XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
26
O PAPEL DA DISCIPLINA DIDÁTICA EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL
E NO EXERCÍCIO DA DOCÊNCIA
Adriana Patrício Delgado
O artigo em questão faz uma análise crítica sobre a Didática em cursos de formação de
professores, sobretudo, nos cursos de Pedagogia. Inicialmente, é feito um resgate
histórico sintético da disciplina Didática, com destaque ao período dos anos 1960 até a
década de 2000, buscando compreender e situar a área de conhecimento da Didática,
bem como qual seja seu objeto de estudo. Na sequência o texto faz referência à
Resolução nº 01 de 2006, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do CNE, com
vistas a estabelecer relações e apontar as implicações das políticas públicas na dinâmica
e estrutura dos cursos de formação de professores com o enfoque da disciplina Didática.
Por fim, faz uma reflexão de base teórica sobre o papel e função da Didática nos cursos
de formação de professores, apresentando o caminho de transição de uma Didática
essencialmente prescritiva, pela sua própria história, para uma Didática esvaziada de
prescrição que segue um caminho de base reflexiva. Marin, Candau, Warde e Soares são
as autoras que trouxeram as contribuições mais relevantes na elaboração deste trabalho.
O presente artigo demonstra sua relevância na medida em que analisa a Didática pelo
cotejo de autores da área com a legislação. Conclui-se que a disciplina Didática, pelo
lugar que ocupa no currículo dos cursos de licenciatura, precisa buscar o equilíbrio entre
o prescrever e refletir, sendo o ensino posto como elemento fundante do fazer docente.
Portanto, cabe sim à Didática o papel da prescrição, oferecendo subsídios teóricos e
práticos aos futuros professores, em seu percurso de formação inicial, de modo que no
fazer docente seja cumprida sua função precípua, ensinar.
Palavras-chave: didática, políticas públicas, formação de professores, prática docente.
Introdução
O presente trabalho tem como eixo norteador discutir a formação inicial de
professores a partir da análise da Didática, focalizando sua natureza e o papel que a
disciplina ocupa no currículo desses cursos, sobretudo, de Pedagogia. Considerando a
relevância da disciplina Didática no processo de formação docente, faz-se necessário
compreender as abordagens da Didática nos cursos de Licenciatura focalizando o
preparo para o exercício da profissão, ou seja, preparo para o ato de ensinar na dinâmica
do espaço da sala de aula.
O texto organiza-se em três momentos. No primeiro apresentam-se alguns dados
históricos da Didática como área de conhecimento e disciplina presente nos cursos de
formação docente. Depois é exposta uma análise teórica do objeto de estudo da
Didática. No terceiro momento, o texto indica o movimento da disciplina entre a
prescrição e a reflexão. Nesse momento traz em pauta as políticas de formação de
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002538
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
27
professores descritas nas Diretrizes Curriculares Nacionais do CNE pela Resolução nº
01 de 2006 (BRASIL, 2006), buscando destacar a sua relevância na formação docente.
E, por fim, trabalha com as interfaces desses impactos com a Didática e no tocante ao
que se ensina nos cursos de formação de professores e suas contribuições para o
processo educativo.
Elementos do contexto histórico da Didática no Brasil
Historicamente, a Didática tem tido sua origem localizada no século XVII. O
livro Didáctica Magna (1997) é considerado o primeiro tratado de pedagogia e didática,
onde Comenius preocupa-se com o método de ensinar pela defesa do ensino de tudo a
todos.
A Didática então “nasce” organizada como um corpo de doutrina, de prescrição,
cujas raízes permanecem até hoje, no momento em que ainda é abordada, em cursos de
formação de professores, como um conjunto de normas, princípios e procedimentos
para informar e orientar a atuação dos professores em sua prática cotidiana escolar.
Indo mais à frente desse percurso histórico, nos últimos anos da década de 1950
e início da de 1960, o debate em torno da primeira Lei de Diretrizes e Bases - nº 4024,
de 1961 (BOYNARD, GARCIA e ROBERT, 1972), mobiliza parte dos profissionais da
área educacional. A Didática, nesse período, faz o discurso escolanovista buscando
superar o modelo da escola tradicional. Consiste, em uma Didática de base psicológica,
que enfatiza o “aprender a aprender” e o “aprender fazendo”.
