Efeitos dos gastos com a Equalização das Taxas de Juros do Crédito Rural na Economia Brasileira Eduardo Rodrigues de Castro1 Erly Cardoso Teixeira2* A Equalização das Taxas de Juros (ETJ) equivale ao pagamento do diferencial entre as taxas de juros cobradas no mercado financeiro e as taxas de juros pagas pelo produtor. Os recursos disponibilizados pela ETJ correspondem a, aproximadamente, 30,0% do volume total de crédito aplicado na agricultura. Essa pesquisa objetiva avaliar a ETJ, comparando os gastos da política com os benefícios gerados por ela, levando-se em conta os efeitos diretos e indiretos dos gastos do setor agrícola com recursos disponibilizados pela ETJ. Os resultados mostram que cada Real gasto com a equalização gera um crescimento no PIB equivalente a 1,75 vez o montante gasto com a ETJ, para a agricultura familiar, e 3,57 vezes o gasto com a ETJ para a agricultura comercial. Além disso, ocorre aumento da arrecadação de impostos de 16,9% do gasto com a ETJ, para a agricultura familiar, e 37,0% do gasto com a ETJ, para a agricultura comercial. Portanto, a ETJ possui justificativa econômica, uma vez que os benefícios gerados na forma de crescimento econômico mais que compensam os gastos com a política. Palavras chave: Equalização das taxas de juros, Crédito Rural, Matriz Insumo Produto. 1 – Introdução As políticas macroeconômicas adotadas nos últimos anos fizeram com que houvesse grande transferência de recursos do meio rural para o meio urbano, provocando descapitalização do setor, atraso tecnológico, desemprego, pobreza e concentração de renda e terra (TEIXEIRA E CARVALHO, 2004). De acordo com LOPES (1993), 40,0 a 50,0% da renda agrícola anual, no período de 1970/92, foi transferida para viabilizar o processo de industrialização. FRANCO e TEIXEIRA (1999) e PIRES et al. (1995) mostraram ainda que essa transferência penalizou mais os agricultores familiares. Na década de 90, a redução das taxas de juros para a agricultura, além de permitir o acesso ao crédito por parte do setor agrícola, constituiu-se num mecanismo de redistribuição de renda para o setor agrícola. Parte dos recursos disponibilizados, no entanto, são feitos através do sistema de Equalização das Taxas de Juros (ETJ), que implica em gastos do governo no pagamento do diferencial entre as taxas de juros de mercado e as taxas de juros praticadas junto aos produtores. A Equalização das Taxas de Juros é uma subvenção importante para a agropecuária, visto que explica, em parte, o crescimento da demanda de crédito nos últimos anos. Cerca de 30% do total dos recursos aplicados na agricultura mediante Crédito Rural é disponibilizado através da ETJ (CASTRO, 2004). O subsídio ao crédito rural foi muito criticado na década de 70, porque provocava concentração de renda e terra na agricultura. Essa situação fez jus a uma das principais críticas às intervenções governamentais no mercado, qual seja, o subsídio 1 Doutorando em Economia Aplicada, Departamento de Economia Rural –Universidade Federal de Viçosa. 2 Ph.D, Professor Titular do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa 1 beneficia apenas grupos específicos, enquanto a sociedade incorre no ônus da política. Outra crítica aos subsídios é que eles geram ineficiência alocativa e distributiva, propiciando o aparecimento de elevados custos sociais. A teoria e os trabalhos empíricos que evidenciam essa conclusão tratam apenas dos efeitos diretos dos subsídios, ignorando os efeitos indiretos, isto é, as ligações entre os setores produtivos ao longo das cadeias. Assim, é possível que a soma dos benefícios diretos e indiretos seja superior ao custo do subsídio, constituindo uma justificativa econômica para estes e, talvez, mais relevante que seu aspecto social de manter empregos, facilitar ajustamentos e garantir a permanência da população no meio rural. Apesar do evidente desgaste da tese do intervencionismo estatal