AUTOMOTIVO
1
Equipe ATS
Mauro Borges Lemos - Presidente ABDI
Mariano Laplane - Presidente CGEE
Coordenação Geral
Maria Luisa Campos Machado Leal (ABDI)
Marcio Miranda (CGEE)
Coordenação Executiva
Carla Ferreira Naves (ABDI)
Liliane Rank (CGEE)
Zil Miranda (ABDI)
Katia Beltrão (CGEE)
Adriana Santos (ABDI)
Setorialistas ABDI
Bruno Jorge Soares (ABDI)
Coordenação Técnica Geral
Fabio Stallivieri (UFF)
Ricardo Naveiro (UFRJ)
Rodrigo Sabbatini (UNICAMP)
Coordenação Técnica Setorial
Fernando Sarti (UNICAMP) – Panorama Econômico
Roberto Marx (USP) – Panorama Tecnológico
Adriana Marotti (USP) – Panorama Tecnológico
Comitê Técnico de Especialistas
Bernardo Hauch
Edson Orikassa
Fabricio Pujatti
Marcio de Almeida D’Agosto
Marcio Massakiti Kubo
Paulo Emilio Valadão
Rogério Ferraz
Spartacus Pedrosa
Organizadores
Carla Ferreira Naves (ABDI)
Marina Oliveira (ABDI)
Zil Miranda (ABDI)
2
Características econômicas e tendências competitivas do setor
automobilístico no Brasil
Fernando Sarti1
Roberto A. Z. Borghi2
Sumário executivo
Este estudo tem como objetivo geral analisar as principais características
econômicas do setor automobilístico no Brasil (SAB), destacando as perspectivas de
demanda e as mudanças recentes na estrutura de oferta no Brasil e no mundo. Como
objetivo específico, o estudo discute as possibilidades de o setor no Brasil ampliar e
melhorar sua inserção na estrutura produtiva internacional, apontando limites e
oportunidades competitivas deste setor no país nos próximos anos, particularmente com
base em sua capacidade de inovar e os rumos dados ao padrão tecnológico em escala
mundial. O relatório é composto de sete seções, além deste sumário executivo e das
considerações finais.
Na primeira seção, apresentam-se as principais características econômicas do
setor automobilístico, no que se refere aos padrões de concorrência, aos padrões de
organização da cadeia produtiva e aos atributos de competitividade. Ressalta-se que este
setor é marcado por um padrão de concorrência oligopolística, em que a concorrência
ocorre principalmente por meio de inovações de produto e processo, criação de nichos
de mercado e melhorias de qualidade a fim de assegurar participação de mercado. A
estrutura de organização da cadeia produtiva apresenta um caráter sobretudo horizontal
e modular, com a participação de fornecedores nas linhas de produção das montadoras.
Essa segmentação permite uma expansão geográfica das atividades produtivas e uma
rearticulação operacional para atender diversos mercados a depender das estratégias
competitivas das corporações.
Como principais atributos de competitividade do setor, podem-se mencionar: a
contínua capacidade de inovação com elevados volumes de investimento em pesquisa e
desenvolvimento e a introdução de novos produtos e novas tecnologias, como o recente
direcionamento para veículos com formas alternativas de propulsão menos nocivas ao
1
Professor e Diretor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE-Unicamp) e
Pesquisador do NEIT-IE-Unicamp.
2
Doutorando na Universidade de Cambridge, Reino Unido. Mestre em Economia pelo IE-Unicamp.
3
ambiente; o regime macroeconômico dos países, em particular a evolução das taxas de
câmbio e de juros, bem como o regime tributário; o padrão de financiamento atrelado a
novos investimentos e à comercialização de veículos; a estrutura de proteção praticada
em âmbito doméstico, especialmente no que tange à entrada de novos players, ao
acirramento da concorrência e à manutenção da cadeia produtiva interna; as vantagens
de custo, o aproveitamento de oportunidades de demanda e as estratégias
intracorporação, o que afeta a organização geográfica da produção, dada a maior
flexibilidade do padrão produtivo; a gestão do grau de utilização da capacidade; o
padrão de especialização da produção; e a articulação e complementaridade regional da
produção.
Na segunda seção, analisa-se a estrutura recente da oferta do setor
automobilístico no mundo e no Brasil, ressaltando a evolução dos principais mercados
produtores e das empresas líderes. Destacam-se o forte incremento da produção mundial
(mais de 80 mil unidades produzidas em 2011) e uma mudança de caráter estrutural na
localização da produção ao longo da última década, com o deslocamento de parcela
significativa das atividades produtivas para economias emergentes, sobretudo asiáticas.
Além disso, evidencia-se um processo de estagnação da produção das companhias
americanas concomitante à forte expansão de montadoras asiáticas em âmbito mundial
nos anos 2000.
Mostra-se que a estrutura de oferta no Brasil também se alterou bastante nos
últimos anos. A produção de veículos no país dobrou entre 2000 e 2011, com um forte
incremento a partir de 2003 e 2004. Embora bastante concentrada, a distribuição da
produção por montadora aponta para a consolidação de outras companhias, em especial
francesas e japonesas, no mercado produtivo doméstico. Com a instalação mais recente
de capacidade produtiva de outras montadoras no país, tais como a Hyundai, e a atração
de montadoras chinesas, a configuração e a concentração da produção do setor tendem a
se modificar ainda mais nos próximos anos.
Na terceira seção, discorre-se sobre a dinâmica recente da demanda mundial e
brasileira, em especial contrastando a forte expansão das economias emergentes e o
arrefecimento das economias centrais como principais mercados consumidores de
veículos. A China tornou-se o maior demandante de veículos, ultrapassando os Estados
Unidos em 2009. Brasil e Índia também apresentaram elevado crescimento e se
firmaram entre os maiores consumidores, ao passo que Japão e Alemanha, tradicionais
mercados de veículos, encolheram.
4
No Brasil, a trajetória ascendente das vendas, que vinha ocorrendo desde 2005,
foi reforçada a partir dos estímulos governamentais para enfrentar a crise,
particularmente por meio da redução das alíquotas do Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) e da expansão da concessão de crédito. Durante a fase de
expansão do mercado interno, também se verificou um processo de fortalecimento de
outras montadoras para além das quatro principais empresas (Fiat, Volkswagen, General
Motors e Ford), que tradicionalmente concentram a maior parcela de mercado no país.
No entanto, para suprir a demanda doméstica em expansão, também houve um forte
incremento do volume importado, condicionado pelas estratégias das corporações em
redirecionar sua produção de outras localidades para aproveitar as oportunidades de um
mercado em crescimento, o que é ressaltado na seção anterior sobre a estrutura de oferta
brasileira.
Essa dinâmica acentuou-se diante do contexto recente de crise, em que o rápido
reaquecimento da demanda doméstica se traduziu em impulso maior à oferta externa do
que fortalecimento dos encadeamentos produtivos domésticos. Além disso, houve um
aumento das remessas de lucros e dividendos em relação aos investimentos externos por
parte das corporações. Tais constatações verificaram-se ainda em um cenário de elevado
grau de utilização da capacidade instalada do setor no Brasil. Isso indica para um baixo
comprometimento das empresas com a base produtiva no país, sobretudo porque
utilizaram em alguma medida a capacidade ociosa em outras localidades para atender ao
mercado brasileiro e transferiram parte da renda ou do lucro gerados domesticamente
para o caixa da matriz, quando de nítidas oportunidades de converter esse capital em um
volume de novos investimentos muito superior ao efetuado e fortalecer a estrutura
produtiva e de inovação brasileira.
Na quarta seção, realiza-se uma discussão acerca da dimensão e dinâmica
recente do mercado de caminhões e ônibus no Brasil. Toda a discussão precedente
envolve a indústria automobilística como um todo, de veículos leves a pesados. Porém,
dada a participação relativa maior de veículos leves no volume de produção e vendas de
autoveículos, a evolução do consolidado total tende a refletir a dinâmica desse
segmento. Em razão da importância na matriz de transporte brasileira, inserem-se,
portanto, algumas notas sobre os segmentos de caminhões e ônibus. Salientam-se: a
forte expansão das vendas e sobretudo da produção no país na última década; sua
representatividade relativamente baixa no setor automobilístico em geral; a condição de
ofertante líquido que caracteriza o país; e o baixo e geralmente declinante coeficiente de
5
importados nas vendas, indicando que a forte elevação do coeficiente para o setor como
um todo nos últimos anos, em particular diante da crise, refletiu especialmente a
dinâmica do segmento de veículos leves, cuja expansão da demanda foi em grande
medida suprida por oferta externa. Isso, no entanto, não afasta a preocupação em relação
ao conteúdo nacional envolvido na fabricação de novas unidades domesticamente, uma
vez que, embora possa não haver uma substituição de oferta nacional por oferta externa
em termos de bens finais nesses segmentos, isso não impede a utilização crescente de
insumos importados e, logo, o enfraquecimento da cadeia produtiva doméstica.
Sublinham-se adicionalmente as principais medidas governamentais de apoio a esses
segmentos.
A partir das considerações precedentes, na quinta seção, exploram-se o
direcionamento recente dado ao padrão tecnológico em escala global pelas montadoras
e as perspectivas em relação à evolução da demanda por veículos híbridos, que já são
uma realidade, e veículos elétricos, que têm grandes possibilidades de expansão.
Destaca-se a importância que terá a China na determinação da trajetória tecnológica
dominante e na velocidade de implementação das novas tecnologias. Avalia-se ainda a
situação brasileira nesse processo. Ressalta-se a consolidação das vendas de veículos
leves com tecnologia bicombustível no mercado nacional, o que reforça a oportunidade
de o país se fortalecer na geração de tecnologias sustentáveis em um cenário mundial de
busca crescente por matrizes energéticas alternativas. Salientam-se, porém, os desafios
colocados a partir do posicionamento chinês, bem como da baixa participação no país
dos principais desenvolvedores das novas tecnologias, com exceção da General Motors.
Na sexta seção, retomam-se os atributos de competitividade do setor
automobilístico, identificando os principais desafios e oportunidades no Brasil. Dentre
os principais desafios, destacam-se: o volume ainda baixo de gastos em P&D pelas
empresas e o desenvolvimento restrito de tecnologias e produtos em âmbito doméstico,
além das poucas linhas governamentais de fomento à inovação; o comportamento
volátil e apreciado da taxa de câmbio, favorecendo importações de bens finais e
insumos, ameaçando os elos da cadeia produtiva e prejudicando decisões de
investimento; a ausência de um sistema financeiro nacional com instituições privadas
para financiamento do investimento; o acirramento da concorrência interna e a
manutenção da cadeia produtiva doméstica com a entrada de novos players ou mesmo a
ampliação e redirecionamento da oferta externa no curto prazo de montadoras em outras
localidades para suprir a expansão da demanda doméstica; a concorrência chinesa e
6
indiana em veículos de menor porte; e a possibilidade de rápido reposicionamento
geográfico da produção na ausência de uma estrutura de proteção adequada.
Dentre as principais oportunidades, destacam-se: o aperfeiçoamento da
tecnologia bicombustível em termos de eficiência energética e emissão de poluentes; o
processo de redução da taxa de juros ao longo dos últimos anos e a melhoria das
condições de financiamento atreladas tanto a novos investimentos como à
comercialização de veículos; os efeitos de desonerações tributárias sobre as vendas de
veículos; as exigências (ainda que limitadas) de produção com conteúdo nacional e
desenvolvimento tecnológico doméstico para empresas instaladas no país e novos
entrantes a partir do novo regime automotivo; o anúncio de planos de investimento para
criação ou ampliação de capacidade produtiva no país nos próximos anos por algumas
montadoras; o alinhamento do padrão produtivo especializado em veículos de menor
porte com a orientação mais ampla da demanda mundial por veículos compactos e
subcompactos; e a possibilidade de exportações a partir dos novos investimentos, dada a
complementaridade regional.
Na última seção, examinam-se as políticas atuais de apoio ao setor
automobilístico, em especial a de redução das alíquotas do IPI diante da crise
econômica internacional e o estabelecimento do novo regime automotivo (Inovar-Auto),
além de se discutir diretrizes para a ampliação da capacidade de inovação do setor no
Brasil. A política de redução do IPI mostrou-se importante na retomada da demanda por
veículos no decorrer da crise, enquanto o novo regime automotivo revela avanços de
política, ainda que limitados, para o setor acerca da atuação das montadoras em
território nacional. O programa, no entanto, poderia se mostrar mais ambicioso no
quesito de fomento à inovação e engajamento do país nas novas trajetórias tecnológicas,
ao aplicar exigências maiores às empresas no sentido de ampliar os gastos em pesquisa
e desenvolvimento (P&D) domesticamente, conforme padrão de gastos das corporações
em âmbito global, e promover maior direcionamento desses recursos às tecnologias de
ponta, sobretudo contemplando veículos elétricos.
É
necessária
ainda
a
coordenação
entre
os
estímulos
setoriais
e
macroeconômicos, além de iniciativas com o objetivo de fomentar o processo de
inovação tecnológica no contexto doméstico. Pode-se sustentar assim uma trajetória de
crescimento
do
setor
com
impactos
positivos
sobre
a
cadeia
produtiva
concomitantemente ao aproveitamento por parte das empresas do potencial de demanda
interna por veículos. Seguem as considerações finais do estudo.
7
1. Características econômicas do setor automobilístico
O setor automobilístico apresenta grande importância econômica e setorial em
razão de seu forte encadeamento com outros setores na cadeia produtiva. De acordo
com dados da Anfavea (2012), o setor no Brasil (incluindo o segmento de autopeças)
respondeu por 21% do Produto Interno Bruto (PIB) industrial e 5% do PIB total em
2011. Gerou um faturamento de US$121,3 bilhões e uma arrecadação tributária (no caso
apenas de autoveículos) de US$31,4 bilhões naquele ano. Além disso, emprega direta e
indiretamente mais de 1,5 milhão de pessoas e possui uma capacidade instalada de 4,3
milhões de autoveículos por ano com um montante de investimentos realizados de
US$61 bilhões entre 1994 e 2011 (incluindo autopeças).
O setor automobilístico caracteriza-se, ademais, por ampla internacionalização e
descentralização produtiva com relevante participação dos fornecedores nas linhas de
montagem, o que contribui para a configuração do padrão produtivo e concorrencial. É
um setor bastante concentrado, marcado por fusões e aquisições (F&A) e formação de
alianças estratégicas e no qual se observa uma concorrência sobretudo via diferenciação
de produto, além de um contínuo processo de geração de novas tecnologias (CASOTTI;
GOLDENSTEIN, 2008). Entretanto, apesar das elevadas barreiras à entrada, isso não
significa a impossibilidade de emergência e consolidação de novos players, haja vista o
poder de mercado conquistado pelas empresas japonesas e sul-coreanas e a recente
ascensão de concorrentes chineses. Nesta seção, analisam-se esses tópicos, enfatizandose os padrões de concorrência, os padrões de organização da cadeia produtiva e os
atributos de competitividade do setor.
a. Padrões de concorrência
O setor automobilístico apresenta uma estrutura de mercado oligopolista, em que
um número relativamente pequeno de grandes corporações com escala mundial
responde pela maior parcela da produção e vendas totais e tem poder de mercado para
estabelecer o preço final dos bens. Dentro dessa estrutura de mercado concentrada,
reforçada por movimentos frequentes de fusões e aquisições, a concorrência ocorre
principalmente por meio da diferenciação de produto, que se traduz na criação de nichos
de mercado e na busca constante por melhorias de qualidade, a fim de assegurar e/ou
ampliar participação de mercado.
Nesse aspecto cumpre papel decisivo a dinâmica de inovação do setor, uma vez
que é a partir de inovações de produto e também de processo (produtivo e
8
organizacional) que as corporações procuram manter ou criar vantagens competitivas
que lhes permitam ostentar sua posição de mercado ou expandir-se para outros
mercados, isto é, diversificar-se. Destacam-se, por exemplo, pelo lado do
desenvolvimento de produtos, a diferenciação por meio de design e a incorporação de
novas tecnologias (relativas à motorização, matriz energética, eletrônica embarcada,
etc.), o que se reflete em elevados gastos com pesquisa e desenvolvimento e o
estabelecimento de parcerias entre empresas no desenvolvimento de melhorias a serem
utilizadas em conjunto. Pelo lado da organização do processo produtivo, pode-se
mencionar a emergência do método de produção enxuta, que possibilitou maior
flexibilidade da produção em comparação ao método de produção rígida.
Apesar das elevadas barreiras à entrada no setor, associadas às economias de
escala e de escopo existentes e aos volumes de capital necessários para incorporar a
tecnologia de produção, isso não impossibilita a emergência de novos concorrentes.
Assim como grupos japoneses e sul-coreanos entraram no mercado internacional a
partir da década de 1980 e se consolidaram no período mais recente dentre as principais
montadoras globais, corporações chinesas e indianas configuram-se atualmente como
importantes players em âmbito mundial. A fim de conquistar inicialmente maior parcela
de mercado, tais corporações tendem a adotar a curto prazo uma estratégia de
concorrência via preços para posteriormente, como estratégia de médio e longo prazo,
fortalecer a marca e a imagem de produtos de qualidade. Portanto, ao acirrar a dinâmica
concorrencial no setor, a ascensão desses novos players exige o reposicionamento dos
grupos estabelecidos, reiterando a importância do processo inovador para assegurar
competitividade e garantir posição de mercado diante de uma estrutura concentrada.
b. Padrões de organização da cadeia produtiva
A estrutura de organização da cadeia produtiva do setor apresenta um caráter
sobretudo horizontal e modular, com a participação de fornecedores nas linhas de
produção das montadoras. Esse arranjo é condizente com as transformações nos padrões
produtivos, particularmente a partir da passagem do modo de produção rígida (ou
“fordista”) para o modo de produção enxuta (ou “toyotista”).
Em contraposição ao modelo de produção rígida, característico das empresas
americanas desde o início do século XX até as décadas de 1970 e 1980, o modelo de
produção enxuta, desenvolvido pelas empresas japonesas, está assentado em uma
estrutura organizacional das empresas menos verticalizada e hierarquizada, o que
9
permite maior flexibilidade da produção em resposta às variações de demanda. Isso
ocorre mediante a fragmentação da produção e o processo de subcontratação, isto é, a
subdivisão da produção, com maior participação dos fornecedores de partes, peças e
componentes, responsáveis por determinadas etapas, na linha de montagem,
dinamizando o processo produtivo e inovativo (CEPAL, 2004).
