CIRCUITO DE AUXÍLIO À COMUTAÇÃO NÃO DISSIPATIVO
APLICADO AO CONVERSOR FLYBACK COM ALTO FATOR DE POTÊNCIA
Autores:
Adriano Péres, Doutor (autor para correspondência)
Altamir Ronsani Borges, Mestre
Sérgio Vidal Garcia Oliveira, Mestre
Endereço:
Rua São Paulo, 3250
Bairro Itoupava Seca – Blumenau – SC
CEP: 89030-000
Tel.: (+47) 221-6022 – Fax: (+47) 221-6001
e-mail: [email protected]
Vínculo Institucional:
FURB – Universidade Regional de Blumenau
Departamento de Engenharia Elétrica e de Telecomunicações
RESUMO
Neste trabalho é apresentado o estudo de um circuito passivo de auxílio à comutação não
dissipativo aplicado em conversores estáticos isolados para fins de correção de fator de
potência. Este circuito é utilizado para desviar a energia proveniente dos elementos indutivos,
durante a comutação dos interruptores, para a carga. Com a utilização do circuito proposto o
conversor não sofre alteração no seu funcionamento original, os interruptores são
adequadamente protegidos dos esforços de tensão e corrente provenientes da comutação e o
rendimento é melhorado. São apresentados a análise do circuito proposto, exemplo de projeto
e resultados experimentais que validam o estudo realizado.
Palavras Chave: circuito de auxílio à comutação, não dissipativo, correção de fator de
potência, conversor flyback.
ABSTRACT
This work present the study of a totally passive non-dissipative snubber used in isolated static
converter applied in power factor correction. This circuit deviate the inductive energy during
the commutation process to the load. The proposed snubber does not change the original
functionality of the converter, the commutation voltage and current stress are significantly
diminished and the converter efficiency is improved. Are shown in the paper the theoretical
analysis, a design example and experimental results that validate the efficiency of the
proposed converter.
Key Words: auxiliary commutation circuit, non dissipative snubber, power factor correction,
flyback converter.
1 – INTRODUÇÃO
Os conversores chaveados operando em alta freqüência, em especial os
isolados, apresentam indutâncias que no processo de comutação dos interruptores provocam
altos esforços de tensão, podendo ser destrutivo aos semicondutores. Para evitar a destruição
os semicondutores são normalmente especificados com tensões superiores as que realmente
seriam necessárias se o conversor tivesse alguma proteção contra esses esforços.
Para eliminar ou diminuir os efeitos das indutâncias sob os interruptores,
durante a comutação, utiliza-se circuitos de auxílio à comutação (CAC). A literatura sobre
Circuitos de Auxílio à Comutação (CAC) é muito vasta, o que tornou o assunto de domínio
industrial a vários anos.
Existem muitos tipos de CAC aplicados à conversores estáticos. De uma
maneira geral são classificados como grampeadores, snubbers, e conversores ressonantes. Os
CAC agem modificando as curvas das trajetórias de tensão e corrente sobre os interruptores,
evitando a dissipação da energia envolvida na comutação sobre os mesmos. Tais perdas, são
diretamente proporcionais a freqüência de operação dos interruptores e tornam-se
significativas a medida que esta aumenta.
Os primeiros CAC a surgir, e ainda hoje muito utilizados, foram os
dissipativos, ou seja, dissipam a energia envolvida na comutação, sob a forma de calor, em um
elemento resistivo que é especialmente adicionado ao conversor. Essa energia é perdida, o que
compromete o rendimento da estrutura.
Com a modernização da eletrônica de potência, e a crescente preocupação com
a elevação do rendimento e a diminuição do volume dos conversores, foram propostas várias
alternativas de se evitar as perdas por comutação das chaves, entre elas podem ser citadas os
conversores ressonantes, quase-ressonantes, pseudo-ressonantes, não ressonantes, snubbers
não dissipativos e grampeadores ativos, entre outros.
Os conversores que se utilizam da ressonância são de excelente concepção
teórica, porém não tiveram a aplicação industrial esperada devido ao alto custo de
implementação. Além disso, pecam na complexidade topológica, alteram o funcionamento do
conversor, modificando sua relação de transferência de potência e, geralmente, sobrecarregam
excessivamente os interruptores, já que os submete a elevados esforços de tensão e corrente.
