Público • Quinta-feira 19 Maio 2011 • 19 Mundo Prémio literário Decisão do júri, anunciada em Sydney, não foi consensual Philip Roth ganha Booker Prize por uma obra que reanimou a ficção contemporânea Candidato crónico ao Nobel da Literatura, o ficcionista americano Philip Roth venceu, com os protestos de uma jurada, a quarta edição do Man Booker International Prize Luís Miguel Queirós a O romancista americano Philip Roth foi ontem anunciado como vencedor do Booker Man International Prize, um prémio de carreira, no valor de 60 mil libras (cerca de 68 mil euros), instituído em 2005 e atribuído de dois em dois anos a um escritor de ficção. “Há mais de 50 anos que os livros de Philip Roth vêm estimulando, provocando e divertindo uma enorme audiência, que continua a expandir-se”, afirmou o presidente do júri, Rick Gekoski, acrescentando que a “imaginação” do autor de O Complexo de Portnoy ou Pastoral Americana “não só alterou a nossa ideia da identidade judaica, como reanimou a ficção contemporânea”. Mas o juízo de Gekoski, um estudioso de literatura inglesa que negoceia em livros raros, não foi inteiramente consensual no júri. Carmen Callil, escritora e fundadora da editora assumidamente feminista Virago Press, ficou tão irritada com a escolha de Gekoski e do romancista Justin Cartwright, o terceiro jurado, que decidiu mesmo abandonar o júri em sinal de protesto. “Não o valorizo de todo enquanto escritor”, disse Callil, que já tinha objectado a que Roth integrasse sequer a long list do prémio. Mais um incidente a marcar um prémio que já tinha sido perturbado pelo pedido de John Le Carré para que o seu nome fosse retirado dos finalistas. Afirmando-se sensibilizado com a distinção, o autor que revolucionou a literatura de espionagem explicou que não competia por prémios e que achava que estes deviam ser dados a autores mais jovens. Não parece ser de excluir que uma boa parte da antipatia de Callil pela obra de Philip Roth se fique a dever à alegada misoginia do romancista, que o próprio, aliás, desmentiu numa recente entrevista concedida ao PÚBLICO (tema de capa da edição de 15 de Abril do Ípsilon): “Disparates. Não trato melhor os homens.” O escritor, que sofre de problemas graves nas costas, que o obrigam mesmo a escrever de pé, não pôde deslocar-se ao festival literário de Sydney, na Austrália, onde o prémio foi anunciado, mas enviou uma mensagem de vídeo, agradecendo “esta grande honra” ao júri e manifestando votos de que o prémio conquiste novos leitores para a sua obra. “Um dos meus prazeres particulares, enquanto escritor, é ver a minha obra lida internacionalmente”, disse ainda Roth. Sistematicamente referido como um candidato óbvio ao Nobel da Li- Philip Roth fez votos de que o prémio conquiste novos leitores para a sua obra teratura, o autor nunca recebeu o mais cobiçado prémio literário do mundo, mas teve um considerável número de outras distinções, a começar pelo National Book Award, que lhe foi atribuído pela primeira vez em 1960, quando tinha apenas 27 anos, por Adeus, Columbus, publicado no ano anterior. A par de outras distinções menos significativas, ganhou ainda por duas vezes o prémio do National Books Critics Circle, recebeu três prémios PEN/ Faulkner e o seu romance Pastoral Americana (1997) foi distinguido com o prestigiado Pulitzer na categoria de ficção. Consagração precoce Nascido em 1933 numa família judaica de Newark, Roth tornou-se um caso de consagração precoce com Adeus, Columbus, livro que reunia uma novela e vários contos e que oferecia um retrato irreverente e iconoclasta Nos últimos anos, Roth tem trocado os romances extensos por novelas mais curtas, geralmente centradas nos tópicos da velhice e da doença, um ciclo que fechou em 2010 com Nemesis dos judeus americanos, mas só adquire verdadeira celebridade uma década mais tarde, quando publica o ainda mais controverso O Complexo de Portnoy, protagonizado por um jovem universitário judeu obcecado pela mãe e dotado de uma líbido assanhada. Uma parte significativa da sua obra posterior gira em torno de uma espécie de alter-ego seu, Nathan Zuckerman, que aparece pela primeira vez em My Life as a Man (1974), na qualidade de personagem, e que Roth irá depois recuperar como narrador da sua grande trilogia americana – Pastoral Americana (1997), Casei com Um Comunista (1998) e A Mancha Humana (2000). Este último, como outros livros de Roth, foi adaptado ao cinema, num filme protagonizado por Anthony Hopkins e Nicole Kidman. Em 2004, o escritor publicou A Conspiração contra a América, uma incursão na história alternativa que ERIC THAYER/REUTERS conta os dissabores da família Roth nuns Estados Unidos em que o aviador Charles Lindbergh, adversário feroz da entrada da América na Segunda Guerra, teria ganho as eleições a F. D. Roosevelt e levado o país para um clima de crescente anti-semitismo. Nos últimos anos, Roth tem trocado os romances extensos por novelas mais curtas, geralmente centradas nos tópicos da velhice e da doença, um ciclo que fechou em 2010 com Nemesis, ainda não disponível em tradução portuguesa. Entre a dúzia de finalistas que este ano perderam o Booker Man International Prize para Roth contavam-se nomes como Juan Goytisolo, Amin Maalouf, Anne Tyler, David Malouf ou o escritor de sagas juvenis Philip Pullman. Desde 2005, quando foi criado, o prémio já distinguiu o albanês Ismail Kadaré, o nigeriano Chinua Achebe e a canadiana Alice Munro.