UMA NOVA BASE PARA A LÓGICA JURÍDICA: A LÓGICA ESTÓICA ENQUANTO SISTEMA
IDEALISTA TEORÉTICO DO PENSAMENTO BASEADO EM RELAÇÕES DE IMPLICAÇÕES
EMPÍRICO-TEMPORAIS
UNA NUOVA BASE PER LA LOGICA GIURIDICA: LA LOGICA STOICA COME SISTEMA
IDEALISTA TEORETICO DEL PENSAMENTO FONDATO IN RAPPORTI DI IMPLICAZIONI
EMPIRICHE E TEMPORALI
Fernando Joaquim Ferreira Maia
RESUMO
Este artigo busca analisar a lógica estóica. A lógica estoicista revestiu-se de originalidade, com construções
próprias, voltadas não só para a persuasão a partir do senso comum, como também para a busca da verdade
absoluta, traduzindo um pensamento lógico proposicional voltado para a procura das respostas mais justas
exigidas pela realidade, numa compreensão dialética, conjuntural. A tese central concebe que o estoicismo,
tomando por base a realidade exterior, construiu um paradigma lógico original, incorporando elementos da
realidade e da ação do homem enquanto ser singular e direcionando esta para a manipulação e construção de
proposições enunciadoras de acontecimentos, de fenômenos. A lógica coloca-se como instrumento capaz de
articular a razão mediante implicações de relações temporais, assumindo nítido caráter idealista na
compreensão dos fenômenos da realidade.
PALAVRAS-CHAVES: LÓGICA, ESTOICISMO, VERDADE
RIASSUNTO
Questo articolo cerca analizzare la logica stoica. A logica stoica si caracterizzò per l’originalità, oggetivando
non solo la persuasione a partire del senso comune, come anche la cerca della verità assoluta, tradurrindo un
pensamento tornato a cerca delle risposte più giuste poste per la realità, in una comprensione dialetica. La
tese centrale difende che lo stoicismo, prendendo per base la realità esteriore, ha construito un sistema logico
originale si differenziando delle troppo di sua época, incorporando elementi della realità e della azione umana
e direzionando questa per la manipolazione e costruzione di propozioni enunciatori di fenomeni. La logica è
capace di articolare la razione via implicazioni di relazioni temporali, prendendo carater idealista nella
comprensione dei fenomeni della realità.
PAROLE CHIAVE: LOGICA, STOICISMO, VERITÀ
Sumário: 1. Um novo enfoque sobre a lógica: a desconstrução da sua estrutura a partir do estoicismo.
2. A função e articulações da lógica estóica. 3. O critério da verdade: a sensação e a representação
compreensiva (ou cataléptica). 4. A dialética como parte da lógica: a proposição, enquanto incorpóreo
verdadeiro ou falso, e o problema dos significantes e dos significados. 5. A retórica como ornamento e
como parte da lógica. 6. O devido lugar da lógica estóica: entre Platão e Aristóteles. 7. Referências
bibliográficas.
1. Um novo enfoque sobre a lógica: a desconstrução da sua estrutura a partir do estoicismo
O estoicismo é uma filosofia helenística que sustenta que a felicidade consiste na exigência do bem,
ditada pela razão e que transcende o indivíduo, devendo ser estendida a todos. Seus fundadores foram:
Zenão de Cício (século IV a.C.), Cleanto (século IV a.C.) e Crisipo (século III a.C.). Já em relação aos
continuadores, estes foram Sêneca (século I d.C.), Epitecto (50-130 d.C.) e Marco Aurélio (século II d.C.).
O período que corresponde ao estoicismo se estende desde a ocupação macedônica da região da
Grécia no século III a.C., passando pela chegada dos romanos no século II a.C., indo até o século II d.C.
Nesse período, o estoicismo experimentou três fases:
1 – o Estoicismo Antigo (séculos IV e III a.C., tendo por teóricos Zenão de Cício, Cleanto e
Crisipo), correspondendo à formação das bases ideológicas do estoicismo, dando-se atenção à lógica, à física
e à ética;
2 – o Estoicismo Médio (século II a.C., tendo por teóricos Panécio de Rodes e Possidônio),
correspondendo ao ecletismo no estoicismo;
3 – o Estoicismo Imperial (séculos I e II d.C., tendo por teóricos Sêneca, Epitecto e Marco
Aurélio), fase que corresponde à decadência desta filosofia, com forte penetração religiosa e transformação
do estoicismo em mero sistema axiológico; é a paranética, pela qual o estoicismo vai se colocar como a arte
de exortar e aconselhar bem, sendo Marco Aurélio principal exemplo[1].
O presente trabalho tem como objeto de estudo a lógica estóica. A tese central concebe que o
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estoicismo, tomando por base a realidade exterior, construiu um paradigma lógico original, incorporando
elementos da realidade e da ação do homem enquanto ser singular e direcionando esta para a manipulação e
construção de proposições enunciadoras de acontecimentos, de fenômenos. A lógica coloca-se como
instrumento capaz de articular a razão mediante implicações de relações temporais, assumindo nítido caráter
idealista na compreensão dos fenômenos da realidade. Neste sentido, pode-se dizer o articular das palavras,
com o objetivo de estabelecer o sentido diante de ambigüidades, não deixa de auxiliar na universalização da
ideologia da camada social dominante pelos mecanismos estatais de reprodução da ideologia.
De qualquer forma, a lógica estoicista revestiu-se de originalidade, com construções próprias,
voltadas não só para a persuasão a partir do senso comum, como também para a busca da verdade absoluta.
Neste sentido, a lógica estóica envolve, de certo modo, à luz dos condicionantes históricos e materiais da
sociedade escravista da época, ornamento e episteme. De fato, as formulações estóicas, quanto à lógica,
conforme será sustentado, unem dialética e retórica.
