CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA
EMENTA: ILEGALIDADE
DO
CONVÊNIO
ENTRE O HOSPITAL DA POLÍCIA MILITAR DO
ESTADO DE SÃO PAULO E A FACULDADE DE
MEDICINA DA UNIVERSIDADE MAYOR REALY
PONTIFICIA DE SAN FRANCISCO XAVIER DE
CHUNQUISACA DA REPÚBLICA DA BOLÍVIA
Interessado: Dr. I. A. – Coronel Médico da Polícia Militar
Assunto: Legalidade do convênio entre o Hospital da Polícia Militar e faculdade da
Bolívia para que os alunos do 6º ano façam estágio no referido nosocômio
Nota Técnica nº 164/2001.
Aprovada em Reunião de Diretoria do dia 6/12/2001.
I – DOS FATOS
Trata-se de dúvida encaminhada pelo Dr. I.A., Coronel
Médico da Polícia Militar de São Paulo, acerca da legalidade do convênio que está
para ser firmado entre o Hosp. Militar do Estado de São Paulo e a faculdade de
medicina da Universidade de Mayor Realy Pontifícia de San Francisco Xavier de
Chunquisaca da República da Bolívia.
Na cognição do solicitante, há indícios de “ato ilícito e
antiético“ no referido convênio, por isso encaminhou o expediente para análise deste
CFM.
Esses são, em síntese, os fatos.
II – PARECER
Antes de adentrarmos na resposta do presente expediente
é mister esclarecer que o aluno do 6º ano do Curso de Medicina (internato) ainda não
está diretamente sob fiscalização dos Conselhos de Medicina, sendo, pois, é seu
orientador o responsável perante o órgão de fiscalização.
Sendo assim, inexiste por parte dos Conselhos de Medicina
uma orientação (norma específica) acerca da forma com que este estágio curricular
do estudante de Medicina (internato) seja realizado. A matéria, é afeta à
Universidades e aos Hospitais que recebem e orientam os alunos do 6º ano. E, no
Brasil, o internato é regulamentado pelo Ministério da Educação, justamente por ser
parte das matérias de graduação em medicina.
Portanto, sobre a questão ética em epígrafe, não pode o
Conselho de Medicina manifestar-se conclusivamente, conforme já referido acima.
Todavia, acerca da legalidade do referido convênio, necessário faz-se algumas
observações.
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O internato de Medicina é regulamentado pela Resolução
nº 09, de 24/05/1983, do Conselho Federal de Educação. O seu artigo 1º reza que:
“Art. 1º - O estágio curricular do estudante de medicina
(internato) será realizado na mesma instituição em que o
curso esteja sendo ministrado ou em outras, por ela
designada mediante convênio”.
Por sua vez, o artigo 2º da referida resolução estabelece
assim:
“Art. 2º - O internato poderá ser realizado fora da
instituição, mediante convênio, atendidas as seguintes
exigências:
a) preferência às instituições de saúde do mesmo distrito
ou região geoeducacional.
b) existência de pessoal médico capacitado para exercer a
função de orientador a juízo do colegiado superior da
instituição responsável pelo ensino,
c) (....),
d) (....).
Conforme pode-se aferir no artigo transcrito, não há no
texto restrição à vinda de estudantes de outra localidade para realização de internato
no país, apenas refere-se a um “preferência às instituições de saúde do mesmo
distrito” (grifou-se). Todavia, não impede que os convênios sejam firmados com
hospitais em distritos (ou mesmo países) distantes. Ademais, a norma em comento é
dirigida para as instituições de ensino brasileiras, a regra não se aplica à universidade
estrangeira. Para esta, deve existir em seu respectivo país norma que regulamente
esta questão.
Novamente, torna-se imperioso esclarecer, que por não
serem os alunos do 6º ano inscritos nos Conselhos de Medicina, posto que ainda não
concluíram o curso, a fiscalização ética da atuação destes estudantes não é do
controle dos CRM’s e sim de seus orientadores, recaindo, em caso de delito ético, a
punição nesses.
Situação diversa ocorre com a residência médico, onde o
médico pós-graduando é obrigado a estar registrado nos Conselhos Regionais de
Medicina. Neste caso, o controle é direto, o residente pratica ato médico passível de
punição.
