Versão preliminar Gasto público com a saúde no Brasil: possibilidades e desafios Hugo Vocurca Teixeira Viviane Barroso Gonçalves Outubro de 2003 INTRODUÇÃO A concepção institucional do Sistema Único de Saúde (SUS), espelha um novo paradigma para a organização do Estado e a formulação de políticas públicas. Sua implementação não só requer, mas também provoca inovações contínuas, do ponto de vista do pacto federativo, do controle social, dos instrumentos de gestão e negociação e da incorporação progressiva de novos segmentos do Estado brasileiro nesse processo de construção. Otimizar a saúde da população a partir da utilização de conhecimento apropriado e minimizar as disparidades entre determinados grupos são pontos referenciais para a organização dos sistemas de saúde. O entendimento de que é preciso utilizar adequadamente os recursos para atender as necessidades e demandas existentes no campo da saúde é enfatizado por diversos autores e traduzido no conceito utilizado por muitos para abordar a Atenção Primária em saúde. Uma maior riqueza nacional não garante as condições socioeconômicas que produzem um alto nível de saúde. A forma de aplicação dos recursos impacta diretamente nas condições de vida e, por conseguinte, nas condições de saúde da população. O trecho que segue, aborda esses aspectos: “(...) a saúde está diretamente associada à vantagem social em termos absolutos. Quanto mais recursos sociais de indivíduos e comunidades, maior a probabilidade de uma saúde melhor. Além disso, a privação social relativa, mais do que a absoluta também está associada a uma saúde pior. Ou seja, quanto maiores as disparidades na riqueza em qualquer população, maiores as disparidades na saúde”.(Starfileld, 2002) A promoção da cidadania de parcela significativa da população, considerando a relação existente entre vantagem social e saúde, depende, por conseguinte, da eficiência do setor público na provisão adequada de ações e serviços de saúde. 2 Segundo Teixeira e Teixeira (2003), este desafio mostra-se particularmente difícil em um contexto de demanda crescente e de restrição orçamentária. Os recursos são escassos, as possibilidades de utilização de subterfúgios de administração financeira são limitadas, e por isto, é preciso planejar as ações a serem desenvolvidas. O planejamento eficaz do gasto e a adequada gestão dos limitados recursos disponíveis são imprescindíveis em todos os setores da economia, em especial no setor público. Afirmam ainda que tão importante como o planejamento, é a mensuração e a avaliação das ações empreendidas e dos resultados alcançados. A condução da política pública requer mais do que boa intuição. São necessárias informações precisas, pertinentes e detalhadas sobre a realidade. Além de funções afetas aos gestores do SUS, mensurar e avaliar são também importantes contribuições sob a responsabilidade das instituições de pesquisa, que interagem com segmentos da sociedade para o aperfeiçoamento contínuo nesse segmento. A disponibilidade de informações financeiras sobre o perfil do financiamento e do gasto com as políticas públicas de saúde, para cada esfera de governo, constitui um imperativo para o processo de construção e avaliação do desempenho do SUS. Tais informações podem viabilizar o aprimoramento da gestão, a disseminação de experiências bem sucedidas entre os entes federados, e a adequada distribuição dos gastos entre investimento e custeio, tendo em vista o dimensionamento das redes de atenção, dentre outras questões. Apesar dos avanços, a base de dados sobre a situação dos gastos com saúde disponível no País ainda é incipiente. A construção de indicadores de avaliação de políticas de saúde tem se demonstrado um desafio sob vários aspectos. Em particular pode-se mencionar a qualidade do serviço prestado, as possíveis alternativas para o tratamento dos problemas diagnosticados, o resultado propriamente dito e a relação custo-benefício. 