É justamente na lógica aplicada para o ser e o devir[2], por meio de um meio termo entre Platão e
Aristóteles, que o estoicismo construiu sua originalidade quanto à lógica, traduzindo um pensamento lógico
proposicional voltado para a procura das respostas mais justas exigidas pela realidade, numa compreensão
dialética, conjuntural, sendo a lógica e a própria filosofia abordadas na perspectiva aristocrática, a partir do
poder político dessa camada da sociedade. É o que se denomina de lógica proposicional.
Ademais, a lógica estoicista tinha uma opção existencial fundamental, baseada na ética, pela qual
não há outro mal que não o mal moral. A atitude correta consiste em reconhecer como bom ou mau apenas o
que é bom ou mau moralmente e em considerar nem bom ou mau, portanto indiferente, o que não é bom nem
mau moralmente. Para o estóico é moral aquilo que depende do homem e indiferente aquilo que não depende
do homem. A única coisa que depende do homem é a intenção moral. O que não depende do homem é o
destino[3]. Aqui, o soberano bem é viver possuindo a ciência do que é conforme a natureza e tornando-o
seu, ou seja, o bem é o útil ou a partir do qual pode ser obtido o útil[4]. A virtude e o bem são no fundo uma
e a mesma coisa. Ou se tem a virtude ou não se tem. Não existe meio termo entre o vício e a virtude.
Ademais, a sabedoria, a física, etc., tudo está contido na virtude. O homem virtuoso é, ao mesmo tempo, um
homem meditativo e um homem de ação[5]. Neste sentido, o domínio das relações temporais, da necessidade
entre um antecedente é fundamental, pois contribui que o homem possa viver segundo a razão e à natureza.
Daí a importância e a relevância da lógica estóica.
Por fim, o fulcro deste trabalho objetiva auxiliar na compreensão de como os estóicos concebem a
sua lógica, bem como a partir de quais bases eles a constroem.
2. A função e as articulações da lógica estóica
Os estóicos concebem que o universo é um ser vivo como Deus, confundindo-se com este. Assim, o
homem deve viver em harmonia com a vida universal, buscando o equilíbrio diante das tensões do universo.
De certo, esta concepção leva a um empirismo no estoicismo. Este empirismo, por sua vez, é um
empirismo da compenetração do homem e do mundo. Aqui, para o homem, sentir é ter os sentidos e a alma
alterados pelo que é exterior, sendo que o homem alcançará a verdade se esta modificação estiver em
harmonia com o que a provoca e estará no erro e na paixão se estiver em desacordo[6]. Para os estóicos, a
lógica fornece justamente os instrumentos adequados para a resolução das dificuldades mundanas e do
espírito[7].
Neste sentido, o estoicismo coloca a lógica, juntamente com a física e a ética, como parte da
filosofia. Por esta posição, a lógica constitui o círculo externo da filosofia. A lógica, por sua vez, é dividida
em dialética e retórica, definindo-se a dialética como a ciência de discutir corretamente sobre assuntos
mediante perguntas e respostas e a retórica como a ciência de falar bem sobre assuntos claramente e
unitariamente expostos[8].
Outrossim, a lógica estóica constitui meio para o alcance da certeza e da verdade absolutas, tocando
a ontologia.
Esse empirismo estóico faz com que a proposição estóica enuncie basicamente acontecimentos, tais
como estes: “está claro” ou “a mulher deu à luz”. Aqui, o raciocínio estóico diz respeito às implicações de
relações temporais. Segue outro exemplo: “se esta mulher tem leite é porque deu à luz”[9]. Observa-se, aqui,
a lição de Lourival Vilanova, quando este afirma que o simbolismo característico da lógica se baseia em
símbolos abstratos construídos a partir de uma linguagem empírica, de comunicação e de conhecimento do
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mundo[10].
A sabedoria baseia-se exatamente nessas relações temporais. É por isto que os estóicos concebem
que o saber, do ponto de vista metodológico, do ensino didático, cabe à lógica[11]. Sendo o tempo
expressão do dinamismo da vida universal e da sua harmonia, a sabedoria é submissão à vida, ao mundo, a
Deus, apoiando-se sobre um conhecimento da necessidade[12].
Para os estóicos, os indivíduos jamais serão idênticos. Esta concepção leva o estoicismo a dar
relevo à conseqüência na lógica, rejeitando a inferência. Neste sentido, o domínio das relações temporais, da
necessidade entre um antecedente é fundamental, pois contribui que o homem possa viver segundo a razão e
à natureza. A relação estóica implica na idéia de entidades eternas e imutáveis, fazendo a lei prevalecer sobre
a idéia de essência à idéia de lei[13].
Outrossim, a lógica estóica se fundamenta nos Megáricos, escola anterior a Aristóteles. Também, os
estóicos diferenciam sua lógica da aristotélica, pois enquanto esta se apresenta como conhecimento
conceitualístico, a estóica se apresenta como sistema idealista teorético do pensamento baseado em relações
de implicações empírico-temporais.
Por fim, dos fundadores do estoicismo, será Crisipo que vai sistematizar a lógica estóica. Aqui,
Zenão de Cício, outro fundador do estoicismo, numa perspectiva socrática, vai dividir a lógica em dialética e
retórica, reconhecendo apenas duas possibilidades para o discurso: proceder por argumentos e desenvolverse de forma oratória. De fato, os estóicos construíram uma lógica original, oposta à de Aristóteles[14], o que
sustentará nos próximos capítulos.