O período de 1960 a 1968 caracteriza-se pela crise da tendência escolanovista e,
em paralelo, há a presença da tendência tecnicista, marcada pelo “saber fazer”. Nesse
momento, o ensino da Didática centra-se na dimensão técnica do processo ensinoaprendizagem, tendo como palavras de ordem a produtividade, a eficiência, a
racionalização, a operacionalização e o controle. “A visão ‘industrial’ penetra o campo
educacional e a Didática é concebida como estratégia para o alcance de ‘produtos’
previstos para o processo ensino-aprendizagem” (CANDAU, 2000, p. 19).
Evidencia-se que, tanto na tendência escolanovista, quanto na tecnicista os
meios são pensados desvinculados dos fins a que servem. A prática pedagógica é vista
apenas à luz dos aspectos internos, desvinculada do contexto social e político em que
ocorre. Nesse cenário, a Didática proposta desconsidera as situações e problemas reais
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002539
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
28
da escola e da prática pedagógica, promove a desarticulação entre teoria e prática e
impacta os professores com um discurso inócuo e descontextualizado.
A partir da década de 1970 começa a ser denunciada a falsa neutralidade do
aspecto técnico e na década de 1980 acentua-se para afirmar a dimensão política da
prática pedagógica. Entretanto, a dimensão política vem acompanhada da negação da
dimensão técnica, vista como vinculada à perspectiva tecnicista. Ou seja, a dimensão
política se contrapõe à dimensão técnica.
Nesse percurso das últimas décadas, identifica-se um dilema para a Didática: de
um lado a transmissão de informações técnicas, vista como conjunto de procedimentos
supostamente neutros e universais, do outro a crítica a essa perspectiva por meio da
assunção de compromissos políticos. Por conseguinte, como posto por Candau (2000),
criticar a visão instrumental da Didática não pode significar a sua negação, pois técnica
e política não são dimensões opostas, mas sim complementares.
Em outras palavras, a prática pedagógica, por ser política na sua essência, exige
a competência técnica e a técnica, por sua vez, requer a compreensão política do seu
fazer, para que não se reduza ao mero tecnicismo - “fazer por fazer”.
Assim, segundo Candau (2000), torna-se premente a necessidade de uma
Didática fundamental (termo utilizado pela autora), a qual cabe congregar, simultânea e
reciprocamente, as dimensões política, técnica e humana do fazer pedagógico. A
conjunção dessas três dimensões passa a representar um desafio à Didática, na condição
de disciplina presente no currículo dos cursos de formação docente.
Foi nessa direção que a referida autora propôs a revisão da Didática pela
superação da Didática meramente instrumental e consequente construção da Didática
fundamental. Ou seja, o papel da Didática na formação docente, como reflexão
sistemática do fazer docente ou busca de alternativas para os problemas da prática
pedagógica está colocado em discussão.
Tendo como referência esse panorama, Soares (1985) propõe o movimento de
revisão da Didática por meio da reflexão sobre sua história, para então, redirecionar e
repensar seu papel nos cursos de formação docente. De acordo com a autora, tem sido
oferecidas, à área da Didática, prescrições ou denúncias, ou mesmo, propostas de
reformulação das prescrições com vistas a responder às denúncias. Mas o que cabe
afinal à Didática: prescrever, denunciar ou buscar novos conhecimentos?
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002540
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
29
A área da Didática e seu objeto de estudo
Ao se abordar a área da Didática na perspectiva de produção de conhecimento, é
preciso destacar que sua origem está diretamente associada ao mesmo tecnicismo que
marcou a formação docente.
Entender a área de conhecimento da Didática implica compreender como
ensinam os professores e os processos de escolaridade. E, entender como ensinam os
professores, por sua vez, envolve a análise das condições de trabalho (materiais, físicas,
salariais) e a organização da rotina profissional, a qual, como apontado por Salinas
Fernandéz (1995), denuncia a ausência da prática de reflexão coletiva, ordenada e
sistemática sobre o próprio trabalho.
Para Salinas Fernández (1995) a falta do exercício coletivo da reflexão e
discussão pode ser fruto do discurso didático de caráter cientificista e técnico decorrente
da Reforma dos anos 1970, na Europa, com a introdução da chamada pedagogia por
objetivos. Nessa pedagogia o trabalho pedagógico da escola se norteia centralmente por
objetivos e não por conteúdos.