e de todas as experiências de sucessos e fracassos dessas intervenções ocorridas na agricultura nos últimos anos, praticamente todos os países capitalistas importantes continuam a manter programas agrícolas que exigem grandes transferências de recursos para a agricultura (COELHO, 2001). De acordo com TAYLOR (1994), incentivos à agricultura, quando combinados com elevação da renda rural, podem levar a economia a um processo de desenvolvimento, uma vez que traria impacto positivo também no setor não-agrícola. No entanto, dada a polêmica relativa ao fato de as subvenções gerarem ineficiências alocativas e distributivas e a aplicação da equalização promover a redistribuição de renda intersetorial e a competitividade da agropecuária, torna-se relevante determinar a relação entre os custos da equalização e seus efeitos no crescimento da economia. O objetivo geral desta pesquisa é determinar o impacto dos gastos governamentais com a ETJ no crescimento da economia brasileira, levando-se em conta os efeitos diretos e indiretos. Este trabalho está organizado da seguinte forma: a próxima seção apresenta o modelo analítico e fonte de dados, seguindo-se a discussão dos resultados e por fim, as conclusões. 2. Metodologia Para atingir os objetivos especificados nesta pesquisa é utilizada a Matriz Insumo Produto (MIP). São calculados os multiplicadores da renda e os índices de ligação para frente e para trás. As análises de insumo-produto são feitas, normalmente, a partir de choques de demanda em determinado setor, avaliando-se os efeitos sobre os outros setores. No entanto, ao se analisarem os impactos da equalização das taxas de juros do crédito rural na economia, considera-se que, como a equalização está disponibilizando crédito para a agricultura, este setor irá demandar produtos de outros setores. Portanto, com base nas planilhas de custo e nos valores do crédito aplicados na agricultura, os valores disponibilizados de crédito são distribuídos entre os setores da MIP, dos quais a agricultura é demandante. Dessa forma, os choques de demanda dos setores que fornecem insumos para a agricultura provocam efeitos na economia, os quais são medidos pelos multiplicadores da renda, determinando o impacto no valor adicionado. Dessa forma, é possível quantificar o acréscimo provocado no Produto Interno Bruto (PIB) e compará-lo com os gastos do governo na política de equalização das taxas de juros do crédito rural. 2 A matriz de coeficientes técnicos (A) representa os efeitos diretos que são derivados da matriz de fluxos intersetoriais. Pressupõe-se que haja relação linear entre as aquisições de um setor e o valor bruto de sua produção. A relação é descrita por3: xij aij = Xj , (1) em que o coeficiente aij é a proporção do produto oriundo do setor i e utilizado pelo setor j, dividido pelo valor bruto da produção do setor j. O valor adicionado é composto por salários, remuneração do capital e impostos. O efeito direto da renda (mj) representa a distribuição da renda entre os seus componentes: mj = Vj Xj , (2) em que Vj representa salários, capital e impostos. Para o cálculo dos efeitos diretos e indiretos da renda, é necessária a obtenção da matriz de efeitos globais, que capta as interações diretas e indiretas de dado setor produtivo em relação aos demais setores da economia. Essa matriz é obtida pela inversão da diferença entre a matriz identidade (I) e a de coeficientes técnicos (A), ou seja, [I-A]-1. No cálculo dos efeitos diretos e indiretos da renda multiplica-se a matriz –1 [I-A] pelo vetor-linha de efeitos diretos da renda, transposta. [ ] × [I − A] rj = m j T −1 , (3) em que rj representa os efeitos diretos e indiretos da renda. Os choques em cada setor são multiplicados pelos multiplicadores da renda, obtendo-se assim os efeitos diretos e indiretos no Produto Interno Bruto. O procedimento adotado é apresentado na Tabela 1. 3 Baseado em HADDAD (1989). 