3. O critério da verdade: a sensação e a representação cataléptica
A representação é uma impressão que reproduz uma coisa proveniente de algum lugar e que não
pode exprimir aquilo de que não provenha. Neste sentido, a representação manifesta-se por si mesma ao
indivíduo e revela a este o que a produz. É por isto que os estóicos entendem que a representação é o
elemento primeiro desta interação do homem situado no mundo[15]. Neste sentido, a representação é uma
impressão ou marca na alma, uma alteração nesta[16].
A representação tem função importante na lógica estóica, pois ela constitui o critério de verdade.
Aqui, a base da cognição é a sensação, esta uma impressão provocada pelos objetos sobre os nossos órgãos
biológicos sensoriais[17].
De certo, os estóicos elaboram a representação entendendo que o conhecimento, para ser
verdadeiro, deve ser verdadeiro de imediato.
Objetivando uma melhor compreensão deste importante conceito estóico, que é a representação,
dar-se necessário diferenciar representação, representado, imaginatividade e fantasma. Para Crisipo, a
representação é um tipo de pathos produzido no interior da alma e que denota, ao mesmo tempo, ele próprio
e o objeto que o provoca. Já o representado é o objeto que produz a representação. Em relação à
imaginatividade, esta é a atração do vazio, um sentimento, paixão, que se produz no espírito, mas sem que
seja a partir de um objeto qualquer imaginável[18]. A imaginatividade não está fundada em nada. Por fim, o
fantasma é aquilo em direção ao qual o homem é arrastado nessa atração do vazio imaginativo. É o que
ocorre, por exemplo, com os loucos. A representação difere do fantasma, pois, como já dito, a primeira é
uma alteração no espírito e o segundo é uma aparição produzida pelo pensamento, uma atração vã, a
exemplo dos sonhos[19].
Realizadas estas importantes diferenciações, entende-se, entretanto, que o critério da verdade
estóico não diz respeito a qualquer representação, mas apenas àquela que exprime um sentir e um assentir,
um consentir e um aprovar proveniente do logos que está na alma humana[20], ou seja, aquela que conduz
os conteúdos de consciência através dos quais é preciso dar início ao conhecimento[21].
Aqui, é de bom alvitre considerar que o logos é entendido como o destino, a causa universal[22]. É
por isto que, para Zenão de Cício, o logos é muito mais que a razão pensante e cognitiva, envolvendo,
também, o princípio espiritual que dá formato ao universo, à base de um plano rigoroso, fixando para o
indivíduo o seu destino[23]. Ressalte-se que esta definição de logos é própria dos estóicos, pois o sentido de
logos experimentou uma posterior evolução. Assim, como exemplo, o sentido de logos para a retórica
jurídica metódica é o de linguagem em sentido performático, com todas as suas estratégias e matizes, indo
além de um sistema de regras de pensamento, pela qual todas as coisas são ao mesmo tempo boas e más,
justas e injustas, verdadeiras e falsas[24]. Este sentido de logos, proposto pela retórica jurídica metódica,
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parece reforçado por Lourival Vilanova quando este, ao comentar a lógica de Husserl, diz que o tópico
apropriado para o sentido do logos, a sede adequada das significações, é a linguagem em sentido estrito[25].
Realizadas essas importantes observações, entende-se que o critério da verdade é a representação
compreensiva, também chamada de cataléptica, pois esta representação é justamente aquela representação
verdadeira calcada no assentimento do indivíduo[26]. Inclusive, os fundadores da lógica estóica entendem
que a representação compreensiva só constitui o critério da verdade desde que não encontre obstáculos, ou
seja, a representação compreensiva não é o critério da verdade absoluta. Aqui, não encontrando obstáculo,
ela é evidente e inquestionável, forçando o homem ao assentimento[27]. Neste sentido, todo o problema
reside em saber o que torna uma representação compreensiva ou não[28].
A representação compreensiva é, como a própria representação, uma imagem passiva, como já dito,
uma impressão na alma. Esta impressão é alheia à vontade humana, ocorrendo aleatória e inevitavelmente,
mas o homem pode dar assenso ou recusar assenso a ela. Pois é justamente, e apenas, quando o homem dá
assenso é que acontece a apreensão; e, portanto, a representação que recebeu o assentimento do homem
torna-se representação compreensiva ou cataléptica. De certo, a alma é atingida pelo objeto exterior quando
ela imagina a causa da impressão (afecção, pathos). Assim, se essa “imaginação” é correta, o agente é
percebido, ocorrendo a representação compreensiva ou perceptiva ou cataléptica[29]. Aqui, o espírito fica
tão afetado pela representação que o assentimento fica evidente[30].
Apenas para ilustrar, objetivando esclarecer esta teoria, vale citar uma alegoria de Zenão de Cício
descrita por Cícero: “Zenão mostrava sua mão aberta com os dedos estendidos e dizia: "Tal é a
representação"; depois, dobrando ligeiramente os dedos: "Eis o assentimento"; a seguir, cerrava o punho e
dizia que era a percepção, e, finalmente, cobrindo com sua mão esquerda o punho direito dizia: "E aqui a
ciência, exclusiva do sábio". Isto é, a representação, compreensiva ou não, não capta nada, que o
assentimento prepara a percepção e, finalmente, que só a percepção capta o objeto, o que faz ainda melhor a
ciência[31].
A representação compreensiva é produzida por uma coisa existente, marcada e impressa no sujeito
conforme essa coisa existente. Ela não deriva sua existência de uma coisa não existente. Assim, o primeiro
atributo da representação compreensiva é que ela se origina de uma coisa existente, real, reproduzida com
todas as suas particularidades. Já o segundo atributo consiste em tirar sua origem ao mesmo tempo de uma
coisa existente e conforme essa coisa existente, o que já foi dito aqui[32].
Observa-se que a representação compreensiva deve ser imaginada e impressa no sujeito, de maneira
que todas as particularidades dos objetos possam ser reproduzidas com arte. Nesta ótica, aqueles que
experimentam a representação compreensiva de coisas reais devem perceber todas as suas
características[33].