É de se salientar, ainda, que o referido convênio possui
algumas peculiaridades que demonstram ilegalidades latentes. O estágio curricular
final do estudante de medicina (internato) é uma fase complementar da graduação do
aluno. Como tal, deve ter acompanhamento direto por parte da instituição de ensino e
do próprio Ministério da Educação, o qual, no Brasil, fiscaliza e credencia as
instituições (hospitais) onde é realizado o internato.
No presente caso, em análise ao aludido convênio, não
vislumbramos uma forma legal de controle direto por parte da universidade
conveniante, o que per si já se mostra ilegal. Outrossim, sequer faz-se menção à
fiscalização do órgão competente (Ministério da Educação??) na Bolívia. Ou seja,
2
para quê serviria tal estágio? Este é outro fator que atenta contra idoneidade de tal
convênio.
Por outro lado, o controle do Hospital da Polícia Militar pelo
órgão competente da Bolívia, como determina a lei brasileira, é praticamente inviável,
e seria esdrúxulo que o órgão da administração pública boliviana (Ministério da
Educação??) fiscalizasse o ensino de graduação em um hospital brasileiro, que
sequer sabe-se ser credenciado pelo Ministério da Educação do Brasil.
Ora, a autonomia do Estado Brasileiro ficaria, no mínimo,
mitigada. Assim, novamente mostra-se ilegal o referido convênio.
Outro fator estranho é a forma de avaliação, prevista no
item 5 da cláusula 4º (da contribuição das partes), onde tem-se que “ao término do
internato rotatório de 12 meses, os alunos receberão um declaração com notas em
formato especial (ficha de avaliação) que a UNIVERSIDADE, enviará oportunamente
em duas vias para cada aluno, o mesmo que deverá ser assinado pelo médico chega
ou diretor do HOSPITAL, com visto do diretor do HOSPITAL, sem o visto BOM não ter
valor as notas."
É de se questionar, se a nota dada pelo Direto ou Chefe do
hospital servirá para o aluno formar-se perante a universidade e também satisfará as
exigências do órgão competente de controle de ensino na Bolívia? Não se sabe
responder, porém se trata de situação bastante diversa das exigências do Ministério
da Educação pátrio. Tal fato, é também demonstrativo de que não está regular tal
convênio.
O Conselho Federal de Medicina, como órgão de
fiscalização da medicina no Brasil, além de sua função precípua de fiscalizar a classe
médica registrada nos Conselhos Regionais, tem o papel de zelar pela correta, legal e
ética medicina no país, bem como a formação dos futuros profissionais da área
médica. O convênio que se apresenta não coaduna manifestamente com a legalidade
e com a teleologia buscada pelo CFM para a medicina nacional. Existem fatores
obscuros e ilegítimos que não se enquadram com o ordenamento brasileiro, fato que,
na opinião desta A.J., o CFM não pode manter-se silente.
Outra questão relevante, e que causa espécie nesta
análise jurídica, é o fato de tais convênio não estarem sendo firmados com hospitais
vinculados às universidades pátria (Hospital da USP, Unicamp, etc). Sem querer
desmerecer os demais hospitais, é evidente que o convênio de universidade
estrangeira deveria ocorrer com alguma universidade pátria, tendo em vista que o
internato é parte da formação acadêmica do médico.
Por tudo isto, esta Assessoria Jurídica entende que o CFM
deve manter posicionamento contrário a tais convênios, tendo em vista as
ilegalidades acima apontadas.
III – CONCLUSÃO
Por fim, sob o ponto da legalidade, não vislumbramos
possibilidade jurídica de tais convênio serem firmados, levando-se em conta a
legislação pátria. Outrossim, no entender desta A.J., mostram-se extremamente
temerários estes convênios, pela dificuldade de fiscalização e a fragilidade no
3
acompanhamento didático dos estudantes. Ademais, questiona-se o porquê dos
mesmos não estarem sendo firmados com hospitais vinculados à universidades
pátrias, o que era de se esperar..
É o parecer, S.M.J.
Brasília – DF, 03 de julho de 2001.
Turíbio Pires de Campos
Assessor Jurídico
Giselle Crosara Lettieri Gracindo
Chefe da Assessoria Jurídica
nota técnica 1642001 internato universidade estrangeira no brasil
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