PARECER CFM nº 7/14
INTERESSADO:
M.S.L.P.
ASSUNTO:
Casa de Parto
RELATOR:
Cons. José Fernando Vinagre
EMENTA: Os Centros de Parto Normal são
regidos pelas Portarias nos 888/99 e 985/99,
instituídas pelo Ministério da Saúde, mas deverão
obedecer a Resolução CFM nº 2.056/13.
DA CONSULTA
“Sou médica pediatra e trabalho como plantonista numa
maternidade municipal em Londrina-Pr. Há 20 anos. Nesta maternidade temos
obstetras, pediatras e anestesistas 24 horas. Agora a Prefeitura está
implantando o Projeto Cegonha do Ministério da Saúde e para que venha a
verba é necessário que seja construída, anexa ao prédio da maternidade (até
200m), uma casa de parto, sendo que esta será de responsabilidade de
enfermeiras. Só que nós como plantonistas da maternidade em anexo teremos
que dar suporte para essa casa de parto. Ou seja, quando complicar, vão
despejar essas pacientes para a maternidade!
Outro absurdo: retrocesso total, nessa casa de parto o bebê não
terá assistência do pediatra!
Gostaria de saber como fica a nossa situação: temos que
compartilhar com esse absurdo? A responsabilidade, caso ocorra algo com a
mãe ou recém-nascido, será de quem, juridicamente falando?
Como o CFM se posiciona com relação a esse Projeto Cegonha?
Necessitamos de um parecer dos conselheiros para lutarmos contra esse
absurdo!”
DO PARECER
O Centro de Parto Normal, também conhecido como “Casa de
Parto”, foi instituído pelo Ministério da Saúde por meio das Portarias nos 888/99
e 985/99.
O artigo 1° da Portaria 985/99, nos parágrafos 2° e 3°, dispõe:
“Parágrafo 2° - O Centro de Parto Normal deverá estar inserido no
sistema de saúde local, atuando de maneira complementar às unidades
de saúde existentes e organizado no sentido de promover a ampliação do
acesso, do vínculo e do atendimento, humanizando a atenção ao parto e
ao puerpério.
Parágrafo 3º - O Centro de Parto Normal poderá atuar física e
funcionalmente integrado a um estabelecimento assistencial de saúde unidade intra-hospitalar ou como estabelecimento autônomo - unidade
isolada, desde que disponha de recursos materiais e humanos
compatíveis para prestar assistência, conforme disposto nesta Portaria”.
No artigo 6°, inciso II, a mesma portaria estabelece:
“Art. 6° Definir os Recursos Humanos necessários ao funcionamento do
CPN:
II - o CPN poderá contar com equipe complementar, composta por 01
(um) médico pediatra ou neonatologista, e 01 (um) médico obstetra”.
Nesse sentido, é possível concluir que a Casa de Parto deve estar
localizada em local bem próximo à unidade de saúde de referência, a fim de
possibilitar o atendimento médico da paciente e de seu bebê, se necessário.
No tocante à equipe de saúde, cumpre ressaltar que não é
obrigatória a presença de obstetra e de pediatra na Casa de Parto. A
contratação desses profissionais é uma liberalidade da Administração, mas
estando a criação do Centro de Parto Normal, legitimado pelas portarias do
Ministério da Saúde. No entanto, a falta de estrutura adequada, de recursos
humanos e de uma unidade de referência próxima podem representar riscos
imensuráveis à população atendida nesses locais.
A Resolução CFM nº 2.056/13, aprovada em 12 de novembro de
2013, no seu artigo 27, incisos b e c, normatiza que:
“b. Os partos normais, em gestantes de risco habitual, realizados por
parteiras e enfermeiras obstétricas, em maternidades ou Centros de Parto
devem ser supervisionados por médicos nos termos do artigo 22
parágrafos 10 e 20 desta resolução.
c. Os Centros de Parto devem estar circunscritos à área da maternidade,
com
infraestrutura
para
abordar
as
emergências
obstétricas
imediatamente”.
A mesma resolução, no seu artigo 22, determina:
“Art. 22. É vedado ao médico delegar a outro profissional ato privativo de
médico, mesmo quando integrante de equipe multiprofissional.
Paragrafo 1° - Quando se tratar de programas de saúde pública
executados em sua área de abrangência, supervisionará o trabalho dos
profissionais envolvidos em sua aplicação, respondendo por seus
aspectos éticos e técnicos.
Paragrafo 2° - Quando a aplicação dos programas de saúde pública não
obedecerem ao que está previsto no parágrafo primeiro, exime-se o
médico de responder por resultados diversos, inclusive morte ou lesão
corporal, devendo comunicar o fato, por escrito, ao diretor técnico médico
ou diretor clínico, e ao Conselho Regional de Medicina, para as
providências legais cabíveis.
O Conselho Federal de Medicina luta pelo exercício digno e ético
da medicina. Por isso, permitir que médicos atuem em Casas de Parto sem
qualquer infraestrutura atenta contra o exercício profissional, contra a ética e,
principalmente, contra a vida dos pacientes.
Considerando que a Casa de Parto é uma realidade em nosso
país, legitimada por normas do Ministério da Saúde, é preciso lutar para que
essas instituições sejam construídas e funcionem em consonância com a
legislação, e que estejam anexadas a unidades de referência equipadas, a fim
de socorrer parturientes e bebês.
Portanto, em que pesem os benefícios do Projeto Cegonha às
grávidas e aos bebês, é importante cobrar dos gestores públicos um
atendimento de qualidade, seguro e eficaz, sob as normas vigentes. Toda esta
situação oferece dificuldade de entendimento para a categoria médica,
principalmente para os obstetras, pediatras e anestesistas, pois é sabido que
nas emergências são esses os especialistas que terão de atuar. Sendo assim,
apesar do cumprimento da norma do Ministério da Saúde, algumas medidas
devem ser adotadas para que a definição dos papéis de cada profissional seja
bem estabelecida e não haja prejuízo para as gestantes e seus recémnascidos, atendidos nessas Casas de Parto que fazem parte do Projeto
Cegonha.
Deve-se sempre exigir para o funcionamento das Casas de Parto: a
supervisão do médico obstetra, a proximidade (até 200 metros) de hospital com
toda a infraestrutura médica e técnica para o atendimento de intercorrências
com a paciente e/ou o recém-nascido, e ainda a imediata avaliação deste pelo
pediatra plantonista do hospital de suporte, mesmo nos casos em que não
ocorra qualquer intercorrência.
No tocante à responsabilidade médica, a eventualidade de qualquer
intercorrência é da alçada da enfermeira obstétrica que acompanha o trabalho
de parto nas Casas de Parto, e deverá ser denunciada ao Coren.
Não recai sob o pediatra qualquer responsabilidade ética acerca da
possível intercorrência com o recém-nascido, pois não está prevista a sua
presença no momento do parto ocorrido nas Casas de Parto.
Necessário se faz registrar que o diretor técnico, no momento em que
concorda com a criação da Casa de Parto acoplada ao hospital com as
diretrizes contidas nas Portarias nos 888/99 e 985/99, está assumindo
responsabilidades éticas com as intercorrências que porventura ocorram.
Este é o parecer, SMJ.
Brasília-DF, 30 de maio de 2014
JOSÉ FERNANDO MAIA VINAGRE
Conselheiro relator
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