3 Tabela 1 – Cálculo dos efeitos diretos e indiretos da equalização das taxas de juros na economia. Setor 1 Setor 2 Setor j Total ∑D Demanda D1 D2 … Dj Impostos rI1 × D1 rI2 × D2 ... rIj × Dj ∑r × Dj Salários rS1 × D1 rS2 × D2 … rSj × Dj ∑r × Dj Capital rC1 × D1 rC2 × D2 … rCj × Dj ∑r × Dj ∑r ∑r × D2 ... ∑r ∑r × Dj × D2 ) / D2 ... Efeito i1 × D1 i2 ij Ijj Sj Cj × Dj ij j Total % sobre a (∑ r i1 × D1 ) / D1 (∑ r i2 (∑ r × D ) / D ij j j (∑ r × D ) / D ij j j demanda A MIP utilizada foi obtida a partir das tabelas de insumo-produto do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para o ano de 1995. Foram desagregados os setores Fertilizantes e Defensivos do setor Indústria Química, e Calcário, de Produtos Minerais não-Metálicos. A desagregação do setor Fertilizantes foi baseada nos coeficientes obtidos de BRAGA (1999), enquanto os outros foram baseados na proporção do valor da produção do setor em relação ao valor total do setor original. O setor Agropecuário foi desagregado em agricultura familiar e agricultura comercial. O valor da produção da agricultura familiar, utilizado na desagregação, foi obtido no Censo Agropecuário de 1995, considerando-se o valor da produção para o estrato de produtores com propriedades até 100 ha, que é um valor aproximado dos quatro módulos fiscais, limite superior para a classificação de uma propriedade como familiar. Baseou-se ainda em GUANZIROLI (1994), que considerou as propriedades de 20 a 100 ha como representativas da agricultura familiar. O valor da produção da agricultura comercial foi obtido das propriedades com área superior a 100 ha. Apesar de esse método manter os mesmos coeficientes técnicos, ou seja, mantém a mesma função 4 de produção, o objetivo desse procedimento foi tentar reduzir o viés que ocorreria, ao se fazer uma análise de gastos da agricultura familiar, considerando-se a “Agropecuária” como um todo. Após essa desagregação, foi feito um ajuste nos setores Remunerações (Salários), baseado na quantidade de pessoal ocupado na agricultura para o estrato até 100 ha. De acordo com o Censo Agropecuário de 1995, esse estrato abrange 80,0% da mão-de-obra. Tomando-se por base esse dado, 80,0% do valor da remuneração da “Agropecuária” foi alocado para a agricultura familiar e o restante, para a agricultura comercial. O fechamento da MIP foi feito no setor Excedente Operacional Bruto (Capital). Os gastos com equalização do PRONAF são destinados apenas à agricultura familiar, enquanto os gastos com custeio e investimento agropecuário são destinados a produtores e cooperativas, embora não se especifique a classe de produtores beneficiados, se familiar ou comercial. Apesar de ser destinado à agricultura familiar, o PRONAF não atende a todos os agricultores familiares, razão por que os recursos destinados a produtores e cooperativas em geral também atendem aos agricultores familiares que não são beneficiados pelo PRONAF. Assim, não é possível separar, com precisão, os gastos de equalização destinados apenas aos agricultores familiares e os destinados apenas aos agricultores comerciais. No entanto, nesta pesquisa, considerouse que os gastos com o PRONAF são destinados aos agricultores familiares e os gastos destinados a produtores e cooperativas, como sendo destinados aos agricultores comerciais. Os cálculos para equalização das taxas de juros são baseados nas portarias do Ministério da Fazenda, que determinam as fórmulas de cálculo, de acordo com a fonte de recursos. Os gastos com a equalização utilizados nesta pesquisa foram obtidos a partir do trabalho de BITTENCOURT (2003), para a safra 2002/03. Baseado nesses dados, foram encontrados os valores disponibilizados pela ETJ, através dos quais, o setor agrícola irá demandar insumos de outros setores. Para determinar a proporção dos gastos com cada insumo foram utilizadas as planilhas de custos das sete culturas que são especificadas nas