É por isto, que o assentimento deve ser espontâneo. Isto significa que a liberdade do assenso é o ato
de reconhecer e dizer sim à evidência objetiva e o ato de rejeitar e dizer não a não-evidência. É neste sentido,
que os estóicos conduzem a representação pela sensação e é aí que reside, lembrando mais uma vez, a
representação compreensiva, permitindo a apreensão dos objetos[34]. De certo, é somente o assentimento
que transforma a consciência da impressão em certeza da presença de um objeto exterior[35]. Ressalte-se
que a primeira espécie de escrita é pelas sensações, pois a retenção da cada vez maior de informações pelo
homem leva este a registrá-las, inviabilizando a obtenção de experiência. Aqui, a experiência é uma coleção e
uma reunião de inúmeras representações semelhantes[36]. A própria idéia de bem supremo forma-se por
transferência a partir das evidências.
Para os estóicos, quando o homem está diante de algum objeto, produz-se nele uma impressão e
uma representação dotadas de tal força e evidência que o leva ao assenso e à representação compreensiva.
Já, ao contrário, quando o homem está diante de representações compreensivas e ele dá o assenso a uma
representação, encontra-se diante de um objeto real. Deste modo, o critério da verdade repousa sobre a
plena correspondência entre a presença real do objeto e a representação evidente que leva o homem ao
assenso. Aqui, a verdade é algo material, um corpo[37].
Deste modo, a representação compreensiva, comum ao sábio e ao ignorante, oferece ao indivíduo
um primeiro grau de certeza, permitindo a percepção verdadeira e ainda a que produz. A ciência, própria do
sábio, não é mais do que acréscimo desta certeza, que não muda de domínio, mas é completamente sólida,
pois se só a percepção capta o objeto, o faz ainda melhor a ciência[38].
É por isto que Zenão de Cicio, na sua alegoria, diz que a ciência é própria do sábio, pois é ela que
permite ao homem dar a sua adesão à estrutura do mundo que o sustém. A ciência é a percepção segura,
porque é total, o que equivale a dizer que é sistemática e racional. É neste ato que o homem, por exemplo, se
põe de acordo com Deus. Portanto, para viver em harmonia é preciso estar conforme a natureza, implicando
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uma correspondência com o que é. Aqui, a sensação representa os diversos itinerários pelos quais a alma
percorre em direção aos objetos[39].
4. A dialética como parte da lógica: a proposição, enquanto incorpóreo verdadeiro ou falso, e o
problema dos significantes e dos significados
Crisipo funda a dialética estóica, esta tendo por objeto o que pode ser expresso pelo discurso.
A dialética é uma virtude que contêm todas as outras, principalmente o raciocínio e a capacidade de
opor argumentos. Neste sentido, conforme já ressaltado no capítulo anterior, a dialética é definida como a
ciência de discutir corretamente sobre assuntos mediante perguntas e respostas. Somente com o estudo da
dialética o sábio pode raciocinar corretamente, distinguindo o verdadeiro do falso, o que é persuasivo do que
é ambíguo. A dialética é condição para o agir metodicamente[40].
Deve-se ressaltar que os estóicos são nominalistas, pois defendem que o que caracteriza um ser é
uma qualidade individual e concreta, não havendo dois indivíduos semelhantes. Assim, o estoicismo
reconhece o universal como algo que depende do pensar e falar humanos, mas recusa-lhe uma existência real
ou, pelo menos, um fundamento na realidade[41]. Desta forma, apenas duas idéias prevalecem:
a) apenas existem indivíduos; o geral não é nada;
b) busca-se definir as implicações dos acontecimentos segundo a verdade[42].
Deste modo, só a causa é realidade corpórea. Os efeitos, ao contrário, são considerados simples
predicados e, portanto, incorpóreos e exprimíveis[43].
Assim, a definição do indivíduo se faz pela enumeração das suas particularidades. Nesta ótica, a
definição exprime fatos que sobrevêm no tempo. Desta forma, a lógica estóica se comporta como uma lógica
das proposições[44].
Antes que se passe propriamente ao exame das proposições, deve-se ressaltar que os estóicos
construíram sua lógica a partir da dialética, dando autonomia ao pensamento. Neste sentido, destaca-se a
questão do intelecto. Este concebe as coisas de dois modos:
1) por um contato e por uma imediata evidência;
2) por uma passagem das coisas evidentes. Esta última acontece, por sua vez, de três modos:
a) pela semelhança;
b) pela composição;
c) pela analogia[45].
A dialética estóica se divide em duas grandes seções:
a) uma diz respeito à linguagem e à sua estrutura, correspondendo ao significante;
b) outra, às formas do pensamento, correspondendo ao significado.
O significante é a linguagem que pertence ao mundo das coisas e os acontecimentos. Já o
significado é aquilo que, captado pelos que compreendem a língua, escapa totalmente aos outros,
constituindo o sentido de uma expressão[46]. Os significados são coisas exprimíveis (coisas expressas,
enunciadas, ditas). Esses significados são também incorpóreos[47].
É bom enfatizar que os estóicos não se limitaram a tratar as partes do discurso (para o estoicismo: o
nome próprio e o comum, o verbo, a conjunção e o artigo) da estrutura deste e das questões conexas de
estilo. Os estóicos trataram, igualmente, das questões relativas à definição, gênero e espécie do discurso.
Essas preocupações eram consideradas pelo estoicismo como relativas às palavras e à linguagem. É esta a
razão do estoicismo contestar toda forma conceitual do real[48].