Para evitar os problemas oriundos da utilização da ressonância, sem que se
comprometa o rendimento das estruturas, surgiram outros tipos de técnicas que não interferem
no funcionamento normal dos conversores. Dessas técnicas surgiram os chamados CAC não
dissipativos ou regenerativos, ou seja, circuitos que absorvem a energia oriunda da comutação
e depois a devolvem para a fonte que excita o circuito. Tais técnicas são muito importantes,
pois seu domínio e implementação são acessíveis a nível industrial, além de apresentarem boa
performance quando aplicadas em conversores CC-CC. Segundo Péres et al., 1994, quando se
deseja aplicá-las a conversores CA-CC com alto fator de potência, seus princípios de
funcionamento podem compromete-los frente ao controle de harmônicas da corrente da rede,
devido a interação com o filtro de entrada, provocando alterações nas formas de ondas, devido
à regeneração da energia.
Para que os conversores CA-CC com alto fator de potência possam atender as
normas de regulamentação de harmônicas, os projetistas se vêem, muitas vezes, obrigados a
sacrificar o rendimento e aplicar os CAC convencionais.
Devido a exigência cada vez maior de se controlar o fator de potência, o
rendimento, o peso e o volume dos conversores, é imprescindível que se apliquem CAC não
dissipativos que não introduzam harmônicas na corrente da rede.
É com esse intuito que se propõe, neste trabalho, a investigação de circuitos de
auxílio à comutação (CAC) que transfiram a energia gerada na comutação dos interruptores à
saída do conversor (carga). Com isto evita-se a regeneração indesejável de energia para a
fonte de alimentação CA, não interferindo, assim, no fator de potência do conversor e
melhorando o seu rendimento.
2 – O PROBLEMA DA COMUTAÇÃO
Os picos de tensão gerados por cargas indutivas, como mostrado na Fig. 1, no
bloqueio, podem ter altos valores de energia armazenada, e a potência gerada pode causar
aquecimento excessivo e falha no componente semicondutor. Esses sãos os pontos principais
a se eliminar na utilização de qualquer espécie de CAC.
Analisando o circuito da Fig. 1, percebe-se que no bloqueio, a chave força a
corrente da carga indutiva a variar com uma alta taxa de decrescimento, e como resultante,
tem-se um pico de tensão, que pode ser de elevado valor, expresso por (1).
+
vT1
-
D
iT1
+
T1
E
C
vLp
Lp
R
Ls
Figura 1 – Circuito indutivo.
v= L
di
(V )
dt
(1)
O pico da energia a ser absorvida pela chave é dado por (2).
W =
1 2
LI ( J )
2
(2)
Ambos, tanto o pico de tensão, como a energia transferida para o interruptor,
podem superar a capacidade deste. O pico de tensão deve ser limitado em um valor abaixo do
de ruptura do componente.
Em baixas freqüências, três métodos são comumente empregados com esse
fim, e são mostradas na Figura 2.
Vcc
Rcarga
R
Vcc
Vcc
Rcarga
Rcarga
i
Lcarga
R
i
D
Lcarga
Lcarga
C
i
S
S
a) Snubber RD
Dz
S
b) Diodo zener
c) Snubber RC
Figura 2 – Alguns CAC de uso comum.
Para altas freqüências são necessários CAC mais bem elaborados, tal como o
apresentado na Fig. 3, onde no bloqueio a corrente é desviada para o capacitor Cs por
intermédio do diodo. O interruptor fica grampeado com a tensão do capacitor controlando os
esforços de tensão, no entanto, esta estrutura é dissipativa. O capacitor Cs é descarregado na
próxima entrada em condução de T1 via Rs.