tabelas de insumoproduto do IBGE. Essas culturas são: algodão, arroz, café, cana, milho, soja e trigo. Em média, no período de 1995 a 2000, essas culturas foram responsáveis por 66,0% do crédito de custeio aplicado na agricultura, que, por sua vez, recebeu 84,0% do crédito rural, sendo o restante para a pecuária (BANCO CENTRAL, 1995 - 2000). Os gastos do crédito com investimento incluem também “gastos com formação de culturas perenes”. A distribuição desse valor baseou-se nas planilhas de custo de café e cana-de-açúcar, considerando-se que são gastos com sementes/mudas, fertilizantes, defensivos e corretivos. Os gastos com investimentos foram obtidos do Anuário Estatístico do Crédito Rural, nos anos de 1995 a 2001, (BANCO CENTRAL, 1995-2000), apenas para os investimentos que poderiam ser claramente alocados em um setor da MIP. Por exemplo, os valores relativos à compra de tratores foram alocados no setor “fabricação e manutenção de máquinas e equipamentos”. Assim, não foram incluídos valores de investimento que não tinham um setor específico da matriz onde pudesse ser claramente enquadrado. Maiores detalhes relativos à obtenção dos dados podem ser encontrados em CASTRO (2004). 3. Resultados e discussão 5 Inicialmente, são apresentados os efeitos da aplicação dos recursos disponibilizados por meio da ETJ; em seguida, comparam-se os gastos da política com os efeitos sobre o Produto Interno Bruto (PIB), e arrecadação de impostos. Por fim, são apresentadas as considerações finais e conclusões. Para comparar os efeitos na economia com os gastos com a política é necessário avaliar o impacto dos recursos aplicados por meio do crédito rural, considerando-se apenas o efeito interno, ou seja, o quanto desse efeito ocorre sobre a economia do país, ou seja, não estão sendo levados em consideração os gastos com importação em cada setor. Na Tabela 2 encontram-se os valores demandados de cada setor, na agricultura familiar, e os efeitos originados nestes, para os componentes do valor adicionado. Na primeira linha encontram-se as despesas com cada setor, ou seja, o quanto a AF demandou desses setores, em milhões de Reais. Mediante coeficientes dos efeitos diretos e indiretos, calcularam-se os efeitos sobre os componentes do valor adicionado. Somando-se esses efeitos na coluna, tem-se o efeito total em cada setor e, na última linha, o quanto representa esse valor em relação à demanda, em valores percentuais. A AF demandou R$ 677,88 milhões do setor FERT, os quais causaram impacto de R$ 38,36 milhões em impostos; R$ 130,69 milhões em salários e R$ 138,40 milhões em capital, dando um total de R$ 307,95 milhões, o que representa 45,4% do valor aplicado nesse setor. Tomando-se o total, na última coluna, observa-se que o efeito total de R$ 1.651,19 milhão representa 51,6% do valor aplicado, ou seja, para cada real aplicado por meio do crédito na AF, R$ 0,51 é distribuído entre os componentes do valor adicionado. Dos R$ 1651,19 milhão, R$ 82,36 milhões (5,0%) vão para impostos; R$ 296,86 milhões (18,0%), para salários; e R$ 472,51 milhões (28,6%), para remuneração do capital. Tabela 2 - Efeitos diretos e indiretos sobre o valor adicionado, na agricultura familiar, considerando-se valor disponibilizado total - custeio e investimento (em milhões de reais) para o ano agrícola 2002/03. AF CALC MAQ VEIC FERT DEF CON Total Demanda 308,26 99,10 42,74 2,77 677,88 520,44 - 1.651,19 Impostos 10,43 5,93 2,66 0,13 38,86 24,35 - 82,36 Salários 77,18 11,18 10,20 0,16 130,69 67,44 - 296,86 Capital 218,22 25,41 17,07 0,42 138,40 72,99 - 472,51 Efeito total 305,83 42,53 29,93 0,72 307,95 164,77 - 851,73 % sobre a demanda 99,20 42,90 70,00 25,90 45,40 31,70 - 51,60 Fonte: Resultados da pesquisa. Na agricultura comercial, os valores são semelhantes aos da agricultura familiar, e os resultados encontram-se na Tabela 3. Da mesma forma, os valores 6 aplicados foram distribuídos