3 Diante do número de variáveis a serem consideradas quando se analisa o contexto da saúde, e da ineficiência de sistemas de informações que contribuam para tal, a construção de um mecanismo de avaliação que permita a comparação dos dados fornecidos pelas diferentes esferas governamentais torna-se fundamental. A análise dos dados à luz dos indicadores de saúde obtidos, pode constituir importante instrumento gerencial. A operação conjunta de tecnologias de informação, ferramentas de gestão, controle social e pesquisa permitirá não só observar as diretrizes constitucionais na provisão de serviços públicos, como também realizar significativos avanços de gestão, redundando em ganhos de bem estar para a sociedade brasileira. As políticas públicas na saúde combinam financiamento das três esferas de governo com execução descentralizada no nível local. A partir da Emenda Constitucional nº 29, de 2000, o aporte de recursos por estados e municípios passou a depender da sua capacidade fiscal, enquanto a União tem seu dispêndio vinculado ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Este desenho enseja a discussão sobre o caráter redistributivo do gasto federal e do volume de recursos necessário ao financiamento do SUS. A avaliação da qualidade do gasto, ou a adequação dos mesmos às necessidades da população, constituem pré-requisitos para o avanço desta discussão. Diante da necessidade de ampliação dos dados disponíveis de gastos com a saúde é preciso encontrar instrumentos de avaliação que possam contribuir para a melhoria do gerenciamento do sistema de saúde. Este texto, corroborando com o mencionado anteriormente, aborda um possível mecanismo de avaliação da efetividade do gasto público com saúde no Brasil tomando como base as informações de utilização de recursos tornadas públicas pelo Ministério da Saúde, correlacionando-as com um indicador de desenvolvimento disponibilizado 4 mundialmente, de forma a levantar aspectos que afirmem a importância da utilização dos recursos para a melhoria das condições de saúde e vida. A análise dos resultados obtidos através da associação entre alguns indicadores disponíveis no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos de Saúde (SIOPS) e o indicador de desenvolvimento humano (IDH) possibilitou o registro de observações que podem subsidiar, no cotidiano do trabalho em saúde, os atores envolvidos na construção de políticas de saúde mais equânimes e efetivas. A análise conjugada das vertentes: financiamento e gasto e qualidade de vida da população, na medida em que associa indicadores de educação, renda e longevidade, este último bastante afeto à saúde, possibilitou a visualização de tendências sobre a utilização dos recursos e o desenvolvimento da população. Ampliar as possibilidades de utilização dos indicadores disponíveis enquanto instrumentos gerenciais e contribuir para o processo de discussão sobre a gestão no setor saúde são os permanentes desafios. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A importância que vem sendo atribuída ao debate das questões relacionadas à gestão no setor saúde pode ser percebida a partir da análise de diferentes fatores, mas relaciona-se, fundamentalmente, à necessidade de, diante das transformações econômicas e sociais, investir em instrumentos e ações que propiciem a melhoria da condição de vida da população. O fortalecimento do poder local, a partir da capacidade de implementação de ações integradas e regionalizadas, tem sido uma das possibilidades de contribuição para o desenvolvimento. Relações de parceria e maior participação popular promovem mudanças na relação entre as esferas governamentais e 5 favorecem a descentralização, o que propicia o melhor reconhecimento dos problemas e a utilização de soluções mais adequadas, a partir dos recursos disponíveis. Essas formulações são compartilhadas por Augusto de Franco 1, conforme abordagem no trecho que segue: “O local é compreendido como a esfera em que os problemas são mais bem reconhecidos, pela proximidade com as comunidades, o que facilita encontrar soluções mais adequadas, no sentido de identificar tanto as necessidades do grupo, como as potencialidades e vocações locais e os recursos existentes para enfrenta-los”. (Franco) Para Fagnani e Spink, é preciso estabelecer critérios transparentes para a aplicação dos recursos e ampliar os mecanismos de controle social. É fundamental também a incorporação de metodologias de avaliação de projetos, especialmente de custos, de critérios de acompanhamento das ações que impliquem a responsabilização dos executores e de modalidades de gerenciamento que incluam a flexibilidade e o gradualismo