Essa reconfiguração da organização da produção é compatível com os
movimentos de formação de redes globais ou regionais de produção e de rearticulação e
descentralização das etapas produtivas promovidos pelas grandes corporações em
âmbito mundial a partir da década de 1980 em busca das vantagens oferecidas pelas
diversas economias diante de seus processos de abertura econômica. “Com a formação
de um sistema de produção na forma de redes que abarca, além da matriz, as filiais com
plantas produtivas ou representações comerciais espalhadas em vários países, passou a
existir um maior grau de articulação e de integração dentro da corporação,
intensificando os fluxos produtivos, financeiros e tecnológicos” (SARTI, 2002, p. 28).
Frente ao avanço das montadoras japonesas, inclusive nos Estados Unidos, e no
bojo de um forte processo de internacionalização produtiva em busca de mercados, as
companhias
americanas
e
europeias
direcionaram
suas
estratégias
para
a
“modularização” da produção. Isso significava reduzir o grau de verticalização dessas
corporações, por meio de maior especialização e subcontratação, de modo que
determinados grupos de fornecedores eram responsáveis pelo suprimento de módulos
que compõem o veículo. Em geral, há grupos de fornecedores que atendem direta
(Tier 1) ou indiretamente (Tier 2 em diante) as demandas por partes e peças das
montadoras.
Essa tendência intensificou-se principalmente ao longo da década de 1990, sob a
existência de uma rede global de fornecedores. Com a maior participação de
fornecedores e sistemistas diretamente na produção, promoveu-se maior integração
entre toda a cadeia produtiva em âmbito internacional, motivada também pelo
estabelecimento de mais alianças estratégicas entre as montadoras, sobretudo no
desenvolvimento de produtos, componentes e novas tecnologias (FREYSSENET;
LUNG, 1999). A fim de reduzir custos e incrementar a competitividade, elas também
passaram, em meio a esse processo, a adotar estratégias de utilizar componentes e
plataformas comuns à produção de diferentes veículos (platform strategy ou
commonalization).
10
A constituição de redes de produção mais horizontais e modulares permitiu uma
expansão geográfica das atividades produtivas, condicionada aos processos de
regulamentação governamental em escala nacional ou regional e uma rearticulação
operacional para atender diversos mercados a depender das estratégias competitivas das
corporações. A cadeia produtiva tornou-se, portanto, mais integrada em âmbito mundial,
intensificando ao longo da cadeia os fluxos comerciais e de capital entre os países.
c. Atributos de competitividade
Elencam-se, nesta seção, os principais atributos de competitividade do setor.
Tais pontos se entrelaçam sob distintas formas e são resgatados adiante na análise sobre
os desafios e oportunidades atinentes ao setor no Brasil.
d. Capacidade de inovação
Está atrelada aos elevados volumes de investimento em pesquisa e
desenvolvimento (P&D) no setor para a elaboração e a introdução de novos produtos e
novas tecnologias que, por sua vez, constituem-se de fatores dinâmicos decisivos para a
competitividade e o crescimento das empresas dentro do ambiente concorrencial do
setor. Dada a complexidade envolvida na fabricação de um veículo e em sua
composição (partes, peças e componentes), o setor constitui um importante núcleo de
promoção e absorção de tecnologia. Cada vez mais, incorporam-se aos veículos e aos
métodos de produção os avanços nas áreas de eletrônica e tecnologias de informação e
comunicação. Isso se manifesta na crescente utilização de eletrônica embarcada nos
sistemas automotivos, que controla inúmeras funções do veículo, tais como aceleração,
frenagem, tração, estabilidade, injeção eletrônica, sistemas de combustão, dirigibilidade,
segurança, navegação, telemática, entretenimento, etc. (CARVALHO, 2008; BORGHI,
2011). Ou seja, há uma crescente integração entre os avanços tecnológicos do setor
automobilístico e os de outros setores.
Como ponto central na discussão sobre novas tecnologias do setor, encontra-se o
recente direcionamento para fomentar e desenvolver veículos baseados em formas
alternativas de propulsão que sejam eficientes, mais econômicas no consumo de
combustível e menos nocivas ao ambiente. Destacam-se, por exemplo, os veículos
bicombustíveis, híbridos, elétricos e com célula de combustível. Isso coloca em debate
os desdobramentos futuros para o setor e para os países a partir da adoção de uma nova
matriz energética. Cumprem papel decisivo no estabelecimento e financiamento de uma
11
nova trajetória tecnológica a orientação governamental e seus auxílios financeiros para
atividades inovadoras, além de sua atuação na regulamentação do setor (mediante, por
exemplo, normas para segurança e emissão de poluentes).
e. Regime macroeconômico
Desempenha papel central na dinâmica produtiva e de investimento, afetando
diretamente a competitividade do setor por meio das principais variáveis
macroeconômicas. Três fatores são essenciais para o processo competitivo, a saber, a
taxa de câmbio, a taxa de juros e o regime tributário. Em relação à taxa de câmbio,
destacam-se tanto seu nível (tendência de apreciação ou depreciação) como seu grau de
volatilidade, uma vez que impactam as decisões de como suprir a demanda interna (com
maior ou menor participação de oferta externa via importações tanto de bens finais
como de insumos/autopeças), bem como as decisões futuras de criação ou ampliação de
capacidade produtiva. Em relação à taxa de juros, sua evolução condiciona as
modalidades de financiamento, seja para investimento, seja para aquisição de veículos.
O regime tributário, por sua vez, é importante em duas direções: por um lado, na
incidência de impostos e contribuições sobre as empresas do setor, que pode implicar
menor propensão a investir no país; por outro, no repasse de desonerações tributárias
sobre bens do setor para os preços e seus impactos sobre as vendas, dada a
elasticidade-preço da demanda.
f. Padrão de financiamento
Refere-se não apenas às condições de financiamento atreladas a novos
investimentos e à comercialização de veículos em termos de volume de crédito, taxas de
juros e prazos de pagamento, mas também às formas de financiamento, particularmente
de novos investimentos. Neste caso, destacam-se o autofinanciamento pelas próprias
filiais, os empréstimos das matrizes, o crédito bancário, a emissão de ações ou títulos de
dívida nos mercados de capitais e a captação de recursos públicos mediante, por
exemplo, bancos de desenvolvimento.
g. Estrutura de proteção
Trata-se do regime praticado em âmbito doméstico que condiciona a dinâmica
interna-externa do setor no país, especialmente no que tange à entrada de novos players,
ao acirramento da concorrência e à manutenção da cadeia produtiva interna (desde
12
veículos até autopeças, o que se relaciona ao grau de conteúdo local ou regional da
produção). Destacam-se, nesse sentido, como fatores preponderantes, o regime
tributário (ponto 2), a taxa de câmbio (ponto 2) e os acordos comerciais (ponto 8).
O regime tributário atua em duas principais vertentes: por um lado, em termos
de benefícios fiscais para a instalação de novas fábricas, especialmente de novos
entrantes no mercado nacional; e, por outro, em termos da tributação incidente sobre
bens finais ou insumos importados. A taxa de câmbio influencia, conforme mencionado
anteriormente, o suprimento da demanda via oferta externa, bem como as decisões de
investir, incluindo não apenas eventuais importações para a concretização do
investimento, mas também possibilidades de exportação que devem ser incluídas no
planejamento de uma decisão de gerar nova capacidade produtiva. Essa dinâmica
também depende dos acordos comerciais existentes entre os países, que podem facilitar
os fluxos comerciais entre eles, isentando-os, por exemplo, de tarifas de importação.
h. Vantagens de custo, oportunidades de demanda e estratégias intracorporação
Esse atributo centra-se nas estratégias intracorporação e nos arranjos geográficos
da produção decorrentes a partir de oportunidades de demanda e de redução de custos
em distintos países, dada a maior flexibilidade do padrão produtivo. Está diretamente
vinculado à estrutura doméstica de proteção (ponto 4) e eventual complementaridade
regional (ponto 8). Ou seja, haja vista a maior mobilidade dos fluxos de capitais e bens
em escala global e a maior flexibilidade de realizar alterações no arranjo produtivo
dentro de uma estratégia coordenada e integrada no âmbito da corporação,
oportunidades de demanda em expansão e/ou vantagens de custo em determinadas
regiões podem alterar a organização geográfica da produção, tanto a curto prazo (apenas
ajustes temporários na produção via fluxos comerciais) quanto a médio e longo prazo
(quando da realização de novos investimentos em determinados mercados).
i. Gestão do grau de utilização da capacidade
Atrelada aos pontos 2, 4 e 5, a gestão do grau de utilização da capacidade
produtiva é um condicionante competitivo adicional, sobretudo por se tratar de um setor
que tende a apresentar capacidade ociosa planejada. Isso permite realizar ajustes
temporários na produção para atender demanda em expansão ou aproveitar vantagens de
custo em determinadas localidades, sob a lógica discutida no ponto 5.
13
j. Padrão de especialização da produção
Vincula-se ao tipo ou porte de veículo produzido no país e o consequente arranjo
produtivo para atender esse padrão de especialização da produção, que pode ser
reforçado a partir da existência de articulação e complementaridade regional (ponto 8).
Essa orientação a respeito de um padrão de especialização torna-se particularmente
relevante no contexto atual do direcionamento mais amplo da demanda por veículos
compactos e subcompactos em diversas economias, além de energeticamente eficientes,
econômicos em combustível e menos poluentes (ponto 1).
l. Articulação e complementaridade regional
A existência de articulação e complementaridade regional da produção, expressa
em acordos de comércio ou investimento sobretudo entre países geograficamente
próximos, condiciona a dinâmica competitiva no setor ao influenciar seja a conformação
de uma estrutura de proteção (ponto 4), seja a estratégia intracorporação de alocação
geográfica da produção (ponto 5), seja o padrão de especialização da produção de um
país dado o estabelecimento de regimes com outros parceiros (ponto 7). Torna-se,
portanto, fundamental na compreensão da dinâmica produtiva e de investimentos
conduzida pelas empresas em âmbito local e regional.
2. Estrutura recente da oferta
Nesta seção, apresenta-se a estrutura de oferta mundial do setor automobilístico
em termos de distribuição geográfica e empresas líderes. Aos indicadores de produção
adicionam-se análises sobre investimento e comércio. Discute-se, ademais, como está
estruturada a oferta no Brasil, avaliando principais players, comércio, investimento e
utilização da capacidade instalada do setor.
a. No mundo
A estrutura de oferta mundial do setor automobilístico modificou-se muito nos
últimos anos. Conforme mencionado anteriormente, houve um processo de
reconfiguração da organização da produção compatível com os movimentos de
formação de redes globais ou regionais de produção e de rearticulação e
descentralização das etapas produtivas em âmbito mundial. A Tabela 1 aponta para um
forte incremento da produção mundial de veículos (cerca de 58 milhões de unidades em
2000 e mais de 80 milhões de unidades em 2011) e um deslocamento da produção na
14
última década em direção às economias emergentes, sobretudo asiáticas. Tem-se de um
lado um processo de estagnação da produção nas economias centrais – particularmente
na Tríade (Estados Unidos, Europa3 e Japão) – e de outro um forte movimento de
expansão produtiva nas economias emergentes. Ressalta-se o ganho de importância dos
BRICs na produção mundial, em especial de China, Índia e Brasil. Trata-se de uma
mudança estrutural recente e importante na configuração geográfica da produção do
setor4.
Tabela 1 – Produção mundial de veículos por região/país, 2000, 2010 e 2011
(em unidades)
Europa
União Europeia (27 países)
União Europeia (15 países)
União Europeia (novos membros)
Outros Europa (incluída a Turquia)
América
Nafta
México
EUA
América do Sul
Brasil
Ásia-Oceania
China
Japão
África
Total
Memo:
BRICs
Brasil
Rússia
Índia
China
2000
2010
20.275.343
19.775.057
17.698.614
1.934.927
12.799.857
2.076.443
1.671.093
17.928.025
2.069.069
10.144.347
317.132
58.295.557
19.891.258
17.107.350
13.825.846
3.281.504
2.783.908
16.367.398
12.173.015
2.342.282
7.762.544
4.194.383
3.381.728
40.930.255
18.264.761
9.628.920
515.076
77.703.987
5.738.936 26.606.806
1.671.093
3.381.728
1.202.589
1.403.244
796.185
3.557.073
2.069.069 18.264.761
Variação 2000- Contribuição
2010 (%)
2000-2010 (%)
-1,9
-2,0
-17,2
-17,6
-31,2
-28,5
21,1
2,1
-39,4
-26,0
102,0
10,9
102,4
8,8
128,3
118,5
782,8
83,4
-5,1
-2,7
62,4
1,0
33,3
100,0
363,6
102,4
16,7
346,8
782,8
2011
21.190.207
17.707.126
14.309.332
3.397.794
3.483.081
17.786.518
13.468.490
2.680.037
8.653.560
4.318.028
3.406.150
40.574.202
18.418.876
8.398.654
556.637
80.107.564
107,5 27.739.579
8,8
3.406.150
1,0
1.988.036
14,2
3.926.517
83,4 18.418.876
Variação 2010- Contribuição
2011 (%)
2010-2011 (%)
6,5
54,0
3,5
25,0
3,5
20,1
3,5
4,8
25,1
29,1
8,7
59,0
10,6
53,9
14,4
14,1
11,5
37,1
2,9
5,1
0,7
1,0
-0,9
-14,8
0,8
6,4
-12,8
-51,2
8,1
1,7
3,1
100,0
4,3
0,7
41,7
10,4
0,8
47,1
1,0
24,3
15,4
6,4
Fonte: Elaboração própria. Dados Oica.
Essa mudança de caráter estrutural torna-se ainda mais explícita no Gráfico 1,
que apresenta as dez maiores economias produtoras de veículos no mundo em 2011. Ao
se comparar 2000 e 2011, observa-se uma queda absoluta da produção nos Estados
Unidos, Japão, Espanha e França. No caso da Alemanha, apesar do aumento absoluto na
produção de veículos, houve redução de sua participação relativa na produção mundial
do setor. Em contrapartida, a produção em mercados emergentes expandiu-se
significativamente em termos absolutos e relativos. O caso mais notório é o chinês, cuja
3
Cabe a ressalva de que mesmo dentro da Europa há movimentos contrastantes, visto que uma tendência
recente das corporações foi deslocar parte das atividades produtivas para o Leste Europeu, no qual
poderiam aproveitar sobretudo vantagens de custo em relação às economias da Europa Ocidental.
4
Vale frisar que, apesar de a comparação anual 2010-2011 sinalizar para uma retomada da produção nas
economias centrais, tais como os Estados Unidos – o que é relevante para a dinâmica do setor –, a
produção em tais economias foi fortemente abalada pela crise internacional eclodida a partir de 2008 e
ainda se encontra em fase de tentativa de recuperação.
15
produção passou de 2 milhões de unidades em 2000 para mais de 18 milhões de
unidades em 2011, elevando sua participação na produção mundial de 3,5% para quase
¼ do total no período e ultrapassando os EUA como maior produtor de veículos no
mundo. A produção absoluta no Brasil dobrou no período, passando de 1,7 milhão de
unidades em 2000 para 3,4 milhões de unidades produzidas em 2011, o que representou
um aumento de sua participação relativa na produção mundial de 2,9% para 4,3%.
Gráfico 1 – Produção dos principais países produtores de veículos no mundo em
2000 e 2011, ordenados com base na produção de 2011*
(unidades e % da produção mundial total)
China
23,0%
3,5%
10,8%
EUA
10,5%
Japão
22,0%
17,4%
7,9%
9,5%
Alemanha
Coreia do Sul
5,3%
Índia
4,9%
1,4%
Brasil
5,8%
2,9%
4,3%
3,3%
3,3%
México
2,9%
5,2%
Espanha
2,9%
5,7%
França
Outros
23,8%
0
5.000.000
10.000.000
2000
15.000.000
23,7%
20.000.000
2011
Fonte: Elaboração própria. Dados Oica.
* As barras expressam o número de unidades produzidas, mensurado no eixo inferior. Os valores em
frente às barras correspondem ao percentual da produção mundial total realizada pelo país em cada ano.
Como condicionantes desse deslocamento da produção para as economias
emergentes destacam-se: o tamanho de seus mercados consumidores e o forte potencial
de demanda em expansão; as vantagens de custo, desde matérias-primas até mão de
obra; a manutenção de proximidade com fornecedores; a constituição de plataformas de
exportação; e a promoção de integração regional da produção. É interessante notar
também se houve deslocamento da capacidade de produção. Apesar das limitações dos
dados – por exemplo, a categoria de veículos e outros equipamentos de transporte é
mais abrangente do que o setor em análise –, pode-se verificar, em linhas gerais, que o
fluxo de entrada de Investimento Direto Estrangeiro (IDE) do setor de veículos e outros
equipamentos de transporte em economias em desenvolvimento cresceu mais do que em
16
economias desenvolvidas, se comparados os períodos de meados da década de 2000 e
início da década de 1990, aumentando a participação das economias em
desenvolvimento no total do IDE recebido (Tabela 2).
Tabela 2 – Estoque interno, estoque externo, fluxo de entrada e fluxo de saída de
IDE, por setor e conjunto de países (US$ milhões)
Economias
desenvolvidas
Total
Estoque
Setor industrial
interno
Veículos e outros equip. de transporte
Total
Estoque
Setor industrial
externo
Veículos e outros equip. de transporte
1.579.483
640.572
46.976
1.765.278
769.479
58.300
Total
Fluxo de
Setor industrial
entrada
Veículos e outros equip. de transporte
Total
Fluxo de
Setor industrial
saída
Veículos e outros equip. de transporte
151.998
47.769
3.530
217.637
80.050
4.061
Economias em
Total
Economias
Economias em Sudeste Europeu e
Total
desenvolvimento mundial desenvolvidas desenvolvimento
CIS
mundial
1990
2007
362.632 1.942.116
11.583.162
3.816.510
297.204 15.696.876
158.026 798.598
3.251.613
916.814
77.407 4.245.834
8.226
55.202
317.231
51.088
1.721
370.039
20.306 1.785.584
14.277.765
1.909.575
19.884 16.207.225
7.217 776.696
4.051.964
163.876
1.603 4.217.443
10
58.310
627.266
1.547
11
628.823
1989-1991
2005-2007
34.551 186.549
1.060.084
367.294
43.886 1.471.264
16.081
63.849
232.141
113.850
7.192
353.183
328
3.859
5.914
2.263
330
8.507
6.142 223.779
1.332.782
140.901
270 1.473.953
3.494
83.543
335.135
24.414
98
359.647
4.061
29.033
170
1
29.204
Fonte: Elaboração própria. Dados da Unctad (2009) – World Investment Report.