entre os setores, e os efeitos foram calculados com base nos coeficientes de efeitos diretos e indiretos, o que faz com que o efeito em cada setor seja o mesmo que para a AF, ou seja, no setor FERT, o efeito total corresponde a 45,4% do valor aplicado. A principal diferença ocorre em relação à magnitude da demanda, que, na AF, foi de R$ 1.651,19 milhão, enquanto na AC foi de R$ 4.723,12 milhões. O efeito total corresponde a R$ 2.672,35 e representa 56,6% do valor aplicado, muito próximo ao valor da AF, que foi de 51,6. A distribuição total encontra-se na última coluna. Em termos percentuais, a demanda da AC causa efeito na economia, distribuído da seguinte forma: 5,9% para impostos, 16,8% para salários e 33,9% para remuneração do capital. As diferenças observadas, em relação à agricultura familiar, são decorrentes da distribuição dos recursos disponibilizados entre os setores. Tabela 3 - Efeitos diretos e indiretos sobre o valor adicionado, para agricultura comercial, considerando-se o valor disponibilizado total - custeio e investimento (em milhões de reais) para o ano agrícola 2002/03. AF CALC MAQ VEIC FERT DEF Total Demanda 625,43 280,23 914,11 Impostos 23,75 16,78 56,83 2,01 82,22 50,04 44,87 276,49 Salários 90,12 31,62 218,28 2,39 276,55 138,60 35,91 793,48 Capital 536,18 71,86 365,10 6,25 292,87 150,00 180,12 1.602,38 Efeito total 650,05 120,26 640,21 10,65 651,64 338,64 260,90 2.672,35 103,9 42,9 70,0 25,9 45,4 31,7 % sobre a demanda 41,18 1.434,43 1.069,59 CON 358,14 4.723,12 72,9 56,6 Fonte: Resultados da pesquisa. Na política de equalização das taxas de juros, os gastos do governo restringemse ao pagamento do diferencial entre as taxas de juros de mercado e as pagas pelo produtor, sendo que os recursos são captados no mercado financeiro. Ao fazer isso, é disponibilizado um volume de recursos maior que o valor gasto com as equalizações, e esses recursos disponibilizados é que serão efetivamente aplicados e causarão efeitos na economia. Dessa forma, ao se avaliar a eficiência da política de equalização, deve-se levar em conta os impactos que os valores disponibilizados causam na economia, os quais serão comparados com os custos de implantação. Na Tabela 4 encontra-se a distribuição dos recursos aplicados entre os componentes do valor adicionado para crédito total, custeio e investimento, na agricultura familiar. Considerando-se a demanda total, pela AF, de R$ 1.651,19, tem-se que 5,0% do valor aplicado retornam ao governo por meio da arrecadação de impostos; 18,0% vão para o pagamento de salários; e 28,6% remuneram o capital, atingindo o total de 51,6%. Isso significa que cada R$ 1,00 aplicado via crédito rural gera R$ 0,52 de aumento no Produto Interno Bruto (PIB). Esse resultado mostra que as despesas com recursos do crédito rural geram um aumento na renda do país, de modo que toda a sociedade se beneficia, e não apenas o setor agropecuário. 7 Tabela 4 - Efeitos dos gastos com a ETJ entre os componentes do valor adicionado à agricultura familiar para o ano agrícola 2002/03. Crédito total R$ milhões Custeio % R$ milhões Investimento % R$ milhões % Demanda 1.651,19 100,0 1.395,00 100,0 256,19 100,0 Impostos 82,36 5,0 71,53 5,1 10,83 4,2 Salários 296,86 18,0 237,66 17,0 59,20 23,1 Capital 472,51 28,6 328,66 23,6 143,84 56,2 Efeito total 851,73 51,6 637,85 45,7 213,87 83,5 Fonte: Resultados da pesquisa. Ao considerar a distribuição do valor aplicado pelo crédito rural separadamente, a distribuição no crédito de custeio e de investimento é semelhante, com exceção da remuneração do capital. No crédito de investimento, a remuneração do capital representa 56,2%, praticamente o dobro do valor para o crédito de custeio, que é de 23,6%. A explicação para essa diferença está na distribuição do crédito de investimento da agricultura familiar, em que 65,0% do total aplicado é destinado ao setor AF e 16,7%, ao setor MAQ, ou seja, 81,7% da