nos processos de implementação. A transparência nas decisões na ação pública, assim como a avaliação de políticas e programas sociais, é questão central na medida em que possibilita a medida da eficiência, da eficácia e da efetividade do gasto público. Apesar da necessidade de se avaliar a aplicação dos recursos, existem dificuldades na apropriação dos dados, pois as informações são, em sua maioria, inexistentes ou pouco utilizadas. Alternativas para a análise dos dados disponíveis são importantes para o efetivo conhecimento da situação e, por conseguinte, para a proposição de novas medidas. É preciso mais do que afirmar quanto se gasta com saúde. Questões como a destinação do recurso, a utilização e os resultados reais sobre a saúde da população devem ser respondidos. Os trechos seguintes abordam as questões mencionadas: 1 Este autor, assim como Eduardo Fagnani, Silvio Bava e Peter Spink, teve seu texto publicado no livro Gestão Social: uma questão em debate; organizado por Elizabeth de Melo Rico e Raquel Raichelis 6 “As ações de governo desenvolvidas nos setores de saúde, educação fundamental e assistência social revelam impulsos positivos no sentido da reestruturação dos mecanismos de gestão dessas políticas”. “No setor da saúde destacam-se os impulsos no sentido de avançar o descontínuo processo de descentralização e implementação do SUS. Importante passo inicial foi a edição, pelo Ministério da Saúde, em 1993 da Norma Operacional Básica (NOB 1/93), que introduz, de forma pactuada com estados e municípios, novos mecanismos operacionais e critérios de repasse automático de recursos federais, visando a impulsionar a implementação do SUS de acordo com os princípios estabelecidos pela Constituição de 1988”. “Posteriormente, em 1996, o Ministério da Saúde instituiu a NOB 1/96 que, intensificando o processo iniciado em1993, estabelece outras modalidades de descentralização de competências e responsabilidades para estados e municípios. Outra inovação é a introdução do Piso de Atenção Básica (PAB), que assegura a transferência de forma regular e automática de recursos aos municípios que aderirem ás formas de gestão previstas na NOB 1/96”. (Fagnani) Analisar e sugerir indicadores de gasto em saúde que possam contribuir para a formulação de políticas que busquem a redução das desigualdades no âmbito da saúde brasileira foi a proposta deste trabalho, que associou três indicadores – Índice de Desenvolvimento Humano, percentual de Receita Própria aplicada em saúde e Gasto per capita em saúde. Todos referem-se à esfera municipal, devendo-se destacar que o gasto per capita em saúde engloba o financiamento realizado pelo poder público local através da arrecadação de impostos, somado ao oriundo das transferências constitucionais e legais no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) provenientes das demais esferas de governo. Algumas informações sobre o sistema de informação utilizado, bem como sobre a composição dos indicadores trabalhados são apresentadas a seguir: Degenszajn. 7 1- SISTEMA DE INFORMAÇÕES SOBRE ORÇAMENTOS PÚBLICOS DE SAÚDE Com o objetivo de promover debates em torno do tema Contas Nacionais de Saúde, foi realizado em 2000, com a participação de representantes da Organização Mundial de Saúde (OMS), da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e do Banco Mundial seminário que constituiu passo importante para o estabelecimento de parcerias que resultaram, inclusive, na aprovação de um grupo de trabalho para o desenvolvimento de indicadores na área. Desta forma, potencializou-se a avaliação de quanto se gasta em saúde, bem como ampliou-se o acesso à informação sobre o perfil do financiamento do setor em cada esfera, e sobre os fluxos financeiros entre as mesmas. Neste sentido, O Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos de Saúde (Siops), contribui com dados e estimativas referentes ao gasto público, o que possibilita a realização de estudos e a formulação de políticas que redimensionem o financiamento da saúde, tendo em vista uma distribuição mais eqüitativa de recursos. A partir da aprovação da Emenda Constitucional 29 (EC29), em setembro de 2000, ficou definida para cada esfera de governo a aplicação de montantes específicos de recursos em saúde. Para a União, ficou estabelecido, para