23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental
VII-053 – VIGILÂNCIA DA QUALIDADE DA ÁGUA PARA CONSUMO
HUMANO – UTOPIA OU REALIDADE?
ESTUDO DE CASO: JUIZ DE FORA – MG
Júlio César Teixeira(1)
Engenheiro Civil e de Segurança no Trabalho. Doutor em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos
pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor Adjunto do Departamento de Hidráulica e Saneamento
da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Endereço(1): Rua Antônio Marinho Saraiva, 115 / 202 – Dom Bosco – Juiz de Fora – MG – CEP: 36.025-555 –
Brasil – Tel: (32) 3232-6342 – e-mail: [email protected]
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo apresentar um estudo comparado entre as exigências sobre a vigilância
da qualidade da água para consumo humano, constantes da Portaria no 518/2004 do Ministério da Saúde
(BRASIL, 2004), que estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigilância da
qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade, e as práticas efetivas de vigilância da
qualidade da água desenvolvidas pela Diretoria de Saúde, Saneamento e Desenvolvimento Ambiental na
cidade de Juiz de Fora – MG. A cidade possui uma Diretoria de Saúde, Saneamento e Desenvolvimento
Ambiental constituída pela Gerência Municipal de Saúde, pela Companhia de Saneamento Municipal –
CESAMA, pelo Departamento Municipal de Limpeza Urbana - DEMLURB e pela Agenda JF – órgão
ambiental municipal. Tal arranjo institucional é precário na medida que a Gerência Municipal de Saúde acha
desnecessário o desenvolvimento de um programa de vigilância da qualidade da água para consumo humano
já que existe uma Companhia de Saneamento Municipal – que já faz o controle desta água.
Em outra vertente, a Gerência Municipal de Saúde alimenta o SISAGUA com dados do controle da qualidade
da água sem auditá-los por meio de um plano próprio de amostragem da água e, ainda, sem realizar análises
do risco de associação entre agravos à saúde e situações de vulnerabilidade do sistema de abastecimento de
água. Assim, este estudo permite afirmar que a vigilância da qualidade da água para consumo humano ainda é
uma utopia para a grande maioria dos municípios brasileiros.
PALAVRAS-CHAVE: Qualidade da Água, Vigilância, Controle, Vigilância Ambiental em Saúde, Portaria
no 518/2004.
INTRODUÇÃO
Segundo Bastos, Heller & Bevilacqua (2004), “conceitualmente, torna-se importante distinguir as ações de
vigilância e de controle da qualidade da água para consumo humano. As ações de vigilância devem subsidiar a
tomada de decisões por parte da autoridade sanitária, assessorando-a quanto à necessidade e à propriedade de
adoção de medidas de controle, entendidas estas como medidas de intervenção, preventivas ou corretivas.
Devem-se ainda distinguir os termos vigilância e monitoramento. O termo monitoramento pode ser entendido
como a realização e análise de mensurações, visando detectar mudanças no ambiente e/ou no estado de saúde
da comunidade (Last, 1988); por exemplo, a análise contínua de indicadores da qualidade de produtos de
consumo humano e de riscos ambientais. A distinção entre vigilância e monitoramento residiria, por exemplo,
no fato de que a vigilância acompanha o comportamento de eventos específicos adversos à saúde da
comunidade, enquanto o monitoramento trabalha especificamente com indicadores, tais como de qualidade
ambiental; ou ainda, no entendimento de que a vigilância é uma aplicação do método epidemiológico,
enquanto no monitoramento este vínculo não é obrigatório. Assim, de acordo com Waldman (1998), o
monitoramento seria um instrumento da vigilância quando aplicado em um sistema de informações para a
agilização das medidas de controle.
Na abordagem assumida no Brasil, do ponto de vista de marco conceitual e institucional, a Vigilância da
Qualidade da Água para Consumo Humano é parte das ações de Vigilância Ambiental em Saúde, de acordo
com a seguinte definição:
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ƒ
Vigilância Ambiental em Saúde – é o conjunto de ações que proporciona o conhecimento e a
detecção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes do meio ambiente que
interferem na saúde humana, com a finalidade de identificar as medidas de prevenção e controle dos
fatores de risco ambientais relacionados às doenças ou outros agravos à saúde.
Na legislação brasileira que estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigilância
da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade - Portaria no 518/2004 do Ministério
da Saúde (BRASIL, 2004) - encontram-se as seguintes definições:
ƒ
Controle da Qualidade da Água para Consumo Humano – conjunto de atividades, exercidas de forma
contínua pelo(s) responsável(is) pela operação de sistema ou solução alternativa de abastecimento de
água, destinadas a verificar se a água fornecida à população é potável, assegurando a manutenção
desta condição.