demanda vai para esses dois setores, que têm elevada participação de capital no custo de produção, 47,0% e 30,0%, respectivamente (CASTRO, 2004). No caso da AF, esse peso ocorre devido ao fator terra, enquanto o setor MAQ, por tratar-se de um setor industrial, utiliza grande quantidade de bens de capital. Com relação ao efeito total, na Tabela 4 verifica-se que o crédito de custeio causa efeito menor no PIB (45,7%) que o crédito de investimento, de 83,5%. No crédito de investimento, 81,7% dos recursos são distribuídos entre os setores AF e MAQ, que apresentam um retorno, em relação ao valor aplicado, de 99,2% e 70,0% (Tabela 2). No crédito de custeio, a maior parte dos recursos (83,2%) vai para os setores DEF e FERT, que causam um efeito de 45,4% e 31,7%, respectivamente, em relação à demanda. Como o maior volume de recursos é aplicado no crédito de custeio (R$1.395,00 contra R$ 256,20 em investimento), o efeito do crédito total sobre o PIB, em relação ao valor aplicado, é um valor mais baixo (51,6%), próximo ao valor relativo ao crédito de custeio, de 45,7%. 8 Na Tabela 5 encontra-se a distribuição dos recursos disponibilizados no valor adicionado, na AC. A distribuição se dá de forma semelhante à distribuição na AF. No caso do crédito total, 5,9% do valor aplicado retornam ao governo na forma de impostos, 16,8% vão para o pagamento de salários e 33,9% remuneram o capital, totalizando 56,6%. Da mesma forma que na AF, ao separar os recursos aplicados em custeio e investimento, a remuneração do capital no crédito de investimento é maior do que no crédito de custeio, pelo fato de o primeiro ser distribuído em setores que apresentam maior efeito sobre o crescimento do PIB. No entanto, a diferença é menor em relação à agricultura familiar porque o crédito de investimento na AC é distribuído de forma mais uniforme entre os setores, não se concentrando tanto naqueles que têm maior participação do capital no custo de produção. A diferença entre o efeito total para o crédito de investimento e crédito de custeio é acentuada (70,2% para investimento contra 46,2% para custeio), mas menor do que na AF. Além disso, quando se consideram os recursos do crédito total, o efeito no PIB é um pouco maior, devido à maior participação do crédito de investimento. Na AC, a diferença entre o volume de recursos aplicados em custeio e investimento praticamente não existe, sendo R$ 2.679,00 milhões para custeio e R$ 2.044,12 para investimento. Tabela 5 - Efeitos dos gastos com a ETJ nos componentes do valor adicionado, na agricultura comercial para o ano agrícola 2002/03. Crédito total Custeio Investimento R$ milhões % R$ milhões % R$ milhões % Demanda 4.723,12 100,0 2.679,00 100,0 2.044,12 100,0 Impostos 276,49 5,9 138,50 5,2 137,99 6,8 Salários 793,48 16,8 427,48 16,0 366,00 17,9 Capital 1.602,38 33,9 671,83 25,1 930,55 45,5 Efeito total 2.672,35 56,6 1.237,82 46,2 1.434,54 70,2 Fonte: Resultados da pesquisa. Esses resultados mostram que investimentos na agricultura geram aumento no crescimento do PIB de, aproximadamente, 50,0% do valor aplicado, devido à interligação dos setores da economia. Para se avaliar a eficiência da política, os efeitos dos gastos realizados com recursos equalizados são comparados com os custos da política. De acordo com a Tabela 6, para o crédito total, no ano de 2002/03, foram gastos R$ 487,00 milhões com equalização das taxas de juros na AF (CASTRO, 2004). Os efeitos sobre o PIB foram da ordem de R$ 851,73 milhões, o que representa um efeito multiplicador sobre o PIB de 1,75 vez o gasto com a ETJ, ou seja, para cada real gasto em equalização, ocorre um aumento de R$ 1,75 no crescimento do PIB. Esse valor pode atingir valores maiores, como no caso do crédito de custeio, em que foram gastos R$ 291,59 milhões com equalização, um efeito de 2,19 vezes esse valor no PIB, o que corresponde a R$ 637,85 milhões. 