Uma história de 30 anos lidando com a tecnologia e transpondo caminhos com as Empresas
Num ano em que celebramos os nossos 30 anos de existência,
com diversas iniciat ivas e eventos um pouco por todo o país, não
poderíamos omitir uma das nossas vertentes fundamentais, parte
da nossa identidade desde a origem: a d imensão tecnológica,
também ela intrinsecamente associada à nossa história. As razões
são óbvias: actuamos junto de um sector de base eminentemente
tecnológica, junto do qual assumiremos sempre o compromisso de
o servir com as competências do 'saber-fazer'.
É tal a diversidade de tecnologias com que l idamos, todas elas
merecendo um lugar de destaque no nosso património histórico e
na actividade format iva e tão ricos os testemunhos que poderíamos
trazer sobre cada uma delas, que me confronto com um óbvio
compromisso de síntese, obrigando-me a eleger um domínio. Para
isso há no entanto um contexto tecnológico que nos é grato, por
reconhecidamente ter desempenhado e vir desem-penhando um
papel de enorme relevo ao nível das competências com que fomos
provindo as empresas do sector: O CNC - Comando Numérico por
Computador.
A sua história começa com a origem do CENFIM. Há 30 anos,
quando esta tecnologia tinha uma onerosidade d issuasiva e a sua
util ização pelo sector da metalomecânica estava longe dos níveis
que hoje recolhe, sendo ainda para muitos apenas uma
terminologia desconhecida, foi aí mesmo, na origem, que se
iniciaram as primeiras acções de formação neste domínio. Desde
então e até hoje o CENFIM formou dezenas de milhares de
profissionais com estas competências na mesma medida em que
estes equipamentos se foram consol idando nas empresas
industriais.
Hoje, a sua general ização nas empresas e também no CENFIM,
deve-se em parte à ultrapassagem de complexos patamares que a
tornaram mais acessível e eficaz, alguns dos quais vale a pena
recordar. No final dos anos 80, numa altura em que muitos destes
equipamentos ainda util izavam fitas perfuradas para ler as
instruções de maquinação celebrámos com jubilo a primeira vez que
conseguimos maquinar a primeira peça cujo programa havia sido
elaborado através de um sistema CAD/CAM, hoje uma tecnologia
praticamente incontornável na elaboração dos programas CNC.
Depois, com a proliferação desses sistemas, os programas CNC
começaram a ter uma dimensão incomportável para a memória dos
equipamentos. Foi quando nos envolvemos com o DNC - Direct
Numerical Control, uma solução ainda estranha nas empresas
util izadoras destes equipamentos e que passava por enviar blocos
de instruções à medida que as mesmas iam sendo 'consumidas' na
maquinação, algo que hoje parece uma trivial idade mas que na
altura nos obrigou a protocolos de confidencial idade com os
produtores destes equipamentos. Em 1994 investimos na
maquinação a 5 eixos com a aquisição de um equipamento para o
nosso Núcleo da Marinha Grande, assumindo os riscos e
dif iculdades destes processos de maquinação na perspectiva de,
também aqui, através da sua experimentação, podermos transpor a
nossa experiência para a Indústria. Hoje a maquinação a 5 eixos,
sendo ainda uma matéria complexa, deixou de ser controversa e
estes equipamentos incorporam já a oferta comum do mercado
fornecedor. Recentemente apetrechámos mais um dos nossos
Núcleos de Formação, em Lisboa, com outro equipamento de 5
eixos e perspectivamos poder alargar este invest imento a outros
locais do CENFIM para dar resposta à procura de formação que se
faz sentir nestes equipamentos, já que é uma evidência da cada vez
maior a adopção por parte das Empresas. Regressando de novo a
meio da década dos anos 90, mergulhávamos então no maior
projecto tecnológico em que já nos investimos, com o
desenvolvimento de um FMS (Sistema de fabrico Flexível), onde
integrámos equipamentos CNC Standard, com soluções externas
de paletização e de transporte automát ico, de inspecção, de
supervisão e associando os restantes constituintes a montante, no
domínio da gestão das ferramentas e do projecto CAD/CAM, numa
altura em que as redes informáticas, sobretudo no contexto fabril,
ainda traziam muitas amarguras e integrar um controlador CNC
com sistemas externos de controlo e monitorização era algo que só
seria assegurado através de soluções chave-na-mão assseguradas
pelos fornecedores, e a preços exorbitantes. Esse projecto procurou
acima de tudo fazer-nos enfrentar estes equipamentos que na
altura eram autênticas “caixas fechadas”, o que trazia grandes
dif iculdades às empresas que quisessem integrá-los ao nível das
operações fabris, de materiais e do seu controlo, tendo daí retirado
grandes ensinamentos que partil hámos mais tarde em iniciativas
periódicas de demonstração e divulgação junto da Indústria. Mais
tarde arriscámos em equipamentos equipados a soluções de alta
velocidade, em equipamentos com controladores PCNC
(tecnologia baseada em arquitecturas de PC's comuns o que mais
tarde se veio a mostrar ainda demasiado instável), enfim
investigando e desenvolvendo todo um conjunto de tendências,
algumas singrando, outras extinguindo-se mais tarde, mas todas
possibil itando-nos mais uma vez levar a imagem do que neste
domínio ia ocorrendo e dos seus riscos, dificuldades, vantagens e
impacto que as Empresas poderiam assim antecipar.
