Avaliação das condições da ocupação em encostas de uma área de baixa renda na Cidade de Salvador Luis Edmundo Prado de Campos Escola Politécnica da UFBA Débora Miranda Barretto Dilma Maria Santos Assunção Leonardo Santana de Oliveira Dias Simone Maia de Oliveira Alunos do MEAU – Escola Politécnica da UFBA Abstract This paper presents the work of the end of disciplines of the Pos Graduate of Urban Environment Engeniring of the Polytechnical School of the Federal University of Bahia, which understands of the evaluation of the conditions of use of a hillside in a community of low income implanted in the area identified “ Vila Nova de Pituaçu”, Salvador - Bahia. It had as objective to evaluate a real problem and to consider stabilization solutions to the area, contributing of this form for a bigger approach with the society, knowing more the condition where the population lives in the hillside area, as well as supplying to this population and agency public a vision of recovery of the degraded area environment, beyond the experience of field lived for the students. Resumo Este artigo apresenta o trabalho do final da disciplina do Mestrado de Engenharia Ambiental Urbana da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia, o qual compreende avaliar as condições da ocupação de uma encosta numa comunidade de baixa renda implantada na área identificada por Vila Nova de Pituaçu, Salvador – Bahia. Teve como objetivo avaliar um problema real e propor soluções de estabilização para a área, contribuindo desta forma para uma maior aproximação com a sociedade, conhecendo melhor as condições em que a população vive na área de encosta, bem como fornecer a esta população e os órgãos públicos uma visão para recuperação ambiental da área degradada, além da experiência de campo vivida pelos alunos. 1 INTRODUÇÃO Na finalização da disciplina Estabilização de Encostas e Taludes do Mestrado de Engenharia Ambiental Urbana da UFBA, coube aos alunos, o estudo de um caso real visando a recuperação de área de encosta, da Cidade do Salvador, ocupada por uma população de baixa renda. A área escolhida foi a da Vila Nova de Pituaçu, por está localizada numa zona de expansão da urbana cidade, ter registros de 45 solicitações de moradores em situação de risco iminente e/ou decorrente de deslizamentos de terra na Defesa Civil entre os anos de 1995 e 2002, e será brevemente contemplada com obras de recuperação pelo governo estadual. Figura 1 – Localização da área em estudo 2 INFORMAÇÕES DA ÁREA A localização da área em estudo está representada na Figura 1, ocupando cerca de 8,6 ha, sendo delimitada palas avenidas Luis Viana Filho, São Rafael e Gal Costa. A área em estudo, na sua parte inferior apresenta solo com elevado teor de umidade devido a presença de minadouros provavelmente provenientes do fluxo de água de uma lagoa localizada a leste da área. Além disso, é cortado por um rio que provoca inundações na área no período das chuvas. Nas partes superior e intermediária da área, o solo apresenta-se não saturado. Utilizando o levantamento planialtimétrico fornecido pela Conder, foi possível modelar a área, cuja visão da mesma é apresentada na Figura 2. Figura 2 – Modelagem da topografia da área Com a modelagem do relevo e acoplando a fotografia área da área pode-se ter uma visão tridimensional do local (Figura 3), sendo observado o alto grau de ocupação da mesma. Figura 3 – Visão 3D com as habitações Com base no mapa geológico de Salvador, a área em estudo é constituída por solo residual proveniente da decomposição do embasamento cristalino, no qual predomina granulito. Sondagens realizadas na área indicam que o subsolo é constituído por solos silto-arenosos e silto-argilosos com compacidade/consistência crescente com a profundidade. A vegetação nativa foi destruída para implantação das habitações, ainda sendo observado no local, árvores de grande porte, bem como capim e bananeiras. 3 PERFIL SÓCIO-ECONÔMICO A Codesal (1998) realizou pesquisa na área entrevistando 158 famílias cujos resultados são apresentados a seguir: A maior parte da população é do sexo masculino e está na faixa etária de 26 a 33 anos. Desses, 59,5% constituíram família, embora nem todos sejam oficialmente casados. Constatou-se também que no grupo dos solteiros muitos deles têm filhos, não morando portanto sozinhos; A comunidade Vila Nova de Pituaçú apresenta residências com uma média de 1 a 2 filhos. A área foge aos padrões das comunidades de baixa renda que geralmente se caracterizam por famílias numerosas e com grande número de residências multifamiliares. Do universo da população cadastrada, a função de chefe de família é assumida, na sua grande maioria, por homens (81,65%); Quanto à escolaridade do chefe de família, 18,99% são analfabetos, 57,59% cursaram até a 4ª série, 17,09% cursaram até a 8ª série, 2,53% tem 2ª grau incompleto e 3,80% tem segundo grau completo, não existindo pessoas com nível universitário. Observa-se que população tem baixo nível de escolaridade já que 76,58% só cursou até a 4ª série do ensino fundamental, enquanto que apenas 3,80% concluiu o 2º grau; Quanto à origem do chefe de família, 27,85% são oriundos da Capital, 63,92% são do interior