9 Além do efeito sobre a economia, os gastos realizados pela agricultura, por meio dos recursos do crédito rural, geram benefícios indiretos para o governo, pelo aumento da arrecadação de impostos. No caso do crédito total, o aumento na arrecadação representa 16,9% do gasto com a política, que chega a 24,5% para o crédito de custeio e 5,5% para o crédito de investimento. Tabela 6 - Gastos com equalização das taxas de juros e efeitos dos recursos aplicados no Produto Interno Bruto (PIB), na agricultura familiar (em milhões de reais) para o ano agrícola 2002/03. Gasto com Multiplicador Retorno em equalização Efeito no PIB (2) 3/1 do PIB impostos (3) (1) % 2/1 Total 487,01 851,73 82,36 1,75 16,9 Custeio 291,59 637,85 71,53 2,19 24,5 Investimento 195,42 213,87 10,83 1,09 5,5 Fonte: Resultados da pesquisa. Na Tabela 7 encontram-se os resultados da AC. Para um gasto com a ETJ de R$ 748,08, o PIB aumentou R$ 2.672,35 milhões, enquanto a arrecadação de impostos, R$ 276,49 milhões. Esses valores representam um efeito multiplicador do PIB de 3,57 vezes o valor gasto com ETJ e 37,0% de aumento na arrecadação de impostos. Tabela 7 - Gastos com equalização das taxas de juros e efeitos dos recursos aplicados no Produto Interno Bruto (PIB), na agricultura comercial (em milhões de reais) para o ano agrícola 2002/03. Gasto com Multiplicador Retorno em equalização Efeito no PIB (2) 3/1 do PIB impostos (3) (1) % 2/1 Total 748,08 2.672,35 276,49 3,57 37,0 Custeio 187,05 1.237,82 138,50 6,62 74,0 Investimento 561,03 1.434,54 137,99 2,56 24,6 Fonte: Resultados da pesquisa. Os multiplicadores e o aumento da arrecadação de impostos para o crédito de investimento são menores que para o crédito de custeio, apesar de o efeito total, em relação ao valor aplicado para o investimento, ser maior que o do crédito de custeio, tanto na AF quanto na AC (CASTRO, 2004). A explicação para isso está no valor 10 percentual dos gastos com equalização em relação ao total disponibilizado, que pode ser observado na Tabela 8. No caso do crédito de custeio, na AF, esse valor é de 20,9%, disponibilizando um volume de recursos 4,78 vezes o valor gasto, enquanto no crédito de investimento os custos com a ETJ representam 67,3% do valor aplicado, disponibilizando um volume de recursos apenas 1,49 vez o valor gasto. Na AC, a diferença, na proporção disponibilizada, entre o crédito de custeio e de investimento é ainda maior. Em conseqüência disso, os recursos disponibilizados são praticamente iguais - R$2.679,00 milhões para custeio e R$2.665,00 milhões para investimento - mas o gasto com equalização no crédito de investimento é muito maior (R$186,97 milhões para custeio contra R$694,51 milhões para investimento). Tabela 8 - Proporção de recursos disponibilizados a partir dos gastos com equalização, na agricultura familiar e comercial (em milhões de reais) para o ano agrícola 2002/03. % do valor aplicado Disponibilizado Gastos com Total Spread + taxas Proporção ETJ (2) 2/1 bancárias2 1/2 1.395,00 291,60 20,9 11,1 4,78 509,00 342,40 67,3 26,8 1,49 Total/Média ponderada1 1.904,00 634,00 33,3 15,3 3.00 AC Custeio 2.679,00 186,97 7,0 6,7 14,33 AC Investimento 2.665,00 694,51 26,1 24,0 3,84 Total/Média ponderada 5.344,00 881,47 16,5 15,3 6,06 (1) AF Custeio AF Investimento Fonte: BITTENCOURT (2003). Elaborado pelo autor 1 Média ponderada pelo valor aplicado em cada modalidade. 