INOVAÇÃO
UMA PARCERIA EXAME
ESPÍRITO SANTO VENTURES
O triunfo
dos cogumelos
É agricultor, mas não tem terras: em quatro centros tem
120 salas de produção, em altura. Líder ibérico, vende 60%
dos cogumelos frescos para França, Holanda e Alemanha
Texto Abílio Ferreira
Fotos Manuel Teles
A
RTUR SOUSA, fundador da Sousacamp, é um agricultor sem terras. E, no entanto, este filho de
produtores de azeite e cortiça
de Vila Flor tem um negócio do
mundo real. É dono de uma área equivalente a 60 campos de futebol que o tornam no
campeão ibérico dos cogumelos frescos. Em
120 salas de produção, distribuídas por quatro centros, frutificam por ano 11 mil toneladas que chegam à mesa de apreciadores alemães, holandeses ou italianos. Para o Dubai
ou Israel segue a versão enlatada.
CASE STUDY NESTA ÁREA DE NEGÓCIO
É com um brilhozinho nos olhos que o empresário, de 43 anos, explica o funcionamento
do computador que controla os fatores termodinâmicos e ambientais das 30 salas da
unidade de Benlhevai (Vila Flor), aldeia com
menos residentes do que a comunidade local
da Sousacamp. Foi ali, em 1989, que a aventura começou, com um investimento de 25 mil
contos (125 mil euros). O jovem Artur partira
à boleia pela Europa e despertou na Holanda
para o admirável fenómeno dos cogumelos.
A decisão da sua vida foi trocar o curso de
Engenharia Eletrotécnica, no Porto, pelo de
Microbiologia, em Eindhoven.
Abre a porta da sala escura e aponta para
os seis andares de prateleiras que acolhem
cogumelos de calibres diferentes, prontos a
70 Exame
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n.º 329  SETEMBRO 2011
CUSTOS DA INTERIORIDADE
Artur Sousa defende a construção urgente
da autoestrada transmontana
A indemnização de 103 mil euros (mais juros)
a que a EDP foi condenada a pagar pelos
danos causados por um corte de energia
em 2006 é um sinal dos custos de contexto
em que se movem as empresas do interior.
A Sousacamp ganhou duas vezes, mas a EDP
recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça
que volta a apreciar a matéria de facto,
sobre as responsabilidades da elétrica.
“Sofremos com os custos da logística,
o péssimo serviço de fornecedores como
a EDP e da escassez de recursos humanos.
Temos de pagar acima do mercado para
atrair especialistas, como programadores.”
diz Artur Sousa, um defensor da construção
urgente da autoestrada transmontana.
No caso de Benlhevai. a vantagem é a sua
proximidade a Espanha. Com a expansão
da empresa, a unidade pode focar-se nos
mercados europeus, transferindo para
Paredes o abastecimento dos clientes
nacionais.
Artur Sousa trocou o curso de
Engenharia Eletrotécnica, no Porto,
pelo de Microbiologia, em Eindhoven
colher e embalar. A Sousacamp foi a primeira
a produzir em altura, potenciando o espaço
de cultivo. Hoje, a sua vocação pioneira e
inovadora tornam o currículo da empresa
num case study no mundo dos cogumelos.
A sua prova mais recente consiste na transformação do que sobra do cultivo num fertilizante destinado à agricultura. Havia um
problema com o destino dos resíduos que
a Sousacamp transformou numa oportunidade de negócio. São 75 mil toneladas de
adubo que a unidade de Sabrosa, em fase de
acertos finais, comercializará no mercado
ibérico. “Somos a única empresa do mundo
que adota esta solução, acrescentando valor
e reaproveitando um subproduto até agora
inútil”, diz Artur Sousa. A matéria orgânica
AGROALIMENTAR
é pasteurizada, desidratada e comprimida
com terra para se obter o fertilizante final.
O projeto de Sabrosa já foi distinguido com
o Prémio Nacional de Inovação Ambiental 2011 da European Environmental Press
(associação europeia de 17 revistas técnicas na área do ambiente). A inovação “está
no código genético, estamos em mudança
constante na informática e na biotecnologia. Alteramos o processo de produção três
ou quatro vezes. É esse o segredo do nosso
sucesso”, diz Artur Sousa.
PARCERIA COM A UTAD
Voltemos ao computador. Ele permite controlar a temperatura, humidade, ventilação,
CO2 e pressão no interior da sala que fecha
A SOUSACAMP EM BREVE
A empresa de vila Flor factura 30 milhões de
euros e vende no exterior 60% da produção
Capital social: 7,8 milhões de euros.
Acionistas: Família Sousa (59,9%)
e Espírito Santo Ventures(39,1%).
Vendas em 2011 (previsão):
30 milhões de euros.
Produção: 11 mil toneladas (1000 camiões).
Principais mercados: Espanha, França,
Holanda e Alemanha. Exporta 60%.
Emprego: 500 pessoas (65 em Espanha).