o primeiro ano, o aporte de pelo menos 5% a mais em relação ao orçamento empenhado do exercício anterior e, para os anos seguintes, a correção do valor apurado no ano anterior pela variação nominal do Produto Interno Bruto. Quanto aos Estados e Municípios, ficou reservada a destinação de pelo menos 7% das receitas de impostos para a saúde sendo que este percentual deveria ser aumentado anualmente, até atingir, em 2004, 12% no caso dos Estados e 15% no caso dos Municípios. A importância desta medida é registrada no trecho que segue: 8 “Reconhece-se que esta medida, de extraordinário impacto potencial na melhoria e ampliação dos serviços de saúde, contribui para realizar o princípio constitucional que define a saúde como direito do cidadão e dever do Estado (CF, art.196). A plena aplicação desse princípio constitucional depende, também, de outros fatores, como o esforço de gestores e trabalhadores da saúde na organização do sistema e no oferecimento dos serviços assistenciais à população, e no desenvolvimento de hábitos culturais, tais como o cuidado com a alimentação e a realização constante de exercícios físicos”. (Teixeira e Teixeira, 2003) Os significados da aprovação desta Emenda são percebidos, ainda, a partir do aumento do volume de recursos em algumas situações, da possibilidade de previsibilidade de recursos a serem aplicados, o que não era possível diante da instabilidade do financiamento do SUS, e da exigência de aplicação mínima pelas três esferas de governo, dentre outros aspectos. O acompanhamento do cumprimento da EC29 passou a ser uma das responsabilidades do Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos de Saúde (Siops) a partir do ano de 2000. De acordo com Teixeira e Teixeira, este Sistema, desde que começou a ser implantado pelo Ministério da Saúde, em 1999, reúne informações sobre o financiamento e o gasto com saúde pública de Municípios, Estados e União e tem como objetivo instrumentalizar o poder público no planejamento, gestão, acompanhamento e avaliação do sistema de saúde, bem como apoiar os órgãos de controle na fiscalização dos dispêndios. As informações coletadas pelo Siops dizem respeito aos gastos realizados pelo SUS nas Administrações Diretas e Indiretas com ações e serviços de saúde de acesso universalizado e visam, ainda, subsidiar os debates para a regulamentação da EC29, em particular no que diz respeito à definição do conceito de ações e serviços públicos de saúde. 9 O número de municípios que alimenta a base de dados vem sendo ampliado, anualmente. O caráter de preenchimento das informações é declaratório e orientado por um manual disponível no site do Siops, que contém explicações e critérios aplicados aos campos a serem preenchidos. O banco de dados permite visualizar, conforme o grau de agregação desejado, o dispêndio e a capacidade de financiamento das ações e serviços públicos de saúde, em nível local, estadual ou federal e, diante de amplitude e versatilidade possíveis através de um sistema interno de verificação de informações recebidas e a partir do cruzamento dos dados impostados produz informações com regularidade. O Siops constitui-se, ainda, como uma importante fonte de dados para a realização de estudos por instituições de pesquisa, para o exercício do acompanhamento e fiscalização pelos órgãos de controle e para a gestão e avaliação das ações no âmbito do SUS. Algumas informações acerca de sua origem são descritas no trecho que segue: “Foi concebido, inicialmente, como um banco de dados contendo as receitas totais e despesas com ações e serviços públicos de saúde da União, dos estados e dos municípios, mas vem, gradualmente, evoluindo e assumindo novas funcionalidades. Exemplo disso são os indicadores já disponibilizados aos gestores, que possibilitam avanços no acompanhamento e avaliação de gastos públicos no setor”. Este avanço só se tornou possível porque a coleta é padronizada pelas informações contábeis e pelo formulário único de declaração. A base de dados é, portanto, homogênea, e a disponibilização utiliza os mesmos parâmetros para as três esferas. Uma das vantagens daí derivadas é a possibilidade de comparações entre os dados financeiros e de resultado dos serviços prestados de um determinado ente, com outras unidades semelhantes na federação“ (Teixeira e Teixeira, 2003) 10 A partir deste instrumento, é possível obter um relatório gerado automaticamente pelo sistema e um conjunto de indicadores essenciais para o planejamento, avaliação e controle social das ações e serviços de saúde. Dentre os indicadores que podem ser obtidos, destacam-se: Relação entre despesa com saúde e receita total; Participação da despesa com saúde na despesa total; Despesa per capita com saúde; Receita de impostos na receita total. Teixeira e Teixeira abordam esta questão da seguinte forma: “Essas informações, como as outras disponíveis no site, podem também ser analisadas por município, Estado ou região, assim como permitem estimativas com alto grau de precisão sobre dados e indicadores de abrangência nacional. Isso faz do Siops uma importante ferramenta de apoio às negociações e decisões dos gestores, seja nos espaços de pactuação intergovernamental do SUS, seja junto à área financeira do respectivo ente na busca por mais recursos. A transparência do financiamento do setor público também viabiliza a interlocução mais qualificada com órgãos e instâncias de controle social”. 2- INDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), é um indicador criado em 1990 pela organização das Nações Unidas (ONU), com o objetivo de avaliar as condições de vida, até então analisadas por índice econômico. Operado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o IDH mede a qualidade de vida dos diferentes países, o que propicia sua utilização para diversos fins comparativos. Foi desenvolvido para medir o nível de desenvolvimento humano a partir de indicadores de educação, longevidade e renda, entre vários outros. Estes índices são construídos a partir da associação de dados referentes à alfabetização, esperança de vida ao nascer e PIB per capita. Países com IDH até 0,499 têm desenvolvimento humano considerado baixo; índices entre 0,500 e 0,799 indicam médio desenvolvimento e IDH maior que 0,800 indica desenvolvimento humano alto. 11 Nos municípios, para a avaliação da dimensão – educação, o cálculo considera dois indicadores com pesos diferentes; taxa de alfabetização de pessoas acima de 15 anos de idade (peso dois) e a taxa bruta de freqüência à escola (peso um). A dimensão – longevidade, é avaliada a partir do indicador de esperança de vida ao nascer que mostra o número médio de anos que uma pessoa nascida na localidade no ano de referência deve viver. Este indicador sintetiza as condições de saúde e salubridade daquele local. Para a avaliação da dimensão – renda, o critério utilizado é a renda municipal per capita, expandida para o total da população e corrigido pela paridade do poder de compra. Os índices específicos de cada uma das dimensões analisadas são trabalhados de forma que a média aritmética simples desses três sub-índices resulta no IDH médio (IDHM) e considera que a melhoria no indicador não está associada à riqueza em si, mas na utilização desta. A base de dados dos municípios favorece a desagregação territorial e amplia as possibilidades de análise da realidade. Nos últimos nove anos, o Brasil melhorou sua posição no IDH Mundial, passando de 0,709, em 1991, para 0,764, em 2000. A mudança demonstra avanços nas três variáveis que compõe o IDHM. O IDH aumentou em todos os estados e em quase todos os municípios brasileiros. No entanto, é preciso ressaltar que permanecem imensas disparidades entre os municípios. O mapa que segue demonstra o crescimento mencionado numa comparação com os países da América Latina. 12 IDH do Brasil cresce acima da média da América Latina 0,85 0,8 0,777 0,756 0,75 0,738 0,717 0,712 0,7 0,678 0,691 0,685 0,741 0,700 0,656 0,65 0,643 0,6 0,55 0,5 1975 1980 1985 1990 1995 2001 Argentina Chile Uruguai Costa Rica México Panamá Colômbia Venezuela Brasil Peru Paraguai Equador El Salvador Bolívia Honduras Nicarágua Guatemala América Latina Tendência Brasil METODOLOGIA O trabalho foi realizado a partir de pesquisa bibliográfica e documental sobre o Siops e sobre o Índice de Desenvolvimento Humano, buscando identificar indicadores que pudessem, ao serem associados, fornecer indicativos acerca da aplicação de recursos em saúde. Teve como base, ainda, as modalidades de pesquisa descritiva e exploratória. Aspectos inerentes a estas modalidades estão