42º CONCURSO DE ADMISSÃO AO CFS
PROVA DE AVALIAÇÃO DE CONHECIMENTOS DE LÍNGUA PORTUGUESA
A prova é constituída por quatro grupos (I, II, III, IV), cada um com cinco itens.
Selecione, em cada um dos itens, a única opção que permite obter uma afirmação adequada
ao sentido do texto.
GRUPO I
[…] Não sinto que pertença a uma geração, não mais do que a um clube de futebol.
Mas tenho um património em comum com os meus inimigos da minha geração. Olhamos
uns para os outros e sabemos que temos em comum o património da contingência. O
termos vivido em circunstâncias que outros não viveram. Já nenhum de nós acha que é
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super-herói, já não somos aquele jovem pugilista que só tem dez vitórias e zero derrotas.
Já fomos ao chão. Somos mais aceitadores uns dos outros, não levamos as coisas tão a
sério.
Aliás, por falar em pertença a uma geração, conto uma história: há uns tempos fui ao
casamento de um ex-aluno e às duas da manhã foi engraçado ver que aquela gente, uns 15
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anos mais nova do que eu, de repente começou a dançar ao som da música do Dartacão.
Há a geração Dartacão. A minha é mais a geração Daktari, uma série americana do fim dos
anos 60.
A minha infância foi passada nos anos 70, no bairro da Pena, o mesmo onde nasceu a
Amália. Lembro-me de ver as peixeiras descalças a subir a calçada. Lembro-me de só uma
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pessoa ter carro lá no bairro. Brincava na rua, os meus filhos não brincam na rua. Os meus
filhos vão lembrar-se daqui a uns anos da vida de condomínio, eu lembro-me da vida de
rua. Ter vivido nesse bairro foi mais importante do que assistir ao 25 de Abril. Claro que o
25 de Abril foi importante, os anos 80 foram importantes, hoje choro quando oiço as
Doce. É isso: chamaria, antes, à minha geração a “geração bem bom”. Não me parece que
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tenhamos tido azar. Todas as gerações são abençoadas, se tiverem noção disso. Agora
temos a geração dos recibos verdes. Mas na casa deles ainda não chove.
Rui Zink, «Ir mais a funerais do que a casamentos mata-nos», in Público, 8 de Agosto de 2010 (excerto)
1. O texto apresenta características de
a) uma crónica.
b) uma biografia.
c) um artigo de apreciação crítica.
d) uma notícia.
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2. Uma das características da geração do autor é
a) o saudosismo.
b) a tolerância.
c) a deceção.
d) a insensibilidade.
3. A palavra «contingência» (l. 3) é usada com o sentido de
a) originalidade.
b) satisfação.
c) serenidade.
d) acaso.
4. A frase «Já fomos ao chão» significa
a) estamos mais calmos.
b) fomos ao tapete.
c) fomos derrotados em diversas circunstâncias da vida.
d) estamos abatidos.
5. Relativamente ao conteúdo do parágrafo anterior, a frase iniciada por «aliás» (l. 8)
apresenta
a) um outro ponto de vista.
b) uma confirmação.
c) uma ideia equivalente.
d) uma consequência.
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GRUPO II
Diálogo
10 Humano, só de humanos meus iguais
Entendo a fala,
Pergunto...
Os gestos
Mas quem me poderia responder?!
E o destino.
Tu não, rio sem asas,
E esses, como eu,
Que permaneces
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15 Olham a terra e o céu,
A passar...
Os rios e os planetas,
Nem tu, planeta alado,
E perguntam também...
Que pareces
Parado
Perguntam, mas a quem?
A caminhar...
Miguel Torga, Antologia Poética, Coimbra: Edição do autor,
1981
1. O sujeito poético reconhece
a) que apenas os homens o podem esclarecer.
b) a impossibilidade de obter respostas às suas interrogações.
c) a dificuldade em comunicar.
d) a indiferença face às suas dúvidas.
2. Ao afirmar “Mas quem me poderia responder?!” (v. 2), o sujeito poético revela
a) inquietação e curiosidade.
b) falta de coragem face aos problemas.
c) desinteresse e indecisão.
d) prudência na procura de soluções.
3. O poema insere-se no modo lírico porque
a) existe diálogo.
b) predomina o discurso de primeira pessoa.
c) está centrado na expressão de sentimentos.
d) é um solilóquio.
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4. De acordo com o contexto, um sinónimo de «alado» (v. 6) é
a) altivo.
b) estático.
c) silencioso.
d) com asas.
5. O modo verbal predominante é
a) o Indicativo.
b) o Imperativo
c) o Conjuntivo
d) o Condicional.