A análise histórica desse autor coincide com a de Warde (1991), pois para ela
também foi nos anos 1970 que se originou o debate sobre o problema da definição do
campo da Didática, que se ampliou na década de 1980. Segundo essa autora, é possível
evidenciar que o fim dos anos 1970 e início dos 1980 representa, historicamente, o
período em que se inicia o interesse teórico em clarificar o estatuto epistemológico das
chamadas Ciências da Educação e, por conseguinte, da Didática. Nesse momento
buscou-se caracterizar a Didática como ciência, técnica, tecnologia, tecnologia
científica, dentre outras concepções.
Para Marin (2008) também foi na segunda metade da década de 1970 que as
análises sobre a Didática colocaram em foco seus fundamentos. A partir desse momento
foram analisadas as interferências de outras áreas de conhecimento, suas linguagens, as
relações estabelecidas da Didática com a formação de professores e com o currículo e
estudos sobre o que se usa e o que se ensina em Didática. De acordo com a autora o eixo
norteador dos trabalhos no final dos anos 1970 e durante toda a década de 1980 foi o
debate sobre o tecnicismo da área pedagógica, com incidência forte na relação da
Didática com o currículo e as consequências que a Didática obtinha a partir de outras
áreas.
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002541
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
30
Warde (1991), ao discutir o estatuto epistemológico da Didática, indica a
influência da Psicologia sobre a Didática como um fenômeno histórico estrutural. No
momento em que escreve destaca a separação da aprendizagem em relação ao ensino,
operada pela Psicologia, e a consequente afirmação de que a aprendizagem é objeto de
estudo da Psicologia e não da Didática.
Entretanto vários aspectos da Didática permanecem nessas dependências
conforme Marin também, retomando estudos que divulgou em décadas anteriores,
aponta essa relação com outras áreas do saber, como a Psicologia ou a Filosofia, o que
reitera a indefinição do campo didático.
O desenvolvimento dos estudos psicológicos ocasionou o surgimento
de análises sistemáticas sobre a criança, o aluno, influenciando
fortemente o campo didático que absorveu tais dados. (...) é preciso
que se compreenda a influência e a importância que as ciências, em
geral, tiveram sobre a Didática, pelo fato de terem, constantemente,
alterado ou aprofundado o temário componente dessa área de estudos.
(2005, p. 19)
Nos anos de 1980 a área da Didática buscou a emancipação das influências da
psicologia de caráter reducionista pela dos processos de ensino, o que configurou um
movimento de superação do paradigma da Didática voltada para a Psicologia e
aprendizagem, presente por tanto tempo.
É possível afirmar, então, que a década de 1980 torna-se significativa, como
marco histórico importante para a área da Didática, pois aparecem as primeiras críticas
ao paradigma tecnocrático (até então dominante), se apresentam outros enfoques na
relação das teorias de aprendizagem e aparecem novas formas de entender a esfera
investigativa da Didática.
Compreender a Didática pelo prisma histórico, segundo Soares (apud WARDE,
1991) se faz necessário, uma vez que, a história da Didática se construiu diferentemente
da história das outras ciências. Tal afirmação se justifica pelo fato da Didática não ter
conquistado autonomia no que tange à delimitação de uma metodologia e objeto de
estudo específicos e, tampouco, ter traçado um caminho dialético pelo qual a teoria se
constrói a partir da pesquisa e reflexão sobre a prática e a ela, por sua vez, retorna com o
intuito de esclarecê-la e aperfeiçoá-la.
Todavia, como aponta Salinas Fernandéz (1995), a Didática é muito mais do que
um mero conjunto de prescrições, visto que compreende um conjunto de saberes em
contínua reconstrução, debate e sistematização de seu objeto de estudo e método.
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002542
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
31
Desse modo a esfera de busca de conhecimento da Didática está diretamente
relacionada ao sistema educativo, à cultura e à sociedade de cada período histórico
(SALINAS FERNANDÉZ, 1995). Segundo o autor, entender essa esfera da Didática
implica compreender como ensinam os professores e como ocorrem os processos de
escolaridade. E, entender como ensinam os professores, por sua vez, envolve a análise
das condições de trabalho (materiais, físicas, salariais) e a organização da rotina
profissional, a qual, como apontado por ele, denuncia a ausência da prática de reflexão
coletiva, ordenada e sistemática sobre o próprio trabalho.
