OPINIÃO29
DOMINGO, 20 DE SETEMBRO DE 2015 A GAZETA
Angelo Passos
É jornalista e escreve aos domingos neste espaço
E-mail: [email protected]
A aprovação da emenda constitucional da DRU
(Desvinculação de Receitas da União) ajudaria a
cortar gastos e dispensaria a volta da odiada CPMF
Uma salada
indigesta
Dois fatos fiscais inusitados já se consolidaram em 2015: a criação de oito
novos pesos tributários e, paradoxalmente
a isso, o envio ao Congresso de um
orçamento com déficit. Duplo retrocesso.
A fome tributária do governo bate
recorde. Recordemos a série de ataques:
1) logo em janeiro, o Planalto recriou a
Cide sobre combustíveis, extinta em
2012; 2) elevou a contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento
das empresa; 3) o IPI dos cosméticos
subiu muito; 4) o
PIS/Cofins sobre a importação ficou pesadíssimo; 5) voltou a ser
cobrado PIS/Cofins sobre aplicações financeiras de empresas, o que
não acontecia desde
2004; 6) foi restabelecida a alíquota do IOF
no crédito à pessoa física; 7) o governo adicionou maior grau de
imposto às bebidas
quentes (vinhos, espumantes, uísques, vodcas,
cachaças, licores, sidras,
aguardentes, gim, ver-
mutes etc); 8) também subiu a carga
tributária de produtos de tecnologia
(computadores, notebooks, tablets, modems, smartphones). O ajuste fiscal virou salada indigesta.
E o resultado se volta contra o governo: a arrecadação federal em agosto,
R$ 93,7 bilhões, é a mais baixa para o
mês em cinco anos. A receita acumulada
em 2015, R$ 805,8 bilhões, é 3,7%
menos do que no mesmo período de 2014.
A economia responde à fúria tributária
com recessão. Neste caminho, o deficit no
Orçamento para 2016 será maior do que
previsto, até agora.
A situação tende a piorar se a CPMF for
ressuscitada. Ela incide em cascata sobre todas as fases da produção e da
comercialização de bens, de serviços, e
sobre o consumo. Atinge principalmente
os mais pobres, pois são
os que mais consomem
em proporção à renda e
porque o repasse do aumento dos custos da produção aos preços lhes
afeta mais fortemente o
minguado ganho.
Uma saída de emergência é aprovar a
emenda constitucional
da DRU (Desvinculação
de Receitas da União), já
encaminhada ao Congresso. Desengessaria
parte do Orçamento,
ajudando a cortar gastos
e evitar o déficit.
Arlindo Villaschi
É professor de Economia da Ufes
A partida de Dário Martinelli torna a cafeicultura
capixaba órfã do seu importante empreendedor
social. Ele deixa rico legado a ser seguido
Construtor
de pontes
Para construir sua teoria do desenvolvimento, o estudioso de economia
Schumpeter constituiu a figura do empresário que com seu “espírito animal”
busca se diferenciar de seus concorrentes através da inovação e por isso
obtém lucros monopolistas. Mais tarde
evidências empíricas fizeram com que a
contribuição schumpeteriana identificasse o processo de inovação como
resultado do processo de busca deliberada por inovações através de pesquisas e trabalhos em equipes.
Hoje é reconhecido que essas equipes
podem extrapolar os limites da firma e
crescentemente resultam de trabalho
cooperativo entre pessoas de empresas
– inclusive concorrentes – institutos de
pesquisas, universidades, agências governamentais etc.. Mesmo que o número de pessoas envolvidas nos processos de inovação se amplie na medida
em que as fronteiras tecnológicas fiquem mais complexas, é reconhecido o
papel de indivíduos na liderança da
busca do novo ou do fazer o novo de
forma diferente.
A história recente da cafeicultura capixaba teve em Dário Martinelli um
importante líder no processo de sua
dinamização a partir da espécie conilon.