Considerando a relação entre os significantes e os significados, a lógica estóica estabelece os laços
que unem os eventos. Daí, mais uma vez, a atenção com a gramática, e conseqüentemente com as
proposições, pois os verbos exprimem eventos, sendo exprimíveis e incorpóreos[49]. Nesta linha, Lourival
Vilanova anota que, na experiência da linguagem, verbo e logos se relacionam. Esta afirmação ajuda a
esclarecer porque os estóicos deram tanto valor à gramática grega, pois é justamente no idioma que se
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acultura o logos, permitindo que este venha aos homens[50].
É por buscar a união de eventos que a proposição estóica não se reduz a um juízo de atribuição,
conceitual, mas anuncia acontecimentos; como exemplo: “Mário passeia”[51].
Essas proposições podem ter relações de diferentes espécies, envolvendo, também, relações
compostas. Seguem as principais:
1 – a proposição condicional depende da conjunção condicional “se”, anunciando que se seguirá
uma segunda proposição, por exemplo, “se é dia, há luz”[52];
2 – a proposição consecutiva depende da conjunção “uma vez que”, por exemplo, “uma vez que é
dia, há luz”[53];
3 – a proposição coordenada depende da conjunção “e”, por exemplo, “é dia e há luz”[54];
4 – a proposição disjuntiva, na qual se introduz uma disjunção “ou”, por exemplo, “ou é dia ou é
noite”[55];
5 – a proposição causal, regida pela conjunção “porque”, por exemplo, “porque é dia há luz”[56];
6 – a proposição comparativa, citando, como exemplo, “é mais dia do que noite” ou “é menos noite
que dia”[57].
Desta forma, a lógica estóica pode incidir sobre consecuções de fenômenos, por exemplo, “se não
faz vento, não choverá”, bem como sobre implicações de atributos, por exemplo, “se é homem, é mortal”.
Observe-se que o estoicismo coloca o silogismo numa perspectiva diferente do silogismo aristotélico, este de
caráter categórico. O silogismo estóico é essencialmente hipotético, conduzindo a lógica para o ser e o
devir[58].
Conforme o paradigma acima posto, o raciocínio estóico é composto por uma maior, uma menor e
uma conclusão, por exemplo: “se é dia, há luz, ora, é dia, logo há luz”. Vê-se que se trata de implicações de
acontecimentos e não de relações entre conceitos, como ocorre no silogismo aristotélico[59].
Nota-se que a proposição é um exprimível completo, pois o seu sentido liga o predicado a um
sujeito. Na lógica estóica, o verdadeiro e o falso são ligados estruturalmente pelo juízo. Porém, para o
estoicismo, a verdade é corpórea, mas o verdadeiro é incorpóreo, pois ele é exprimível, é um enunciado, um
juízo. A verdade é a ciência que afirma todos os verdadeiros. É justamente nestes argumentos que o
estoicismo vai dar atenção, como já ressaltado, aos silogismos hipotéticos e disjuntivos, pois são esses que
ligam melhor os eventos[60]. Desta forma, a ligação do predicado com o sujeito não deixa de refletir certa
universalidade nesta ligação. É por isto que o predicado proposto pelos estóicos tem que estar inserido na
perspectiva absoluta da verdade proposta pelo estoicismo. Aqui, se requer um tratamento rigoroso do
raciocínio calcado numa ontologia formal e material. Lourival Vilanova parece seguir tal formulação ao
comentar a lógica de Husserl[61].
Conforme dito acima, a proposição se relaciona com os significantes e significados, pois ela une
eventos. Aqui, aparece o lectón, sendo um pensamento pensado, uma coisa incorpórea e extra-mundana, que
é o sentido de uma expressão[62].
O lectón é importante para a lógica estoicista, pois é através dele que se determina o verdadeiro e o
falso. Ressalte-se que o lectón que o estoicismo vai utilizar na lógica é aquele que constitui uma proposição.
Assim, o lectón do estoicismo é a proposição, objeto da dialética enquanto incorpóreo verdadeiro ou falso,
exprimindo-se em fases inteiras. Aqui, não há meio termo: ou é verdadeiro ou falso[63].
De fato, o estoicismo fez da lógica uma espécie de ontognoseologia, o que impunha estruturas
lógicas em perfeito acordo com as estruturas gramaticais. Assim, a opção será por formas de raciocínio
rigorosas colocando a partícula negativa no início da frase, de forma a marcar bem que ela incide sobre o
conjunto. Por este processo, uma proposição negativa pode ser ela mesma negada, e esta dupla negativa,
reconduz à afirmativa[64].
Observa-se que o lectón dos estóicos supõe a utilização de conjunções.
De certo, a combinação de proposições forma um raciocínio. Um raciocínio é um sistema de
proposições que tem por função provar uma premissa conclusória. Aqui, os estóicos distinguem os
raciocínios em termos concretos e do esquema formal que se obtém substituindo estes termos concretos por
variáveis. Os estóicos distinguiam bem a forma inferencial e a expressão implicativa. É aqui que se baseia o
seu raciocínio concludente, ditos anapodíticos[65].
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A partir daí, os estóicos vão introduzir, seguidamente, várias distinções sobre as proposições
concludentes.
No sentido posto, vale distinguir o raciocínio não-concludente do concludente. O raciocínio nãoconcludente é aquele em que o contrário da conclusão não se opõe às premissas, por exemplo, “se é dia há
luz, ora, é dia, portanto, Cicrano passeia”. Já o raciocínio concludente é o que conduz à conclusão de um
modo específico, por exemplo, “é falso que seja ao mesmo tempo dia e noite, ora, é dia, logo não é noite”.
