Laboratórios dentro do computador Pela Dra. Juliana Fedoce Lopes Simular fenômenos da natureza sempre foi e continua sendo uma prática constante de cientistas das mais diversas áreas do conhecimento. O entendimento de qualquer processo natural, seja ele físico, químico ou biológico, passa por uma racionalização teórica sobre a observação. Em seguida tenta-se repetir tal comportamento em escala reduzida, controlando-se ou não as condições, ou seja, simula-se tal fenômeno como ele aconteceria realmente. A forma mais moderna de simulação de processos físicos, reações químicas, eventos biológicos, eficiência energética e inúmeras propriedades acontece através da utilização de supercomputadores. A capacidade de processamento e resolução de problemas dos supercomputadores atuais permite que através de programas desenvolvidos especificamente para cada tipo de simulação, vários estudos possam ser realizados nos mais diversos ramos da ciência. Recentemente, simulações de biologia computacional também foram usadas para desvendar o genoma humano e de inúmeras outras espécies. Desta forma, os cientistas foram capazes de prever a presença (ou a ausência) de genes específicos em gerações ainda não nascidas de pessoas. Este resultado permite que as pessoas saibam, por exemplo, da possibilidade real de sofrerem algum problema genético, tornando possível prevenir doenças graves antes da concepção. Ainda no campo da biologia computacional, Figura 1. Simulações utilizando o computador. Desvendando o código genético. Imagem cortesia de Victor Habbick. Acesso em FreeDigitalPhotos.net 22 alguns testes in vivo poderiam ser substituídos por simulações in silico, terminologia que remete ao uso do processador do computador para efetuar as operações. A química computacional é mais uma destas áreas da ciência que se beneficia dos supercomputadores para realizar simulações de reações e processos químicos. Além disso, as simulações permitem os estudos de vários tipos de processos que não seriam totalmente possíveis e economicamente viáveis em um laboratório convencional de pesquisa. Pode-se, por exemplo, estudar reações em temperaturas altíssimas, pressões insuportáveis, reações explosivas, reações que acontecem no corpo humano, reações com reagentes e produtos tóxicos, entre outros processos sem que medidas de segurança tenham que ser tomadas e com uma alta confiabilidade dos resultados. Uma das aplicações mais importantes e atuais da Química Computacional é o planejamento racional de fármacos, que tem por objetivo indicar, através de simulações computacionais, quais moléculas poderiam ser ativas no tratamento das mais diversas doenças. A indústria farmacêutica mundial investe muitos recursos financeiros e humanos todos os anos no desenvolvimento de novas formulações terapêuticas e na síntese de novas moléculas para o tratamento de diversas doenças. Entretanto, muitas destas empresas têm investido em laboratórios de simulação computacional, pois além de reduzirem sistematicamente o custo destas pesquisas, fornecem um conjunto de informações adicionais que permite restringir o campo de ação, direcionando o trabalho experimental, aumentando o sucesso da busca por novos fármacos. Alguns fármacos comercializados no mundo todo foram produzidos através de pesquisas de simulação computacional, cujos resultados sinalizaram o potencial destas moléculas para o tratamento de enfermidades. O Captropil (Figura 2) é um remédio utilizado no tratamento da hipertensão arterial e atua no controle da ação de uma enzima chamada ECA (Enzima Conversora de Angiotensina) que controla o aumento da pressão arterial. Este medicamento foi desenvolvido através de estudos de química Naturale agosto/setembro - 2013 www.mobilize.org.br computacional que simularam o efeito de várias moléculas diferentes na ação desta enzima. Os pesquisadores sabiam que uma molécula semelhante, o ácido 2-benzil-succínico e uma molécula formada por dois aminoácidos (Alanina-Prolina), tinham a ação desejada de inibição da enzima, culminando em ação anti-hipertensiva. Desta forma, os pesquisadores investigaram, através de experimentos realizados no computador, de que forma uma série de novas moléculas quimicamente semelhantes às ativas, se comportariam com a enzima ECA. Depois de várias simulações, chegaram então à fórmula otimizada do Captopril. Porque andar é preciso... Porque pedalar é preciso... Por Elaine Pereira Figura 2. Esquema de otimização através de simulações de Química Computacional para obtenção do Captropil. O Ácido 2-benzil-succínico, e o dipeptídeo alanina-prolina, reconhecidamente ativos no controle da hipertensão arterial serviram de início para busca de uma molécula também anti-hipertensiva. Este estudo foi prioritariamente realizado através de simulações de química computacional. Após estes resultados computacionais, a molécula foi então sintetizada e submetida à testes biológicos até obter a aprovação da agência reguladora americana FDA (Food and Drug Administration) para ser comercializada no tratamento da hipertensão arterial. No laboratório de química computacional (LaQC) localizado no Centro de Estudos e Inovação em Biomateriais Avançados (CEIMBA) da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI), são realizados estudos de química computacional envolvendo mecanismos de ação de fármacos anticancerígenos e outros processos que envolvem otimização de ação de moléculas de fármacos antidepressivos e anti-hipertensivos, com o objetivo de entender como tais moléculas atuam sobre o organismo, quais são as reações químicas que ocorrem do momento da administração do remédio até atingir seu alvo biológico específico e ter então a ação terapêutica desejada. Assim pretendemos fornecer explicações de como estes processos ocorrem e indicar moléculas alternativas às que já existem com eficácia semelhante ou melhorada para o futuro tratamento de doenças. Dra, Juliana Fedoce Lopes, Professora da UNIFEI e Pesquisadora do CEIMBA. Doutora em Química pela Universidade Federal de Minas Gerais e Pós-Doutora em Química pela Massachusetts Institute of Technology. Naturale agosto/setembro - 2013 Muitos estudos apontam para a necessidade das pessoas praticarem exercícios físicos, não só para manter um corpo esbelto, mas para o equilíbrio físico e mental. Ter uma atividade física não apenas quebra a rotina e o sedentarismo mas proporciona também contato com outras pessoas. Quando fazemos uma caminhada ou andamos de bicicleta estamos mais atentos ao nosso entorno, nosso olhar e nossos reflexos parecem despertar para o que acontece a nossa volta. Vivemos num momento em que o paradoxo da atividade física para melhora da saúde incita a todos a praticarem exercícios físicos, a caminharem, pedalarem... O incrível é que o “corpo cidade” também tem pedido a mesma coisa. Nas grandes e médias cidades, o transporte público sempre viveu em crise. Em geral, vemos um sistema de baixa qualidade que não atende à demanda da população que só cresce, e a insistência para se diminuir o uso de veículos individuais vai por água abaixo, pois as pessoas que possuem recursos não deixam de utilizar seus veículos, que lhes dão praticidade, para enfrentar filas intermináveis e superlotação ou o que é igualmente ruim nas cidades de porte médio, a falta de ônibus, linhas reduzidas com intervalos de uma ou até duas horas. O resultado é que nos grandes centros, hoje, carro não significa agilidade, pois com o excesso de veículos, as vias sempre estão congestionadas. Podemos ousar fazer um paralelo, nosso corpo físico precisa de oxigênio na circulação sanguínea e nossas cidades também necessitam de oxigênio para poderem liberar suas vias de circulação. Então, a aposta para ambos os casos e que tem sido bastante estimulada é o uso de bicicletas, que a depender do percurso, acaba sendo mais rápida que os carros 23 Naturale agosto/setembro - 2013