presentes nas atividades realizadas. A partir dos bancos de dados existente no Siops e no Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil, foram desenvolvidas tabelas que permitiram o estabelecimento de correlações entre variáveis, a percepção de características de utilização dos 13 recursos destinados à assistência à saúde e a discussão acerca dos fatores que determinam a ocorrência dos resultados obtidos. As tabelas de origem dos bancos de dados já citados, disponíveis na internet, foram trabalhadas de forma a possibilitar a utilização de informações sobre a utilização dos recursos destinados à saúde. A posterior comparação, no mesmo período trabalhado, permitiu a percepção de padrões de resultados. Para a construção das tabelas foram utilizadas informações referentes ao ano de 2000. Apesar de encontrarmos informações referentes aos anos de 2001 e 2002 no Siops, não foi possível a utilização desta série, pois os dados referentes ao IDH só se encontram disponíveis até 2000. A alimentação dos dados se deu a partir das informações de municípios da federação. Estes, a partir da agregação em novas tabelas, resultaram na organização dos dados por estados, regiões e no País. Foram utilizadas apenas as informações relativas aos municípios que estavam com os dados coerentes a partir de parâmetros estabelecidos pelo Siops e, por isso, diante da necessidade de correlação de dados, alguns municípios que constavam no Atlas de Desenvolvimento no Brasil foram desprezados. A amostra utilizada garantiu a composição necessária para a visualização das correlações em todos os níveis de organização. Aproximadamente 3500 municípios foram trabalhados. Para eliminar as distorções causadas por casos extremos no que diz respeito à aplicação de receita própria e gasto per capita em saúde, optou-se por excluir 0,5% de municípios no extremo superior e no extremo inferior das tabelas. Os dados das tabelas deram origem a gráficos de dispersão que associaram o índice de desenvolvimento humano ao percentual de receita própria aplicada em saúde e ao gasto per capita em saúde. Estes foram elaborados de forma a 14 possibilitar a visualização de linhas de tendência diante da utilização de recursos municipais quando agrupados por estados, regiões ou mesmo compondo o cenário brasileiro. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS Como a apresentação dos gráficos possibilita o agrupamento dos dados por estados e regiões, além da apresentação da situação do Brasil é possível realizar diferentes comparações e estabelecer distintas suposições acerca da aplicação dos recursos municipais em saúde. A análise individual de cada gráfico torna-se, por si só, pouco atraente, pois, além da interpretação inicial, que apontaria apenas para uma tendência isolada, tem-se a possibilidade de, diferentemente, procedermos a comparação dos resultados entre gráficos distintos. O entendimento de receita vinculada, para fins de impostação dos dados no Siops e para efeito de cálculo da EC29, pode ser visualizado, de forma resumida, no esquema: Receita Total = Receita Vinculada. Da mesma forma, para fins de cálculo do gasto per capita, é utilizada a seguinte operação: Despesa Própria = Despesa Total - Transferências. A análise inicial dos resultados obtidos a partir da combinação dos indicadores já referidos possibilitou a identificação de situações pontuais. As aplicações de percentuais superiores a 40% de receita própria, valores incluídos no Siops apenas mediante justificativa dos gestores municipais; bem como os valores negativos nos indicadores de despesa per capita, proporcionam distorções importantes nos gráficos elaborados. Estes fatos ocorrem por estarem estes municípios situados nos extremos das tabelas de origem dos gráficos de dispersão que foram corrigidas, posteriormente. 