Na Fig. 4 é mostrado um CAC passivo de baixas perdas que recupera a energia
diretamente para a carga. Durante o bloqueio, do interruptor, o capacitor Cs se carrega até
atingir a tensão do barramento de alimentação. Na entrada em condução subseqüente, a
corrente de carga se deriva do diodo de roda livre para o interruptor. Simultaneamente o
capacitor Cs carrega o capacitor Co através de L, por ressonância. Quando ocorrer o próximo
bloqueio Cs se carrega e Co se descarrega na carga. Quando Co se descarrega o diodo de roda
livre conduz. Durante o bloqueio Co e Cs estão efetivamente em paralelo através do
interruptor. O CAC dado na Fig. 4 é bastante funcional, porém perde em aplicabilidade devido
ao excesso de componentes.
Vcc
Vcc
Ldispersão
Ldispersão
Rs
Rs
Ds
Ds
T1
T1
Cs
Cs
Figura 3 – Snubber convencional.
Vcc
Ldispersão
Drl
D
Co
Do
L
Ds
T1
Cs
Figura 4 – CAC regenerativo capacitivo.
3 – O CIRCUITO PROPOSTO
O circuito proposto utiliza-se de um capacitor C1 para diminuir a razão de
crescimento da tensão sob o interruptor, um indutor L1 e dois diodos, como mostrado na Fig.
5, caracterizando-se como um CAC passivo formado por apenas quatro componentes. Este
circuito apresenta baixa dissipação de potência e, embora seja mais complexo que um
snubber convencional, proporciona uma boa solução para a proteção dos interruptores no
instante do bloqueio.
Ldispersão
D1
C1
E
D2
L1
T1
Figura 5 – CAC não dissipativo proposto.
A escolha por um circuito passivo é em virtude de os circuitos ativos
apresentarem maior complexidade na sua estrutura e também exigirem interruptores
adicionais, o que pode representar um incremento no custo final do projeto.
3.1 – ETAPAS DE FUNCIONAMENTO
O CAC proposto apresenta quatro etapas de operação especificadas a seguir.
As variações topológicas assumidas pelo conversor são mostradas na Fig. 6.
1a Etapa (t0, t1): ao bloquear-se o transistor T1, a indutância de dispersão se descarrega em C1
via D2. A tensão no capacitor C1 cresce de forma limitada, protegendo o
transistor.
2a Etapa (t1, t2): com a entrada em condução do transistor T1 inicia-se uma etapa de
ressonância entre C1 e L1 via T1 e D2. Nessa etapa o capacitor C1 transfere
sua energia para L1.
3a Etapa (t1, t2): Quando a tensão em C1 se anula o diodo D1 entra em condução, permitindo
que L1 transfira sua energia para a carga, já que sua corrente circulará pelo
primário do transformador flyback.
4a Etapa (t1, t2): quando a corrente em L1 se anula os diodos D1 e D2 se bloqueiam e o
conversor opera de forma tradicional até que o transistor T1 seja bloqueado
novamente, dando início a primeira etapa e completando um ciclo de
funcionamento.
Ld
D1
C1
E
D2
T1
L1
a) primeira etapa
C1
L1
Ld
D1
C1
E
D2
T1
b) segunda etapa
Ld
D1
E
C1
E
D2
L1
Ld
D1
D2
T1
c) terceira etapa
L1
T1
d) quarta etapa
Figura 6 – Etapas de funcionamento do CAC proposto.
O capacitor C1 deve ser escolhido de forma a se controlar a sobretensão em T1.
Já o indutor L1 deve ser escolhido de forma a garantir um período completo de oscilação para
a razão cíclica mínima, o qual é o pior caso. Se o indutor possuir um alto fator de qualidade,
toda a energia armazenada em seu campo magnético será enviada para a carga,
proporcionando um melhor desempenho em termos de rendimento.
4 – RESULTADOS
A fim de se averiguar o funcionamento do CAC proposto projetou-se um
conversor flyback com alto fator de potência operando em condução descontínua, o qual é
mostrado na Fig. 7. As características do conversor são apresentadas a seguir, utilizando-se a
metodologia proposta por Péres et al., 1994 e Barbi et al., 1996.
Tensão de entrada: Ve = 311 sen (wt) [V]
Potência de saída: 200W
Tensão de saída: 311V
Freqüência de chaveamento: 50kHz
Resistência de saída do conversor: 484Ω
Indutância Lp: 450 µH
Capacitância de saída: 220 µF
Dr1
Lp
D1
Ve
D2
~
Dr3
D
Dr2
Ls
C1
C
Dr4
L1
R
T1
Figura 7 – Conversor flyback.