Em relação ao fluxo de saída de IDE dessas economias no setor, o montante
ainda era pouco expressivo, de acordo com os dados disponíveis, o que dificulta a
mensuração da expansão dos novos players asiáticos de economias emergentes para
outros mercados. No entanto, vale sublinhar a intensificação do processo de fusões e
aquisições (F&A), já bastante típico na configuração do setor, nos anos mais recentes,
após a eclosão da crise internacional, com algumas companhias de economias
emergentes adquirindo marcas de grandes grupos. Pode-se mencionar, por exemplo, a
venda das marcas Jaguar e Land Rover pela Ford para a indiana Tata Motors em 2008 e
da Volvo também pela Ford para a chinesa Geely em 20105.
Uma análise complementar que contribui na caracterização da estrutura de oferta
do setor refere-se aos fluxos comerciais entre as economias. A Tabela 3 indica a
importância dos fluxos de exportação intrarregionais de produtos automotivos, reflexo
da constituição de sistemas produtivos com forte caráter regional, condicionados por
acordos comerciais e de investimento entre economias geograficamente próximas ou
pertencentes a blocos econômicos comuns. Destaca-se, em particular, a concentração
comercial no eixo europeu. Como principais exportadores mundiais de produtos
automotivos, apresentam-se a União Europeia, o Japão e os Estados Unidos (Tabela 4).
Como principais importadores, têm-se União Europeia e EUA, seguidos por Canadá e
China (Tabela 5).
5
Ver Borghi (2011) sobre os processos de reestruturação das corporações, sobretudo americanas, diante
da crise internacional.
17
Tabela 3 – Exportações de produtos automotivos de regiões selecionadas, por
destino (US$ bilhões e %)
Regiões
Mundo
Europa
Mundo
Europa
América do Norte
Ásia
África
CIS
Oriente Médio
América do Sul e Central
Ásia
Mundo
Ásia
América do Norte
Europa
Oriente Médio
África
América do Sul e Central
CIS
América do Norte
Mundo
América do Norte
Europa
Ásia
Oriente Médio
América do Sul e Central
África
CIS
Valor
Participação no total de
exportações da região
Participação no total das
exportações mundiais
2010
1.092,0
2005
100,0
2010
100,0
2005
100,0
559,4
409,6
50,8
43,5
17,9
15,7
11,8
9,5
100,0
78,4
4,3
10,2
1,6
2,3
2,0
0,9
100,0
73,2
9,1
7,8
3,2
2,8
2,1
1,7
54,9
43,0
2,4
5,6
0,9
1,3
1,1
0,5
51,2
37,5
4,7
4,0
1,6
1,4
1,1
0,9
277,2
88,4
75,5
38,5
30,1
18,1
14,0
12,3
100,0
24,3
38,1
19,4
7,6
3,6
3,8
3,1
100,0
31,9
27,2
13,9
10,9
6,5
5,1
4,4
21,2
5,2
8,1
4,1
1,6
0,8
0,8
0,7
205,5
156,6
13,1
13,0
9,9
8,8
3,1
1,0
100,0
83,4
3,5
6,8
2,3
2,8
0,7
0,4
100,0
76,2
6,4
6,3
4,8
4,3
1,5
0,5
20,6
17,2
0,7
1,4
0,5
0,6
0,2
0,1
Variação anual percentual
2010
2005-2010
100,0
3,5
2009
-31,5
2010
29,1
2,1
0,7
18,5
-3,3
16,8
6,2
3,4
15,0
-30,3
-28,7
-13,8
-36,5
-68,0
-14,5
-35,1
-34,5
17,6
9,7
70,6
36,7
73,6
10,8
16,8
69,5
25,4
8,1
6,9
3,5
2,8
1,7
1,3
1,1
7,3
13,3
0,3
0,3
15,2
20,8
13,8
15,5
-34,0
-14,0
-33,7
-38,2
-36,8
-36,5
-27,9
-79,8
45,3
49,4
37,0
32,3
45,5
78,9
25,7
136,4
18,8
14,3
1,2
1,2
0,9
0,8
0,3
0,1
1,7
-0,2
14,5
0,4
17,5
10,4
17,3
7,8
-31,7
-28,6
-22,7
-49,5
-31,3
-35,1
-28,6
-80,9
43,7
45,0
73,3
10,6
57,7
39,2
21,2
108,0
Fonte: Elaboração própria. Dados da OMC – International Trade Statistics 2011.
Tabela 4 – Principais exportadores de produtos automotivos (US$ bilhões e %)
União Europeia (27)
Japão
Estados Unidos
México
Coreia do Sul
Canadá
China
Tailândia
Turquia
Brasil
Argentina
Índia
África do Sul
Emirados Árabes Unidos
Taiwan
Total dos 15 acima
Valor
Participação nas exportações mundiais
Variação anual percentual
2010
1980
1990
2000
2010
2005-2010
2008
2009
2010
542,8
49,8
49,7
1,9
2,5
-30,3
17,7
149,5
19,8
20,8
15,3
13,7
4,0
7,7
-39,5
44,6
99,7
11,9
10,2
11,7
9,1
3,0
2,3
-34,9
37,3
55,6
0,3
1,4
5,3
5,1
9,4
1,5
-21,4
53,9
54,5
0,1
0,7
2,6
5,0
7,6
-1,3
-24,2
47,3
50,1
6,9
8,9
10,5
4,6
-5,6
-21,3
-34,0
46,7
28,0
0,0
0,1
0,3
2,6
23,0
24,3
-30,7
41,2
18,7
0,0
0,0
0,4
1,7
18,6
28,1
-28,0
60,1
13,8
0,0
0,0
0,3
1,3
8,0
14,7
-32,9
14,7
12,6
1,1
0,6
0,8
1,2
1,1
12,3
-42,0
47,7
8,1
0,1
0,1
0,4
0,7
21,5
21,4
-17,6
47,1
7,9
...
0,1
0,1
0,7
24,7
42,7
-1,5
65,4
6,7
0,1
0,1
0,3
0,6
9,0
44,1
-34,3
31,7
5,8
...
0,0
0,1
0,5
14,5
15,1
-10,1
3,4
4,9
...
0,3
0,4
0,4
4,9
1,7
-13,5
33,3
1.058,7
98,3
97,0
-
Fonte: Elaboração própria. Dados da OMC – International Trade Statistics 2011.
Tabela 5 – Principais importadores de produtos automotivos (US$ bilhões e %)
18
União Europeia (27)
Estados Unidos
Canadá
China
México
Rússia
Austrália
Brasil
Turquia
Arábia Saudita
Japão
Suíça
África do Sul
Emirados Árabes Unidos
Argentina
Total dos 15 acima
Valor
Participação nas importações mundiais
Variação anual percentual
2010
1980
1990
2000
2010
2005-2010
2008
2009
2010
422,8
42,4
38,0
0,2
-2,4
-29,2
8,2
189,8
20,3
24,7
29,4
17,1
-1,6
-9,8
-33,1
42,3
59,5
8,7
7,7
8,0
5,4
0,7
-8,6
-28,7
36,9
53,0
0,6
0,6
0,7
4,8
31,4
21,0
6,1
71,9
29,4
1,8
0,3
3,5
2,6
3,2
3,4
-29,7
37,3
26,2
0,4
2,4
16,5
44,1
-69,7
82,1
22,9
1,3
1,2
1,5
2,1
8,6
10,8
-30,2
51,7
17,7
0,3
0,2
0,7
1,6
30,2
58,1
-11,1
51,0
15,5
...
0,4
1,0
1,4
5,2
3,2
-30,7
47,3
14,7
2,7
0,9
0,7
1,3
8,3
3,6
-17,8
43,2
14,2
0,5
2,3
1,7
1,3
1,5
3,3
-36,9
41,4
11,7
1,8
1,9
1,1
1,1
7,1
15,6
-15,7
20,5
11,1
...
...
0,4
1,0
3,7
-7,9
-35,8
53,7
10,7
0,4
0,3
0,4
1,0
10,5
48,3
-49,1
23,9
10,6
0,6
0,1
0,5
1,0
19,5
33,5
-35,0
71,0
909,8
92,2
81,9
-
Fonte: Elaboração própria. Dados da OMC – International Trade Statistics 2011.
Nesse quadro de exportadores e importadores, é interessante notar a evolução da
participação brasileira nos respectivos fluxos mundiais ao longo das décadas. No dado
mais recente, para 2010, o Brasil apresentava um volume de importações (US$17,7
bilhões) muito superior ao de exportações (US$12,6 bilhões), o que se explica por um
lado pelo dinamismo do mercado interno e por condições macroeconômicas favoráveis
às importações, como taxa de câmbio apreciada; e por outro pelo arrefecimento de
outras economias para as quais o país poderia exportar.
Além disso, pode-se observar que, enquanto a participação nas exportações
mundiais de produtos automotivos retornou em 2010 ao patamar semelhante ao de
1980, após um período de menor peso relativo, a participação nas importações mundiais
tendeu a crescer, particularmente de maneira mais acentuada na última década. Essa
dinâmica, reforçada pelos dados de variação anual das exportações e importações,
aponta para desafios com os quais o país deve lidar para manter um setor competitivo e
com forte participação e encadeamento da produção nacional.
Por fim, cabe analisar a estrutura de oferta do setor automobilístico no mundo
sob a perspectiva das corporações. Constata-se a partir da Tabela 6 que a produção,
além
de
concentrada
geograficamente
como
sinalizado
anteriormente,
é
majoritariamente controlada por um número relativamente pequeno de grandes grupos.
A participação de mercado dos seis maiores produtores superou 50% em 2011.
Destacam-se, ademais, as diversas modificações nas estruturas patrimoniais dos
grupos ao longo da última década e distintas trajetórias de crescimento que se
expressam nas diferentes participações de mercado. Indubitavelmente, a aliança
estratégica em forma de fusão mais importante no setor nos últimos anos foi a
constituição do grupo DaimlerChrysler entre 1998 e 2007. Muitos dos demais grupos
também adquiriram ou se desfizeram de marcas ao longo do período, do que se deve
enfatizar o movimento mais recente, sobretudo das corporações americanas, de
19
concentrar suas atividades em algumas marcas principais e vender alguns ativos diante
da crise e do consequente agravamento de sua situação de fragilidade financeira.
Os dados de produção por montadora mostram a estagnação ou mesmo retração
do volume produzido por companhias americanas e uma forte expansão de montadoras
asiáticas ao longo da década de 2000. Sobressaem a consolidação das empresas
japonesas como ofertantes globais – com destaque para a Toyota, que se tornou a maior
montadora mundial em 2008, ultrapassando a GM, ainda que tenha perdido o posto em
2011 para GM e Volkswagen em decorrência do terremoto no Japão e seu impacto
sobre a produção e a rede de fornecedores, que se encontram concentrados no país – e a
forte expansão da sul-coreana Hyundai, que alcançou a quarta posição entre os
fabricantes mundiais em 2011. Não se pode esquecer, ainda, a emergência mais recente
de outras montadoras asiáticas, chinesas e indianas, em particular – vide crescimento e
parcela de mercado da Tata Motors, por exemplo –, como importantes players, que,
embora em um movimento incipiente e explorando nichos de mercado, tendem a se
fortalecer no cenário global e acirrar a concorrência no setor, sobretudo no segmento de
veículos compactos e subcompactos, para o qual há um forte direcionamento da
demanda.
Tabela 6 – Produção mundial de veículos por montadora (ranking das 20 maiores
empresas de acordo com a produção de 2010), 2000, 2010 e 2011 (unidades)
2000
Toyota
General Motors
Volkswagen
Hyundai
Ford
Nissan
Honda
PSA
Suzuki
Renault
Fiat
Daimler*
Chrysler*
BMW
Mazda
Mitsubishi
Chana Automobile**
Tata
Faw**
Geely
Outros***
Total
2010
5.954.723
8.557.351
8.133.375
8.476.192
5.106.749
7.341.065
2.488.321
5.764.918
7.322.951
4.988.031
2.628.783
3.982.162
2.505.256
3.643.057
2.879.422
3.605.524
1.457.056
2.892.945
2.514.897
2.716.286
2.641.444
2.410.021
2.333.320
1.940.465
2.333.320
1.578.488
834.628
1.481.253
925.876
1.307.540
1.827.186
1.174.383
1.102.683
193.580
1.011.343
896.060
802.319
6.311.489 12.071.776
58.392.376 77.743.862
Variação 20002010 (%)
43,7
4,2
43,8
131,7
-31,9
51,5
45,4
25,2
98,5
8,0
-8,8
-16,8
-32,4
77,5
41,2
-35,7
422,4
91,3
33,1
Participação de Participação de
Participação de
Variação 2010mercado 2000 mercado 2010
2011
mercado 2011
2011 (%)
(%)
(%)
(%)
10,2
11,0
8.050.181
-5,9
10,2
13,9
10,9
9.146.340
7,9
11,6
8,7
9,4
8.157.058
11,1
10,4
4,3
7,4
6.616.858
14,8
8,4
12,5
6,4
4.873.450
-2,3
6,2
4,5
5,1
4.631.673
16,3
5,9
4,3
4,7
2.909.016
-20,1
3,7
4,9
4,6
3.582.410
-0,6
4,5
2,5
3,7
2.725.899
-5,8
3,5
4,3
3,5
2.825.089
4,0
3,6
4,5
3,1
2.399.825
-0,4
3,0
4,0
2,5
1.528.008
-21,3
1,9
4,0
2,0
2.004.514
27,0
2,5
1,4
1,9
1.738.160
17,3
2,2
1,6
1,7
1.165.591
-10,9
1,5
3,1
1,5
1.140.282
-2,9
1,4
1,4
681.719
-38,2
0,9
0,3
1,3
1.061.229
4,9
1,3
1,2
621.271
-30,7
0,8
1,0
902.824
12,5
1,1
10,8
15,5 12.038.086
-0,3
15,3
100,0
100,0 78.799.483
1,4
100,0
Fonte: Elaboração própria. Dados Oica.
* Produção da DaimlerChrysler em 2000 = 4.666.640 unidades. Na tabela, produção rateada entre as
empresas em igual proporção (50%) no referido ano. Fusão entre 1998 e 2007.
** Produção apenas do grupo nacional. Não inclui a produção decorrente das joint ventures dessas
companhias com montadoras estrangeiras.
*** Em 2000, inclui unidades produzidas pelas empresas chinesas mencionadas na tabela, cujos valores
não são apresentados discriminadamente no referido ano.
20
b. No Brasil
Engajada nas transformações produtivas globais conduzidas pelas grandes
corporações que lideram o setor automobilístico, a estrutura de oferta no Brasil também
se alterou bastante nos últimos anos. Destacam-se a expansão da produção ao longo da
década, a dinâmica de comércio exterior, a consolidação de novos players na produção
nacional (japoneses e franceses, sobretudo) e os ciclos de investimento.
Conforme ressaltado anteriormente, a produção de veículos no país dobrou entre
2000 e 2011, com um forte incremento a partir de 2003 e 2004. Nesses anos, a produção
respondeu especialmente a um incremento das exportações. O coeficiente exportado da
produção alcançou 32,7% em 2004 e 35,4% em 2005, a partir de quando passou a
declinar (Tabela 7).
Nos anos subsequentes, porém, é mais nítido um aquecimento da demanda
interna, que tem puxado a produção, de modo que a diferença entre produção e vendas
internas se afunilou e parte crescente das vendas domésticas passou a ser suprida por
importações. O coeficiente de importados nas vendas, que havia atingido 3,9% em
2004, mostrou forte elevação a partir de então, sendo beneficiado pelas condições de
expansão do mercado interno e o câmbio fortemente apreciado (Tabela 7).
Tabela 7 – Produção e vendas de autoveículos no Brasil, 2000-2011 (unidades)
Produção
Vendas internas
Vendas externas
Importações
% Exportações na produção
% Importações nas vendas internas
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
1.691.240 1.817.116 1.791.530 1.827.791 2.317.227 2.530.840 2.612.329 2.980.166 3.216.381 3.183.482 3.646.548 3.432.616
1.489.481 1.601.282 1.478.621 1.428.610 1.578.775 1.714.644 1.927.738 2.462.728 2.820.350 3.141.240 3.515.064 3.633.248
371.299 390.854 424.415 535.980 758.787 897.144 841.816 789.371 734.583 475.325 767.432 578.728
174.178 178.316 115.244
73.803
61.722
87.961 142.366 277.083 375.150 488.874 660.256 857.901
22,0
21,5
23,7
29,3
32,7
35,4
32,2
26,5
22,8
14,9
21,0
16,9
11,7
11,1
7,8
5,2
3,9
5,1
7,4
11,3
13,3
15,6
18,8
23,6
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
Essa dinâmica de substituição de oferta nacional de bens finais e insumos por
oferta externa agravou-se a partir da crise. Apesar da retomada parcial das exportações,
o ritmo de aumento das importações foi mais acentuado, ampliando o déficit comercial
tanto de autoveículos (desde 2009) como de autopeças (desde 2008) e apontando para a
estratégia adotada pelas corporações de suprir crescentemente por meio de oferta
externa o rápido reaquecimento da demanda doméstica (Gráfico 2). Em 2011, o
coeficiente de veículos importados alcançou 23,6% das vendas (Tabela 7).
Não bastasse a dinâmica deletéria de oferta externa sobre o desenvolvimento
industrial doméstico, as corporações do setor com filiais no país acabaram por adotar
uma estratégia de remeter às suas matrizes no exterior grande parcela das rendas obtidas
21
no mercado brasileiro, sobretudo diante do cenário de crise internacional, de modo a
cobrir, ao menos em parte, os prejuízos alhures com os recursos de mercados em
expansão. O Gráfico 3 retrata nitidamente esse movimento no caso da indústria
automobilística brasileira, com montantes de remessas de lucros e dividendos que
poderiam ser reinvestidos no país bastante superiores aos de ingressos de IDE. Tal fato
aponta que os investimentos do setor no país poderiam ser maiores que os anunciados
pelas empresas no período, dado esse elevado potencial de recursos que poderia ser
aplicado domesticamente, inclusive na expansão dos gastos em pesquisa e
desenvolvimento (P&D).
Gráfico 2 – Exportação, importação e saldo comercial, autoveículos e autopeças no
Brasil, 2001-2011 (em US$ milhões)
Autoveículos
Autopeças
Fonte: Elaboração própria. Dados Secex-MDIC.
Gráfico 3 – Remessas de lucros e dividendos e ingressos de IDE do setor
automotivo: Brasil, 2005-2012
22
6.000
10
9
8,9
5.000
8
4.500
7
US$ milhões
4.000
3.500
6
5,8
3.000
5
4,6
2.500
4,0
2.000
4
3,1
3
1.500
1,9 2
1.000
500
1,3
Relação remessas / ingressos
5.500
1
0,5
0
0
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Remessas de lucros e dividendos (US$ milhões)
Ingressos de IDE (US$ milhões)
Relação remessas / ingressos
Fonte: Elaboração própria. Dados do Banco Central.