GRUPO III
Debaixo das estrelas, sentado no lancil do largo, Campanelo conta a história da Torre
da Má Hora e os meninos estão de roda, escutando. E enquanto a sua fala vagarosa arrasta
todos para longe, tira do bolso da jaqueta o livro de mortalhas e enrola um cigarro.
Os olhos das crianças abrem um silêncio tão grande que só se ouve a voz do homem
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e o dobrar do papel nos seus dedos grossos.
Voz, cigarro, vai tudo vagaroso, porque a história ainda está no princípio, assim
como a noite. Agora mesmo espalmou as mãos sobre os joelhos dobrados e deixou os
meninos mexerem-se, chegarem-se mais para perto, nervosos, adivinhando que a história
vai tomar-lhes todo o interesse.
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E aos olhos e ouvidos abertos, Campanelo demora as sílabas:
– …Ora a fada disse: “Só lá há de chegar quem para trás não olhar!...”
Ia, pois, o menino andando, andando, quando avistou, a uma grande lonjura, a Torre
da Má Hora!...muito alta e negra!...
Neste momento, a Lua, rompendo por detrás das muralhas do castelo, ilumina o
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largo. Os rapazinhos olham a Lua, a sombra das ruas e a cal branca das casas espantadas,
na noite quieta.
Só o rapazinho do bibe preto fica imóvel – esguia e negra, nos seus olhos, desenhase a Torre da Má Hora…
– E se ele olhasse para trás com medo dos gemidos e dos vultos que andavam na
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floresta? … Campanelo, se ele olhasse para trás?
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O homem, tirando o cigarro da boca, alonga a voz:
– Ficava transformado numa estátua de pedra fria como o Príncipe Sem Coração.
Olhar para trás é ter medo!
Como o homem se calasse tão bruscamente, o rapazinho faz estremecer os outros
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com a sua grande ansiedade:
– Continua lá, Campanelo!
E vem-lhe à ideia que a sua vida é tal qual como a do menino que não tinha pai nem
mãe e ia sozinho pelo mundo.
Como os companheiros do largo, cresceu ao deus-dará. Decorou tudo, léguas em
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redor da vila, correndo estradas e caminhos velhos.
Como o menino que Campanelo conta, ele também se sentia às vezes, extenuado de
andar atalhos e matos. Então, à sombra de uma árvore, deitava a nuca sobre as mãos
cruzadas. E todo o silêncio dos campos caía sobre ele, tão largo que daí a pouco se julgava
adormecido. Adormecido e de olhos abertos para as coisas que o cercavam. No horizonte
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ensombrado, parecia-lhe haver qualquer coisa de misterioso como na floresta que
Campanelo compõe cheia de gemidos e vultos. E esse mistério prendia-lhe os olhos.
Noutros dias era diferente. Parecia que alguém lhe tinha ordenado: “Vai e não
olhes para trás!” Corria, corria e não se cansava. E descobria coisas tão novas e
extraordinárias que nem tinha tempo de pensar, e quase sempre a noite lhe caía em cima,
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de surpresa, com a vila a léguas de distância.
Logo, com uma pedra pronta ao que desse e viesse, quando entrava no largo, sentiase homem chegado de aventuras! Só à luz dos candeeiros lhe vinha à ideia as suas
descobertas. E, àqueles que o olhavam admirados, dizia:
– Descobri um sítio!
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Assim ia crescendo ao deus-dará, como o menino da história que não tinha pai nem
tinha mãe…Que a partida dos pais confundia-se na sua saudade com a morte do irmão. Ele
era o que a sorte e a sua vontade queriam. Mas sempre tão para lá donde as suas pequenas
forças davam que, ansiando de correr fadigas, só descansava jogando os olhos de cima das
muralhas do castelo, pelo raso das terras, para o lado por onde os pais tinham partido…
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Só a fada não chegava com a sua vara de condão a ensinar-lhe o caminho. E as velas
dos moinhos das Cumeadas giravam na sua frente lentas como o desânimo triste de
cabeças que tombam por detrás das grades de uma cadeia…
O rapazinho sentia um grito doer-lhe na garganta. Saltava da muralha, corria pelo
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cerro abaixo. Seu desejo era correr para longe à espera da noite e do sono. Mas parava no
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largo, já exausto. E queria brincar aos jogos que os outros jogavam, aturdir-se de saltos e
lutas violentas.
Manuel da Fonseca, “A Torre da Má Hora” (excerto) in Aldeia Nova, Lisboa, Leya, 2009 (texto com supressões)
1. Com a expressão “esguia e negra, nos seus olhos, desenhava-se a Torre da Má
Hora” (ll. 17-18) entende-se que
a) os olhos do menino refletiam ansiedade ao ouvir aquela história.
b) a torre do castelo refletia-se nos olhos do menino.
c) o menino ia desenhando enquanto ouvia a história
d) o menino imaginava a torre descrita.
