O ENSEJO DE NOVAS MATRIZES ENERGÉTICAS NO BRASIL:
Uma análise sobre a produção de biodiesel e seus desdobramentos para a
agricultura familiar
RESUMO
Frente à discussão mundial acerca do desenvolvimento de novas fontes de energia
sustentáveis, o presente trabalho busca contribuir para o entendimento da inserção do
biodiesel no mercado energético, identificando seus entraves na lógica social, econômica
e produtiva na região do Pontal do Paranapanema.
Tendo como base as diretrizes do PNPB – Programa Nacional de Produção e Uso
do Biodiesel, pretende-se acompanhar a implementação das políticas públicas em relação
aos agricultores familiares assentados avaliando-se em que medida um combustível dito
renovável é capaz de gerar trabalho e renda e, acima de tudo, alcançar a meta discursada
pelo governo federal, ou seja, a de mudança da realidade vivenciada pela população rural
a partir da inclusão social.
1
Introdução
Perante a crescente demanda energética e o prenúncio do esgotamento da matriz
de origem fóssil na qual se assenta o consumo mundial, o Brasil tem se destacado no
desenvolvimento de fontes alternativas de energia, cujo caráter se fundamenta
preferencialmente por representar um modelo dito sustentável.
Neste contexto globalizante, o discurso governamental brasileiro elege o biodiesel
como sendo um fator preponderante de solução à futura escassez energética, que
viabiliza, inclusive, a inclusão social ao gerar trabalho e renda para a agricultura familiar.
Surge assim o PNPB – Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, regido
por uma Comissão Executiva Interministerial sob o comando do MCT - Ministério de
Ciências e Tecnologia. Dentre as diretrizes do PNPB está a criação do Selo Combustível
Social, concedido pelo MDA - Ministério de Desenvolvimento Agrário às usinas que
comprarem determinadas porcentagens mínimas de matéria-prima dos agricultores
familiares.
Além disso, consolida-se legalmente uma demanda pelo combustível em questão,
pois é criada a lei 11097/05,1 na qual se estabelece o percentual obrigatório de 5% de
adição de biodiesel ao diesel a partir de 2013.2
Atualmente, o biodiesel vendido nos postos de combustíveis do Brasil é do tipo B2,
ou seja, possui 2% de biodiesel.
Reconhecido mundialmente como um dos países com maior potencial de produção
do biodiesel, tendo em vista suas grandes extensões territoriais e o domínio de condições
climáticas favoráveis ao plantio de múltiplas fontes oleaginosas, no Estado de São Paulo,
a APTA – Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios é a responsável pela
implementação das políticas agrárias do biodiesel voltadas para o agricultor familiar.
Diante do modelo de política pública apresentado, nossa proposta de trabalho
busca conhecer mais à fundo a realidade dos agricultores familiares assentados no
município de Mirante do Paranapanema que aderiram ao programa, diagnosticando seus
principais anseios, necessidades e desejos futuros.
1
A lei 11097 de janeiro de 2005 determina a obrigatoriedade da adição de 2% de biodiesel ao óleo diesel
comercializado ao consumidor. O acréscimo 2% para 5% na mistura será voluntário até 2012 passando a
ser compulsório a partir de 2013.
2
A partir da discussão acerca do contexto vivido por estes, pretendemos
acompanhar a aplicação do PNPB no intuito de fiscalizar a compatibilidade entre a teoria e
a prática, ou seja, assim como o próprio processo de planejamento estratégico situacional
prevê, enquanto uma de suas etapas, a avaliação permanente das ações empreendidas
pelo Estado, aqui então representado por entidades como o INCRA, a APTA e a CATI, por
exemplo.
Este acompanhamento deve analisar os possíveis problemas do programa quando
posto em prática a fim de formularmos soluções para a superação dos obstáculos. Mas,
sobretudo, o objetivo primordial da pesquisa é o de averiguar se os próprios objetivos do
programa estão sendo alcançados e trazendo benefícios satisfatórios ao seu público-alvo.
Procedimentos Metodológicos
A metodologia aplicada na presente pesquisa dá-se a partir de um levantamento
bibliográfico mais aprofundado, visando uma análise crítica da realidade presenciada.
Concomitantemente, objetivamos a realização de trabalhos de campo em Mirante do
Paranapanema, bem como a aplicação de questionários junto aos assentados do
Assentamento Estrela Dalva, líderes da FAAFOP, o MST e outros movimentos,
representantes do Poder Público e Secretarias. Após a apreensão dos dados, far-se-á a
tabulação e posterior análise dos mesmos.