Em um setor concentrado que opera com capacidade planejada, como o
automobilístico, é importante complementar a análise da produção com a gestão do grau
de utilização da capacidade instalada pelas empresas. O Gráfico 4 mostra o acentuado
impacto da crise sobre a utilização da capacidade produtiva ao final de 2008, como
resultado da forte contração dos mercados de crédito e das vendas do setor e da maior
incerteza em relação às perspectivas de recuperação da demanda a curto prazo. O nível
de utilização da capacidade, que se mantinha sob o mercado aquecido em torno de 90%,
reduziu a 75%.
Entretanto, a partir das medidas para a retomada da demanda, a utilização da
capacidade instalada foi gradualmente recuperada, alcançando em 2010 novamente o
patamar de 90%. Diante desse cenário de demanda em expansão e elevado grau de
utilização da capacidade, uma ampliação significativa da capacidade produtiva do setor
mediante a realização de novos investimentos plenamente se justificaria, principalmente
em detrimento do forte impulso doméstico dado à oferta externa no período. Vale notar
um aumento mais recente em 2012 do nível de ociosidade, eventualmente associado à
elevação do volume importado e ao menor dinamismo econômico.
23
Gráfico 4 – Grau de utilização da capacidade instalada: veículos automotores,
Brasil, 2005-2012 (%)
100
95
90
85
80
75
70
65
60
55
jul
jan 12
jul
jan 11
jul
jan/10
jul
jan 09
jul
jan 08
jul
jan 07
jul
jan 06
jul
jan 05
50
Fonte: Elaboração própria. Dados da CNI – Indicadores Industriais.
A estrutura de oferta brasileira também apresenta uma forte concentração entre
um número limitado de montadoras, porém diferencia-se do padrão mundial. A Tabela 8
mostra a distribuição da produção nacional de veículos por montadora, do que se
destacam três fatos. Em primeiro lugar, nota-se uma elevada concentração da produção.
As oito maiores montadoras listadas respondiam ao longo do período por mais de 90%
do total produzido. Desse total, a parcela mais expressiva resultava das operações das
quatro maiores montadoras, a saber, Volkswagen, Fiat, General Motors e Ford. Em
2000, elas eram responsáveis por mais de 88% da produção nacional de autoveículos.
No entanto, e em segundo lugar, a participação dessas montadoras declinou ao
longo da década, atingindo cerca de 75% em 2011. Embora a produção ainda seja
bastante concentrada, isso demonstra o processo de expansão e consolidação de outras
companhias no mercado produtivo doméstico, em especial das montadoras francesas
(Renault e PSA Peugeot Citroën) e japonesas (Honda e Toyota), cujo ciclo de entrada
no mercado brasileiro com plantas produtivas remete ao final da década de 1990 e início
dos anos 2000. Com a recente instalação de capacidade produtiva de outras montadoras
no país, tais como Hyundai, e a atração de montadoras chinesas, a configuração e a
concentração da produção do setor tendem a se transformar mais nos próximos anos.
Tabela 8 – Produção de autoveículos no Brasil por montadora, 2000-2011
(em unidades)
24
Volkswagen
Fiat
General Motors
Ford
Renault
PSA
Honda
Toyota
Subtotal
Total
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
490.871 518.026 493.966 441.197 646.371 693.324 731.967 796.961 848.889 857.549 1.067.105 828.444
29,0
28,5
27,6
24,1
27,9
27,4
28,0
26,7
26,4
26,9
29,3
24,1
433.781 436.640 386.611 358.204 437.024 503.105 562.531 717.839 722.450 736.620 757.418 762.181
25,6
24,0
21,6
19,6
18,9
19,9
21,5
24,1
22,5
23,1
20,8
22,2
442.231 513.558 517.167 511.517 562.012 561.449 550.185 576.952 603.819 598.773 651.051 643.369
26,1
28,3
28,9
28,0
24,3
22,2
21,1
19,4
18,8
18,8
17,9
18,7
122.945 120.557 159.964 219.971 277.960 326.957 320.124 313.237 326.090 347.519 353.128 326.779
7,3
6,6
8,9
12,0
12,0
12,9
12,3
10,5
10,1
10,9
9,7
9,5
58.083
71.108
48.040
58.606
66.645
60.507
65.604
97.458 122.160 121.529 172.455 220.625
3,4
3,9
2,7
3,2
2,9
2,4
2,5
3,3
3,8
3,8
4,7
6,4
18.116
49.437
46.686
68.859
98.902
95.686 119.439 130.975 117.289 149.472 146.299
1,0
2,8
2,6
3,0
3,9
3,7
4,0
4,1
3,7
4,1
4,3
20.568
22.058
20.564
33.927
56.544
65.527
78.962 106.027 131.139 132.122 131.455
85.545
1,2
1,2
1,1
1,9
2,4
2,6
3,0
3,6
4,1
4,2
3,6
2,5
18.809
14.649
17.426
40.953
53.131
57.356
57.991
55.974
66.983
62.713
64.588
60.456
1,1
0,8
1,0
2,2
2,3
2,3
2,2
1,9
2,1
2,0
1,8
1,8
1.587.288 1.714.712 1.693.175 1.711.061 2.168.546 2.367.127 2.463.050 2.783.887 2.952.505 2.974.114 3.346.672 3.073.698
93,9
94,4
94,5
93,6
93,6
93,5
94,3
93,4
91,8
93,4
91,8
89,5
1.691.240 1.817.116 1.791.530 1.827.791 2.317.227 2.530.840 2.612.329 2.980.166 3.216.381 3.183.482 3.646.548 3.432.616
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
Nota: Para cada empresa, dados na linha superior em unidades e dados na linha inferior em porcentagem
do total.
Em terceiro lugar, essa estrutura de oferta por montadora difere-se do padrão
global, no sentido de que não há uma correspondência estrita entre os maiores
produtores mundiais e os maiores produtores no mercado nacional. Ou seja, por um
lado, importantes ofertantes que já se firmaram em nível mundial, tais como Toyota e
Hyundai, ainda estão buscando conquistar espaço no mercado nacional em um
movimento mais recente e, em parte, incipiente. Por outro lado, montadoras com menor
expressividade na produção mundial, a exemplo da Fiat, são centrais na produção
doméstica. Neste caso específico, o fato de o Brasil ser o mais importante mercado da
montadora para além da Itália contribui na explicação dessas diferenças.
Por fim, cabe destacar os dois ciclos de investimentos realizados no setor nas
últimas duas décadas (Gráfico 5). O primeiro ocorreu em meados da década de 1990 em
função de diversos fatores, por exemplo: o grande potencial de mercado existente
impulsionado pela estabilização de preços e pelo ressurgimento do crédito ao consumo;
a estratégia das montadoras de interligar os mercados regionais ao participar do
processo de criação do Mercosul, visando a otimizar a utilização de fatores produtivos
na região (principalmente com a Argentina), racionalizar os investimentos e incrementar
a qualidade dos produtos, combinado com o processo de maior liberalização comercial e
consequente redução das tarifas de importação; a negociação de redução de impostos
sobre carros populares, o que marcaria o padrão de especialização do setor no Brasil
nesse segmento de veículos; e o estabelecimento do regime automotivo para ampliar e
modernizar o parque produtivo existente, com suas diretrizes anunciadas em meados de
1995 (SARTI, 2001; BAER; CINTRA, 2004).
25
% faturamento
2011
2010
2009
2008
2007
2006
2005
2004
0
2003
0
2002
2
2001
1.000
2000
4
1999
2.000
1998
6
1997
3.000
1996
8
1995
4.000
1994
10
1993
5.000
1992
12
1991
6.000
1990
US$ milhões
Gráfico 5 – Volume de investimentos no Brasil – autoveículos e autopeças,
1990-2011
Investimento - autoveículos (US$ milhões)
Investimento - autopeças (US$ milhões)
Investimento - autopeças (% faturamento)
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
Nota: Dados preliminares para 2011.
O segundo ciclo de investimentos é mais recente e remete à expansão do
mercado doméstico a partir da segunda metade da década de 2000. Foi motivado pela
retomada da trajetória positiva de emprego e renda no país, perspectivas de expansão da
demanda doméstica e melhorias nas condições de financiamento, sobretudo a partir do
declínio das taxas de juros e fortalecimento das operações de financiamento às empresas
pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Esse ciclo,
contudo, foi parcialmente interrompido pela crise, embora tenda a se fortalecer a partir
da execução dos planos de investimento anunciados para os próximos anos, o que deve
ampliar a capacidade de oferta brasileira e acirrar a concorrência no mercado nacional a
partir do estabelecimento de unidades produtivas de novos players.
Notam-se, todavia, algumas diferenças entre esses ciclos de investimentos, em
especial separando-se os investimentos de montadoras e fornecedores de autopeças. Em
primeiro lugar, o montante do segundo ciclo de investimentos é mais expressivo do que
foi o do primeiro. Em segundo lugar, os investimentos de fornecedores tenderam a
acompanhar os investimentos das montadoras em proporção muito maior no primeiro
ciclo do que no segundo, haja vista que, embora em valores absolutos os investimentos
de autopeças sejam significativos, não acompanharam no mesmo ritmo a expansão dos
investimentos das montadoras, um indício adicional em relação ao suprimento recente
26
por oferta externa não apenas dos bens finais (veículos), mas também dos insumos da
cadeia produtiva (autopeças). Por último, percebe-se um forte declínio da proporção do
faturamento das companhias de autopeças destinado a investimentos, o que reforça a
necessidade de assegurar mediante políticas públicas a competitividade das empresas e
estimular a produção com conteúdo nacional.
A partir dessas constatações, deve-se realizar uma importante distinção acerca
do segundo ciclo de investimentos, comparando os períodos 2003-2008 e 2009-2011 em
termos de investimentos e importações para autoveículos e autopeças (Gráfico 6). Para
o setor automotivo como um todo, o montante total de investimentos praticamente não
se alterou enquanto as importações se ampliaram (em um período relativamente menor),
ocasionando uma elevação da relação entre importações e investimentos.
Esse movimento, contudo, é explicado por dinâmicas diferentes nos segmentos
de autoveículos e autopeças. Para autoveículos, apesar de um incremento dos
investimentos no período recente, observa-se uma elevação do valor das importações
muito mais expressiva, o que resulta em aumento da relação entre importações e
investimentos. Para autopeças, verifica-se uma queda tanto dos investimentos como das
importações, porém de modo mais acentuado no montante investido, provocando sob
outras circunstâncias uma elevação do coeficiente entre importações e investimentos.
Além disso, tal relação é muito maior no caso de autopeças do que de autoveículos,
ressaltando a maior dependência de oferta externa para o mesmo montante investido no
caso dos fornecedores de autopeças em comparação às montadoras.
Gráfico 6 – Investimentos e importações de autoveículos e autopeças, Brasil,
acumulado 2003-2008 e 2009-2011
27
Valor dos investimentos e das importações (US$ milhões)
Relação entre importações e investimentos (%)
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea e Sindipeças.
Essa relação explicita um dos principais desafios que se colocam no período
recente para se pensar o desenvolvimento futuro do país, o que passa por assegurar e
ampliar suas bases industriais. Diante do contexto recente de crise, observou-se um
impacto mais forte do estímulo à demanda sobre as importações do que sobre a
produção e o investimento, tanto para autoveículos quanto para autopeças. Ou seja, o
rápido reaquecimento da demanda doméstica traduziu-se em impulso maior à oferta
externa ao invés de fortalecer os encadeamentos produtivos no país. Além disso, houve
um aumento das remessas de lucros e dividendos em relação aos investimentos
externos. Tais constatações verificaram-se ainda em um cenário de elevado grau de
utilização da capacidade instalada do setor no Brasil.
28
Essa dinâmica indica para um baixo comprometimento das empresas do setor
com a base produtiva no país, sobretudo porque utilizaram em alguma medida a
capacidade ociosa em outras localidades para atender ao mercado brasileiro e
transferiram parte da renda e do lucro gerados domesticamente para o caixa da matriz,
quando de nítidas oportunidades de converter esse capital em um volume de novos
investimentos muito superior ao efetuado e fortalecer a estrutura produtiva e de
inovação brasileira. Quanto mais investimentos em geral, com as filiais e a base
produtiva local adquirindo maior importância na dinâmica das corporações, maiores as
possibilidades de ampliação de investimentos em inovação de produto e processo em
âmbito doméstico.
Dessa forma, são necessárias políticas que, junto aos interesses empresariais,
promovam a realização de investimentos com menor elasticidade das importações,
preservando os encadeamentos produtivos domésticos. Disso decorre a preocupação
governamental acerca da manutenção da produção nacional, motivando alterações de
política no setor para os próximos anos, a fim de que os estímulos de demanda a partir
da crise e o aquecimento do mercado interno se traduzam em um impulso para a
produção e articulação produtiva doméstica maior do que um transbordamento para o
setor externo.
3. Dinâmica recente da demanda
Analisa-se nesta seção a dinâmica recente da demanda do setor no mundo e no
Brasil. Procura-se identificar os principais mercados consumidores e as tendências da
demanda doméstica, detalhando sua evolução e ressaltando as transformações
econômicas que a impulsionaram.
a. No mundo
Assim como a estrutura de oferta, a estrutura de demanda do setor
automobilístico no mundo também sofreu modificações importantes ao longo da última
década. Houve alterações significativas entre os principais mercados consumidores de
veículos, com sinais de expansão das economias emergentes e estagnação das
economias avançadas. A China tornou-se o maior demandante de veículos,
ultrapassando os Estados Unidos em 2009. Brasil e Índia também apresentaram elevado
crescimento e se firmaram entre os maiores consumidores, ao passo que Japão e
Alemanha, tradicionais mercados de veículos, encolheram.
29
O Gráfico 7 mostra a evolução das vendas ao longo dos anos 2000. Além da
forte ascensão chinesa, destaca-se o crescente desempenho brasileiro (a partir de 2005)
e indiano (a partir de 2003). Dado o cenário de arrefecimento econômico nas economias
avançadas e a recuperação mais rápida promovida por grandes economias emergentes
frente à crise internacional, o Brasil ultrapassou a Alemanha em 2010 como mercado
consumidor de veículos e o Japão ao longo de 2012, o que o coloca atualmente como
terceiro maior mercado mundial. A Índia ocupa a sexta posição e logo deve superar
outros mercados tradicionais.
Gráfico 7 – Evolução das vendas de veículos dos 6 principais mercados
consumidores (de acordo com classificação em 2011), 1999-2011 (mil unidades)
20.000
18.000
16.000
14.000
12.000
10.000
8.000
6.000
4.000
2.000
0
1999
2000
2001
China
2002
2003
2004
Estados Unidos
2005
Japão
2006
2007
Brasil
2008
2009
Alemanha
2010
2011
Índia
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
Essas transformações são ainda mais emblemáticas se considerado o ponto de
partida dessas economias. Em 2000, os maiores mercados consumidores eram, em
ordem decrescente: Estados Unidos, Japão, Alemanha, Itália, França, Reino Unido,
China, Canadá, Brasil, Coreia do Sul, México, Índia e Austrália. Em 2011, o ranking
apresentava-se com: China, Estados Unidos, Japão, Brasil, Alemanha, Índia, França,
Reino Unido, Itália, Canadá, Coreia do Sul, Austrália e México. Ou seja, nesse período
a China passou da sétima para a primeira posição, o Brasil da nona para a quarta (ou
terceira ao longo de 2012) posição e a Índia da décima segunda para a sexta posição. De
2000 a 2010, a demanda por veículos cresceu 28,6%, sendo a maior parte explicada pelo
crescimento de China, Índia e Brasil. Na China, cresceu 763,7%; no Brasil, 136,1%; e,
na Índia, 253,8%; enquanto na maior parte das economias avançadas a demanda
30
declinou, com a retração mais acentuada no mercado americano (Tabela 9). Apesar
disso, dados de 2010 e 2011 apontam para o início de recuperação da demanda em
alguns mercados mais afetados pela crise, a exemplo dos Estados Unidos.
Diante da crise e seus desdobramentos, contudo, a recuperação mais rápida
aconteceu nas economias emergentes. Nas economias avançadas, ainda que se tenham
também adotado pacotes de estímulo à demanda mediante incentivos tributários ou
financeiros à troca de veículos, a resposta em termos do incremento de vendas
domésticas mostrou-se comparativamente mais lenta, menos por causa do efeito direto
da política e mais em razão das perspectivas ainda incertas de uma retomada das
condições de renda e financiamento que possam sustentar as vendas. Essa diferença no
dinamismo dos mercados consequentemente afeta os arranjos produtivos e as estratégias
das corporações no atendimento da demanda via produção local e importações, o que,
por sua vez, impacta a competitividade do setor em cada país e, em termos mais gerais,
seu desempenho econômico.
Tabela 9 – Vendas de veículos nos principais mercados consumidores, 2000, 2010 e
2011 (mil unidades)
2000
China
Estados Unidos
Japão
Brasil
Alemanha
Índia
França
Reino Unido
Itália
Canadá
Coreia do Sul
Austrália
México
Total
2.089
17.402
5.963
1.489
3.693
859
2.611
2.520
2.701
1.586
1.430
787
889
44.019
2010
18.042
11.772
4.956
3.515
3.198
3.039
2.709
2.291
2.166
1.580
1.465
1.036
847
56.616
Variação 2000- Contribuição
2010 (%)
2000-2010 (%)
763,7
126,6
-32,4
-44,7
-16,9
-8,0
136,1
16,1
-13,4
-3,9
253,8
17,3
3,8
0,8
-9,1
-1,8
-19,8
-4,2
-0,4
0,0
2,4
0,3
31,6
2,0
-4,7
-0,3
28,6
100,0
2011
18.505
13.041
4.210
3.633
3.508
3.293
2.687
2.248
1.945
1.617
1.593
1.008
937
58.225
Variação 2010- Contribuição
2011 (%)
2010-2011 (%)
2,6
28,8
10,8
78,9
-15,1
-46,4
3,4
7,3
9,7
19,3
8,4
15,8
-0,8
-1,4
-1,9
-2,7
-10,2
-13,7
2,3
2,3
8,7
8,0
-2,7
-1,7
10,6
5,6
2,8
100,0
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
b. No Brasil
Diante das transformações mencionadas na estrutura de demanda mundial do
setor e da ascensão brasileira ao longo dos últimos anos, vale explorar mais detidamente
o comportamento da demanda no país. Após a crise internacional e a redução
generalizada
nas
vendas,
o reaquecimento
do mercado doméstico
ocorreu
principalmente por meio da política governamental de redução das alíquotas do Imposto
sobre Produtos Industrializados (IPI), discutida em seção posterior, e do paulatino
31
restabelecimento dos canais de crédito junto à manutenção das condições de emprego e
renda na economia.
