaixo da meta de 1,6 bilhão, mas
com a ressalva que essa meta já tinha sido revisada para baixo. Fatores sustentam os atrasos,
incluindo a ausência de controle da agência de privatização sobre alguns dos seus ativos, dificuldades
na venda de participações minoritárias; obstáculos para a preparação de imóveis à venda, processos
regulatórios longos; necessidade de estruturas regulatórias para indústrias de rede; e a necessidade de
apoio de diferentes ministérios, Os próximos avanços para a privatização dos aeroportos.
Regulação: as autoridades gregas estavam a tomar novas medidas para abrir profissões
regulamentadas, que incluem a abertura de acesso à profissão de mediação (que vai ajudar a reduzir o
alto ingresso de novos casos nos tribunais), eliminando as restantes restrições excessivas relativas aos
advogados, eliminando as atividades reservadas excessivas para os engenheiros, e da adoção de
legislação secundária em um número de profissões e atividades importantes . As próximas etapas
incluem uma avaliação das profissões que não foram liberalizadas.
Redução da burocracia. O compromisso de simplificar o regime altamente discricionário de
licenciamento de investimento. O governo grego já estaria adotando algumas recomendações de uma
equipe da OCDE para reduzir os procedimentos administrativos pesados em 13 setores (as
recomendações gerais procurar reduzir os encargos em cerca de 25 por cento), tal como a simplificação
dos requisitos de informação.
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