Observe-se que os raciocínios concludentes, evidentes, são anapodíticos, pois não precisam de
demonstração[66]. Crisipo distingue cinco tipos de anapodíticos:
1 – o argumento é composto de um condicional e seu antecedente como premissas, tendo o
conseqüente do condicional como conclusão, ou seja, começa-se pela condição e dela deriva a conclusão,
por exemplo: “se é noite, está escuro; é noite, logo está escuro”[67];
2 – o argumento é composto de um condicional e o contraditório de seu conseqüente como
premissas, tendo o contraditório de seu antecedente como conclusão, ou seja, da condição e do contraditório
da sua conclusão tira-se uma conclusão oposta à maior, por exemplo: “se é noite, está escuro; mas é dia,
logo não é noite”[68];
3 – o argumento composto de uma conjunção negada e um de seus membros como premissas,
tendo o contraditório do outro membro como conclusão, ou seja, das premissas negativas e de um dos
termos das premissas tira-se o contrário do outro termo, por exemplo: “não é verdade que Cicrano esteja
vivo e morto; ora Cicrano está morto, logo não está vivo”[69].
4 – o argumento composto de uma disjunção e um de seus membros como premissas, tendo o
contraditório de seu outro membro como conclusão, em outras palavras, de uma disjunção e de um dos
termos de uma disjunção, conclui-se o contrário do outro termo, por exemplo: “ou é dia ou é noite; ora é
dia, logo não é noite”[70];
5 – o argumento composto de uma disjunção e o contraditório de um de seus membros como
premissas, tendo o disjuntivo remanescente como conclusão, em outras palavras, de uma disjunção e do
contrário de um dos termos da disjunção, obtém-se o outro termo, por exemplo: “ou é dia ou é noite; mas
não é dia, logo é noite”[71].
O lectón, veículo da lógica estoicista, denotava grande empirismo, fundando os encadeamentos das
proposições lógicas numa harmonia entre uma experiência interior e a experiência que cada indivíduo é
levado a fazer no mundo exterior em que vive.
Vale ressaltar que a representação compreensiva é a única forma de conhecimento que permite ao
indivíduo captar a realidade, constituindo um contato íntimo e imediato com as coisas corpóreas, por isso,
um conhecimento sensível. Neste sentido, é correto dizer que o pensamento e a razão no estoicismo não
captam o ser, no mínimo apenas o tocam[72]. Aqui, a dialética estóica só capta os incorpóreos irreais, ou
seja, ela não capta o ser e a essência das coisas. Ela é acidental, passando apenas pela superfície das coisas.
5. A retórica como ornamento e como parte da lógica
Conforme já mencionado, a retórica aparece para o estoicismo como parte da lógica, constituindo a
ciência de falar bem sobre assuntos com exposição clara e unitária.
De certo, a retórica permite esclarecer o verdadeiro, este descoberto pela dialética. Daí porque o
estoicismo subordinar a retórica à dialética[73].
Para os estóicos, a retórica divide-se em deliberativa, forense e encomiástica. Ela se compõe dos
seguintes elementos:
1 – invenção;
2 – disposição;
3 – representação[74].
Já o discurso retórico é constituído das seguintes partes:
1 – proêmio;
2 – narração dos fatos;
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
5441
3 – refutação;
4 –epílogo[75].
Outrossim, entende-se que no paradigma filosófico do estoicismo a retórica é o modo de falar do
logos estóico.
Com base nisto, os estóicos estabelecem uma teleologia para a retórica, concebendo esta como a
arte de falar com elegância, dizendo de modo sistemático a verdade. Aqui, novamente a dialética exprime a
verdade enquanto conteúdo em si. Já a retórica exprime a verdade de modo apropriado e ornamentado. Que
fique bem claro, para os estóicos, a retórica é ornamento[76].
O certo é que os estóicos não desenvolveram as conseqüências do conhecimento intuitivo, único
ativo e real. Na verdade, o desprezo, como foi sustentado acima, pelos incorpóreos produziu o abandono da
lógica discursiva em benefício da atividade moral e religiosa, da ética[77].
Outrossim, a incompreensão da ontologia do incorpóreo e a pouca valorização da lógica sobre o
real provocaram a sobreposição da física à lógica e da ética à física e à lógica. Na física a mola propulsora é a
intuição religiosa e na ética a é uma nova intuição emocional dos valores[78].
Por fim, em que pesem as insuficiências apontadas acima, a lógica estoicista implica:
1 - que só o indivíduo possui realidade (os conceitos são tidos apenas por palavras);
2 - que todos os indivíduos estão numa interação mútua;
3 - uma teoria do destino, justificando relações temporais de causalidade[79].
Com base nessas implicações, os estóicos entendem que o homem não pode duvidar de certas
representações que levam uma marca de evidência indiscutível. São as representações objetivas ou
compreensivas, estas independendo da vontade humana. Agora, o conteúdo dessas representações depende
do discurso interior humano. É aqui que pode haver o erro e a liberdade.
Neste sentido, o destino pode provocar no homem uma sensação, dando possibilidade de se
enunciar um juízo sobre aquela situação.
De certo, a opção existencial fundamental do estoicismo é que não há outro mal que não o mal
moral. A atitude correta consiste em reconhecer como bom ou mau apenas o que é bom ou mau moralmente
e em considerar nem bom ou mau, portanto indiferente, o que não é bom nem mau moralmente.
6. O devido lugar da lógica estóica: entre Platão e Aristóteles
O juízo do estoicismo acerca da lógica envolve todo o fenômeno jurídico. De certo, a lógica estóica
é importante para a História do Direito, tendo influenciado o pragmatismo jurídico, o realismo jurídico e, até
mesmo, a análise econômica do direito, além do fato dos gregos terem elaborado uma ciência política e
influenciado com sua filosofia o desenvolvimento da civilização romana e do posterior desenvolvimento da
sociedade ocidental à base das várias doutrinas cristãs.