O conversor flyback projetado foi experimentado de forma totalmente
dissipativa, ou seja, sem nenhum CAC, com o snubber convencional apresentado na Fig. 3 e
com o CAC proposto, conforme apresentado na Fig. 7.
As Figs. 8, 9 e 10 mostram a tensão sobre o interruptor T1 respectivamente,
sem nenhum CAC, com o snubber convencional e com o CAC proposto.
Tensão sob M2 sem circuito snubber
700
600
Tensão ( V )
500
400
300
200
100
Tempo ( s )
Figura 8 – Tensão sobre o interruptor T1 sem CAC.
Figura 9 – Tensão sobre o interruptor T1 com CAC convencional (snubber).
Figura 10 – Tensão sobre o interruptor T1 com CAC proposto.
Na Fig. 9, com a presença de um snubber convencional, formado por uma
célula RCD, percebe-se a funcionalidade do circuito, porém o rendimento do conversor
diminui, não caracterizando-se como uma boa solução. Já na Fig. 10 percebe-se um
1E-04
9E-05
8E-05
8E-05
7E-05
7E-05
6E-05
5E-05
5E-05
4E-05
4E-05
3E-05
2E-05
2E-05
1E-05
6E-06
-100
0
0
desempenho semelhante em termos de proteção do transistor com uma sensível melhora de
rendimento quando usado o CAC regenerativo proposto.
A Fig. 11 mostra a tensão sobre o interruptor para o período de rede, onde
percebe-se a modulação sofrida e nenhum esforço adicional de tensão.
Figura 11 – Tensão sobre T1 para o período da rede.
A Fig. 12 apresenta a tensão e acorrente na entrada do conversor,
caracterizando o alto fator de potência da topologia utilizada, comprovando a funcionalidade
do CAC proposto, já que não interfere na operação normal do conversor flyback.
Figura 12 – Tensão e corrente de entrada.
Quanto ao rendimento final do conversor fez-se uma comparação no ponto de
potência nominal, mostrada na tabela 1, a qual evidencia a superioridade do CAC regenerativo
proposto.
Tabela 1 – Comparação de Rendimento
Tipo
Rendimento
Sem CAC
78,50%
Snubber convencional
76,80%
CAC regenerativo proposto
85,40%
5 – CONCLUSÕES
A interrupção de corrente em circuitos indutivos é danosa aos transistores,
obrigando os projetistas a superdimensioná-los em tensão ou aplicar circuitos de auxílio a
comutação. Vários circuitos de auxílio a comutação tem sido propostos na literatura, alguns
ativos e outros passivos. Os ativos exigem a utilização de transistores auxiliares, já os
passivos se utilizam de redes RCD ou LCD, sendo preferidos para uso industrial por serem de
menor complexidade e por apresentarem custos mais reduzidos. Os snubbers convencionais
do tipo RCD são boas alternativas do ponto de vista de proteção dos transistores, no entanto,
dissipam a potência proveniente da comutação reduzindo o rendimento do conversor de uma
forma geral. Tal efeito é agravado quanto maior for a freqüência de operação do conversor.
Neste trabalho mostrou-se que o circuito de auxílio a comutação proposto elimina os esforços
de tensão sobre o interruptor sem apresentar esforços excessivos de corrente, além disso
apresentou um rendimento bastante superior ao obtido com o snubber convencional e sem
CAC. O CAC proposto demonstrou funcionalidade semelhante ao CAC convencional,
entretanto sua grande vantagem é a de regenerar, quase que totalmente, a energia envolvida na
comutação. Isto é de fundamental importância, pois contribui para a redução do volume total
do conversor e de seu peso, bem como, do aquecimento deste. Com relação a aplicação em
circuitos com alto fator de potência, o CAC analisado é o mais indicado, pois é não
dissipativo, não interfere no funcionamento original do conversor, é composto apenas de
componentes passivos e não regenera a energia para a rede, pois esta, é enviada para a carga.
6 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Frequency Power Converters. In anais do IEEE PESC'93, Seattle – EUA.
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