Uma trajetória de 47 anos
Meu caro Tote
Se bem o conheço, você torcerá
o nariz ao constatar, nesta manhã de
domingo, que lhe dirijo a carta de hoje.
Não, não se preocupe. Quando comecei a escrevê-la, no meio da semana, de pronto me veio sua absoluta aversão ao protagonismo. "Jornalista produz notícia, jornalista não é
notícia", disse-me você muitos anos
atrás, quando então iniciávamos esta
convivência que me é tão grata.
Mas, esta correspondência tem
uma razão de ser. Amanhã, 13 de
dezembro, o nosso Diário de Mogi
comemorará seu 47° aniversário de
fundação. Iniciará seu 48° ano de circulação. Eu, algumas vezes muito
próximo, outras nem tanto, tenho o
orgulho de ter participado de quase
40 anos dessa trajetória. Lembro-me
agora do dia em que, julho de 1975,
você e Neid estiveram em minha casa
da Praça Rotary, para conhecerem
nosso primogênito Felipe. E você me
disse naquela manhã: "Onde, afinal,
esteve até agora esse menino?" E eu
me pergunto: "Onde estaria eu próprio agora se, em uma manhã de janeiro de 1965, o nosso Diário de Mogi
não tivesse publicado um anúncio
convocando "jovens, com aptidão
para o jornalismo, a exercerem a função de Redator"?
Começou ali, 8 ano do jornal, a
minha passagem por ele. Cheguei
com um amigo, Arístio Serra e você
nos ofereceu, como teste, o exercício de escrever sobre um tema. A
mim coube "administração pública".
A Redação tinha quatro mesas e
uma escrivaninha inglesa, que você
ocupava."A primeira mesa era dè
Moura Santos. E m cada uma delas
havia uma máquina de escrever
o
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obstáculos.
O primeiro chegou poucos dias
depois. U m temporal sobre Mogi fez
cair o telhado da oficina sobre as
máquinas j á capengas. Poderia ter
entregado os pontos, preferiu pegar
o Expressinho da Central do Brasil
Tote Da Sam para São Paulo e iniciar uma pereBiagio, há 47 grinação pelos fornecedores. A toanos diretor dos se apresentava e pedia crédito
para compras. De quase todos recedo Diário de
negativa. No meio da tarde, senMogi, jornal beu
tou em um banco do Largo do
por ele
Paissandu; cabeça entre as mãos,
fundado no pensou em desistir. Lembrou-se de
um derradeiro fornecedor, olhou o
dia 13 de
relógio e viu que ainda tinha algum
dezembro
tempo para chegar à E s t a ç ã o
de 1957
Roosevelt e tomar novamente o
Expressinho de volta para Mogi. Bateu lá; foi tratado como vip. Voltou
para Mogi e nunca mais pensou em
desistir.
O jornal, que em sua primeira edição tinha 4 páginas, em poucos meses j á somava 8. Em poucos anos,
duas outras linotipos agregaram-se à
Olivetti e uma extensão do telefone rem tamanha petulância! Venderam bateria; mais algum tempo e a plana
3822.. Hoje fico a pensar o que o para outros. Não faz mal: um contra- manual foi substituída por uma plana
levou a dar uma oportunidade a al- to de aluguel do prédio da Barão de automática. Que acabou aposentada
guém que tinha então 18 anos incom- Jaceguai 388, duas linotipos velhas, em 1975, quando uma rotoplana foi
pletos. E a única resposta que en- uma impressora plana manual e uma instalada no novo prédio da Rua
contro: você tinha 34 anos. E já fa- mesa de tipos móveis era tudo do que Ricardo Vilela. A esse tempo, a Rázia 8 que dirigia o jornal.
vocês precisavam. Mais a coragem dio Diário de Mogi já se incorporara
Começou com 26 anos, acreditan- de companheiros como Jair à família. Sinal dos tempos, a rádio
do ser possível construir em uma ci- Monsores, Diomar A c k e l Filho, também seria substituída pela T V
dade onde todos que mandavam ti- Alberto Steolla, Ditinho, João do Pra- Diário, retransmissora da Rede Glonham mais de 40 anos. O prefeito, do e outros. Na manhã de 13 de de- bo de Televisão e hoje 100% sob o
mais de 80. Foi no segundo semestre zembro de 1957 o jornal estava nas controle do grupo.
de 1957. A o deixarem a Folha de ruas.
Para quem vê de longe esta trajeMogi, cujo controle fora transferido
Você saiu cedo; nem dormiu. Foi tória será fácil supor que tudo foi
pelos irmãos Isaac e Jayme Grinberg, ver nas bancas como reagiam os lei- muito fácil. Não, tudo foi, tudo tem
você e Neid ousaram fazer uma pro- tores. Em um, pelo menos, conseguiu sido muito difícil. Poderia relembrar
posta para a compra do jornal. Como detectar um sorriso sarcástico. Não aqui nossas derrotas ou nossas vitópodiam aquele filho de migrante itali- ficou bravo, fez daquele aparente rias. Prefiro ficar com a incessante
ano e aquela filha de ferroviário te- deboche alavanca para enfrentar os luta que você nos ensinou de bata-
noite de anteontem e confirmado pelo
prefeito.