ƒ
Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano – conjunto de ações adotadas
continuamente pela autoridade de saúde pública para verificar se a água consumida pela população
atende a esta Norma e para avaliar os riscos que os sistemas e as soluções alternativas de
abastecimento de água representam para a saúde humana.
Na mesma legislação fica estabelecido que:
- os responsáveis por todo sistema que forneça água coletivamente para consumo humano deverão
obrigatoriamente exercer o controle sistemático da qualidade da água;
- toda a água destinada ao consumo humano deve obedecer ao padrão de potabilidade e está sujeita à
vigilância da qualidade da água, exercida pelas autoridades de saúde pública.
Define-se, assim, que o controle de qualidade da água é uma atribuição obrigatória dos prestadores de serviços
de abastecimento coletivo de água, sejam públicos ou privados. Naturalmente existirão contingentes
populacionais não atendidos por sistemas coletivos e que, do ponto de vista de avaliação/gerenciamento de
riscos à saúde, merecem a devida atenção, neste caso por parte das autoridades de saúde pública.
As citações da legislação brasileira não pretendem encontrar aplicação universal, mas trazem conceitos
bastante disseminados na comunidade internacional e em plena consonância com o entendimento veiculado
pela Organização Mundial da Saúde”.
OBJETIVO
O presente trabalho teve como objetivo apresentar um estudo comparado entre as exigências sobre a vigilância
da qualidade da água para consumo humano, constantes da Portaria no 518/2004 do Ministério da Saúde
(BRASIL, 2004), e as práticas efetivas de vigilância da qualidade da água desenvolvidas pela Diretoria de
Saúde, Saneamento e Desenvolvimento Ambiental na cidade de Juiz de Fora – MG.
MATERIAIS E MÉTODOS
Em uma etapa inicial da elaboração deste trabalho, procedeu-se ao levantamento da legislação vigente sobre a
vigilância da qualidade da água para consumo humano no Brasil. A seguir, foi submetido um questionário,
versando sobre as práticas de vigilância da qualidade da água para consumo humano, à Diretoria de Saúde,
Saneamento e Desenvolvimento Ambiental, equivalente à Secretaria Municipal de Saúde da cidade de Juiz de
Fora – MG. Em uma terceira etapa, foi feito um estudo comparado entre as práticas efetivas de vigilância da
qualidade da água desenvolvidas no município de Juiz de Fora - MG e as exigências da Portaria do Ministério
da Saúde no 518/2004.
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
1. O exercício da vigilância da qualidade da água no âmbito do município de Juiz de Fora - MG
Os incisos I e XI do artigo 7o da Portaria MS no 518/2004 estabelecem que é dever das secretarias municipais
de saúde exercer a vigilância da qualidade da água em sua área de competência, em articulação com os
responsáveis pelo controle de qualidade da água, segundo um plano próprio de amostragem de vigilância.
No entanto, no município de Juiz de Fora - MG, a Diretoria de Saúde, Saneamento e Desenvolvimento
Ambiental não possui plano próprio de amostragem para o exercício da vigilância da qualidade da água. Tal
diretoria recebe, mensalmente, resultados de amostras da qualidade da água fornecidas pelo responsável pelo
controle da qualidade da água, a saber, a concessionária dos serviços de abastecimento de água e de
esgotamento sanitário - a Companhia de Saneamento Municipal - e adota tais resultados como sendo
resultantes da atividade de vigilância da qualidade da água.
2. Sistematização e interpretação dos dados gerados pela concessionária, em relação às características
da água dos mananciais, sob a perspectiva da vulnerabilidade do abastecimento de água quanto aos
riscos à saúde da população
O inciso II do Artigo 70, da Portaria MS no 518/2004, fixa que é obrigação das secretarias municipais de saúde
sistematizar e interpretar os dados gerados pelo responsável pela operação do sistema ou solução alternativa
de abastecimento de água, assim como, pelos órgãos ambientais e gestores de recursos hídricos, em relação às
características da água dos mananciais.
No município de Juiz de Fora, os resultados das análises das amostras de água, realizadas pela concessionária
dos serviços de saneamento, identificados como sendo oriundas dos diferentes mananciais de abastecimento
são entregues a uma profissional de curso superior, uma enfermeira, que apenas arquiva os resultados, sem
que nenhuma sistematização e, principalmente, interpretação dos dados seja feito.
3. Estudo de associação entre agravos à saúde e situações de vulnerabilidade do sistema de
abastecimento de água
O inciso IV do Artigo 70 da Portaria MS no 518/2004 e a terceira edição do Guidelines for drinking-water
quality (WHO, 2004) estabelecem que cabe às secretarias municipais de saúde efetuar, sistemática e
permanentemente, avaliação de risco à saúde humana de cada sistema de abastecimento ou solução alternativa.