O trabalho de campo permitirá o mapeamento das culturas oleaginosas destinadas
à produção do biodiesel, além da execução de entrevistas e aplicação de questionários,
momento no qual se pode observar o processo produtivo da mamona e as relações de
trabalho que antecedem a finalização do biodiesel.
Resultados Preliminares
Os resultados preliminares foram obtidos com base na leitura de publicações em
jornais e periódicos; consultas a sites governamentais e na execução de algumas
entrevistas.
2
Podendo este prazo ser reduzido mediante a Resolução do CNPE - Conselho Nacional de Política
Energética, órgão atrelado ao Ministério de Minas e Energia, desde que satisfeitas as condições
estabelecidas nesta lei.
3
O biodiesel é um combustível proveniente de biomassa renovável, ou seja, matéria
orgânica utilizada na produção de energia.
As fontes de biomassa compreendem uma vasta variedade de espécies
oleaginosas das quais podem ser extraídos óleos vegetais ou, ainda, pode ser utilizada
como matéria orgânica para a produção de biodiesel a gordura animal.
Segundo a revista Biodieselbr, dentre as plantas e grãos passíveis de
transformação em biomassa voltada a produção de biodiesel, destacam-se: baga de
mamona, polpa do dendê, amêndoa do coco de dendê, amêndoa do coco de babaçu,
semente de girassol, amêndoa do coco da praia, caroço de algodão, grão de amendoim,
semente de canola, semente de maracujá, polpa de abacate, caroço de oiticica, semente
de linhaça, semente de tomate e de nabo forrajeiro, além de outras espécies cuja
obtenção se dá de maneira extrativista.
Também são consideradas potenciais matérias-primas e, por isso, estão em fase de
estudo,o pinhão manso e a macaúba.
O método de fabricação mais utilizado no Brasil decorre basicamente de um
processo químico denominado transesterificação3, cuja reação permite a separação da
glicerina dos óleos vegetais. Dessa forma, a glicerina, subproduto do biodiesel que lhe
proporciona maior densidade e viscosidade é separada dos triglicérides4 dos óleos
vegetais. Todavia, o óleo extraído não compreende o produto em sua totalidade, pois o
mesmo deve ser adicionado ao diesel de origem mineral conforme determina a lei
11.097/05 e cujas porcentagens são discriminadas segundo a nomenclatura B2, B5, etc.
Dentre os planos para a implantação de culturas oleaginosas e até usinas de
biodiesel no Pontal, consolidou-se, desde 2007, um projeto liderado pela FAAFOP Federação Associação Assentados e Pequenos Produtores Rurais Oeste Paulista em
parceria com o INCRA e o MDA.
O projeto aprovado junto ao governo federal destina quase um milhão de reais
visando financiar a entrada de agricultores familiares assentados na cadeia produtiva do
biodiesel.
Sucintamente, as tarefas foram distribuídas da seguinte maneira: o INCRA ficou
responsável por fornecer as sementes, o calcário e o adubo, enquanto a Federação
3
Reação química na qual um triglicerídeo reage com um álcool de cadeia curta (etanol ou metanol)
resultando na mistura de ésteres etílicos ou metílicos (biodiesel) mais a glicerina
4
Moléculas de óleo vegetal formadas por três ésteres ligados a uma molécula de glicerina.
4
(FAAFOP) ficou com a parte operacional, ou seja, organizar as famílias e preparar o solo.
Para tanto, formou-se um corpo técnico composto por 14 técnicos agrícolas, todos filhos
de assentados, um engenheiro agrônomo, além da compra de três máquinas
beneficiadoras de mamona. Também foi fechado um contrato de compra de toda a
produção dos assentados com a usina Biobrás, localizada no município de Dom Aquino
em Mato Grosso, cujo valor estipulado oscila entre R$0,90 e R$1,00 o kilo de grão da
mamona a depender do mercado.
Beneficidora de Mamona BMN 30 D
Totalizam no projeto a participação de mil e duzentas famílias assentadas no Pontal
do Paranapanema, das quais, duzentas e cinqüenta concentram-se no município de
Mirante do Paranapanema, nossa delimitação de estudo. Cada família ocupa,
aproximadamente, dois hectares de seu lote com o plantio de mamona enquanto o
restante é destinado ao cultivo de culturas alimentícias e à produção leiteira.