Talvez seja agora mais compreensível porque se justifica eleger
aqui o CNC como um caso paradigmático da nossa convivência com
a tecnologia ao longo da nossa história. Todos estes processos de
maior ou menor complexidade técnica que nos obrigámos a
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atravessar, criaram em primeiro lugar uma competência com base
na experimentação, impregnada nos nossos técnicos e formadores,
que se mostrou fundamental para o processo de implementação,
consol idação e crescimento destas tecnologias junto das empresas
que tivemos oportunidade de servir. E se hoje nos congratulamos de
encontrar nessas empresas que visitamos por todo o país, os
milhares de prof issionais que foram por nós preparados no domínio
do CNC, não é menos verdade, e assinalamo-lo com algum regozijo
e imodéstia também, que essa capacidade foi induzida nas
empresas, em épocas críticas, não apenas enquanto capacidades
operacionais, mas também ao nível da capacidade de decisão sobre
a aquisição e implementação destas tecnologias e potenciando a
incorporação contínua dos seus desenvolvimentos, trazendo um
olhar mais crít ico por parte das Empresas, dotando-as de um maior
sentido de oportunidade, esse que tão importante é no mundo dos
negócios.
Lidar com a tecnologia significa em primeiro lugar olhar para o
homem e nisso começar por trazer ao profissional a competência
para operar com as mesmas. Mas é também envolver a empresa,
aos seus mais diversos níveis, num processo de aprendizagem (em
particular quando estamos perante novas tecnologias e/ou
tecnologias emergentes) de forma a poder rentabil izar, com
sentido crít ico, todos estes factores. O nosso orgulho, quando
testemunhamos esta nossa convivência com a tecnologia, não se
resume por isso a qual ificar operadores em CNC ou em qualquer
outro equipamento, mas em constatar que esses, por via dos novos
conhecimentos que levaram para as Empresas, são parte essencial
do sucesso das mesmas sempre que enfrentam os complexos
processos de modernização tecnológica.
Outras áreas tecnológicas poderiam ser trazidas para evidenciar a
mesma abordagem, a orientação para explorar as tecnologias,
reclamando primeiro essa capacidade interna, para a seguir a
disseminar, seja em processos formativos formais, seja por via de
diversas iniciat ivas conjuntas ou individuais com que mantemos
uma comunicação estreita com as empresas. A mesma matriz e
determinação continua a prevalecer na nossa actuação e
convivência com as tecnologias que julgamos mais determinantes
para o sector, procurando estar atentos aos novos horizontes
tecnológicos que se abrem. Para progredirmos até aos dias de hoje
poderemos trazer agora o fenómeno da fabricação adit iva, ou o que
mais comumente é referido como a Impressão 3D. Não nos
alargaremos aqui sobre esta tecnologia que hoje é reconhecida em
todos os fóruns mundiais como uma das maiores tendências dos
dias de hoje e do futuro próximo, até porque temos vindo aqui a
abordar o tema e outras oportunidades existirão para notícias mais
detalhadas sobre este fenómeno. Mas este é mais um caso, um
domínio, uma tecnologia à qual o CENFIM não deixará de se
entregar com os propósitos de sempre.
Não estamos perante uma tecnologia de grande complexidade,
ao nível da sua operacional idade. Aquilo que nos convoca para
sensibil izar as Empresas sobre estes novos processos tem algo mais
a ver com o seu próprio modelo de negócio e as oportunidades que
esta pode trazer. Estamos, incontornavelmente, perante um
fenómeno onde é a própria tecnologia que impõe uma mudança do
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paradigma industrial - e que por isso já vem sendo referida como 3ª
revolução industrial, o que não se trata de uma mera invenção
científica mas sim de uma tendência que se perspect iva ter um dos
maiores impactos industriais de sempre - já que traz à sociedade
pela primeira vez a capacidade produtiva que até então estava
confinada às estruturas industriais, mas também porque a sua área
de impacto não pára de aumentar, com aplicações que hoje se
alastram à industria al imentar, à construção civil, à área da
biomedecina, apenas para citar alguns exemplos.