Neste cenário e frente aos sinais ainda tímidos de recuperação da demanda nas
economias avançadas, o que torna as exportações pouco viáveis, a atenção das empresas
volta-se, a curto prazo, ao atendimento do mercado doméstico, com elevada utilização
da capacidade instalada, conforme mostrado previamente. Ainda que o ciclo recente de
ampliação da capacidade de oferta mediante novos investimentos no país se enquadre
nas perspectivas de expansão da demanda doméstica por veículos, faz-se necessário a
mais longo prazo, e tendo em vista a continuidade dos planos de investimento, pensar
na retomada de outros mercados e do coeficiente exportado da produção, inclusive
como parte do fortalecimento da integração regional.
Tal como sinalizado anteriormente, a dinâmica ascendente da demanda por
veículos no Brasil fortaleceu-se a partir de 2005. Podem-se mencionar como principais
impulsos à demanda doméstica os ganhos reais de renda da população, a crescente
formalização dos empregos (o que permite aos trabalhadores acesso ao crédito) e a
melhoria nas condições de financiamento para aquisição de veículos, com taxas de juros
menores e prazos de pagamento ampliados. Soma-se a isso a política tributária de
redução do IPI, que, em resposta à crise, obteve êxito em reaquecer a demanda por
veículos a curto prazo e assim conter os efeitos deletérios sobre emprego e renda.
O Gráfico 8 ilustra o comportamento das vendas de veículos no Brasil, que
vinha em trajetória ascendente antes da crise e que retoma, particularmente
condicionado pelo encaminhamento e prorrogação da política ao longo do tempo, esse
movimento positivo, inclusive com registros de recordes de vendas. Em agosto de 2012,
um dos meses em que o encerramento da política de incentivo ocorreria, foram vendidas
mais de 420 mil unidades.
Vale caracterizar, ademais, a participação de mercado das montadoras,
sobretudo nessa fase de expansão do mercado interno. Verifica-se, pela Tabela 10, que a
Fiat é líder de vendas no mercado brasileiro há alguns anos, posição já ostentada pela
Volkswagen no início da década de 2000 e pela General Motors em 2004. Apesar da
elevada concentração de mercado – as quatro maiores montadoras (Fiat, Volkswagen,
GM e Ford) respondiam por mais de 80% das vendas no começo da década –, essa
configuração está, em algum grau, se modificando.
Gráfico 8 – Vendas mensais de autoveículos novos no Brasil, 2007-2012
32
(mil unidades)
440
400
360
320
280
240
200
160
120
80
40
out-12
jul-12
abr-12
jan-12
out-11
jul-11
abr-11
jan-11
out-10
jul-10
abr-10
jan-10
out-09
jul-09
abr-09
jan-09
out-08
jul-08
abr-08
jan-08
out-07
jul-07
abr-07
jan-07
0
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea – Renavam/Denatran.
Tabela 10 – Vendas de autoveículos no Brasil por montadora, 2000-2011
(unidades)
Fiat
Volkswagen
General Motors
Ford
Renault
PSA
Toyota
Honda
Subtotal
Total
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
362.249 415.871 358.083 340.960 349.027 404.667 465.543 607.559 657.763 736.969 760.487 754.275
24,3
26,0
24,2
23,9
22,1
23,6
24,1
24,7
23,3
23,5
21,6
20,8
392.017 416.513 357.159 291.286 331.719 355.728 412.812 540.233 586.611 686.408 700.621 703.863
26,3
26,0
24,2
20,4
21,0
20,7
21,4
21,9
20,8
21,9
19,9
19,4
332.983 353.864 338.940 333.429 364.214 365.251 409.916 498.655 548.869 595.491 657.707 632.255
22,4
22,1
22,9
23,3
23,1
21,3
21,3
20,2
19,5
19,0
18,7
17,4
132.590 122.843 142.361 164.245 185.672 212.438 220.465 265.678 282.043 325.504 365.924 344.382
8,9
7,7
9,6
11,5
11,8
12,4
11,4
10,8
10,0
10,4
10,4
9,5
56.608
70.389
60.618
58.021
53.524
47.517
51.672
73.608 115.153 117.521 160.299 194.294
3,8
4,4
4,1
4,1
3,4
2,8
2,7
3,0
4,1
3,7
4,6
5,3
30.621
48.613
64.514
56.466
63.777
80.303
95.986 128.217 150.965 151.159 174.383 175.862
2,1
3,0
4,4
4,0
4,0
4,7
5,0
5,2
5,4
4,8
5,0
4,8
25.487
23.920
25.631
42.476
50.157
60.904
69.714
72.081
80.892
93.506
99.585
99.236
1,7
1,5
1,7
3,0
3,2
3,6
3,6
2,9
2,9
3,0
2,8
2,7
20.322
21.860
20.903
32.149
50.694
57.039
67.329
85.749 117.599 125.869 126.439
92.901
1,4
1,4
1,4
2,3
3,2
3,3
3,5
3,5
4,2
4,0
3,6
2,6
1.352.877 1.473.873 1.368.209 1.319.032 1.448.784 1.583.847 1.793.437 2.271.780 2.539.895 2.832.427 3.045.445 2.997.068
90,8
92,0
92,5
92,3
91,8
92,4
93,0
92,2
90,1
90,2
86,6
82,5
1.489.481 1.601.282 1.478.621 1.428.610 1.578.775 1.714.644 1.927.738 2.462.728 2.820.350 3.141.240 3.515.064 3.633.248
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
100,0
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
Nota: Para cada empresa, dados na linha superior em unidades e dados na linha inferior em porcentagem
do total.
Dois fenômenos podem ser destacados. O primeiro refere-se à perda de
participação relativa desse grupo de montadoras ao longo dos anos 2000 (declina-se
para cerca de 74% em 2008) sem que a participação das oito principais montadoras
listadas se reduza a patamares inferiores a 90%. Isso indica que houve um movimento
de expansão e consolidação das demais montadoras (francesas e japonesas) no mercado
brasileiro nesse período.
33
O segundo fenômeno concerne à continuidade da perda de participação de
mercado das quatro maiores montadoras nos anos mais recentes (em 2011 detinham
67% do mercado) junto com a perda de participação do conjunto das oito montadoras
(em 2011 respondiam por 82,5% das vendas), particularmente em um momento de
aquecimento da demanda. Embora em termos absolutos as vendas tenham se expandido
significativamente, essa perda de participação relativa aponta para a entrada ou
fortalecimento de outros concorrentes não listados na tabela, como o caso da sulcoreana Hyundai, da japonesa Nissan ou de marcas chinesas recém-chegadas ao
mercado doméstico.
Essa análise, se combinada com os dados apresentados anteriormente de
produção nacional por montadora, mostra maior dispersão das vendas do que da
produção entre as montadoras, uma vez que o mesmo conjunto de empresas responde
por maior parcela da produção do que das vendas, embora ao longo do tempo as
participações em ambos os casos tenham declinado. Soma-se a isso – o que reforça o
argumento de um incremento do volume importado para suprir a demanda doméstica
em expansão – o fato de nos anos recentes diversas montadoras terem vendido
internamente mais do que sua produção nacional (considerando-se ainda que nenhuma
parcela tenha sido exportada), o que é condicionado pelas estratégias das corporações
em redirecionar sua produção de outras localidades para aproveitar as oportunidades de
um mercado em expansão. Resta, no entanto, que esse movimento seja coordenado em
âmbito nacional para que essas oportunidades sejam apropriadas internamente, não
apenas conduzindo a um processo de ampliação da capacidade produtiva, mas também
de promoção e incorporação de desenvolvimento tecnológico no setor.
4. Notas sobre o mercado de caminhões e ônibus no Brasil
Toda a discussão precedente compreende o setor automobilístico em geral,
representando a dinâmica conjunta da evolução da produção e vendas de automóveis,
comerciais leves, caminhões e ônibus. Os dados acerca de produção e vendas de
autoveículos no Brasil e no mundo retratam a evolução do consolidado total dessas
categorias, que, no entanto, dado o peso significativo do mercado de veículos leves no
setor, tende a refletir a dinâmica dessa categoria, sobretudo de automóveis. Cabem,
portanto, como parte da discussão sobre a indústria, algumas notas adicionais sobre a
dimensão e a dinâmica recente do mercado de caminhões e ônibus no Brasil.
34
O mercado de caminhões e ônibus deve ser ressaltado particularmente em razão
de sua importância na matriz de transporte brasileira, baseada principalmente em malha
rodoviária, haja vista os impactos sobre as atividades de produção e distribuição de
bens, assim como o deslocamento de pessoas. Desse modo, constitui uma ligação de
duplo sentido com o dinamismo econômico do país. Por um lado, um processo de
aceleração econômica tende a exigir o acompanhamento e crescimento das atividades
desse subsetor, dadas as perspectivas de expansão da demanda. Por outro, um baixo
dinamismo produtivo nesse mercado, em decorrência, por exemplo, de condições
competitivas desfavoráveis, pode representar um limitante ao crescimento econômico
em virtude das restrições de oferta que pode acarretar no âmbito da logística e
infraestrutura ao escoamento da produção dos demais setores.
A evolução dos indicadores de produção e vendas internas aponta para a forte
expansão das atividades nesse mercado na última década, sobretudo a partir de 2003
com a retomada do crescimento econômico (Tabela 11). A produção de caminhões no
país passou de 71,7 mil unidades em 2000 para 225,8 mil unidades em 2011, enquanto a
produção de ônibus passou de 22,7 mil unidades para 55,1 mil unidades no mesmo
período. Isso totalizou uma produção conjunta de caminhões e ônibus na ordem de
280,9 mil unidades em 2011, praticamente o triplo daquela observada em 2000. Embora
menos expressivo comparativamente à evolução da produção total de autoveículos no
Brasil, esse movimento representou, com algumas oscilações ao longo do período, um
ganho de participação relativa desses segmentos na produção total (8,2% em 2011).
A trajetória das vendas também foi expressiva, ainda que mais tênue em relação
à produção. As vendas internas de caminhões e ônibus ultrapassaram 207 mil unidades
em 2011, patamar cerca de 2,5 vezes maior do que o verificado em 2000. Vale destacar,
nesse sentido, que o ritmo de crescimento das vendas nesses segmentos foi inferior
àquele de veículos leves, resultando em leve perda de participação nas vendas internas
totais de autoveículos ao longo do período. As exportações mostraram-se mais
significativas entre 2005 e 2008, até a eclosão da crise internacional. As importações,
por sua vez, foram pouco expressivas, declinando na maior parte do período.
35
Tabela 11 – Produção e vendas de caminhões e ônibus no Brasil, 2000-2011
(unidades)
Produção
Vendas internas
Caminhões
Exportações
Importações
Produção
Vendas internas
Ônibus
Exportações
Importações
Produção
Caminhões e Vendas internas
Ônibus
Exportações
Importações
Produção
Total
Vendas internas
Autoveículos Exportações
Importações
% PT1
% VIT2
%
% ET3
Caminhões e
% IT4
Ônibus
% EP5
% IVI6
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
71.686
77.431
68.558
78.960 107.338 118.000 106.644 137.281 167.330 123.633 191.621 225.751
69.209
73.517
65.886
66.291
83.005
80.334
76.258
98.498 122.349 109.873 157.694 172.902
9.293
6.762
5.475
12.820
25.650
38.312
37.457
41.325
38.665
13.504
23.060
29.114
7.585
3.008
2.180
1.603
2.135
2.968
3.328
3.328
4.121
3.387
2.663
3.971
22.672
23.163
22.826
26.990
28.758
35.387
34.474
38.986
44.111
34.535
45.879
55.113
16.439
16.578
16.594
15.989
17.652
15.363
19.768
23.198
27.010
22.625
28.422
34.672
6.028
6.902
6.765
9.320
12.947
18.969
15.726
14.901
15.689
9.896
14.626
13.576
56
53
60
107
6
5
45
46
92
59
76
92
94.358 100.594
91.384 105.950 136.096 153.387 141.118 176.267 211.441 158.168 237.500 280.864
85.648
90.095
82.480
82.280 100.657
95.697
96.026 121.696 149.359 132.498 186.116 207.574
15.321
13.664
12.240
22.140
38.597
57.281
53.183
56.226
54.354
23.400
37.686
42.690
7.641
3.061
2.240
1.710
2.141
2.973
3.373
3.374
4.213
3.446
2.739
4.063
1.691.240 1.817.116 1.791.530 1.827.791 2.317.227 2.530.840 2.612.329 2.980.166 3.216.381 3.183.482 3.646.548 3.432.616
1.489.481 1.601.282 1.478.621 1.428.610 1.578.775 1.714.644 1.927.738 2.462.728 2.820.350 3.141.240 3.515.064 3.633.248
371.299 390.854 424.415 535.980 758.787 897.144 841.816 789.371 734.583 475.325 767.432 578.728
174.178 178.316 115.244
73.803
61.722
87.961 142.366 277.083 375.150 488.874 660.256 857.901
5,6
5,5
5,1
5,8
5,9
6,1
5,4
5,9
6,6
5,0
6,5
8,2
5,8
5,6
5,6
5,8
6,4
5,6
5,0
4,9
5,3
4,2
5,3
5,7
4,1
3,5
2,9
4,1
5,1
6,4
6,3
7,1
7,4
4,9
4,9
7,4
4,4
1,7
1,9
2,3
3,5
3,4
2,4
1,2
1,1
0,7
0,4
0,5
16,2
13,6
13,4
20,9
28,4
37,3
37,7
31,9
25,7
14,8
15,9
15,2
8,9
3,4
2,7
2,1
2,1
3,1
3,5
2,8
2,8
2,6
1,5
2,0
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
1
Produção total.
2
Vendas internas totais.
3
Exportações totais.
4
Importações totais.
5
Exportações na produção.
6
Importações nas vendas internas.
36
Dessa análise, três conclusões merecem destaque. Em primeiro lugar, a
representatividade dos segmentos de caminhões e ônibus no total de produção e vendas
do setor automobilístico é relativamente baixa (foi, em média, de 6% para o período
considerado). Em decorrência disso, a análise dos dados consolidados do setor tende a
refletir principalmente a dinâmica do segmento de veículos leves. Isso, todavia, não
diminui a importância dos segmentos de caminhões e ônibus na própria continuidade de
um processo de crescimento econômico e os efeitos do dinamismo de suas atividades
sobre os demais setores por meio de seus encadeamentos produtivos.
Em segundo lugar, trata-se de segmentos em que o país é ofertante líquido, isto
é, apresenta em geral volume de produção superior ao de vendas domésticas. A
diferença entre produção e vendas no período inclusive se acentuou, com alta do volume
exportado e declínio das importações, as quais se referem majoritariamente ao segmento
de caminhões. O coeficiente exportado da produção ultrapassou 37% em 2005 e 2006, a
partir de quando, entretanto, passou a declinar. Em 2011, atingiu 15,2%, patamar
inferior ao de 2000 (Tabela 11). O nível registrado por esses segmentos nos anos de
crise (2009 em diante) foi abaixo do coeficiente do setor automobilístico como um todo,
mostrado anteriormente na Tabela 7. Já o coeficiente de importados nas vendas de
caminhões e ônibus nunca foi elevado (em média, 3% no período), o que caracteriza tais
segmentos com uma ampla base produtiva nacional para atender ao mercado doméstico
e promover exportações de bens finais.
Em terceiro lugar, a constatação de um baixo e, em geral, declinante coeficiente
de importados nas vendas nesses segmentos mostra que a forte elevação do coeficiente
para o setor como um todo nos últimos anos, em particular diante da crise (Tabela 7), é
reflexo da dinâmica do segmento de veículos leves, cuja expansão da demanda foi em
grande medida suprida por oferta externa no período recente. Dessa forma, os estímulos
de demanda promovidos em resposta à crise não se traduziram, nos segmentos de
caminhões e ônibus, em um coeficiente crescente e elevado de importados nas vendas,
tal como observado na dinâmica setorial conjunta discutida anteriormente. É notório,
por exemplo, de acordo com os dados da Tabela 11, que houve uma queda absoluta no
volume total de autoveículos produzidos domesticamente de 2010 para 2011, apesar da
ampliação das vendas internas, enquanto no caso de caminhões e ônibus a expansão da
demanda foi acompanhada por aumento mais que proporcional da produção nacional.
Isso, no entanto, não afasta a preocupação em relação ao conteúdo nacional envolvido
na fabricação de novas unidades domesticamente, uma vez que, embora possa não haver
37
uma substituição de oferta nacional por oferta externa em termos de bens finais nesses
segmentos, isso não impede a utilização crescente de insumos importados e, portanto, o
enfraquecimento da cadeia produtiva doméstica.
Cabe mencionar, por fim, que as principais medidas governamentais para
estimular os segmentos de caminhões e ônibus diante da crise foram a redução da
alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de 5% para 0% no caso de
caminhões a partir de dezembro de 2008 – no caso de ônibus, a alíquota já era nula – e a
diminuição da taxa de juros de longo prazo (TJLP) para captação de recursos junto ao
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), bem como das
taxas de financiamento para produção e aquisição de caminhões e ônibus ligadas aos
programas Finame e Procaminhoneiro do BNDES, como parte do Programa de
Sustentação do Investimento (PSI). Mantém-se em 2013 uma taxa de juros abaixo da
inflação em 3% ao ano para as operações contratadas no primeiro semestre e 4% ao ano
para as do segundo semestre, com o objetivo de estimular a produção e as vendas de
veículos pesados, as quais dependem em quase sua totalidade (mais de 90%) de alguma
modalidade de financiamento.
Apesar da recuperação da demanda observada após 2009, ano em que os efeitos
da crise foram sentidos mais profundamente, vale salientar que em 2012 os segmentos
registraram uma forte queda nas vendas em relação ao ano anterior. Contribuiu para
isso, em especial, a introdução do novo diesel S50, seguindo requisitos do padrão
Euro 5 de emissão de poluentes. Menos poluente devido à menor quantidade de enxofre,
o novo combustível exigiu a readequação dos motores, o que significou um
encarecimento de até 10% dos preços de caminhões novos. Com a continuidade das
medidas de apoio, entretanto, espera-se uma retomada em 2013 (BORLINA FILHO,
2013).