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Horta do lote do Sr. Jurandir no Assentamento Estrela Dalva
A produção de oleaginosas voltadas ao biodiesel tem por objetivo complementar a
renda oriunda da terra, pois, segundo a Federação, ainda é o leite que sustenta os
assentamentos.
Além da venda do grão do qual se extrai o óleo de alto teor de viscosidade, o
agricultor se utiliza da casca da mamona, chamada de marinheiro, para reter a umidade
da terra, simplesmente espalhando-a sobre o solo. Mas se fosse possível processá-la no
próprio assentamento, a casca da mamona poderia se transformar num excelente adubo
orgânico, ou seja, a obtenção de mais um produto capaz de elevar o valor agregado à sua
produção.
Sendo assim, segundo o presidente da Federação José Eduardo, o Edu, o objetivo
do projeto é criar um incentivo a mais para o assentado obter renda, pois o valor destinado
pelo governo consiste num recurso a fundo perdido, o que significa que o assentado não
pagará nada pelo financiamento e nem vai se endividar com alguma instituição bancária,
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pois o recurso destinado a produção de mamona transita diretamente entre a Federação e
o produtor.
Ademais, criou-se um mercado garantido ao produtor porque a empresa, no caso, a
Biobrás, vem de caminhão comprar no próprio lote do assentado toda produção, trazendo
consigo uma equipe que pesa a mamona já ensacada e paga o produtor no ato.
Agora, um novo projeto deve ser iniciado por volta do final de setembro e começo
de outubro, momento de reinício do ciclo da mamona.
Este projeto, cuja colheita deve dar-se entre abril e maio do ano de 2009
corresponde ao processo que desejamos acompanhar, pois a experiência do primeiro
projeto defrontou-se com alguns problemas como o atraso no recebimento do calcário e a
má qualidade das sementes, onde um teste de germinação que deveria atingir no mínimo
85%, em laboratório apresentou somente 44%.
Para os agricultores familiares, é de primordial importância a boa qualidade das
sementes, pois esta condição se reflete diretamente na produtividade.
A safra média obtida no primeiro projeto foi de aproximadamente 700kg/hac,
enquanto o esperado, dentro de condições normais, eram de 1000 a 1200kg/hac.
Mesmo com o atraso do INCRA, Erivelton, o engenheiro agrônomo da Federação,
considera que a colheita de 700kg/hac foi satisfatória, visto que o plantio de muitos
assentados se deu bastante tardio em relação ao ciclo da mamona.
Outro problema durante o primeiro projeto foi o fato da mamona não corresponder a
uma lavoura convencional e uniforme porque são pequenas e distribuídas entre muitos
lotes de vários municípios que apresentam características físico-climáticas distintos.
Dessa forma, a preparação do solo também era bastante diferenciada, pois a quantidade
de adubo e calcário colocado num lote não permanecia o mesmo para os demais e cada
região apresentava diferentes índices pluviométricos.
Vale ressaltar que, quando se iniciou o projeto a intenção dos assentados era a de
produzir pinhão manso porque dentro deste plano havia sido firmado a concessão de um
salário, além de antemão muitos produtores conhecerem e cultivarem esta oleaginosa.
Porém, o pinhão manso não possui zoneamento climático e nem semente registrada no
Ministério da Agricultura, o que impossibilita o encaminhamento do projeto por parte de
Brasília.
Outra vantagem levantada pelos produtores em relação ao pinhão manso é a de
que, diferentemente da mamona que corresponde a uma cultura rotativa, pois possui um
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ciclo de vida de seis meses, o pinhão manso é uma cultura perene, cuja maturação
posterior ao oitavo mês lhe confere maior produtividade podendo, inclusive, produzir
durante mais 25 a 30 anos. Sem necessitar ser replantado, exige apenas a correção do
solo, inclusive possui características climáticas adaptadas à região do Oeste Paulista,
além de ser um excelente seqüestrador de carbono.
Todos estes fatores proporcionam ao pinhão manso um menor custo de produção
em relação a mamona, tornando-o carro chefe das projeções em relação à inserção do
assentado na cadeia produtiva do biodiesel.
E, como demonstração da perseverança do agricultor assentado, o pinhão manso está
sendo plantado em vários lotes como forma de estudo, para melhor conhecer suas
características, vulnerabilidades à pragas e intempéries verificando onde se destaca. A
busca pelo zoneamento se reflete na quantidade plantada, totalizando uma média de 60 a
80 hectares espalhados desigualmente pelo Pontal.