2. O menino do bibe preto é uma criança
a) sonhadora e tranquila.
b) divertida e sonhadora.
c) sonhadora e amargurada.
d) conciliadora e tranquila.
3. A expressão “com uma pedra pronta ao que desse e viesse” mostra que o rapazinho
a) gostava de atirar pedras enquanto caminhava.
b) tinha consciência de que poderia correr algum perigo.
c) queria mostrar que era o mais forte.
d) queria sentir-se homem.
4. A palavra “que” no excerto “E vem-lhe à ideia que a sua vida é tal qual como a do
menino que não tinha pai nem mãe” é, respetivamente, (ll. 27-28)
a) uma conjunção subordinativa completiva e um pronome relativo.
b) um pronome relativo e uma conjunção subordinativa causal.
c) um pronome relativo e uma conjunção subordinativa completiva.
d) uma conjunção subordinativa completiva e uma conjunção subordinativa causal.
5. O adjetivo “imóvel” (l. 17) desempenha a função sintática de
a) complemento direto.
b) complemento indireto
c) modificador do grupo verbal
d) predicativo do sujeito.
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GRUPO IV
Promontório de Sagres. Cenário esquemático e sem realismo mas com cores puras e vivas como
um desenho de criança.
Ao fundo, sozinho, voltado para o mar, vestido de escuro (única cor sombria no meio das cores
claras), de costas para a cena, para os outros personagens e para o público, o Infante.
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Está sentado numa pedra, ligeiramente curvado para a frente, com o queixo apoiado na mão
direita e o cotovelo apoiado no joelho direito; o pé direito avança à frente do outro pé. […]
Entra uma mulher com uma criança (que é um rapazinho de sete anos).
Criança (apontando com o dedo o Infante) - Mãe, O Infante, o que é que ele está ali a fazer,
sozinho, a olhar para o mar?
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Mulher- Está a ver.
Criança- Mas não se vê nada. É só mar.
Mulher - Ele vê melhor do que nós.
Criança- Ah!? Eu pensava que ele não via. No outro dia encontrei-o no caminho e disse: “Bom
dia, meu Senhor”. Mas ele não me viu.
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Mulher- Ele vê bem o que está longe.
(Enquanto
acabam
de
falar
entra
um
velho
com
barbas
compridas
e
brancas.)
Velho- Era melhor que visse o que está perto. Já todos murmuram e muitos já troçam. Há doze
anos, há doze anos que o Infante D. Henrique manda os seus barcos em busca deste cabo. E já a
gente do povo e os próprios nobres falam deste Infante com muito escárnio porque de todas as suas
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navegações, trabalhos, estudos e despesas nunca lhe virá senão desgraça sem nenhum proveito.
Pois que há no mar? Distância, solidão, nevoeiro, abismos, temporais, sede, fome, naufrágios,
morte. Em breve o Reino estará cheio de crianças órfãs e de mulheres viúvas. Do mar não vem
nem glória nem proveito.
(Entra um rapaz de vinte anos que ouve a última frase.)
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Rapaz- Tens a certeza, Velho?
Velho- Todos os anos ele manda para Sul as suas Barcas. E diz aos capitães: “Ide mais longe.”.
Mas já ninguém pode ir mais longe.
Sophia de Mello Breyner Andresen, O Bojador
1. Ao longo da conversa, o Velho
a) teme as dívidas do Reino.
b) considera que o Infante é fútil e ambicioso.
c) considera que as viagens envolvem demasiados riscos.
d) almeja a prossecução das viagens marítimas.
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2. A expressão «vê melhor do que nós» (l. 12) sugere que o Infante
a) vê bem ao longe.
b) deu uma grande visibilidade ao país.
c) é um homem culto.
d) é um visionário.
3. Pelas palavras da Mulher, depreende-se que
a) admira o Infante.
b) é compassiva.
c) o infante lhe é indiferente.
d) lisonjeia o Infante.
4. No excerto «No outro dia encontrei-o no caminho…mas ele não me ouviu» (ll. 1314), os pronomes pessoais sublinhados têm, respetivamente, a função de
a) complemento direto e complemento indireto.
b) sujeito e complemento direto.
c) complemento direto e sujeito.
d) complemento indireto e sujeito.
5. Todas as referências ao espaço e à caracterização das personagens são fornecidas
através
a) do texto principal e dos apartes.
b) da didascália e dos diálogos.
c) do texto secundário e dos apartes.
d) dos apartes e dos diálogos.
FIM
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