Segundo ele, entretanto, "isso
não deve surpreender ninguém e a
própria Prefeitura não pode impedir as dezenas de a ç õ e s de
u s u c a p i ã o propostas constantemente na cidade. O que não podemos admitir, isto sim, é que tentem
' g r i l a r ' uma praça. A í j á é demais". N a verdade, pela Justiça de
M o g i correm, j á há vários anos,
dezenas de ações de usucapião reivindicando a posse de áreas algumas vezes bastante valorizadas,
como é o caso da V i l a Oliveira,
onde e s t á l o c a l i z a d a a p r a ç a
ameaçada por um desses processos. Esse bairro, onde estão hoje
as residências de maior valor da
cidade, algumas das quais avaliadas em mais de 10 milhões de cruzeiros, é também o que teve seus
imóveis com a maior taxação de
imposto territorial pela Prefeitura
em áreas residenciais - o metro
quadrado foi taxado à razão de 500
cruzeiros.
Diariamente a imprensa local publica editais, para conhecimento de
"possíveis interessados", dando conta
da tramitação de ações de usucapião
no Município. Embora boa parte delas digam respeito a propriedades rurais, na área urbana a maioria absoluta refere-se a imóveis localizados na
Vila Oliveira.
E-mail: [email protected]
POSSE EM 1962 - Vice-prefeito da cidade, Maurílio de Souza Leite Filho discursa na
antiga sede da Prefeitura, na Rua José Bonifácio, ao ser empossada como sucessor do
prefeito cassado Rodolpho Jungers. Ao seu lado, a esposa e os funcionários
municipais Dirce Monteito Leite, Luiz Rosa e Oscar de Almeida Melo Freire.
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Chiquinho
Flagrante do século XX
Usucapião em praça pública
Acredite se quiser. Em dezembro
de 1978 o jornal O Estado de S. Paulo publicou o seguinte texto, assinado
por seu correspondente em Mogi das
Cruzes:
"Uma denúncia levada à Prefeitura de M o g i das Cruzes há alguns dias impediu que fosse proposta uma ação de usucapião sobre uma área municipal destinada
à construção de uma praça pública. O fato foi confirmado na noite
de anteontem pelo prefeito
Waldemar Costa Filho, durante reunião do Conselho Municipal de
Desenvolvimento.
A denúncia foi levada à Prefeitura de Mogi no início do mês, dando
conta de que uma área de 400 metros
quadrados, localizada no bairro da
Vila Oliveira, o mais valorizado pela
especulação imobiliária nos últimos 10
anos, havia sido cercada com
mourões e arame farpado. Alguns
vizinhos da área, que está reservada,
junto com outras adjacentes, para a
construção de uma praça pública,
chegaram a comentar, com alegria,
que a cerca seria indício de que a
Prefeitura estava iniciando as obras
da praça. Um deles, entretanto, resolveu comunicar o fato à Prefeitura
que, imediatamente, determinou a
derrubada da cerca. Mantido em sigilo por alguns dias, o fato foi levantado por um integrante do Conselho
Municipal de Desenvolvimento na
lhar pelos interesses da cidade. Começou no primeiro número do jornal,
no qual a manchete defendia a eletrificação da linha férrea entre Mogi e
São Paulo. Seguiu-se com a defesa
da ampliação das varas judiciais do
foro local. A campanha pela
estatização da antiga Mineração Geral do Brasil, única forma de devolver os empregos que a falência da
empresa tirou da cidade. Também
pela construção e, depois, duplicação
da Mogi-Dutra; a abertura da nova
estrada Mogi-São Paulo, construção
do novo presídio e conclusão do hospital Luzia de Pinho Melo. Paro por
aqui sob pena de me tornar um chato
e ficar relembrando uma peregrinação de 47 anos.
Mas não posso deixar de retomar
a lembrança do primeiro encontro que
você teve com seu afilhado de batismo, Felipe - "onde, afinal, esteve até
agora esse menino?" - para me perguntar de novo onde estaria eu, agora, se não tivesse respondido, em janeiro de 1965, àquele anúncio do D i ário de Mogi. São quase 40 anos de
convivência e permanente aprendizado. Da profissão à qual você me abriu
as portas tenho tirado todo o meu
sustento e de minha família. Minha
mulher e meus filhos, sei, orgulhamse. Sobretudo dos preceitos éticos que
aprendi nesta casa. U m dos quais me
ensina a não tripudiar sobre antigos
aliados e ter a consciência, sempre,
de que, "enquanto a caravana passa,
os cães ladram".
Espero estar com todos do jornal
amanhã para comemorarmos o muito que temos para comemorar.
Assino, grato, da forma como
sempre fui tratado nessa casa.
Filas nos bancos. Com raríssimas
exceções, não há banco nesta cidade
que atenda com dignidade seus clientes
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Uma trajetória de 47 anos