Em seu estudo Warde também indica o interesse recente apontado por “pesquisas
sobre a prática docente ou as práticas escolares, em detrimento dos debates teóricos e
conceituais” (1991, p. 55). A autora nos alerta sobre a valorização dada ao saber
advindo das práticas cotidianas do professor, mas, em contrapartida, aponta o descrédito
pelas teorias científicas e estudos mais conceituais.
Dessa forma o movimento de revisão da didática ainda precisa considerar com
força, em seus estudos, qual é o objeto de estudo da didática para que se possa encontrar
o lugar ressignificado da Didática nos cursos de formação docente.
É possível dizer que o discurso didático “nasceu” como um discurso sobre os
meios para alcançar fins previamente estabelecidos. Em seu percurso histórico, a
Didática foi sendo compreendida como um conjunto de métodos e técnicas de ensino
com vistas a orientar o professor a “como planejar, como ensinar e a como avaliar”.
Portanto, uma disciplina de caráter teórico prescritivo, com o fim da instrumentalização
docente.
Dessa forma, a reconstrução do discurso didático pressupõe o desvelamento dos
verdadeiros fins e processos, explícitos e ocultos, que têm lugar nas escolas com o fim
da instrumentalização docente.
Para Soares (apud WARDE, 1991) o conteúdo a ser ensinado consiste em objeto
de estudo das Práticas de Ensino, as quais podem e devem ter caráter prescritivo, e não
da Didática. Cabe à prática de ensino “(...) identificar a melhor maneira de ensinar e
aprender um determinado conteúdo, de acordo com sua natureza, sua estrutura e os
processos cognitivos nele predominantes” (p. 50). Já à Didática caberia estudar a aula,
analisando-a e descrevendo-a, considerando suas peculiaridades e a diversidade de
contextos e conteúdos que nela se desenvolvem. Pode-se afirmar que a Didática objetiva
fornecer subsídios ao professor que possibilitem a compreensão da ação pedagógica no
contexto escolar, não se limitando ao processo ensino-aprendizagem.
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002543
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
32
É esperado que a Didática aborde temas voltados ao trabalho pedagógico da sala
de aula, com foco em vários aspectos. Segundo Marin (2005) nem sempre se constata a
relação de aspectos teóricos com a prática, seja no âmbito da docência ou da pesquisa.
Nesse sentido, uma das dificuldades da Didática consiste nos variados elementos
que têm composto o campo didático, tais como: aula, programas de ensino,
planejamento didático, materiais didáticos, dentre outros. Em meio a toda essa
variedade de temas é possível identificar elementos comuns, como o caso do termo
“ensino”, que deve ser compreendido como parte da educação escolarizada, categoria
mais restrita, mas fundamental do processo educativo sistemático. (MARIN, 2005)
Vale lembrar que o ensino consiste em uma atividade intencional expressa por
objetivos e que, por sua vez, não ocorre exclusivamente no espaço sala de aula. Por isso,
o ato de ensinar intencionalmente pressupõe formação especializada para quem o
executa.
Marin (2005) aponta pontos de insatisfação atuais em relação ao estado da área
de Didática. São eles: escasso número de trabalho de pesquisa nessa área, fragmentação
dos estudos, temário de estudos variados e a indefinição da própria área da Didática de
modo disseminado.
Diante dessas considerações, cabe à área buscar novos conhecimentos
denunciando, se necessário, de modo a auxiliar a formação dos professores e cuidar,
sim, de propostas de modo analítico.
A prescrição e reflexão da Didática nos cursos de formação docente
Discutir formação inicial de professores nos remete inevitavelmente a aspectos
legais. Portanto, é de extrema relevância compreender e ter a clareza de como as
políticas públicas incidem diretamente na organização curricular dos cursos de
formação de professores, bem como no perfil de egresso esperado.
Neste caso, como proposto para os trabalhos deste painel, a política pública
educacional em referência é a Resolução nº 01 de 2006, instituidora das Diretrizes
Curriculares Nacionais – DCN’s - para o curso de Licenciatura em Pedagogia. De
acordo com o Artigo 2º as DCN’s se aplicam à formação inicial para o exercício da
docência na Educação Infantil, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, no Ensino
Médio (modalidade Normal) e em cursos de Educação Profissional na área de serviços e
apoio escolar, ou em outras áreas em que estejam previstos conhecimentos pedagógicos.