4. Considerações finais e conclusões Os resultados mostram que cada real gasto com a equalização gera um crescimento no PIB equivalente a 1,75 vez o gasto com a Equalização da Taxa de Juros (ETJ) na agricultura familiar (AF), e 3,57 vezes o gasto com a ETJ na agricultura comercial (AC). Conclui-se que, para o caso da ETJ, os benefícios gerados para a economia em termos de crescimento econômico são mais elevados que o custo da política. Além disso, há aumento na arrecadação de impostos de 16,9% do gasto com a ETJ na agricultura familiar, e de 37,0% do gasto com a ETJ na agricultura comercial. Ou seja, os gastos governamentais com a ETJ são parcialmente recuperados com o aumento na arrecadação de impostos. Nas análises, os impactos de investimentos na agricultura familiar e comercial foram semelhantes, em relação ao impacto na economia. Isto ocorreu em razão de a desagregação do setor agricultura em familiar e comercial ter sido baseada na proporção 11 do valor da produção, o que faz com que ambas tenham a mesma função de produção. Além disso, na distribuição dos gastos com insumos (sementes, mudas, fertilizantes e defensivos), considerou-se a mesma planilha de custo para AF e AC. Para uma análise mais precisa, é necessário o levantamento de coeficientes de produção para a agricultura familiar e comercial, de modo que se possam captar as diferenças existentes relativas aos efeitos gerados na economia. A sugestão para novos tópicos de pesquisa é avaliar outros instrumentos de política, como os subsídios do crédito rural nas décadas de 70 e 80, a Política de Garantia de Preços Mínimos, investimentos públicos em infra-estrutura para a agropecuária, dentre outros. Essas análises, sempre que possível, devem ser realizadas no contexto do equilíbrio geral, para que se avaliem os efeitos diretos e indiretos e obtenha uma estimativa mais precisa dos benefícios da política, que são subestimados nas análises de equilíbrio parcial. O multiplicador encontrado para a AC é o dobro do multiplicador da AF. A principal razão para isso é o fato de a agricultura comercial pagar juros mais altos e, portanto, apresentar custo de equalização menor. Para dada dotação de recursos, o volume disponibilizado de recursos para AC é maior que o disponibilizado para a AF e, conseqüentemente, os efeitos na economia também são maiores que os proporcionados pela AF. No entanto, os recursos aplicados mediante equalização das taxas de juros na AF geram efeitos positivos relevantes no crescimento da economia. Considerando-se o aspecto dual existente no setor agrícola, a política de ETJ pode ser utilizada na redução das diferenças existentes, aplicando-se maior volume de recursos, pela ETJ, na AF. Assim, além de melhorar a distribuição de renda entre setores, a política de ETJ pode constituir um instrumento eficiente de redistribuição de renda dentro do próprio setor agrícola. 6. Referências Bibliográficas BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural. Brasília, 1995. v. 1. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural. Brasília, 1996. v. 1. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural. Brasília, 1997. v. 1. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural. Brasília, 1998. v. 1. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural. Brasília, 1999. v. 1. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural. Brasília, 2000. v. 1. BANCO CENTRAL DO BRASIL - BCB. Anuário estatístico do crédito rural 2001. (www.bcb.gov.br). 12 BITTENCOURT, G.A. Abrindo a caixa preta - o financiamento da agricultura familiar no Brasil. Campinas: UNICAMP, 2003. 213 p. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente) - Universidade Estadual de Campinas, 2003. BRAGA, M.J. Reforma fiscal e desenvolvimento das cadeias agroindustriais brasileiras. Viçosa: UFV, 1999. 155 p. Tese (Doutorado em Economia Rural) Universidade Federal de Viçosa, 1999. CASTRO, E. R. Efeitos dos gastos com a equalização das taxas de juros do Crédito Rural na economia brasileira. Dissertação de Mestrado (Programa de Pós-graduação em Economia Aplicada) – Departamento de Economia Rural, Universidade Federal de Viçosa. Viçosa: UFV 2004, 81 p. COELHO, C.N. 70 anos de política agrícola no Brasil. Revista de Política Agrícola, ano 10, n. 3, 2001. FRANCO, J.M.C., TEIXEIRA, E.C. Transferência de renda da agricultura comercial e familiar produtora de arroz, feijão e leite. 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