Seu sistema lógico pretende um empirismo baseado na conformação do homem com a vida
universal, como forma do homem singular viver em harmonia. Essa harmonia pressupõe que o sentir é ter os
sentidos e a alma modificados pela realidade e em conformação com esta. A verdade aparece quando isto
ocorre e o erro e a paixão quando não há esta conformação.
A concepção estoicista da lógica repousa numa relação fenomenológica entre o acontecimento e
proposição, vendo isto na perspectiva de implicações de relações temporais. A sabedoria é alcançada por
essas relações temporais[80].
Segundo o estoicismo, a sabedoria apóia-se sobre a necessidade e, portanto, o que existe são os
indivíduos e suas carências. Assim, conhecer as relações temporais, de necessidade entre um antecedente e
um conseqüente é fundamental para equacionar o homem com a razão. É por isto que a lógica estóica é uma
lógica conseqüencialista, importando sempre a essência das coisas[81].
Neste sentido, aparece a idéia de representação. As idéias aqui expostas conduzem a uma conexão
entre a representação e a proposição. A primeira é uma alteração da crise interior da alma por uma coisa
exterior que, por sua vez, também enfrenta uma crise própria. É a representação que fornece o critério de
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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realidade e de verdade. Já a segunda conduz dos valores de verdade. As representações compreensivas são
aquelas que apresentam um objeto clara e distintamente, constituindo uma imagem passiva; as proposições,
enquanto são conforme as representações racionais, apresentam completa e adequadamente o objeto
concebido, na medida em que são expressas num discurso[82].
Em relação ao problema dos signos e do raciocínio (implicação lógica), o estoicismo transpôs
semanticamente a palavra comprehensio, para muito além do processo de apreensão de objetos pela mente
provindos da sensibilidade ou da mente, indo designar de forma ampla o processo de apreensão do sentido
do discurso, visto que apreender o sentido do discurso é apreender o que está expresso pelos signos, ou
seja, significa apreender a representação racional, equivalendo ao que é o que pode ser expresso num
discurso. Aqui, os estóicos ligaram o significado, o significante e o objeto; destes o significante é a
linguagem em si e o significado é o sentido de uma expressão, submetido à faculdade intelectiva do
homem[83].
De fato, a lógica estóica é uma lógica sistemática, englobando tanto a doutrina da representação
quanto a doutrina do discurso e da cogência lógica, mas também uma doutrina da linguagem. Isto exige que
se tematize o “liame” que perpassa e unifica todos esses fatores que é o ser humano. No plano formal,
todavia, basta estabelecer as relações entre linguagem e realidade, repondo, estruturando e unificando as
experiências dos acontecimentos humanos e naturais. A perspectiva aqui é ontológica, pois, para o
estoicismo, o mundo já se apresenta estruturado e unificado naturalmente, mediante uma organização dada
irrefletida e inconscientemente.
Nesta linha, a utilização de silogismos hipotéticos, conduzindo a lógica para o ser e o devir[84],
torna toda investigação e reflexão semi-tautológica no sentido de que a apenas retoma essa organização e a
opera logicamente, mediante noções claras e unívocas, corrigindo os falsos juízos e as ambigüidades das
representações naturais, em direção à verdade absoluta.
Nos termos postos acima, segundo o estoicismo, a lógica se divide em dialética e retórica. É aqui,
principalmente que vai se delinear o paradigma lógico estóico frente às contribuições de Platão e de
Aristóteles.
De certo, Platão concebe a sua dialética em oposição à sofística, o que se materializou no combate e
estigmatização da retórica, gerando a dicotomia filosofia/retórica. Esta oposição da dialética desce de nível
em Aristóteles, para quem esta disciplina não é mais que a arte da discussão ou da disputa. O estoicismo
retoma isto, mas tenta conciliar a retórica com a ciência, convertendo-a na ciência do verdadeiro, numa
episteme. Aqui, o falso e o que não é uma coisa nem outra. Assim, o estoicismo consagra o caráter
ornamental da retórica, mas admite também o caráter científico desta[85], conciliando a retórica com a
formação filosófica e, desta forma, se posicionando entre as posições platônicas e aristotélicas.
De fato, ao unir dialética e retórica na lógica, para os estóicos, a base mesma da lógica, a reflexão,
resulta ser objeto próprio da lógica, pois parte-se do pressuposto de que a meditação do homem enquanto
ser singular é equivalente à expressão dos pensamentos mediante a linguagem. O fundamento de tal
concepção reside na idéia de que nas palavras associadas aos elementos fônicos existem conteúdos mentais,
pois as palavras envolvem conhecimento refletido.
Outrossim, para o estoicismo, só a dialética permite esclarecer as formas e as leis do pensamento,
constituindo o pressuposto formal para a consciência da verdade, base de toda a conduta moral. Como já
dito no capítulo anterior, no sistema estóico, a linguagem e suas articulações políticas e sociais, do qual a
retórica se inseria, era o meio pelo qual se articulava a razão para se assegurar a virtude, cabendo à outra
parte da lógica, a dialética, esclarecer e determinar com precisão os elementos necessários para tanto[86]. De
certo, a retórica permite esclarecer o verdadeiro, este descoberto pela dialética, mediante as operações
lógicas, as quais devem servir à moral. Daí porque o estoicismo subordina a retórica à dialética, associando a
retórica à virtude, ao mesmo tempo que insere a retórica e a dialética na lógica, bem como inclui a lógica na
filosofia[87].