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002544
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
33
De acordo com a Resolução, em seu Artigo 4º:
O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de
professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e
anos Iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na
modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e
apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos
conhecimentos pedagógicos. (BRASIL, 2006, p.2)
Dentre as funções indicadas na Resolução, relativas ao egresso do curso de
Pedagogia, destacam-se: o reconhecimento e respeito às manifestações e necessidades
dos educandos; o ensino de conteúdos das áreas de conhecimentos específicos de forma
interdisciplinar e adequada aos diferentes ritmos e necessidades dos alunos; e a relação
das linguagens dos meios de comunicação com a educação, nos processos didáticopedagógicos.
Para o foco da docência, diante desse conjunto, torna necessário entender
aspectos da disciplina Didática nos cursos de Pedagogia.
Conforme apontou Soares (1985), desde o início a Didática se constituiu como
uma “disciplina prescritiva”, fundamentada em modelos preestabelecidos e não na
pesquisa debruçando-se sobre o fenômeno que busca prescrever. Entretanto, essa
perspectiva encontra outros pontos de vista diversos. Sobre o papel da Didática nos
cursos de formação de professores Brandão (apud WARDE, 1991) identificou a
dicotomia presente entre a Didática que se ensina e a Didática que se usa. De forma
surpreendente foi constatado, sobre a Didática que se ensina sua pequena contribuição
nos cursos de formação de professores. No tocante à Didática, os professores
pesquisados, em sua maioria indicaram que aceitam a ideia de que o professor aprende
ensinando, ou seja, na prática, no fazer cotidiano da sala de aula. Nesse contexto, é
possível indicar uma perspectiva de inocuidade do professor de Didática, pois o
professor aprende na prática ou continuará sem aprender, gerando consequências sérias
em termos de resultados escolares, como estamos vendo neste país.
Pode-se afirmar que, com base no exposto até o momento, houve um
deslocamento do papel da Didática de uma vertente estritamente prescritiva, decorrente
do tecnicismo, para uma de caráter de lassidão ao extremo, com ausência de parâmetros
e fundamentações claras.
Isso significa perda de foco e direção, pois a Didática pode e deve ter seu papel
formativo, a questão é que não pode restringir-se somente à prescrição. Em outras
palavras, ela é necessária, mas não suficiente para formar o professor. Nessa vertente,
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002545
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
34
Salinas Fernandez (1995) defende que, nos tempos atuais, se refute a universalidade do
método e das proposições que conduzem a um ensino eficaz, para substituir por uma
perspectiva que considera a complexidade e a multidimensionalidade da prática. O
processo de posicionamento de teoria da Didática conduz a um caminho paradoxal,
onde de um lado tem-se um discurso que propõe o desenvolvimento profissional e
autônomo dos professores por meio da reflexão crítica e da investigação e, de outro, a
manifestação das forças sociais, econômicas e políticas que influenciam a escola como
meio de reprodução social.
Para o autor mencionado, os professores buscam, sim, em sua maioria, uma
teoria de como ensinar, representada na Didática e na capacidade desta em ajudar a
solucionar problemas que emergem de dentro da sala de aula e no interior das
organizações de ensino; problemas que afetam o trabalho docente.
As análises feitas até aqui tornam claro que cabe à Didática, sim, discutir
questões técnicas, mas sempre relacionando a aspectos políticos, econômicos e
culturais. Isso significa que a técnica ensinada na disciplina Didática precisa estar
vinculada à cultura em geral e, sobretudo, à cultura escolar em particular, de modo que
o ambiente escolar é o que deve constantemente contextualizar e alimentar as aulas de
Didática.
Nessa perspectiva, as técnicas e procedimentos podem e devem ser aprendidos,
mas sem a conotação, enraizada historicamente no campo didático, do tecnicismo
atrelado ao conceito de eficiência. Ou seja, o professor necessita fazer escolhas das
técnicas e procedimentos a serem utilizados em sua prática, sabendo definir o mais
adequado para aquela determinada faixa etária, nível de ensino, conteúdo a ser ensinado
e objetivo a ser atingido. É preciso que os professores compreendam os valores
implícitos dessas técnicas, decorrentes das propostas, pondo em prática, norteados por
um olhar investigativo, crítico e reflexivo e não como meros executores de uma técnica.