Segundo um produtor Wagmar que cultiva quatro mil e quinhentos pés de pinhão
manso, sua produção é destinada à doação para outros assentados com a finalidade de
se expandir a pesquisa e, conseqüentemente, o conhecimentos sobre a planta. Para ele,
os produtores estão comprovando que a oleaginosa se desenvolve muito bem,
enquadrando-a como a solução sustentável para o assentado.
Porém, apesar da grande quantidade de pés de pinhão manso existente, a escala
de produção dos assentados ainda não é suficiente para uma indústria testá-lo e
confeccionar o biodiesel a partir de seu óleo.
Ainda segundo Wagmar, como o governo não pode plantar o pinhão manso, quem
o faz são eles, buscando impulsionar o negócio por meio da construção de um relatório
técnico – “(...) vamos entrar numa briga do mercado, vamos brigar com as grandes
empresas!”
Mas enquanto o pinhão manso não é legalizado, os agricultores familiares
assentados no Pontal que aderiram ao programa cultivam a mamona.
A mamona selecionada para cultivo no assentamento é da espécie Guarani 2002
porque possui maior teor de óleo em relação aos seus genótipos, como a mamona Preta.
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Fonte: Clube do Diesel
Para Josival, agricultor familiar pertencente ao assentamento Estrela Dalva, o
trabalho é vantajoso porque numa área de dois hectares onde ele trabalhava quatro vezes
por semana na roça, sua produção foi aproximada ao esperado de 1000kg/hac, apesar do
atraso dos insumos que o obrigaram a plantar a partir de janeiro de 2008, ao invés de
novembro ou dezembro de 2007. A mamona também dá menos pragas que outras
culturas; as formigas, por exemplo, não comem a mamona por causa de uma toxina
presente em suas folhas, mas ainda assim houve problemas com pragas na lavoura por
conta da má qualidade das sementes compradas pelo INCRA que, segundo Erivelton, na
realidade não vieram sementes, mas grãos.
Pensando,
de
maneira
geral,
sobre
todas
as
atividades
produtivas
do
assentamento, a observação que alguns dos produtores rurais têm é a de que o maior
obstáculo continua a ser a deficiência de mercado para a compra da produção. O produtor
não tem como produzir em maior escala produtos como ovos, frango e leite se os preços
são baixos. Considerando seus gastos com transporte, deveria haver uma localidade mais
próxima para entregar o produto e viabilizar melhores preços de venda, tal como um
Ceasa. A única indústria de laticínio, por exemplo, para onde vai toda produção excedente
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de leite do assentamento, manipula o agricultor que é obrigado a vender seu produto ao
preço por eles estabelecido.
Como pode ser observada, a expansão da agroindústria do biodiesel já alcança o
extremo oeste paulista e se insere no Pontal. Portanto, é necessária a atenção da
sociedade sobre os empreendimentos relativos ao PNPB, visto que historicamente o país
já possui experiência relativa aos interesses econômicos de minorias que se sobrepõe ao
que, a princípio, é colocado como prioridade de uma política pública.
Considerações Finais
Ao passo que o segundo projeto de plantio de mamona voltada ao biodiesel teve
início em meados do mês de outubro de 2008 com a preparação dos solos, não foram
realizados todos os procedimentos pertinentes à metodologia e, ademais, por tratar-se de
um assunto recente no cenário mundial que se evidencia pela quantidade insipiente de
bibliografias que tratam da temática em questão, principalmente sob o viés da participação
dos agricultores familiares assentados; ainda não foi possível avaliar em que medida o
programa proporciona alternativas de renda aos agricultores familiares.
Todavia, pode-se fazer reflexões acerca de algumas diretrizes já praticadas pelo
PNPB e possíveis desdobramentos para o agricultor familiar.
A partir da concessão do Selo Combustível Social pelo MDA às usinas que
procuram “promover” a inclusão social, as unidades produtivas familiares terão mercado
para sua produção de oleaginosas. Entretanto, as mediações de vários outros segmentos
da cadeia produtiva tendem a disputar e se apropriar de frações da renda da terra gerada
pela atividade.
Assim, a capacidade de apropriação do excedente econômico relativo a renda da
terra fica atrelada ao poder de mercado de cada produtor. E quando este não apresenta
um significativo poder de mercado, a renda pulverizasse sob a forma de juros e lucros
agroindustriais.
A situação referenciada acima é tratada por Oliveira (2003) como a de “ser
integrado”, condição na qual, basicamente, o agricultor familiar transformasse em
trabalhador rural, pois, apesar de continuar sendo dono de suas terras, as exigências do
mercado (o capital) para com o seu produto o obrigam a perder a autonomia como
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agricultor que se declina à dependência total por parte dos ditames dos intermediários da
cadeia produtiva.