Centros de produção: Vila Flor, Vila Real,
Paredes e Albacete. Unidade conserveira
em Mirandela.
o ciclo de seis ou oito semanas na produção
dos cogumelos – oito colheitas por ano. No
início, “não havia controlo, fomos aperfeiçoando os programas informáticos”. A primeira versão saíra da sua cabeça. As salas
são um dos fatores críticos porque têm de
replicar o ambiente de um ecossistema
natural. No caso dos cogumelos exóticos,
que a Sousacamp produz no seu centro de
Albacete (Espanha), é um aspeto nuclear: o
ambiente tem de ser uma imitação perfeita
da natureza em que se movem os cogumelos silvestres.
Mas se numa padaria o segredo está na
massa, na Sousacamp o essencial é o substrato, o composto orgânico que é a base da
cadeia de cultivo. Em Benlhevai uma nave
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INOVAÇÃO AGRO-ALIMENTAR
COGUMELOMANIA
Factos e números que descrevem o admirável
mundo que seduziu
Os cogumelos são classificados
frequentemente como um vegetal
ou uma erva, mas são realmente fungos.
São constituídos por água (80%-90%), ricos
em proteínas e vitaminas (B1 e C), e fibras.
■ O consumo per capita em Portugal é baixo
(3 kg/ano). Na Holanda é de 14 quilos.
■ O seu ciclo de produção, entre seis e
oito semanas, inicia-se com o fabrico do
substrato: compostagem e enchimento,
pasteurização, inoculação e incubação.
O substrato frutifica depois nas salas de
cultivo. Por ano, fazem-se oito colheitas.
■ Os cogumelos frescos têm uma validade
de oito dias, desde que são apanhados.
O transporte é um fator crítico para quem
exporta. Não podem demorar mais de
dois dias a serem entregues no cliente.
industrial fabrica o substrato para as unidades do grupo. A base para a “sementeira” de
fungos que evoluirão para cogumelos resulta
da homogeneização, rega por capilaridade
e pasteurização a 60 graus de palha, estrume de galinha e micronutrientes.
Nesta frente das matérias-primas, a Sousacamp está também um passo à frente da
concorrência, através de uma parceria com
a UTAD – Universidade de Trás-os-Montes
e Alto Douro. Laboratórios conjuntos investigam novos processos e potenciam a qualidade das matérias-primas. No Alentejo, a
Sousacamp tem uma pequena produção de
palha e recorre à importação do Nordeste
de Espanha. “Nem na palha o país é autossuficiente”, desabafa o empresário.
A inovação revela-se também no plano
comercial. A empresa associou-se ao chefe Chakall no lançamento de uma linha de
tasty grocery com 23 derivados de frutas
e legumes desidratados. Um novo desafio
centra-se na Quinta Comporta, em Setúbal.
Uma parceria como grupo Espírito Santo
avalia a criação de cluster agrícola, a partir
da produção de hortícolas.
CRESCER SEGUINDO O IP4
A partir de Benlhevai, Artur Sousa seguiu
o IP4 (Porto-Bragança) no sentido do mar,
montando novos centros de produção em
Vila Real e Paredes. O projeto PIN – Poten72 Exame
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n.º 329  SETEMBRO 2011
cial Interesse Nacional de Vila Real representa a maior unidade da Europa, com mais
de 100 salas de cultivo, absorvendo a maior
fatia do programa de investimentos, da ordem
dos 90 milhões de euros, apresentado, em
2008, ao Proder – Programa de Desenvolvimento Rural. O Proder paga um terço, repartindo-se o restante entre capitais próprios
e financiamento bancário. A primeira fase
de Vila Real está concluída, mas as outras
duas sofrem atrasos devido ao traçado da
nova autoestrada transmontana. O terreno
da Sousacamp estava reservado a um acesso
e demorou dois anos a desatar este nó.
A ofensiva em Espanha representou 7,5
milhões de euros, com a criação da base de
Albacete e centros logísticos e vendas em
A PROXIMIDADE
EXPLICA PORQUE
ESPANHA É O
PRINCIPAL DESTINO
DA EXPORTAÇÃO DA
SOUSACAMP QUE
QUER CRESCER
NO REINO UNIDO,
SUÍÇA E ITÁLIA
Palência e Barcelona. A proximidade justifica
que o mercado espanhol seja o principal destino de exportação. No futuro, Artur Sousa
quer crescer no exterior à custa de mercados
como o Reino Unido, Suíça e Itália.
SEM TERRA NO BRASIL
A vantagem da Sousacamp face aos concorrentes holandeses ou irlandeses, os principais produtores europeus, é a verticalização
do negócio. Nesses países, impera a lógica das cooperativas. “Para fazer o que nós
fazemos, são envolvidas umas dez empresas. Cada fase da cadeia (substrato, micélios,
etc.) tem um interveniente específico”, justifica Artur Sousa.
Digerido o plano de expansão em curso, que impulsionará as suas vendas para
50 milhões de euros em 2014, a Sousacamp
tenciona replicar no Brasil a sua vocação de
agricultor sem terras. Artur Sousa já avaliou o mercado e verificou potencialidades
enormes: “É uma questão de tempo. Não
podemos dar passadas maiores do que a
perna.” 
Esta iniciativa resulta de uma parceria entre
a EXAME e a Espírito Santo Ventures para divulgar
casos de sucesso e promover a inovação do tecido
empresarial português. As empresas foram escolhidas pela EXAME e pela Espírito Santo Ventures
de entre as várias participadas por esta.
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