15 O município de Itaipulândia no Paraná, por possuir a maior parte de suas receitas compostas por royalties, uma vez que estes não são computados no cálculo da EC29, apresenta um percentual de receita própria próximo de 150%. Este dado distancia-se enormemente dos demais o que propicia uma distorção gráfica que foi corrigida, posteriormente, com a eliminação dos 0,5% dos municípios nos extremos inferiores e superiores. O gráfico original, antes da correção da tabela de origem, estava assim configurado: Inserir gráfico que contém o município de Itaipulândia, antes da correção da tabela. CONCLUSÕES As análises realizadas a partir do estudo proposto reafirmam a importância da série histórica para a ampliação das possibilidades de análise, bem como da associação de outros indicadores para a melhor composição do cenário das condições de vida e de saúde das populações. A escolha da utilização do IDH procurou favorecer a percepção de que a otimização da saúde está relacionada a outros determinantes. A percepção do impacto da aplicação dos recursos em saúde poderia ser mais bem visualizada se fossem associados diferentes indicadores num período maior de tempo. Podemos sugerir a utilização do Índice de Mortalidade Infantil e/ou do Índice de Qualidade de Vida (IQV) para a ampliação das possibilidades de análise. O trecho que segue valida tal afirmativa: “O desenvolvimento local integrado e sustentável exige uma nova base de informação desagregada que permita uma análise mais apurada da economia e da realidade social local, bem como novos indicadores locais de 16 desenvolvimento, que incorporem índices capazes de aferir os níveis de qualidade de vida e de sustentabilidade alcançados nos diversos momentos do processo”.(Franco) O trabalho realizado apresentou limitações em função do grande número de informações disponíveis e da utilização de bancos de dados que não foram construídos de forma a favorecer a inter-relação e a comparação dos dados existentes. O pequeno tempo de alimentação da base de dados do SIOPS, associado à não disponibilização de dados posteriores ao ano de 2000 no que diz respeito ao IDH, reduziu as possibilidades de correlação das informações, o que pode ser corrigido, posteriormente, quando da existência de série histórica suficiente. A dificuldade de encontrar indicadores que refletissem a situação de saúde de cada localidade e a utilização de hipóteses que para serem confirmadas exigiriam uma ampliação do estudo foram outros limitadores. É importante ressaltar, entretanto, as possibilidades de utilização da metodologia proposta em estudos futuros; principalmente se forem associados outros indicadores. Ainda, vale registrar que este trabalho, ainda que de pequena monta, favorece a transparência e a democratização das informações, mecanismo de aperfeiçoamento da sociedade e, por conseguinte, é capaz de estimular a permanente criação de instrumentos para a observação e a análise da realidade brasileira. Para melhorar a qualidade de vida é preciso saber se os recursos foram bem gerenciados. E isto é só é possível a partir do planejamento com base em informações que retratem a realidade. Associar arrecadação, gestão financeira com responsabilidade social e investimento no capital humano, inclusive incentivando a participação e o controle social pode levar a um bom desenvolvimento humano. 17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1) BRASIL. Constituição de 1998. Emenda Constitucional nº 29, de 2000. Brasília: Diário Oficial da união nº 178 E, 14 de setembro de 2000. 2) BRASIL. Ministério da Saúde; Brasil. Portaria Interministerial Ministério da Saúde e Procuradoria Geral da República nº 529, 30 de abril de 1999. Brasília: Diário Oficial da União nº 82, 03 de maio de 1999, Seção II. p. 16. 3) BRASIL. Ministério da Saúde; Brasil. Procuradoria Geral da República. Portaria Conjunta nº 1163 de 11 de outubro de 2000. Brasília: Diário Oficial da União nº 203, 20 de outubro de 2000, Seção I.pp. 27-28. 4) SOUZA, M.F (org). Os Sinais Vermelhos do PSF. São Paulo: Hucitec, 2002. 5) STARFIELD, Bárbara. Atenção Primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia – Brasília: UNESCO, Ministério da Saúde, 2002. 6) RICO, E.M., DEGENSZAIN, R.R. /orgs. Gestão Social: uma questão em debate. São Paulo: EDUC; IEE, 1999. 7) TEIXEIRA, H.V. TEIXEIRA, M.G. Financiamento da saúde pública no Brasil: a experiência do Siops. ABRASCO - Ciência e Saúde Coletiva: Economia e Gestão da Política de Saúde. Volume 8 número 2, 2003. 8) Atlas de Desenvolvimento Humano do Brasil – Instituto de Pesquisa econômica Aplicada (IPEA), Fundação João Pinheiro (MG) e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Outubro de 2002. 9) Endereços eletrônicos: www.saude.gov.br/sis/siops e www.undp.org.br 18 ANEXOS 19