Segundo Paulillo (2007), o programa nacional do biodiesel mostra todos os sinais
de ser um sistema neocorporativista, igual o Proálcool dos anos 1970, que restringiu a
realização das políticas e seus benefícios à uma pequena rede de lobistas.
Mas nem Oliveira e nem Paulillo incluem em seus cálculos os movimentos
socioterritoriais como agentes de peso na implementação das políticas (Fernandes, 2005).
Militantes do MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra como o agrônomo
Enio Guterres (2006), defende que o contexto do biodiesel cria condições para que se
vivencie um desdobramento diferente do vislumbrado pelo Proálcool, justamente por
possibilitar oportunidades aos movimentos sociais debaterem e participarem na
elaboração das políticas. Por outro lado, o geógrafo Thomaz (2007) antecipa a
neutralização dos movimentos camponeses que se envolverem na expansão da frente dos
agrocombustíveis, principalmente a relativa ao etanol de base canavieira.
O desafio do pesquisador é encontrar um caso onde todos os elementos estão em
jogo para poder analisar as hipóteses do biodiesel enquanto salvação, destruição ou
oportunidade à permanência dos pequenos agricultores nos assentamentos de reforma
agrária. Por isso, a região do Pontal do Paranapanema foi escolhida. É a região do país
com maior concentração de assentamentos e ocupações, cuja participação de entidades
governamentais e movimentos socioterritoriais se dá de maneira latente.
Os estudos em andamento buscam aprofundar a análise sobre a percepção do
trabalhador perante a prática social por ele desenvolvida, uma vez que uma temática tão
relevante sob o contexto mundial veiculasse pela mídia proferida a partir de várias
autoridades governamentais e outros representantes ambientais em detrimento daqueles
que realmente participam ativamente do processo de produção do biodiesel.
Nesse sentido, o caráter essencial da pesquisa é o de apresentar os
desdobramentos
da
trajetória
empreendida
pelo
biodiesel
no
Pontal,
mais
especificamente, no assentamento Estrela Dalva em Mirante do Paranapanema,
desmistificando possíveis mitos e desvendando lacunas deste curso.
Afinal, o biodiesel vem sendo enaltecido como a possibilidade de ser um potencial
substituto do diesel, fonte renovável alternativa ao petróleo, atual matriz energética na qual
o consumo mundial se sustenta e, cujas características evidenciadas são as de
esgotabilidade e de elevado poder de emissão de dióxido de carbono, o que contribui para
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a poluição atmosférica e o aquecimento do planeta.
Porém, as práticas necessárias à inserção das oleaginosas em superfície, onde
poderiam se incluir queimadas, o uso de pesticidas, fertilizantes ou demais atividades
referentes à fabricação do biodiesel que produzam rejeitos, por exemplo, não estão
totalmente esclarecidas, pois ainda existem muitas controvérsias no que diz respeito às
vantagens, tanto sob o parâmetro econômico quanto ambiental, em se fazer uso
sistemático dos biocombustíveis.
Paralelamente à preocupação ambiental, o discurso governamental coloca a
bioenergia enquanto plataforma social, na medida em que uma série de políticas e
programas beneficia os empreendedores que compram uma porcentagem de matériaprima proveniente do trabalho agrícola familiar para o sustento de suas usinas.
No entanto, o pronunciamento do trabalhador rural não se tornou público e tão
pouco foi evidenciado com tanta veemência como as “vantagens ambientais e os
benefícios sociais”.
Dessa forma, torna-se de fundamental importância investigar os modos de
produção do biodiesel e a rentabilidade por este conferida a fim de balancearmos os reais
aspectos positivos e negativos do mesmo. Contudo, cabe a pesquisa abrir espaço no
universo acadêmico-científico aos trabalhadores que vivenciam cotidianamente a labuta
engendrada pelo biodiesel, com o objetivo de apresentarmos em que grau o novo
empreendimento satisfaz suas necessidades e alimenta suas perspectivas.
Compreender o processo de produção contemplando a maneira pela qual empregase a força-de-trabalho e qual sua rentabilidade corrobora à projeção equilibrada do ganhos
e danos atrelados ao expansionismo do biodiesel, principalmente no que se refere ao bem
estar e o atendimento das necessidades dos sujeitos vinculados ao trabalho.
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