5. Nova trajetória tecnológica no setor automobilístico: perspectivas e desafios
A inovação, tomada como o desenvolvimento e a introdução de novas
tecnologias no mercado, constitui elemento fundamental dentro da concorrência
estabelecida na indústria automobilística e uma das fontes de competitividade e
crescimento das corporações. Conforme ressaltado anteriormente, o principal debate
recente sobre inovação no setor está vinculado ao estabelecimento de uma nova
trajetória tecnológica com o desenvolvimento de formas alternativas de propulsão mais
eficientes e menos nocivas ao ambiente, do que se destacam desde os veículos
38
bicombustíveis e os veículos híbridos até os veículos puramente elétricos e com célula
de combustível. Nesse contexto, é determinante o direcionamento a ser dado por países
e empresas na consolidação de uma nova tecnologia.
O setor como um todo (considerando-se montadoras e fornecedores de
autopeças) tem grande relevância na realização de atividades inovadoras. Segundo
dados apresentados na Tabela 12, entre as mil empresas que mais investiram em
pesquisa e desenvolvimento (P&D) no mundo em 2009/2010, 72 pertenciam ao setor
automotivo, e elas respondiam por cerca de 16% dos US$556 bilhões gastos no período
pelo total de empresas. As dez principais empresas do setor, por gasto em P&D no
referido período, figuravam entre as quarenta principais companhias do ranking de mil
empresas6. Apenas elas, com desembolsos de quase US$58 bilhões, representavam mais
de 10% dos gastos totais das mil empresas e 65% dos gastos do setor automotivo,
indicando uma concentração das atividades de P&D em volume significativo em poucas
e grandes empresas. Seus gastos em P&D giraram, em média, próximos a 5,5% das
vendas, superiores à média do setor (4,7%) e das mil empresas de diversos setores
(3,6%), ainda que a média fosse distorcida pelo desempenho da Bosch (com gastos em
P&D equivalentes a 9,4% de suas vendas).
Observa-se, ademais, uma evolução mais favorável dos gastos em P&D em
empresas japonesas e europeias, distintamente das americanas do setor. GM e Ford, por
exemplo, reduziram seus gastos em P&D, principalmente após 2007/2008, com a
eclosão da crise, e não encabeçaram, como ocorreu com a Volkswagen na Alemanha e a
Toyota no Japão, a lista nacional das empresas que mais investiram em P&D (no caso
da Toyota, também líder mundial em 2009/2010). Os gastos em 2009/2010 das cinco
empresas europeias listadas na Tabela 12 corresponderam a quase 30% do total do setor,
seguidos por 23% das big three japonesas (Toyota, Honda e Nissan) e 12% das duas
americanas. Ainda que todas tenham sido afetadas pela crise, conforme verificado pela
redução dos gastos entre 2008/2009, bem como em 2009/2010, os cortes mais
expressivos foram efetuados pelas companhias americanas: queda de 24% na GM e
33% na Ford em relação ao período anterior, ou seja, muito superior à diminuição média
dos gastos do setor (11%) e de outras montadoras, tais como Toyota (6%) e
Volkswagen (2%).
6
Outras classificações com as empresas que mais investiram em P&D no mundo e na União Europeia
podem ser encontradas em Guevara et al. (2010).
39
Tabela 12 – Gastos de empresas do setor automotivo em P&D
Empresas
(país de origem)
Toyota (Japão)
Volkswagen (Alemanha)
General Motors (EUA)
Honda (Japão)
Daimler (Alemanha)
Bosch (Alemanha)
Ford (EUA)
Nissan (Japão)
BMW (Alemanha)
PSA (França)
Subtotal
Total do setor
Total 1.000**
Períodos (gastos em US$ milhões*)
2009/2010
9.711,6
8.307,7
6.068,0
6.049,9
5.974,6
5.133,8
4.900,0
4.892,8
3.512,5
3.320,2
57.871,0
89.025,7
555.552,6
2008/2009
2007/2008
10.300,3
8.502,8
8.000,0
6.315,9
6.367,8
5.618,8
7.300,0
4.914,3
4.109,4
3.403,4
64.832,6
100.522,4
566.065,6
9.568,8
7.063,7
8.100,0
5.927,9
7.013,4
5.108,0
7.500,0
4.993,3
4.511,1
2.975,8
62.762,1
95.827,1
522.033,4
2006/2007
8.729,5
6.083,7
6.600,0
5.482,6
7.509,9
4.875,5
7.200,0
4.807,9
4.602,9
3.120,8
59.012,8
89.557,9
472.918,0
2005/2006
8.111,8
5.846,9
6.700,0
5.024,6
7.951,8
4.205,5
8.000,0
4.276,9
4.469,5
3.086,3
57.673,4
87.055,2
428.749,4
Período 2009/2010
Empresas
(país de origem)
% das
vendas***
% do total de
% do total de
gastos das mil
gastos do setor
empresas
Posição no
ranking P&D
1.000**
Posição entre
as empresas de
seu país de
origem
Toyota (Japão)
4,4
10,91
1,75
1
Volkswagen (Alemanha)
5,7
9,33
1,50
4
General Motors (EUA)
5,3
6,82
1,09
12
Honda (Japão)
5,6
6,80
1,09
13
Daimler (Alemanha)
5,3
6,71
1,08
14
Bosch (Alemanha)
9,4
5,77
0,92
21
Ford (EUA)
4,1
5,50
0,88
23
Nissan (Japão)
5,4
5,50
0,88
24
BMW (Alemanha)
5,1
3,95
0,63
35
PSA (França)
4,8
3,73
0,60
39
Subtotal
5,5
65,00
10,42
Total do setor
4,7
100,00
16,02
Total 1.000**
3,6
100,00
Fonte: Elaboração própria. Dados do BIS (2010).
Nota: Estão listadas na tabela as dez principais empresas em gastos em P&D do setor automotivo, que
inclui montadoras e fornecedores de partes e peças. O total do setor corresponde às 72 empresas do ramo
presentes no ranking das mil empresas que mais investem em P&D no mundo.
* Valores convertidos de libra para dólar, de acordo com a taxa de câmbio de 1,6149 dólar por libra,
vigente em 31/12/2009 e apresentada no relatório BIS (2010).
** Mil empresas que mais investem em P&D no mundo.
*** O subtotal da porcentagem das vendas refere-se à média dos gastos em P&D como porcentagem das
vendas das dez empresas apresentadas.
Dada a importância do direcionamento estatal em cada país para o
desenvolvimento de novas tecnologias, cabe destacar o volume de recursos
governamentais destinados para P&D no setor. Segundo Arnold et al. (2007), a
destinação média anual no período 2002-2008 foi da ordem de €140 milhões nos
Estados Unidos, seguidos por Japão (€110 milhões), Alemanha (€65 milhões) e França
40
1
1
4
2
3
4
9
5
6
3
(€55 milhões). É interessante também notar as linhas de pesquisa mais fomentadas em
cada país. Para células de combustível de hidrogênio, o governo japonês destinou quase
€70 milhões anuais entre 2002 e 2008; o governo americano, €60 milhões; e os
governos canadense e alemão, € 21 milhões e € 13 milhões, respectivamente. Para
materiais avançados, o montante oferecido pelo governo alemão foi próximo a €19
milhões, seguido por Estados Unidos (€13 milhões) e Japão (€7 milhões). Para baterias,
os Estados Unidos gastaram pouco mais de €7 milhões; e o Japão, cerca de €5,5 milhões
anuais. Para tecnologias híbridas, elétricas e de baixa emissão, o maior apoio
governamental foi da França (€45 milhões), seguida por Estados Unidos e Suécia (com
montantes acima de €15 milhões), além de Alemanha (€10 milhões). Para sistemas de
transporte inteligentes, foram quase €14 milhões anuais dos Estados Unidos e €10
milhões da Alemanha.
A partir dessas considerações, examinam-se as perspectivas de consolidação de
um novo padrão tecnológico em escala global, considerando a evolução recente e
esperada da demanda por veículos híbridos, que já se mostram uma realidade, e por
diferentes tipos de veículos elétricos, que possuem grandes possibilidades de expansão.
Destaca-se ainda a importância da China na determinação da trajetória tecnológica
dominante e na velocidade de implementação das novas tecnologias. Por fim, avalia-se
a situação brasileira nesse processo, reforçando-se as oportunidades a partir da
tecnologia bicombustível, porém salientando-se os desafios que podem advir do
posicionamento chinês acerca da consolidação de uma nova trajetória tecnológica.
O Quadro 1 diferencia as principais terminologias concernentes às formas
alternativas de propulsão dos veículos. Todas envolvem algum grau de autonomia com
propulsão elétrica. A modalidade correntemente mais difundida é a de veículos híbridos
(ou veículos elétricos híbridos), que teve origem com o Toyota Prius. Embora
incipiente, há uma tendência em direção aos veículos elétricos híbridos plug-in e ainda
aos veículos elétricos a bateria, os veículos “puramente” elétricos. Entretanto,
permanecem como desafios o elevado custo da bateria, a eficiência e autonomia
propiciadas por essa tecnologia e a difusão de infraestrutura para recarga. Relativamente
às demais, a tecnologia baseada em células de combustível é a menos disseminada.
Apesar da existência de alguns modelos, sobretudo protótipos, equipados com a
tecnologia, tais veículos ainda não apresentam escala comercial.
41
Quadro 1 – Diferenciação entre os tipos de veículos baseados em novas formas de
propulsão
Veículo
Híbrido*
Híbrido plug-in
Com autonomia
estendida
(extended-range)
Elétrico
Definição
Utiliza tanto um motor elétrico como de combustão
interna.
Possui bateria alimentada por fonte externa, que
possibilita ao veículo rodar por algum período
somente com base na eletricidade. Após esse período,
continua a operar como um veículo híbrido.
Funciona como um veículo elétrico a bateria até a
bateria descarregar, quando então um motor de
combustão interna traciona um gerador elétrico para
rodagem por um período estendido.
Exemplos de modelos
Honda Insight e Toyota
Prius.
Toyota Prius híbrido
plug-in e Ford C-Max
Energi híbrido plug-in.
Chevrolet Volt.
Nissan Leaf, Tesla Model
F, BMW ActiveE,
Mitsubishi i, Coda Sedan
e Smart ED.
A bateria**
É tracionado exclusivamente por eletricidade de sua
bateria interna, que é recarregada por fonte externa.
Com célula de
combustível
Converte a energia química de um combustível (por
Hyundai Tucson e Honda
exemplo, o hidrogênio) em eletricidade por meio de
FCX Clarity.
uma reação química para tracionar um motor elétrico.
Fonte: Elaboração própria. Informações da Electric Drive Transportation Association (EDTA).
Disponível em: <www.electricdrive.org>.
* Ou veículo elétrico híbrido. Pode ser híbrido paralelo ou em série.
** Ou simplesmente veículos elétricos ou ainda veículos elétricos “puros”.
É possível verificar o grau atual de difusão dessas modalidades de veículos com
tecnologia alternativa a partir dos dados de vendas nos Estados Unidos. Os veículos
híbridos, cujo início da comercialização remonta ao final da década de 1990, já se
firmaram como uma realidade. Suas vendas nos últimos anos estiveram na ordem de
300 mil unidades no território americano e representavam quase 3% do mercado total de
veículos novos. Em 2012, foram mais de 430 mil unidades vendidas, que, juntas com
todos os demais veículos elétricos, totalizaram aproximadamente 3,4% do mercado.
Conforme ressaltado, os veículos elétricos ainda encontram-se em estágio inicial de
difusão, mas com grande potencial de expansão. Em 2010, foram apenas 345 unidades
comercializadas, porém este número rapidamente se elevou, ultrapassando 52 mil
unidades em 2012 (Tabela 13).
O Gráfico 9 retrata esse movimento de expansão recente com dados mensais
para as vendas de veículos elétricos como um todo nos Estados Unidos. Percebe-se que,
desde a introdução das primeiras unidades, em dezembro de 2010, o estoque de veículos
elétricos cresceu exponencialmente, com vigor ainda maior a partir do segundo semestre
de 2012. Nota-se que, naquele período, as vendas mensais de veículos elétricos novos
42
foram mais expressivas, contribuindo para a expansão do acumulado. Em janeiro de
2013, o estoque de unidades novas comercializadas até então superou o montante de 75
mil veículos.
Tabela 13 – Evolução das vendas de veículos híbridos e elétricos nos Estados
Unidos, 2007-2012 (unidades)
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Veículos híbridos Veículos elétricos*
352.274
313.673
290.292
274.210
345
266.329
17.735
434.645
52.835
Participação de mercado (%)
2,99
2,37
2,78
2,37
2,23
3,38
Fonte: Elaboração própria. Dados da Electric Drive Transportation Association (EDTA). Disponível em:
<www.electricdrive.org>.
* Vendas a partir de dezembro de 2010. Incluem veículos elétricos a bateria, com autonomia estendida e,
a partir de 2012, híbridos plug-in.
Gráfico 9 – Vendas acumuladas de veículos elétricos* nos Estados Unidos,
dezembro de 2010 a janeiro de 2013 (unidades)
Fonte: Electric Drive Transportation Association (EDTA).
Nota: Em vermelho, montante de novas unidades vendidas em cada mês.
* Veículos elétricos a bateria, com autonomia estendida e, a partir de 2012, híbridos plug-in.
Esses números ainda representam uma pequena parcela do mercado, se
comparados com o volume de veículos comercializados com a tecnologia dominante
atual, porém as estimativas de vendas globais para os próximos anos mostram um
mercado em forte ritmo de expansão, particularmente no caso dos veículos elétricos
(Gráfico 10). A venda de veículos híbridos, embora crescente, deve seguir um ritmo
43
mais cadenciado, ao passo que os veículos elétricos – tanto a bateria como híbridos
plug-in – devem apresentar um incremento mais acelerado nas vendas, de modo que em
cerca de cinco anos a proporção de tais veículos vendidos seja quase equivalente à de
veículos híbridos. Sinaliza-se também para uma expansão das vendas ainda maior dos
veículos elétricos a bateria em comparação aos elétricos híbridos plug-in.
Gráfico 10 – Estimativa da evolução das vendas globais de veículos elétricos e
híbridos, 2011-2017 (unidades)
Fonte: Pike Research (2011).
Nota: BEV = veículos elétricos a bateria; PHEV = veículos elétricos híbridos plug-in; HEV = veículos
elétricos híbridos (ou simplesmente veículos híbridos).
Em uma perspectiva da demanda em mais longo prazo, aponta-se para a
consolidação das vendas dos veículos puramente elétricos com autonomia de 400
quilômetros e dos veículos elétricos híbridos plug-in com autonomia de 120
quilômetros. Para o período estimado de quarenta anos, espera-se uma tendência de
predomínio das vendas dos veículos elétricos híbridos plug-in em relação aos veículos
puramente elétricos. Todavia, a taxa de crescimento das vendas destes últimos deve ser
maior que daqueles, em especial a partir de meados da década de 2030. A partir de tal
momento, deve ocorrer uma consolidação dentre os veículos plug-in daqueles de maior
autonomia concomitante a um declínio das vendas dos demais. No caso dos veículos
puramente elétricos, a tendência é de continuidade da expansão das vendas, porém da
mesma forma com maior expressividade dos veículos com maior autonomia. Em 2050,
estima-se que as vendas de todos os veículos puramente elétricos e plug-in se
aproximem de 120 milhões de unidades anuais (Gráfico 11).
44
Com esse dinamismo das vendas, o estoque global de veículos equipados com
essas tecnologias deve ultrapassar um bilhão de unidades até 2050. As tendências para
os estoques de cada modalidade de veículo seguem as tendências das respectivas
vendas, porém com relativa defasagem, de aproximadamente uma década, para que as
mudanças observadas no ritmo das vendas se verifiquem em termos dos estoques
(Gráfico 12).
Gráfico 11 – Estimativa da evolução das vendas globais de veículos elétricos*,
2010-2050 (milhões de unidades)
Fonte: OCDE e IEA (2012).
* Vendas esperadas de acordo com o tipo de tecnologia – veículos elétricos a bateria ou simplesmente
veículos elétricos (EV) e veículos elétricos híbridos plug-in (PHEV) – e a autonomia em quilômetros.
Gráfico 12 – Estimativa da evolução do estoque global de veículos elétricos*, 20102050 (milhões de unidades)
45
Fonte: OCDE e IEA (2012).
* Estoque esperado de acordo com o tipo de tecnologia – veículos elétricos a bateria ou simplesmente
veículos elétricos (EV) e veículos elétricos híbridos plug-in (PHEV) – e a autonomia em quilômetros.
As tendências das vendas e do estoque de veículos elétricos por país são
apresentadas nos Gráficos 13 e 14, respectivamente. Observa-se que até 2020 a China
deve alcançar mais de 1,5 milhão de unidades vendidas anualmente com a nova
tecnologia e, com isso, ultrapassar os Estados Unidos. As vendas americanas, apesar de
mais fortes no início, devem seguir crescendo a taxas menores ao longo do tempo. O
Japão também se mostra um importante mercado de expansão futura das vendas, assim
como um conjunto de países da União Europeia. As vendas anuais dos países listados
devem corresponder a quase 6 milhões de veículos por volta de 2020.
Nesse cenário, o estoque total de veículos elétricos comercializados por esses
países em menos de dez anos deve se aproximar de 20 milhões de unidades. A tendência
do estoque por país é semelhante à das vendas, porém com certa defasagem temporal.
Dado que se espera um ritmo de vendas desses veículos inicialmente maior nos EUA
em comparação com a China, o estoque deve ser superior no território americano nessa
fase inicial. Todavia, com a expansão do mercado chinês a taxas mais elevadas adiante
para essa modalidade de veículos, o estoque tende a se fortalecer, atingindo cerca de 5
milhões de unidades até 2020.
Gráfico 13 – Estimativa da evolução das vendas de veículos elétricos* por países
selecionados, 2010-2020 (milhões de unidades)
Fonte: OCDE e IEA (2012).
* Veículos puramente elétricos e elétricos híbridos plug-in.
46
Gráfico 14 – Estimativa da evolução do estoque de veículos elétricos* por países
selecionados, 2010-2020 (milhões de unidades)
Fonte: OCDE e IEA (2012).
* Veículos puramente elétricos e elétricos híbridos plug-in.
Dentro dessa perspectiva, é decisiva no encaminhamento da dinâmica do setor a
orientação dada pela China ao longo dos próximos anos acerca da fabricação de
veículos com tecnologia sustentável, o que evidentemente não diminui a relevância da
influência das metas dos Estados Unidos e da União Europeia na evolução do setor. As
metas governamentais chinesas apontam para uma forte expansão da produção de
veículos elétricos – sejam a bateria, sejam híbridos plug-in – nos próximos anos.
Estima-se que a produção doméstica desses tipos de veículos passe de 500 mil unidades
em 2015 para 5 milhões de unidades em 2020 (Gráfico 15). Dessa forma, tal como o
forte movimento de expansão da produção e das vendas de veículos de combustão
interna no mercado chinês durante o último decênio, espera-se um grande impulso na
oferta e na demanda por veículos elétricos para os próximos anos. É indubitável,
portanto, a importância que terá a China na determinação da trajetória tecnológica
dominante e na velocidade de implementação das novas tecnologias.
