estratégia e execução | reportagem
empreendedorismo
O grande salto do
Youtube
A plataforma de compartilhamento de vídeos controlada
pelo Google vai, assim como o Netflix, competir diretamente
com a televisão, invadindo a telona com o decodificador
Chromecast, do Google; Shiva Rajaraman, diretor de gestão
de projetos do YouTube, detalha o caminho à massificação
A reportagem é da equipe
da Knowledge@Wharton.
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divulgação
C
Com um traje pressurizado que mais parecia a
roupa de um astronauta do que a de um paraquedista, o aventureiro austríaco Felix Baumgartner
pulou de uma plataforma situada a mais de 39
mil metros de altura, em Roswell, no estado norte-americano do Novo México. Só a subida até a
base do salto, a bordo de uma cápsula espacial levada à estratosfera por um balão aerostático, durou duas horas e meia.
Após alguns anos de preparação, havia chegado
a hora da verdade: pular (e sobreviver) depois de
se arriscar na que foi a maior queda e a maior distância já desafiadas por um ser humano até então.
“Sei que o mundo inteiro está olhando para
mim”, declarou Baumgartner alguns segundos
antes de se lançar pelos ares. E estava mesmo:
no dia 14 de outubro de 2012, data da etapa
mais perigosa do projeto (chamado de Red Bull
Stratos por causa do patrocinador, a marca de
bebida energética de mesmo nome), a transmissão pelo YouTube registrou mais de 8 milhões de
visualizações simultâneas –o número equivalia a
Lembrete HSM: O YouTube será um dos
temas da ExpoManagement 2014. Seu fundador,
Chad Hurley, será um dos palestrantes.
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Vídeo do DJ sul-coreano Psy, um dos hits do
YouTube, cujo clipe Gangnam Style já superou
2 bilhões de visualizações
A trajetória do YouTube, repassada por Rajaraman em sua
palestra, é fundamental para
explicar o salto que a empresa
tenta dar agora, especialmente
três sistemas que quebraram resistências de criadores de conteúdo, viabilizaram o modelo
de receita e aumentaram o alcance potencial.
o Sucesso foi construído
O volume da audiência atingido pelo YouTube
naquele dia, um recorde, representou um marco
importante na trajetória da empresa. “Ali entendemos que, se conseguíssemos fazer coisas fenomenais, estaríamos em condições de chegar até
a massa”, explicou Shiva Rajaraman, diretor de
gestão de projetos do site de compartilhamento
de vídeos, durante uma palestra proferida como
parte do evento BizTech@Wharton.
O fenômeno Gangnam Style, do astro pop sul-coreano Psy, confirmou essa sensação [recentemente ultrapassou os 2 bilhões de visualizações], passando de uma curiosidade divertida a um sucesso
mundial em pouco tempo.
Porém o interessante da trajetória do YouTube é
como sua atuação foi revolucionada desde que surgiu, principalmente como um “depósito” de vídeos
virais sobre animais de estimação. Tornou-se a ferramenta favorita dos espectadores de vídeos de duração mais longa por meio de dispositivos de todos
os tipos –computadores de mesa, tablets, celulares
e televisores de alta definição (HD).
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feedback
de anúncio
Quando decide assistir a um
anúncio até o fim, o usuário
do YouTube está confirmando
ao anunciante que ele é um
alvo potencial; esse feedback
é valioso para as empresas
Content ID. Pelo sistema
de identificação de conteúdos,
o YouTube passou a conseguir
rastrear os conteúdos protegidos por direitos autorais, com o
objetivo de permitir que os proprietários possam bloquear ou
cobrar pelo acesso a eles.
Anúncios TrueView. Esse sistema de anúncios de vídeo possibilita aos usuários
escolher a quais anúncios
desejam assistir depois de visualizar seus cinco segundos
iniciais (e os anunciantes pagam apenas quando o espectador assiste a pelo menos 30
segundos da mensagem pu-
divulgação
8% de todo o movimento mundial da internet
naquele momento. Agora, nos bastidores dos
negócios, é o salto que o YouTube está dando,
ao invadir acintosamente o território da televisão de massa, que chama mais a atenção.
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O Chromecast,
decodificador
multimídia à venda
no Brasil por
R$ 199, liga um
televisor diretamente
ao YouTube e
outros serviços do
Google e, com app
correspondente, o
vídeo do YouTube
que rodava no
celular passa a ser
automaticamente
reproduzido no
televisor
blicitária), além de permitir que as pessoas escolham entre diferentes anúncios e decidam se
querem ver o spot antes de um vídeo ou em
momentos intercalados.
“Não foi uma grande façanha tecnológica,
mas sem dúvida foi algo poderoso, para nós e
para o mercado”, explicou Rajaraman. “No
modelo publicitário tradicional, o objetivo é dizer: ‘As pessoas podem gostar ou não do meu
anúncio, mas vou encontrar uma forma de reproduzi-lo centenas de vezes’. Não existe feedback de qualidade sobre esse sistema.”
O YouTube ofereceu esse feedback quase imediato ao permitir que os espectadores possam
optar por assistir ou não ao comercial inteiro.
Afinal, quem decide conferir a publicidade revela envolvimento com o conteúdo apresentado.
Tradutor automático e legendagem
por crowdsourcing. Grande parte da audiência de um criador de conteúdos do YouTube
se origina de países diferentes do lugar em que
ele vive, ou seja, os vídeos são internacionais.