Por fim, para o estoicismo, a lógica se faz necessária justamente para permitir uma compreensão
correta dos fenômenos e otimizar a apreensão do objeto. Isto conduz a uma atitude conformista perante o
mundo, pois o homem não deve fazer nada que viole o logos, ou seja, não deve agir de forma temerária ou
leviana, permitindo um desprendimento da realidade, conformando a razão com a natureza e livrando o
homem de perturbações mundanas. Aqui, a lógica se une à virtude, esta sendo a única coisa verdadeira,
repousando no indivíduo. É justamente na libertação dos impulsos humanos que a liberdade estóica se
realiza. De certo, é sob o processo de produção escravista que erigirá toda uma forma de consciência social
nas cidades-Estado na Grécia, segundo a qual a emancipação do homem só se realizaria com a sua
emancipação do trabalho.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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Assim, a lógica formulada pelos estóicos representa a construção de uma lógica empirista,
preocupada em adequar o dizer com o dito, ou seja, preocupada em se determinar o que pode ser dito com
sentido. Isto significava uma atenção com o léxico e as proposições, pois só as estruturas verbais são
exprimíveis e incorpóreas, podendo exprimir eventos. È claro que isto servia a um discurso jurídico objetivo,
articulado, permitindo mecanismos que traduzissem a vontade da classe dominante na vontade do processo
decisório jurídico-político na sociedade.
O pensamento estóico, particularmente sua ética e lógica, é fruto desta consciência social, sendo o
próprio conteúdo da lógica estóica. Aqui, as aristocracias gregas impuseram um desenvolvimento
circunscrito às artes, às ciências e à informação, pelo qual a produção do conhecimento, e o acesso a este, só
podia ser restrito à classe dominante[88].
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[3]
[4]
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[5]
Idem, ibidem, pp. 78, 80.
[6]
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[9]
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[10]
[11] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[12] BRUN,
[13] Idem,
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 275.
Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 37.
ibidem, p. 37.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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[14] REALE, Giovanni. História
da filosofia antiga. São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, pp. 276-277;
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[15] BRUN,
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[16] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[17] Idem,
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 279.
ibidem, p. 278.
[18] DUMONT, Jean-Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: UnB, 2004, p. 617.
[19] ILDEFONSE,
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[20] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 278.
[21] ILDEFONSE,
Frédérique. Lógica 1: teoria da representação. In: ILDEFONSE, Frédérique. Os estóicos.
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[22]
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[23]
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[24]
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[25]
[26] ILDEFONSE,
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[27] DUMONT, Jean-Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: UnB, 2004, p. 622.
[28] BRUN,
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[29] DUMONT, Jean-Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: UnB, 2004, p. 617.
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[30]
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[32] DUMONT, Jean-Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: UnB, 2004, pp. 620-621.
[33] Idem,
ibidem, p. 621.
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[34]
[35] DUMONT, Jean-Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: UnB, 2004, p. 618.
[36] Idem,
ibidem, p. 624.
[37] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, pp. 281-282.
[38]BRÉHIER,
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[39]
[40] DIÓGENES
LAÉRTIOS. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Brasília: UnB, 1988, pp. 191-192.
[41] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[42] BRUN,
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 286.
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[43] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 287.
[44] BLANCHÉ,
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Bertrand Russell. Lisboa: Edições 70, 1986, pp. 96-97.
[45] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[46] BLANCHÉ,
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 283.
Robert. Megáricos e estóicos. In: BLANCHÉ, Robert. História da lógica de Aristóteles a
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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filósofos ilustres. Brasília: UnB, 1988, p. 191.
[47] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[48] Idem,
ibidem, p. 289.
[49] Idem,
ibidem, p. 290.
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 285.
VILANOVA, Lourival. Escritos jurídicos e filosóficos. São Paulo: Axis Mundi: IBET, 2003, v.2, p.
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[50]
[51] BRUN,
Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 43.
[52] DIÓGENES
[53] Idem,
ibidem, p. 198.
[54] BRUN,
[55] Idem,
LAÉRTIOS. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Brasília: UnB, 1988, p. 198.
Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 43.
ibidem, p. 43.
[56] DIÓGENES
[57] BRUN,
LAÉRTIOS. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Brasília: UnB, 1988, pp. 198-199.
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[58] BLANCHÉ,
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Bertrand Russell. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 97; BRUN, Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986,
p. 44.
[59] BRUN,
Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 44.
[60] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
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VILANOVA, Lourival. Escritos jurídicos e filosóficos. São Paulo: Axis Mundi: IBET, 2003, v.2, p.
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[61]
[62] BLANCHÉ,
Robert. Megáricos e estóicos. In: BLANCHÉ, Robert. História da lógica de Aristóteles a
Bertrand Russell. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 109.
[63] Idem,
ibidem, p. 110.
[64] Idem,
ibidem, pp. 98, 109-111.
[65] Idem,
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[66] BRUN,
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2003, p. 117; DUMONT, Jean-Paul. Elementos de história da filosofia antiga. Brasília: UnB, 2004, p.
627.
[71]
[72] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[73] Idem,
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 295.
ibidem, p. 293.
[74] DIÓGENES
LAÉRTIOS. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Brasília: UnB, 1988, p. 191.
DIÓGENES LAÉRTIOS. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Brasília: UnB, 1988, p. 191;
REALE, Giovanni. História da filosofia antiga. São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 294.
[75]
[76] REALE, Giovanni. História da filosofia antiga.
[77] Idem,
ibidem, p. 295.
[78] Idem,
ibidem, p. 296.
[79] BRUN,
São Paulo: Edições Loyola, 1994, v. III, p. 294.
Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986, pp. 44-45.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
5447
[80] BRUN,
[81] Idem,
Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986, pp. 36-37.
ibidem, p. 37.
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[83]
[84] BLANCHÉ,
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Bertrand Russell. Lisboa: Edições 70, 1986, p. 97; BRUN, Jean. O estoicismo. Lisboa: Edições 70, 1986,
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[85]
[86] Idem,
ibidem, p. 58.
[87] REALE,
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[88]
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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