Esta tecnologia adit iva que implodiu há algumas décadas atrás,
através de soluções de prototipagem rápida, conforma hoje
soluções industriais que se orientam já para a produção final (rapid
manufacturing), tecnologias essas que muitas empresas do sector
vêm adoptando em Portugal de forma entusiasmante como temos
tido oportunidade de conf irmar (veja-se notícia neste número
dando nota do evento real izado no nosso Núcleo de Trofa sobre
este tema). Mas a Impressão3D acaba por introduzir uma nova
oferta (que merece ser observada pela Industria mais tradicional) e
essa sim, poderá transformar significat ivamente o conceito da
Industria, enquanto infra-estruturas formais. Estima-se que nos
próximos tempos existam cerca de 3,5 milhões de util izadores de
impressoras 3D - tecnologias tão acessíveis que hoje são já
oferecidas como presentes de Natal - e que partil ham através da
Internet um espól io incomensurável de modelos CAD. A criatividade, a oportunidade de desenvolver novos produtos, democratizou-se e está art iculada em rede, à escala mundial, em cada
acesso da internet. Em muitos lares existirá uma Impressora3D,
como hoje existem as impressoras tradicionais, trazendo a
possibil idade a um cidadão, sem infra-estruturas fabris, produzir os
seus próprios protótipos ou mesmo produto f inais.
Como em todos os fenómenos da inovação poderemos olhá-los
de diferentes formas: como sendo irrelevantes (o que nos mantém
na nossa área de conforto), como uma ameaça (fazendo com que
provavelmente os combatamos com abordagens obsolescentes) ou
como uma oportunidade (adequando-nos em novas abordagens ao
mercado e estabelecendo novos modelos de negócio e parcerias). A
postura perante o fenómeno da inovação depende apenas do nosso
esclarecimento face ao mesmo. Muito poderíamos agora elaborar
sobre a Impressão 3D no entanto, tome-se como certo, ela é, hoje,
já, incontornável. Se dúvidas houvessem registe-se que são os
próprios fabricantes de máquinas-ferramenta CNC que começam a
incorporar nesses equipamentos esta tecnologia, o que chamam de
tecnologias híbridas (Additive and Subtract ive Manufacturing), isto
é, integrando num mesmo equipamento processos por arranque de
apara com processos de fabricação adit iva.
Aqui está mais uma vez a razão fundamental para o nosso
envolvimento com a tecnologia: levar às Empresas as competências
associadas a esta nova área de fabricação, mas também induzir a
uma visão mais esclarecida sobre este fenómeno que não deixará
indiferentes até mesmo os sectores mais tradicionais. Hoje já temos
todos os Núcleos apetrechados com pequenos equipamentos de
Impressão 3D e adquirimos também um equipamento industrial
que está alojado nas nossas instalações do Porto. Estamos
presentemente a trabalhar nos nossos currículos de formação para
integrar estas matérias na nossa resposta formativa. Há um mês foi
lançada a “Plataforma Portugal 3D” (ver notícia infra) que visa
agregar a Academia, os Promotores da Tecnologia, as Empresas, os
Especial istas e todos os indivíduos que cooperat ivamente queiram
intervir neste processo que tem uma concorrência à escala global e
onde iniciativas agregadoras deste género são part icularmente
visíveis nos EUA mas que se alastram um pouco pelos mais diversos
países. O CENFIM é co-fundador desta iniciativa/plataforma que
está agora a dar os primeiros passos e que obteve desde logo o Alto
Patrocínio da Presidência da República. A quem se interrogar das
razões do envolvimento do CENFIM neste tipo de iniciativa e do
entusiasmo com que vimos acompanhando e propagando este
fenómeno, permita-me o atrevimento de sugerir que retorne ao
início deste testemunho, quando se contava a história do CNC no
CENFIM, então uma tecnologia ainda quase púbere e para muitas
empresas do sector até desconhecida ou desvalorizada.
Um texto que já vai longo. Mas como falar da tecnologia com
meias palavras? Como falar da tecnologia no CENFIM, não as
máquinas mas a visão que nos leva até junto delas, sem trazer um
pouco da nossa história? Pois continuaremos a acreditar que a
nossa missão só se cumpre plenamente enquanto os nossos
formandos - futuros profissionais das empresas do sector ou
aqueles que junto de nós retornam para se aperfeiçoarem conseguirem levar com eles também um pouco de tecnologia, não
apenas a capacidade de operar com elas, mas a capacidade crítica
para melhor a compreender e com isso prestar um melhor contributo às Empresas do sector, essas sim, a razão da tecnologia no
CENFIM.
José Novais da Fonseca - Director do Departamento de Gestão de
Projectos do CENFIM
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