Entretanto, a Diretoria de Saúde, Saneamento e Desenvolvimento Ambiental de Juiz de Fora - MG reconhece
que, até outubro de 2004, passados quase quatro anos da publicação da Portaria MS no 1.469/2001 (BRASIL,
2001), antecessora da Portaria MS no 518/2004, nunca foi realizado um estudo visando buscar evidências da
associação entre agravos à saúde verificados no município e situações de vulnerabilidade do sistema de
abastecimento de água.
4. Auditoria da qualidade da água produzida e distribuída pela empresa concessionária dos serviços de
abastecimento de água
O Artigo 70 em seu inciso V, da Portaria MS no 518/2004, estabelece que é responsabilidade do órgão
municipal de saúde auditar o controle da água produzida e distribuída, assim como das práticas operacionais
adotadas no serviço de abastecimento de água.
Nunca houve, contudo, no município de Juiz de Fora, segundo a Diretoria de Saúde, Saneamento e
Desenvolvimento Ambiental, uma auditoria no controle da qualidade da água produzida e distribuída no
município, bem como sobre as práticas operacionais adotadas pela concessionária dos serviços de saneamento.
5. Acesso, por parte da população, a informações a respeito da qualidade da água e riscos a ela
associados
A referida Portaria do Ministério da Saúde, no inciso VI do artigo 70, garante à população informações sobre a
qualidade da água e riscos à saúde associados.
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No entanto, os dados oriundos do controle da qualidade da água, tomados como dados produzidos pelo
serviço de vigilância de qualidade da água para consumo humano, não podem ser consultados pelo público,
sendo as informações consideradas sigilosas, de acesso restrito ao gestor do sistema de saúde do município.
6. Origem dos dados que alimentam o SISAGUA
No município de Juiz de Fora - MG, os dados que alimentam o SISAGUA – Sistema de Informação da
Qualidade da Água para Consumo Humano – são fornecidos pela concessionária dos serviços de água e
esgotos, a saber, a Companhia de Saneamento Municipal, não havendo por parte da Diretoria de Saúde,
Saneamento e Desenvolvimento Ambiental um plano próprio de amostragem de vigilância da qualidade da
água produzida e distribuída no município de Juiz de Fora.
CONCLUSÃO
Embora Juiz de Fora seja uma cidade de 493.121 habitantes (IBGE, 2005), localizada na Zona da Mata
mineira, entre Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo, é indiscutível que inexiste no município um
programa de vigilância da qualidade da água para consumo humano.
A cidade possui uma Diretoria de Saúde, Saneamento e Desenvolvimento Ambiental constituída pela
Gerência Municipal de Saúde, pela Companhia de Saneamento Municipal – CESAMA, pelo Departamento
Municipal de Limpeza Urbana - DEMLURB e pela Agenda JF – órgão ambiental municipal. Tal arranjo
institucional é precário na medida que a Gerência Municipal de Saúde acha desnecessário o desenvolvimento
de um programa de vigilância da qualidade da água para consumo humano já que existe uma Companhia de
Saneamento Municipal – que já faz o controle desta água.
Em outra vertente, a Gerência Municipal de Saúde alimenta o SISAGUA com dados do controle da qualidade
da água sem auditá-los por meio de um plano próprio de amostragem da água e, ainda, sem realizar análises
do risco de associação entre agravos à saúde e situações de vulnerabilidade do sistema de abastecimento de
água. Assim, este estudo permite afirmar que a vigilância da qualidade da água para consumo humano ainda é
uma utopia para a grande maioria dos municípios brasileiros.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BASTOS, R.K.X.; HELLER, L.; BEVILACQUA, P.D. Tendências no controle e vigilância da
qualidade da água para consumo humano. Anais do Seminário Novos Desafios e Tendências no
Tratamento de Água de Abastecimento. Belo Horizonte: UFMG, 2004.
BRASIL. Portaria Ministério da Saúde no 518 de 25 mar. 2004. Estabelece os procedimentos e
responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu
padrão de potabilidade, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 26 mar. 2004.
BRASIL. Portaria Ministério da Saúde no 1.469 de 29 dez. 2000. Estabelece os procedimentos e
responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu
padrão de potabilidade, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 22 fev. 2001.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IBGE Cidades@.
Disponível em: <www.ibge.gov.br>
Acesso: 11 mar. 2005.
LAST, J.M. A dictionary of epidemiology. New York: Oxford University Press, 1988.
WALDMAN, E.A. Usos da vigilância e da monitorização em saúde pública. Informe Epidemiológico do
SUS, ano VII, n.3, p.7-20, 1998.
WHO - WORLD HEALTH ORGANIZATION. Guidelines for drinking water quality. 3rd ed. Geneva:
WHO, 2004.
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