Nesse sentido, em uma perspectiva brasileira, torna-se necessário refletir sobre o
posicionamento do país e os desafios que se colocam a partir desses encaminhamentos
na consolidação de uma nova tecnologia em âmbito global. Dado o crescente
direcionamento da demanda por matrizes energéticas alternativas, coloca-se ao país a
47
oportunidade de continuar a explorar a tecnologia bicombustível (flex fuel) e o potencial
do etanol em escala nacional, reforçando os elos produtivos e de desenvolvimento
tecnológico a partir das parcerias das montadoras com grandes sistemistas instalados no
Brasil.
Gráfico 15 – Perspectivas da produção total de veículos elétricos a bateria e
veículos elétricos híbridos plug-in na China, 2015 e 2020 (unidades)
Fonte: China’s State Council (2012).
Um indicador da importância adquirida pela tecnologia bicombustível e de sua
consolidação no mercado doméstico refere-se à distribuição das vendas de veículos
leves novos por combustível7 (Gráfico 16). Verifica-se que, após a introdução da nova
tecnologia no mercado em 2003, a participação dos veículos bicombustíveis cresceu
vertiginosamente. Em 2005, metade das vendas foi de veículos flex. A partir de 2007, a
proporção de tais veículos se estabilizou entre 85% e 90% das vendas totais de veículos
leves. Esse incremento ocorreu em detrimento das vendas de veículos apenas movidos a
gasolina.
Cabe frisar ainda que, se fossem considerados somente os automóveis (isto é,
excluídos os comerciais leves do total de veículos leves), o percentual recente de
veículos bicombustíveis seria ainda maior. Segundo dados da Anfavea (2012), em 2000,
99,2% dos automóveis novos licenciados eram movidos a gasolina. Essa parcela
declinou ao longo da década até atingir 4,6% em 2009, mantendo-se em 5% em 2010 e
7,5% em 2011. Em contrapartida, a proporção de automóveis novos bicombustíveis
7
Optou-se por considerar apenas veículos leves (automóveis e comerciais leves), ao invés do total de
veículos, pois no caso de caminhões e ônibus os veículos são movidos sobretudo a diesel.
48
cresceu vertiginosamente desde 2003, passando de 3,5% naquele ano para 95,4% em
2009. Em 2010 e 2011, 95% e 92,5% do total de automóveis novos licenciados
possuíam tecnologia flex fuel, respectivamente. Isso reforça a importância de o país
seguir explorando esse elemento de competitividade do setor mediante, por exemplo, o
aperfeiçoamento dos níveis de eficiência energética e redução da emissão de poluentes8
e, consequentemente, se fortalecer na geração de tecnologias sustentáveis.
Gráfico 16 – Distribuição das vendas de autoveículos leves novos por combustível,
Brasil, 2000-2011 (%)
5,9
0,7
4,6
4,0
5,3
1,2
4,2
3,7
2,8
4,3
4,8
3,9
4,7
4,5
5,2
5,9
85,6
87,2
88,2
86,4
83,1
0,0
10,5
0,0
8,1
0,0
7,4
0,0
8,4
0,0
11,0
4,5
21,6
3,3
50,2
78,1
93,4
93,5
91,4
89,2
2,0
70,8
43,1
0,1
17,3
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
1.403.833 1.511.187 1.404.265 1.291.750 1.523.521 1.618.947 1.831.712 2.341.032 2.670.991 3.008.742 3.328.948 3.425.674
Gasolina
Etanol
Bicombustível
Diesel
Fonte: Elaboração própria. Dados Anfavea.
Nota: Os valores apresentados abaixo dos anos representam o número total de licenciamentos de
autoveículos leves novos.
Em uma perspectiva mais ampla das atividades de inovação realizadas pelo setor
automotivo
no
Brasil,
convém
destacar
alguns
indicadores
de
pesquisa,
desenvolvimento e inovação (P&D&I) que permitem o dimensionamento dessas
atividades pelas empresas do setor em âmbito nacional (Tabela 14). Observa-se que a
indústria automotiva como um todo apresenta um índice de empresas inovadoras
(45,1%) superior ao da indústria em geral (38,1%) ou da indústria de transformação
(38,4%). Contribui para isso, em especial, o setor automobilístico, produtor de veículos
leves e pesados, no qual 30 empresas do total de 36 empresas consideradas
8
Nesse âmbito, pode-se mencionar, por exemplo, a necessidade de adequação da produção às normas de
redução da emissão de poluentes até 2014 (ou 2013, no caso de veículos a diesel), de modo que veículos
com peso de até 1.700 quilogramas devem reduzir em 35% a emissão de monóxido de carbono (de 2g/km
para 1,3g/km) e veículos com peso superior devem apresentar redução de 26% na emissão (de 2,7g/km
para 2g/km).
49
implementaram inovações de produto e/ou processo no período 2006-2008. Vale
destacar que a indústria automotiva respondeu, em 2008, por 16,3% do total de gastos
com P&D no país. Esse percentual foi ainda mais expressivo (28,9%) se considerados
apenas os gastos com P&D internos às empresas, ou seja, atividades em inovação
efetivamente conduzidas pelas empresas listadas e não por terceiros contratados ou
referentes a tecnologias adquiridas. Uma vez mais, o setor automobilístico foi o
primordial para a obtenção desses resultados, ainda que o segmento de autopeças
também exerça atividade inovadora bastante relevante.
Tabela 14 – Indicadores de P&D&I da indústria automotiva brasileira, 2008 (%)
Inovadoras
38,1
P&D
100,0
P&D interno
100,0
P&D / RL
2,54
38,4
98,9
99,3
2,60
0,64
24,6
Automóveis, camionetas e utilitários, caminhões e ônibus
83,2
11,9
23,2
4,20
2,01
47,9
Peças e acessórios para veículos
46,7
3,8
4,9
2,36
0,74
31,4
Cabines, carrocerias, reboques e recondicionamento de motores
41,6
0,6
0,8
2,51
0,79
31,5
Subtotal Indústria Automotiva
45,1
16,3
28,9
3,47
1,51
43,4
Indústria Geral
Indústrias de Transformação
P&D Int / RL P&D Int / Total
0,62
24,5
Fonte: Elaboração própria. Dados Pintec 2008 – IBGE.
Notas: RL = Receita Líquida; P&D = Gastos totais com Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), que podem
incluir gastos internos e externos (por exemplo, contratação de serviços de outras organizações) à
empresa; P&D Int = Gastos com Pesquisa e Desenvolvimento internos à empresa.
Desses indicadores é possível constatar a elevada importância do setor
automotivo nas atividades inovadoras no país. Esse papel de destaque em relação aos
demais setores pode ser notado, ademais, a partir da proporção de receitas destinadas
aos gastos com P&D. Enquanto a indústria em geral destinou 2,5% das receitas para
P&D em 2008, esse percentual alcançou 3,5% no setor automotivo e 4,2% entre
veículos leves e pesados. Tomados somente os gastos com P&D internos às empresas,
essa proporção foi de apenas 0,6% no caso da indústria em geral e de 1,5% e 2%,
respectivamente, no setor automotivo como um todo e no setor automobilístico em
particular. Vale enfatizar ainda que, enquanto os gastos com P&D internos às empresas
corresponderam a 24,5% dos gastos totais com P&D na indústria em geral, esse
percentual foi de 43,4% na indústria automotiva e quase metade (47,9%) no caso de
autoveículos, reforçando o argumento de se tratar de um setor extremamente
significativo na condução de atividades inovadoras em comparação à média da indústria
(Tabela 14). Cabe destacar, contudo, apesar da limitação e pouco detalhamento dos
dados, que a relação de gastos com P&D como proporção das receitas registrada pelas
empresas no país se mostrou inferior ao verificado nas corporações em âmbito global
50
(vide discussão pertinente à Tabela 12). Nesse sentido, haveria espaço para exigir como
iniciativa de política para fomento às atividades inovadoras contrapartidas maiores em
relação aos gastos com inovação domesticamente, seguindo nas filiais instaladas no
Brasil nível semelhante ao de desenvolvimento de tecnologias em outras localidades,
particularmente nas matrizes.
Diante dos cenários descritos, devem-se considerar os desafios colocados a partir
da consolidação de um novo padrão tecnológico em escala global, o que em grande
medida está atrelado ao posicionamento chinês, além dos tradicionais mercados
americano e europeu. Caso maior direcionamento seja dado aos veículos híbridos,
apresenta-se como possibilidade de inserção do Brasil a combinação entre etanol e
motor elétrico. Todavia, se os esforços se concentrarem nos veículos puramente
elétricos, os riscos ao país tendem a ser maiores. O efeito escala da China pode baratear
o custo de produção desses veículos – o que atualmente ainda permanece uma barreira
importante na consolidação dessa tecnologia – e, com isso, resultar em ampla difusão da
comercialização.
Ademais, pode-se verificar um processo concorrencial mais intenso com efeitos
sobre a base produtiva doméstica, haja vista o padrão de especialização da estrutura
produtiva brasileira em veículos compactos. Com a entrada de China e Índia no nicho
de mercado dos veículos de menor porte (compactos e subcompactos), mais propícios a
veículos elétricos devido a questões técnicas (como peso, autonomia, etc.) e ambientais,
além do próprio direcionamento da demanda, a concorrência tende a se intensificar.
Além disso, pode-se impor uma questão estrutural nas contas externas, acentuando-se o
déficit na balança comercial, caso não haja um acompanhamento da cadeia produtiva
nacional de acordo com as transformações em âmbito mundial para atender à demanda
por tecnologias alternativas, sobretudo no caso da entrada e do fortalecimento da
trajetória em direção aos veículos elétricos. Logicamente os desdobramentos dessa
dinâmica no mercado nacional dependerão do padrão regulatório em torno dessas novas
categorias de veículos, em especial no que concerne à segurança e ao nível de eficiência
energética, além de possível adequação tributária, mediante por exemplo alíquotas
diferenciadas de IPI aos novos veículos, conforme seu grau de eficiência energética.
Soma-se a esses desafios a baixa participação no país dos principais
desenvolvedores das novas tecnologias, com exceção da General Motors. Conforme
visto, apesar de crescente a participação de montadoras japonesas, pioneiras no
desenvolvimento de veículos movidos com tecnologia alternativa, o mercado brasileiro
51
ainda continua muito concentrado em montadoras que, embora invistam grande volume
de capital em pesquisa e desenvolvimento, encontram-se competitivamente mais
defasadas em relação às suas concorrentes asiáticas neste fator de consolidação de uma
forma alternativa de propulsão. É a partir dessa estrutura de mercado concentrada,
porém altamente competitiva, que deve se consolidar o mercado de veículos híbridos e
elétricos. Em decorrência disso, torna-se mais difícil esperar das companhias um
engajamento maior no desenvolvimento tecnológico doméstico nesta área de fronteira
do setor automobilístico.
Ainda que o novo regime automotivo, a ser apresentado adiante, represente
avanços de política em relação ao setor e à promoção tecnológica em âmbito nacional,
pode-se caracterizá-lo como tímido diante das transformações mundiais que se
sinalizam para o setor nos próximos anos. Isso ocorre particularmente por não incluir
explicitamente metas em relação ao desenvolvimento de tecnologias alternativas,
notadamente de veículos elétricos; e também por exigir relativamente pouco das
empresas em termos dos gastos em P&D para se abater as alíquotas maiores de imposto.
Com base nos dados apresentados anteriormente, as corporações automobilísticas
(incluindo-se montadoras e autopeças) em nível global investem em média quase 5% de
suas receitas em P&D – proporção superior à de filiais instaladas no Brasil –, ao passo
que no novo regime a meta consiste em alcançar apenas 0,5% até 2017, o que
nitidamente atestaria a possibilidade de contrapartidas mais expressivas das subsidiárias
em operação no país. Ou seja, o programa poderia exigir a aplicação de um volume de
recursos
mais
elevado
pelas
empresas
no
desenvolvimento
de
tecnologia
domesticamente e, ao mesmo tempo, fornecer maior direcionamento a esses recursos,
sobretudo no que tange à incorporação dos veículos elétricos.
6. Atributos de competitividade do setor automobilístico no Brasil
A partir das considerações sobre as estruturas de oferta e demanda do setor
automobilístico, exploram-se seus atributos de competitividade no Brasil. Retomam-se
os
atributos
anteriormente
mencionados
(capacidade
de
inovação,
regime
macroeconômico, padrão de financiamento, estrutura de proteção, estratégias
intracorporação a partir de vantagens de custo e oportunidades de demanda, gestão do
grau de utilização da capacidade, padrão de especialização da produção e
complementaridade regional) a fim de apontar desafios e oportunidades que se colocam
ao setor.
52
a. Desafios e deficiências
Como principais desafios à competitividade do setor apresentam-se:
1. Em relação à capacidade de inovação: o volume ainda baixo de gastos em
P&D pelas empresas e o desenvolvimento restrito de tecnologias e produtos em âmbito
doméstico, além das poucas linhas governamentais de fomento à inovação, o que tende
a melhorar em alguma medida com as políticas setoriais a vigorar nos próximos anos.
2. Em relação ao regime macroeconômico: i) o comportamento da taxa de
câmbio, em particular seu nível relativamente apreciado (atualmente menos do que na
maior parte do período de expansão da demanda doméstica na década de 2000) e seu
elevado grau de volatilidade, favorecendo importações de bens finais e insumos,
ameaçando os elos da cadeia produtiva e prejudicando decisões de investimento; ii) o
regime tributário em termos da incidência de impostos e contribuições sobre as
empresas do setor, que poderiam ser reduzidos mediante, por exemplo, o cumprimento
de metas de inovação tecnológica no setor.
3. Em relação ao padrão de financiamento: a ausência de um sistema financeiro
nacional com instituições privadas para financiamento do investimento, ou seja, a
dificuldade de as empresas captarem recursos via crédito bancário ou mercado de
capitais, o que torna o autofinanciamento das filiais, os empréstimos das matrizes e os
empréstimos do BNDES as principais fontes de financiamento para ampliação de
capacidade produtiva ou realização de atividade inovadora.
4. Em relação à estrutura de proteção: o forte aumento das importações de
veículos e autopeças, o acirramento da concorrência interna e a manutenção da cadeia
produtiva doméstica com a entrada de novos players ou mesmo a reorientação da
produção de montadoras em outras localidades para o mercado brasileiro, dada a taxa de
câmbio, a estrutura tributária e os acordos comerciais entre países.
5. Em relação às estratégias intracorporação: a ampliação e redirecionamento da
oferta externa a curto prazo para suprir a expansão da demanda doméstica.
6. Em relação ao grau de utilização da capacidade: o aquecimento da produção e
a utilização próxima de 90% da capacidade instalada, exigindo novos investimentos ou
suprimento por importações.
7. Em relação ao padrão de especialização da produção: a intensificação da
concorrência com a entrada de China e Índia nos mercados de veículos de menor porte,
53
além de recente demanda doméstica crescente por veículos de diversos portes e
categorias, muitas vezes suprida por oferta externa.
8. Em relação à complementaridade regional: a possibilidade de rápido
reposicionamento geográfico da produção na ausência de uma estrutura de proteção
adequada.
b. Vantagens e oportunidades
Como principais oportunidades à competitividade setorial, colocam-se:
1. Em relação à capacidade de inovação: a introdução da tecnologia
bicombustível em veículos leves e os consequentes desdobramentos na continuidade do
aperfeiçoamento da tecnologia em termos de eficiência energética e emissão de
poluentes.
2. Em relação ao regime macroeconômico: i) o processo de redução da taxa de
juros ao longo dos últimos anos, cuja trajetória deve ser mantida para facilitar as
condições de financiamento e, assim, ampliar as oportunidades de investimento para as
empresas e aquisição de veículos pelas famílias; ii) o regime tributário em termos dos
efeitos de desonerações tributárias sobre as vendas de veículos, conforme evidenciado
no caso da política de redução do IPI.
3. Em relação ao padrão de financiamento: a melhoria das condições de
financiamento atreladas tanto a novos investimentos como à comercialização de
veículos, dada a elevação do volume de crédito, a redução das taxas de juros e a
ampliação dos prazos de pagamento nos últimos anos a partir do movimento de declínio
da taxa Selic.
4. Em relação à estrutura de proteção: as exigências (ainda que limitadas) de
produção com conteúdo nacional e desenvolvimento tecnológico doméstico para
empresas instaladas no país e novos entrantes a partir do novo regime automotivo.
5. Em relação às estratégias intracorporação: o anúncio de planos de
investimento para criação ou ampliação de capacidade produtiva no país nos próximos
anos por algumas montadoras frente à sustentação da demanda doméstica.
6. Em relação ao grau de utilização da capacidade: a necessidade de nova rodada
de investimentos para aumento da capacidade produtiva das empresas.
7. Em relação ao padrão de especialização da produção: seu alinhamento para
produzir sobretudo veículos de menor porte com a orientação mais ampla da demanda
mundial por veículos compactos e subcompactos.
54
8. Em relação à complementaridade regional: a possibilidade de exportações a
partir dos novos investimentos.
7. Políticas de apoio ao setor automobilístico
Discutem-se, nesta seção, as principais políticas atuais de apoio ao setor
automobilístico no Brasil. Enfatizam-se, em particular, a política de incentivos
tributários mediante a redução da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados
(IPI) incidente sobre veículos e o estabelecimento do novo regime automotivo.
Complementarmente, realizam-se algumas reflexões sobre a possibilidade de se ampliar
a capacidade de inovação do setor no país.
a. Políticas atuais
Dada a importância do setor automobilístico na estrutura produtiva brasileira
para agregação de valor e geração de emprego e em razão do agravamento da crise
econômica internacional e seu efeito contágio dos países centrais para as economias
periféricas a partir da falência do banco de investimentos americano Lehman Brothers e
a consequente contração da liquidez nos mercados de crédito, o governo brasileiro
implementou rapidamente, em dezembro de 2008, uma política tributária de redução do
IPI diferenciada de acordo com os tipos de veículos produzidos9, cujo objetivo central
era reaquecer a demanda final por veículos a curto prazo e evitar um aprofundamento da
crise em termos de emprego e renda. O Quadro 2 sintetiza as principais alterações nas
alíquotas incidentes sobre os diferentes veículos leves a partir daquele período10.
Adotou-se alíquota zero para os carros de até mil cilindradas. Para os
automóveis de motorização 1.1 a 2.0, a alíquota foi reduzida pela metade, passando para
6,5% no caso de carros a gasolina e 5,5% no caso de carros a álcool ou bicombustíveis.