(Por exemplo, cerca de 80% das visualizações do
YouTube acontecem fora dos Estados Unidos,
apesar de boa parte dos conteúdos ainda ser de
lá.) A disponibilização de um tradutor automático, do Google, ainda que dotado de uma precisão questionável, facilitou esse fenômeno. Mas
o YouTube também vem testando a metodolo-
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gia de crowdsourcing para a
legendagem dos vídeos. “Não
há como um computador dar
conta disso, mas sabemos que
algumas pessoas acham fácil
colaborar fazendo a tradução”, contou Rajaraman.
telinha e TELONA
Desde que a empresa atingiu a notoriedade, a pergunta
que está no ar é se o YouTube pretende migrar para os
televisores. A suposição era de
que sim, mas agora a resposta
“sim” é oficial. Rajaraman justificou que, como uma grande
porcentagem dos vídeos esco-
lhidos pelos usuários tem longa duração, isso leva naturalmente à necessidade de chegar
à sala de estar dos usuários.
Uma das medidas para isso
foi a criação de diversos acordos com os consoles de games
–Xbox, PlayStation, Nintendo–
e todos os fabricantes de smart
TVs, os aparelhos de televisão
com conexão à internet. Mas
os gestores do YouTube tinham
consciência de que ainda é pequeno o número de proprietários de televisores inteligentes.
Por outro lado, eles não eram
indiferentes ao fato de que quase todas as pessoas carregam
um celular no bolso. “Essa realidade nos colocou diante da
pergunta: o que aconteceria se
transportássemos a experiência dos telefones celulares para
a televisão?”, falou Rajaraman.
Então, o executivo e seus colegas perceberam, há um ano,
que mais de 50% de todo o movimento do YouTube da Coreia
do Sul se originava de telefones
celulares. E a ideia começou a
ganhar altitude.
Por meio da empresa-mãe, o
Google, o YouTube deu à luz
o Chromecast. Trata-se de um
pequeno decodificador multi-
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YouTube faz milionários
no brasil
não ser conservador
Quando o balão do projeto Red Bull Stratos partiu, o YouTube contabilizou um total de 500 mil
usuários de olho na transmissão ao vivo. Assim que
a cápsula ultrapassou os 10.500 metros de altura,
o número de espectadores online já era superior a
2,2 milhões. No momento em que Baumgartner
superou os 30.500 metros, a audiência conectada
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ultrapassou os 5 milhões e, assim
que o aventureiro chegou à plataforma de salto, a 39.045 metros de altura, mais de 8 milhões
de usuários estavam conectados
ao YouTube.
“Temos de começar a pensar no funcionamento da internet, para garantir que ela conseguirá suportar esse padrão
de tráfego”, disse Rajaraman,
externando o que hoje é uma
das maiores preocupações do
YouTube. Segundo ele, o desafio da massificação à frente é
fantástico de todos os ângulos
que se olhe, e também assustador, “como a maioria das coisas
grandiosas que estão por vir”.
Indagado sobre o que caracteriza essa capacidade de
inovar do YouTube, ele falou
do hábito de se opor a qualquer expressão de impossibilidade. E completou: “É preciso sempre mirar em algo realmente grande. O segredo está
em não ser conservador”.
hsm management
© Knowledge@Wharton
Reproduzido com autorização.
Todos os direitos reservados.
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mídia que, assim que
conectado à porta
HDMI de um televisor de alta definição (e a uma porta USB como fonte de energia externa), liga o aparelho diretamente
aos serviços do Google, entre eles o YouTube.
Mais interessante ainda, um app do Chromecast transforma um telefone celular (com sistema operacional Android ou iOS) em um controle remoto intuitivo: quando o usuário aperta
o botão Chromecast enquanto assiste a um vídeo, a televisão com Chromecast liga automaticamente e dá prosseguimento à reprodução. (O
botão Chromecast é integrado no aplicativo de
YouTube desses telefones.)
Com um preço acessível de US$ 35 nos Estados
Unidos [R$ 199 no Brasil, anunciado no início
de junho], o Chromecast proporciona uma forma extremamente simples de assistir aos vídeos
do YouTube nos televisores com tecnologia HD.
O dispositivo também permite reproduzir
os conteúdos disponibilizados por serviços como Netflix, Pandora e HBO Go. Em 2013, a
revista Time apontou o Chromecast como o
aparelho do ano, alertando que seu preço estimula a compra por impulso.
Enquanto o YouTube se massifica, empreendedores vão
construindo negócios com a plataforma. O Brasil é um ótimo
exemplo disso. No início de 2013, o site YouPix anunciou os dez
primeiros brasileiros que fizeram fortuna no YouTube. A lista de
milionários era encabeçada pelo comediante e empresário Felipe
Neto, cujo canal no YouTube tem uma média de 3,5 milhões de
visualizações por vídeo, algo equivalente a 15 pontos no Ibope, o
que poucas emissoras da TV aberta brasileira conseguem. Como
1 ponto de audiência no Ibope significa algo em torno de 60 mil
domicílios ligados em um programa na Grande São Paulo, um
vídeo de Felipe Neto atingiria uma audiência equivalente à de um
capítulo médio da novela vespertina Malhação, da TV Globo, se o
Chromecast já estivesse diesseminado.
Outros canais de humor, como Parafernalha, Galo Frito
e Porta dos Fundos, estão entre os líderes do ranking de
milionários, mas há também os “gamers” e o fenômeno infantil
Galinha Pintadinha, que atingiu 1 bilhão de visualizações no início
de 2014, audiência restrita a menos de 50 canais no mundo
inteiro. Segundo estudo de caso do Insper, a galinha nascida no
YouTube construiu um negócio sólido, com shows, licenciamento
em fraldas e internacionalização de animações em inglês e
espanhol –estima-se que fature mais de R$ 20 milhões ao ano. E
sua empresa? Não vai aproveitar o novo YouTube massificado?
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