Superar a crise em que esteve envolvida
com o processo de erradicação de cafezais de baixa produtividade ocorrido
nos anos 1950/60 foi tarefa que exigiu
muito engenho e articulação. O jovem
dentista Dário exerceu importante papel de apoio à determinação do prefeito
Eduardo Glazer em sua saga para evitar
que a agricultura familiar da Região
Noroeste do Espírito Santo falisse.
Dário construiu pontes com pesquisadores – com destaque para Adelson Paulino; com extensionistas do sistema Acares; com agências de desenvolvimento, o
que resultou no bem-sucedido complexo
econômico do café capixaba. Esse sucesso
é hoje reconhecido mundialmente e está
bem documentado por trabalhos desenvolvidos na Ufes e no Incaper.
A compreensão que Dário Martinelli
tinha da complexidade do processo inovativo – sempre cercado de incertezas –
o transformou em dedicado líder da
inovação na cafeicultura capixaba. Isso
tanto como presidente do Cetcaf (Centro de Desenvolvimento Tecnológico do
Café) quanto como proprietário rural
que ousava fazer diferente. Mais do que
buscar o lucro extra provocado pela
inovação, Dário procurava incentivar
outros produtores a adotarem novas
técnicas, a partir do sucesso de inovações por ele mesmo adotadas.
A partida de Dário Martinelli torna a
cafeicultura capixaba órfã do seu importante empreendedor social. Ele deixa rico legado a ser seguido.
Luís Filipe Vellozo de Sá
Auditor de controle externo do Tribunal de Conta do ES, mestre em Economia pela Ufes, graduando em Direito pela UVV e membro fundador da ONG Transparência Capixaba
A transparência é o melhor antídoto contra a corrupção. É uma função de Estado e não de governo
Governança: eu quero
uma para viver bem
A governança no setor público se alicerça
sobre os princípios da transparência,
integridade e da responsabilidade ou do
dever de prestar contas, este último,
conhecido também como accountability.
Compreendem, essencialmente, os mecanismos de liderança, planejamento estratégico e controles postos em prática
para avaliar, direcionar e monitorar a
atuação da gestão, visando à implementação de políticas públicas que ge-
rem resultados para a sociedade.
Conceituar transparência é destacar a
sua importância como instrumento de
controle e participação social. A transparência é o melhor antídoto contra a
corrupção. É uma função de Estado e
não de governo. Não é favor algum do
gestor público ser transparente. É imperativo constitucional!
O sistema de integridade, por sua vez,
é o conjunto de arranjos institucionais,
gerenciamento, controle e regulamentações que visam à promoção da integridade pública, transparência e à
redução do risco de atitudes que violem
os princípios éticos e legais.
Estamos vivenciando uma das mais graves crises institucionais (econômica e politica) da história republicana brasileira.
Uma crise clássica de governança que
desencadeou uma grave crise econômica.
O quadro mais otimista é que, antes de
melhorarmos, enfrentaremos um cenário
econômico ainda mais deteriorado até,
pelo menos, o primeiro semestre de 2016.
Mais do que nunca, diante do cenário
de queda de receita, por conta da recessão econômica, os gestores públicos
deverão acordar e dormir pensando em
como melhorar sua governança.
É mais “fácil” governar com dinheiro,
mas quando não há recursos é hora de o
gestor mostrar seu lado de empreendedor público responsável. O gestor que
previu a chegada da crise, certamente,
sofrerá um impacto menor do que aqueles que não se preocuparam com a
chegada da tormenta, mesmo com todos os avisos “meteorológicos”.
O momento, portanto, exige dos gestores
públicos criatividade, liderança, competência para escolher sua equipe e as políticas públicas prioritárias; renegociar contratos; reestruturar e racionalizar a máquina administrativa fortalecendo o controle interno e criando comitês de controle
e de qualidade do gasto; buscar outras
fontes de recursos; entre outras medidas.
Não tem mágica – 2016 está logo ali!
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