A alíquota incidente sobre veículos comerciais reduziu de 8% para 1%. Essa medida
tributária foi inicialmente prevista para vigorar até o final de março de 2009. Todavia,
com a continuidade dos efeitos negativos da crise sobre o país, sobretudo em termos da
atividade econômica e do emprego, a política foi prorrogada até junho e,
posteriormente, setembro daquele ano.
9
Para uma comparação entre as políticas de estímulo ao setor adotadas por diversos países frente à crise
internacional, ver Borghi (2011).
10
Em relação a veículos pesados, a alíquota foi zerada para caminhões. Sobre ônibus, a alíquota já era
nula.
55
Estabeleceu-se a partir daquele momento que as alíquotas retornariam
paulatinamente até janeiro de 2010 aos patamares anteriores à crise. As alíquotas sobre
veículos a gasolina voltaram a seus níveis pretéritos de 7% e 13% no caso de veículos
com motorização até 1.0 e entre 1.1 e 2.0, respectivamente. A de comerciais leves subiu
para 4%. As alíquotas sobre carros a álcool ou bicombustíveis, por sua vez,
permaneceram reduzidas ao longo do primeiro trimestre de 2010, retornando aos
patamares de 7% (até 1.0) e 11% (1.1 a 2.0) a partir de abril.
Deve-se frisar que as vendas de veículos leves se recuperaram fortemente em
2009 após a adoção da política tributária, praticamente retornando em março daquele
ano, mês inicialmente previsto para o término da alíquota reduzida de IPI, ao patamar
anterior à crise, de setembro de 2008. De modo geral, refletindo as diversas
prorrogações, realizadas trimestralmente, dos prazos de vigência do incentivo tributário,
as vendas aumentaram de maneira expressiva nos meses de março, junho, setembro e
dezembro de 2009, tal como explicitado pela evolução das vendas totais de autoveículos
apresentada no Gráfico 8 em seção anterior.
Quadro 2 – Alterações das alíquotas do IPI sobre veículos leves a partir da crise
Motorização
Até 1.0
1.1 a 2.0
Comerciais
leves
Combustível
Álcool ou
bicombustível
Gasolina
Álcool ou
bicombustível
Gasolina
Todos
Antes
da
crise
Dez.
2008*
Jan.
2010
Abr.
2010
Fora do novo
regime
automotivo**
Mai. 2012 a
Dez. 2012***
Jan. 2013 a
Dez.
2013****
7%
0%
3%
7%
37%
0% / 30%
2% / 32%
7%
0%
7%
7%
37%
0% / 30%
2% / 32%
11%
5,5%
7,5%
11%
41%
5,5% / 35,5%
7% / 37%
13%
6,5%
13%
13%
43%
6,5% / 36,5%
8% / 38%
8%
1%
4%
4%
34%
1% / 31%
2% / 32%
Fonte: Decretos nº 6.687 de 11 de dezembro de 2008, nº 6.809 de 30 de março de 2009, nº 6.890 de 29 de
junho de 2009, nº 7.017 de 26 de novembro de 2009, nº 7.660 de 23 de dezembro de 2011, nº 7.716 de 3
de abril de 2012, nº 7.725 de 21 de maio de 2012 e nº 7.834 de 31 de outubro de 2012. Ver também
Anfavea (2010), Prado (2012) e Planalto (2013).
* Alíquotas em vigor até março, junho e setembro de 2009, após distintas prorrogações. Retorno
paulatino, com elevações mensais, até janeiro de 2010, ao patamar anterior à crise. No caso dos veículos a
álcool ou bicombustíveis, retorno ao patamar original em abril de 2010.
** Lançado em setembro de 2011 e válido de dezembro de 2011 a dezembro de 2012, com novas regras
em vigor de 2013 a 2017.
*** À esquerda, alíquotas em vigor sobre veículos dentro das regras do regime automotivo. À direita,
alíquotas sobre veículos que não satisfazem as regras do regime válido até o final de 2012.
**** Alíquotas anunciadas até o final de 2013. Alíquotas deveriam sofrer três elevações ao longo do
primeiro semestre do ano para retornar ao patamar pretérito, porém o governo optou ao final de março por
manter as alíquotas reduzidas até o final do ano no patamar em que se encontravam após o primeiro
reajuste, ocorrido em janeiro. À esquerda, na tabela, apresentam-se as alíquotas em vigor sobre veículos
dentro das regras do regime automotivo. À direita, as alíquotas sobre veículos que não satisfazem as
regras do regime válido a partir de 2013.
56
Apresentam-se no Quadro 2, ademais, as alíquotas que passaram a vigorar sobre
os veículos que não se enquadravam no regime automotivo adotado a partir do final de
2011, bem como a nova rodada de redução do IPI realizada pelo governo para vigorar
do final de maio a dezembro de 2012, com prorrogações de dois meses no final de
agosto e outubro, e as alíquotas em vigor para 2013. Diante da forte elevação das
importações para atender o mercado interno e da preocupação governamental em
preservar as bases industriais domésticas e manter o nível de produção e emprego,
estabeleceu-se em setembro de 2011 o novo regime automotivo, válido de dezembro de
2011 a dezembro de 2012, segundo o qual as montadoras deveriam utilizar no mínimo
65% de conteúdo nacional ou regional (Mercosul e México) na fabricação de seus
veículos, além de investir em pesquisa e desenvolvimento e realizar ao menos 6 de 11
etapas produtivas em território nacional. A partir do novo regime, todos os veículos não
enquadrados na nova regulamentação sofreriam aumentos de 30 pontos percentuais nas
alíquotas incidentes.
De 2013 a 2017, vigoram novas regras que expressam a necessidade de também
se promover a inovação tecnológica em âmbito doméstico dado o crescente potencial de
demanda interna por veículos. O Decreto nº 7.819/2012 regulamenta o Programa de
Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos
Automotores (o Inovar-Auto), que constitui parte da política industrial, tecnológica e de
comércio exterior do governo federal expressa no Plano Brasil Maior. A partir de então,
as empresas devem cumprir 3 de 4 requisitos para abater o aumento de 30 pontos
percentuais no IPI. As regras são: investir no mínimo 0,15% da receita operacional
bruta em inovação em 2013, o que subirá para até 0,5% em 2017; apresentar no mínimo
0,5% da receita operacional bruta investida em engenharia, o que subirá até 1% em
2017; realizar no país 8 de 12 etapas produtivas na fabricação de veículos leves e 10 de
14 no caso de veículos pesados em 2013, o que subirá até 2017 para 10 de 12 etapas e
12 de 14 etapas para veículos leves e pesados, respectivamente; elevar o nível de
eficiência energética dos veículos, de acordo com selo de consumo de energia do
Inmetro (25% dos veículos produzidos em 2013, subindo para 100% em 2017).
Indubitavelmente, as proposições do programa impelem uma dinâmica em favor
da ampliação dos investimentos e da manutenção das bases produtivas nacionais,
particularmente ao exigir o cumprimento de grande parte das etapas produtivas no país.
Também preveem um incremento substancial do nível de eficiência energética dos
veículos ao longo dos anos. Esses fatores tendem a elevar as barreiras à entrada para
57
potenciais concorrentes no mercado. Todavia, conforme ressaltado anteriormente, o
programa poderia se mostrar mais ambicioso no quesito de fomento à inovação e
engajamento do país nas trajetórias tecnológicas futuras, ao aplicar exigências maiores
às empresas no sentido de ampliar o volume de recursos investidos domesticamente no
desenvolvimento de tecnologia e promover maior direcionamento desses recursos às
tecnologias de ponta, sobretudo em relação aos veículos elétricos.
b. Proposições para ampliar a capacidade de inovação no Brasil
Entende-se que, numa perspectiva de mais longo prazo, é necessária uma
reestruturação produtiva apoiada no desenvolvimento tecnológico e em um novo ciclo
de investimentos, cujo encaminhamento está em curso a partir dos recentes planos de
expansão da capacidade produtiva no país anunciados por algumas montadoras para os
próximos anos. Isso, no entanto, requer uma reflexão sobre o comportamento das
companhias instaladas no Brasil e dos novos entrantes, uma vez que respondem por
grande parcela dos fluxos comerciais, tecnológicos e de capitais e se encontram
inseridas numa lógica de operação comandada pelas estratégias globais das corporações,
o que, por sua vez, tem impacto sobre a dinâmica produtiva doméstica e as contas
externas do país.
Torna-se necessário, portanto, repensar o regime de proteção (proteger o país de
quem?) e de acumulação (proteger o país para quem?) vigente para o setor no país.
Nesse âmbito, é indispensável ter em mente, no que concerne à atuação das montadoras
em território nacional, sobretudo de novos entrantes no mercado, suas estratégias em
relação: i) à importação de bens finais (veículos); ii) à instalação de unidades
produtivas, ou seja, realização de investimentos no mercado doméstico; iii) à
importação de insumos (autopeças) para produção e à manutenção de conteúdo
nacional; e iv) ao desenvolvimento de tecnologia em âmbito nacional. Nesse sentido, o
estabelecimento do novo regime automotivo revela avanços de política, ainda que
limitados, para o setor acerca dessas questões.
No entanto, exige-se que outros mecanismos de estímulo setoriais e
macroeconômicos sejam simultaneamente adotados ou reforçados, preferencialmente de
maneira coordenada, caso o objetivo consista em sustentar uma trajetória de
crescimento do setor com impactos positivos sobre a cadeia produtiva, sobretudo diante
da persistência de um cenário internacional de baixo dinamismo. Podem-se mencionar,
por exemplo: a continuidade do processo de redução da taxa básica de juros e seu
58
repasse tanto para a comercialização de veículos, ampliando o volume de crédito ao
consumidor a taxas mais baixas, como para o financiamento das empresas na realização
de novos investimentos; políticas de contenção da apreciação e volatilidade da taxa de
câmbio; medidas para assegurar a competitividade dos fornecedores de autopeças no
país e sua inserção no desenvolvimento de novas tecnologias em conformidade com os
encaminhamentos da trajetória tecnológica; e a negociação de redução da carga
tributária para empresas que cumpram metas preestabelecidas em relação à produção e à
inovação no país, semelhante ao caso do IPI dentro do regime automotivo.
No que se refere especificamente à ampliação da capacidade de inovação do
setor no país, destacam-se como principais diretrizes (em parte, refletidas em algumas
medidas em curso que eventualmente podem ser aprofundadas): i) incentivos fiscais
e/ou ampliação das linhas de financiamento mediante agências de fomento federais ou o
BNDES para que as empresas ampliem os investimentos em P&D domesticamente; ii)
apoio às atividades conjuntas de desenvolvimento tecnológico entre montadoras e
sistemistas instalados no país, sobretudo para aperfeiçoar níveis de eficiência energética
e redução da emissão de poluentes dos veículos com tecnologia bicombustível; iii)
fomento às parcerias de pesquisa entre empresas e universidades para a geração ou
aprimoramento de tecnologias sustentáveis; e iv) fortalecimento da capacitação
profissional mediante ampliação de cursos técnicos e educação superior em áreas de
engenharia, inclusive com internacionalização do ensino e pesquisa (vide programa
Ciência sem Fronteiras). Tais iniciativas teriam por objetivo fomentar o processo de
inovação tecnológica em âmbito doméstico, concomitantemente ao aproveitamento por
parte das empresas do potencial de demanda interna por veículos.
Considerações finais
O setor automobilístico encontra-se diante de transformações-chave em âmbito
global tanto pelo lado da oferta como pelo lado da demanda. Isso abre claras
oportunidades às economias emergentes, que não mais apenas se colocam como
mercados produtores, mas crescentemente também como importantes e dinâmicos
centros consumidores. A inserção dessas economias, no entanto, depende de políticas
coordenadas que aproveitem essa reestruturação produtiva em escala global e o
redirecionamento da demanda para tornar ou manter o setor domesticamente
competitivo e produzir impactos positivos em termos de geração de emprego e renda
sobre o restante da economia.
59
Faz-se necessário, portanto, às economias com estrutura industrial consolidada e
peso significativo do setor, como é o caso brasileiro, refletir a respeito dos impactos
dessas transformações em âmbito internacional sobre a dinâmica do setor em escala
nacional. Isso envolve a execução de planos de investimento para ampliação da
capacidade produtiva nos próximos anos, a entrada de novos concorrentes no mercado
doméstico via importações e produção local, os efeitos das estratégias corporativas de
redirecionamento da produção sob integração regional sobre os elos da cadeia produtiva
e particularmente os estímulos à expansão da capacidade de inovação do setor no país.
É importante que a continuidade do processo de expansão da demanda
doméstica por veículos se converta em um processo simultâneo de fortalecimento da
indústria automobilística brasileira, mediante ampliação da capacidade produtiva,
promoção de inovações tecnológicas e ganhos de competitividade. Observou-se no
período recente, em especial diante da crise, um descompasso entre a demanda e a
oferta interna, haja vista o intenso fluxo de importações para suprir o aquecimento do
mercado nacional em termos de bens finais e insumos. A elevada relação
importação/investimento diante de um alto grau de utilização da capacidade instalada e
elevado volume de lucros e dividendos remetidos ao exterior que poderiam ser
reinvestidos no país aponta para um baixo comprometimento das empresas com as
bases produtivas domésticas.
Somam-se a isto os gastos em pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D&I)
realizados pelas empresas. Embora a indústria automotiva seja um dos principais setores
promotores de atividades inovadoras no país, há espaço para que tais gastos se ampliem
como proporção das receitas domésticas, seguindo o padrão das corporações em âmbito
global. Nesse sentido, as metas do programa Inovar-Auto poderiam ter sido mais
ambiciosas, sobretudo no que tange ao desenvolvimento de tecnologias. Se, por um
lado, exigências maiores poderiam ter sido aplicadas às empresas para ampliarem seus
gastos em inovação no país; por outro, um direcionamento maior desses recursos às
tecnologias de ponta, sobretudo contemplando veículos elétricos e os desdobramentos
da nova trajetória tecnológica, deveria ter sido promovido.
Ciente da relevância do setor na estrutura industrial brasileira e no dinamismo
econômico do país, torna-se indispensável uma crescente coordenação entre as políticas
macroeconômicas, industriais e de inovação que afetam o setor. Quanto maiores os
investimentos em geral, com crescente importância das filiais e da base produtiva local
na dinâmica das corporações, maiores também as possibilidades de investimentos em
60
inovação de produto e processo em âmbito doméstico. Dessa forma, a execução dos
planos de investimento programados pelas montadoras para os próximos anos,
sobretudo se acompanhados de ampliação do conteúdo produtivo e tecnológico
nacional, representa um passo importante para o aproveitamento da demanda doméstica
em expansão com fortalecimento dos encadeamentos produtivos, bem como
consolidação das bases para a geração de novas tecnologias no país.
Referências
ANFAVEA. Anuário da indústria automobilística brasileira 2010. São Paulo:
Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), 2010.
ANFAVEA. Anuário da indústria automobilística brasileira 2012. São Paulo:
Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), 2012.
ARNOLD, E.; WORMALD, J.; KITCHING, E.; OLLIVIER, A.-C. A survey of state
funding for vehicles R&D in selected countries. Report to PFF, Technopolis Group and
Vinnova (Agência de Inovação da Suécia), abr. 2007.
BAER, M.; CINTRA, M. A. M. Brasil: Investimento Estrangeiro Direto e Estratégias
Empresariais. Santiago: Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal),
set. 2004.
BIS. The 2010 R&D Scoreboard. UK: Department for Business, Innovation and Skills
(BIS), nov. 2010.
BORGHI, R. A. Z. Economia financeira e economia produtiva: o padrão de
financiamento da indústria automobilística. Dissertação (Mestrado em Ciências
Econômicas)–IE/Unicamp, Campinas, 2011.
BORLINA FILHO, V. Setor de caminhões e ônibus projeta retomada com crescimento
de 8% em 2013. Folha de S.Paulo, Rio de Janeiro, 2 jan. 2013
CARVALHO, E. G. de. Inovação tecnológica na indústria automobilística:
características e evolução recente. Revista Economia e Sociedade, IE/Unicamp,
Campinas, p. 429-461, dez. 2008.
CASOTTI, B. P.; GOLDENSTEIN, M. Panorama do setor automotivo: as mudanças
estruturais da indústria e as perspectivas para o Brasil. BNDES Setorial, Setor
Automotivo, Rio de Janeiro, n. 28, p. 147-188, set. 2008.
CEPAL. Inversión y estrategias empresariales en la industria automotriz. In: LA
INVERSIÓN extranjera en América Latina y el Caribe, 2003. Santiago: Cepal y
Naciones Unidas, maio 2004. p. 103-137.
CHINA’S STATE COUNCIL. Development Plan for Energy-Saving and New Energy
Vehicle Industry (2012-2020). Mimeo, 2012.
FREYSSENET, M.; LUNG, Y. Between globalization and regionalization: what is the
future of the automobile industry? GERPISA International Network, out. 1999.
GUEVARA, H. H.; TÜBKE, A.; HERVÁS, F.; CINCERA, M. The 2010 EU industrial
R&D investment scoreboard. European Union (EU): Institute for Prospective
Technological Studies (IPTS), Joint Research Centre (JRC), European Commission,
2010.
61
OCDE; IEA. EV City Casebook: a Look at the Global Electric Vehicle Movement.
Paris: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE),
International Energy Agency (IEA), 2012.
PIKE RESEARCH. Electric Vehicle Market Forecasts – Global Forecasts for LightDuty Hybrid, Plug-in Hybrid, and Battery Electric Vehicles: 2011-2017. Research
Report, 3. trim. 2011.
PLANALTO. Governo mantém IPI reduzido para caminhões e automóveis até
dezembro de 2013. Brasília: Portal do Planalto, 1 abr. 2013. Disponível em:
<www.planalto.gov.br>.
PRADO, M. Novo regime automotivo permitirá que montadoras escapem de alta do IPI.
Folha de S.Paulo, Brasília, 3 abr. 2012.
SARTI, F. Internacionalização comercial e produtiva no Mercosul nos anos 90. Tese
(Doutorado em Ciências Econômicas)–IE/Unicamp, Campinas, 2001.
SARTI, F. Cadeia: Automobilística. Nota técnica final. Estudo da Competitividade de
Cadeias Integradas no Brasil: impactos das zonas de livre comércio. Campinas:
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Núcleo de Economia Industrial e da
Tecnologia (NEIT-Unicamp); Brasília: Ministério do Desenvolvimento, da Indústria e
do Comércio Exterior (MDIC), Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT); Rio de
Janeiro: Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), dez. 2002.
UNCTAD. World Investment Report 2009: Transnational corporations, agricultural
production and development. New York; Geneva: United Nations, 2009.
62
Download

Abrir Arquivo