Brasil prepara lançamento de diesel de cana
Bettina Barros
Segundo maior produtor mundial de etanol, o Brasil será em breve o primeiro país a colocar no
mercado o diesel de cana, um combustível limpo e com custo de produção inferior ao do
petróleo. A partir de 2010, o grupo Santaelisa Vale, de Sertãozinho (SP), começará a operar a
nova planta para produção exclusiva do combustível
A iniciativa, vista como "revolucionária" pelo setor sucroalcooleiro, é fruto da joint venture da
empresa californiana de biotecnologia Amyris e a Crystalsev, subsidiária da Santaelisa, firmada
em abril. Para as empresas, o novo diesel dará outros usos à cana e abrirá portas para outros
combustíveis à base da matéria-prima, estendendo-se à gasolina e ao querosene.
"Após o álcool, açúcar e energia, teremos diesel de cana", afirmou Fernando Reinach, diretorexecutivo da Votorantim Novos Negócios, agora um dos cinco maiores investidores da Amyris.
O braço da Votorantim responsável por investimentos de capital de risco e private equity
anunciou ontem aporte não revelado na empresa californiana, responsável pela engenharia
genética que resultou no diesel de cana. Com o aporte, o capital investido na Amyris em 12
meses ultrapassa US$ 100 milhões. "Os recursos têm como objetivo contribuir para a
comercialização de diesel a partir de cana", diz ele.
A estimativa de produção pela Santaelisa do diesel "superpuro" como os engenheiros
geneticistas o chamam será de 400 milhões de litros em 2011, subindo para 1 bilhão de litros
no ano seguinte, o equivalente a 20% da importação de diesel convencional do Brasil.
Uma planta-piloto em Campinas, onde a Votorantim faz pesquisas, entrará em operação em
fevereiro. A Santaelisa, por sua vez, construirá um novo tanque de fermentação, a adaptação
necessária para a produção do novo diesel.
O diesel de cana pertence à chamada segunda geração de combustíveis, fortemente
amparados na biotecnologia. Ao contrário do biodiesel, ele não tem em sua composição óleos
vegetais. "A técnica é a utilização de uma levedura geneticamente modificada para atuar na
fermentação da cana. Essa levedura permite que a garapa [caldo de cana] se transforme em
diesel em vez de etanol", diz Reinach.
O grande passo foi a identificação de uma molécula o farnesane que sintetizasse as
características do diesel, explica John Melo, CEO da Amyris. "Como essa substância não existe
na natureza, buscamos sintetizá-la a partir do açúcar da cana", diz. Foram necessárias 16
mudanças de genes para chegar ao resultado desejado.
Para os cientistas, uma vez descoberta a "rota do metabolismo" da molécula será possível
partir para vôos mais altos, como o querosene de cana. "Será questão de substituir dois
genes", diz Reinach.
O diesel de cana foi concebido para o mercado brasileiro, dependente de importações. Hoje, o
país consome 45 bilhões de litros de diesel por mês. "Cerca de 5 bilhões são importados", diz
Melo. Mas a produção será insuficiente para substituir o diesel convencional. "Ela será
complementar ao diesel".
Os custos de produção serão inferiores aos do petróleo, diz o CEO da Amyris. Segundo Melo,
com a teconologia, a previsão é que o diesel de cana custe US$ 60 por barril. Inferior ao custo
de produção do petróleo na Rússia e à prospecção em águas profundas, de US$ 75.
Fonte: Valor Econômico, São Paulo, 15 out. 2008, Empresas & Tecnologia, p. B12.
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