Considerações finais
Redimensionar a esfera teórica da Didática implica diretamente em
redimensionar a formação docente e, consequentemente, sua prática nas escolas.
Estudar a docência e suas implicações teóricas e práticas, tanto no âmbito da
formação inicial em cursos de Licenciatura, quanto no âmbito do exercício da prática
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002546
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
35
profissional, está intimamente relacionado à esfera teórica, ao objeto de estudo da
Didática.
A busca por respostas indica caminhos de novas pesquisas para melhor
compreender o papel que a Didática tem ocupado nos cursos de Pedagogia e, sobretudo,
o conhecimento das realidades escolares de todos os níveis.
Evidentemente compete aos profissionais da área a busca por um caminho que
equilibre a reflexão com as propostas de possibilidades, ou seja, uma Didática que não
desconsidere a proposta de normas, técnicas e procedimentos, mas que seja
acompanhada de uma análise reflexiva, crítica e contextualizada do fazer docente,
caracterizando-se como um fazer reflexivo.
Por fim, a busca por uma prática que possibilite ao futuro professor a aquisição
de habilidades que lhe dêem condições de fazer escolha técnicas, de recursos e
procedimentos adequados a cada situação pedagógica, nível de ensino e contexto
político-econômico.
Encerra-se este artigo retomando uma preocupação que ficou evidente a partir
das contribuições dos autores referenciados: da Didática, por tantas vezes criticada pela
ênfase na prescrição, percebe-se que hoje pouco prescreve, pouco apresenta métodos e
técnicas, pouco ensina o fazer denominado como didático e, dessa forma, tem pouco
preparado os professores àquilo que lhe é inerente: ensinar.
Retomando Marin (2008) é fundamental que haja coerência entre a Didática que
se ensina nos cursos de formação de professores, com a Didática que se usa na prática
docente cotidiana. Caminhos que sigam uma direção comum, qual seja: a formação
inicial de professores, considerando o prescrito nas políticas públicas e o fazer docente
no exercício efetivo da profissão. Uma Didática que se ensine e que se aplique.
Esse equilíbrio precisa ser encontrado e posto em prática nos cursos de formação
docente não porque está previsto que haja formação didático-pedagógica na Resolução
nº 01 que coloca em destaque a formação do professor da Educação Infantil e dos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental, mas porque uma das funções precípuas do fazer
docente é ensinar, indicado nos objetivos da própria Resolução, e de extrema relevância
no processo de formação de nossas crianças e jovens.
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002547
XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
36
Referências bibliográficas
BOYNARD, Aluízio Peixoto; GARCIA, Edília Coelho; ROBERT, Maria Iracilda. A
reforma do ensino. São Paulo: Livros Irradiantes S.A., 1972.
BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CNE/CP nº 1, de 15 de maio de 2006.
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia,
licenciatura.
Brasília,
2006.
Disponível
em:
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_06.pdf. Acesso em: 10/12/2011.
CANDAU, Vera Maria. A didática e a formação de educadores. Da exaltação à negação:
a busca da relevância. _________. In: A Didática em Questão. Vozes: Petrópolis, 2000.
COMENIUS. Didática Magna. Martins Fontes: São Paulo, 1997.
MARIN, Alda Junqueira. Didática e trabalho docente. Araraquara: Junqueira & Marin,
2005.
_________. Didática e Currículo: conceitos, pesquisa e necessidade de avanço. Anais
do IV Colóquio Luso-Brasileiro sobre Questões Curriculares; VII Colóquio sobre
Questões Curriculares. UFSC – Florianópolis – SC – Brasil, 2008.
SALINAS FERNANDÉZ, Bernardino. Limites del discurso didáctico atual. In: VV.
AA. Volver a pensar La educación – II Madrid: Morata, 1995, p. 43-60.
SOARES, Magda Becker. Didática, uma disciplina em busca de sua identidade. Revista
Ande, v.5, n. 9, p. 39-42, 1985.
WARDE, Mirian Jorge. O estatuto epistemológico da Didática. Idéias, n. 11, p. 48-55,
1991.
Junqueira&Marin Editores
Livro 2 - p.002548
Download

o papel da disciplina didática em cursos de formação