e 8,23% de outros Estados. Observa-se assim que 72,15% dos chefes de família são provenientes do interior do estado ou de outros estados, enfatizando o processo de movimento migratório, acarretando via de regra, grandes concentrações nas áreas urbanas; Quanto a ocupação e vínculo empregatício, observa-se que 84,72% trabalham por conta própria como prestadores de serviços. Boa parte das mulheres, chefes de família ou não, desempenham a ocupação de lavadeira. Em inúmeras situações essas águas de lavagens, são lançadas em quantidade significativa nas encostas, contribuindo para a instabilização da área; A faixa salarial predominante é de até 01 salário mínimo (50,63%) seguido da faixa de 01 a 03 salário mínimo (46,84%), o que equivale à 97,47% de famílias sobrevivendo com renda mínima. Em 68,99% dos casos a família é sustentada exclusivamente pela renda do chefe do grupo. A maioria das residências é em alvenaria mural de blocos (67,7%), com estrutura de pilares e vigas (23,2%), madeira (8,6%) e taipa (0,5%). No local, a parte comercial é pouca desenvolvida constituída por bares, mercearias, locadora de vídeos, oficinas, entre outros. Existem ainda instituições religiosas, educacionais e associativas, não existindo posto de saúde; A característica comum é a ocupação desordenada e irregular (física e jurídica) das habitações. 4 INFRA-ESTRUTURA EXISTENTE Apesar da existência da rede de esgotamento recentemente implantada, pode-se notar que ainda existem muitas casas não ligadas ao sistema, jogando as águas servidas em sumidouros ou diretamente nas encostas. Os moradores justificam a falta de recursos para a realização da interligação das águas servidas ao sistema de esgotamento sanitário da rede pública. Inexiste sistema de drenagem das águas pluvias, sendo que os deflúvios escoam a céu aberto, havendo possibilidade de alagamento nas vias próximas ao córrego da Bica, na época das chuvas. Consta a existência de rede de abastecimento de água, sendo que algumas casas não estão ligadas à rede pública, sendo utilizadas cisternas, que se apresentam em condições de não potabilidade devido ao lançamento de esgoto nas proximidades. Foto 1- Condições das vias internas Foto 2 – Vista do córrego na parte inferior Podem ser notados, ainda, alguns pontos de abastecimento direto da rede pública, provavelmente sem permissão da empresa fornecedora de água tratada. Existe fornecimento de energia elétrica para as habitações, não sendo observada ligação clandestina, devido a fiscalização da empresa fornecedora de enérgia elétrica, após a privatização desta. Quanto ao lixo, falta coleta regular nas vias internas, sendo o mesmo depositado numa área próxima a via externa ou nas encostas. Observou-se grande quantidade de lixo no corrego existente. 5 CONDIÇÕES DAS ENCOSTAS A população ocupa de forma desordenada a encosta, executando além do desmatamento, cortes e aterros. Na vistoria realizada no local pode-se observar que os escorregamentos de terra estão relacionados com a ação antrópica. Os escorregamentos ocorrem geralmente no período de chuvas, não havendo controle das águas que caem nas encostas. Fotos mostrando as condições de utilização das encostas são apresentadas a seguir: Foto 3 – Vista de área onde ocorreu ruptura diretamente nas encostas, proporcionando, além da erosão a infiltração de água no terreno; Devido às condições precárias das habitações, baixa escolaridade da população, baixo poder aquisitivo e situação fundiária irregular das habitações, a área vem sendo ocupada sem nenhum controle, propiciando condições desfavoráveis a estabilização da mesma. Devido à baixa posição do nível de água na região das encostas e a ocorrência de deslizamentos superficiais, acredita-se que os escorregamentos estão relacionados com a perda de resistência do solo em decorrência do seu umedecimento (Gonçalves, 1986; Elbachá et al, 1987; Campos et al, 1994; Guidice, 1999) pelas águas das chuvas como também das águas servidas, que são jogadas diretamente sobre a encosta, ou em fossas, apesar da existência de sistema de esgotamento sanitário; Com base nestas observações, foram pospostas alternativas para estabilização, diferentes das rotineiramente adotadas que são contenções caras, já que as mesmas eram dimensionadas para a condição de saturação do terreno. Uma vez que haja pouca ou nenhuma infiltração de água, poderá ser considerada a contribuição da resistência ao cisalhamento do terreno devido ao solo não estar saturado. Foto 4 – Proximidade da casa do corte 6 RECOMENDAÇÕES Foram observados os seguintes problemas: Existência de camada superficial inconsistente proveniente de aterro, entulho, decomposição de resíduos sólidos sobre o maciço natural; As encostas estão sendo cortadas quase que verticalmente pelos moradores, em grande parte da área, como forma de aumentar o terreno para ampliação do imóvel; Existência de capim e pequenos arbustos em praticamente toda ocupação das encostas, propiciando o acúmulo de lixo contido pela vegetação; A intervenção recente realizada no local dotou a área de rede de esgotamento sanitário, que não foi interligada ao sistema de esgotamento sanitário de cada habitação por falta de recursos, segundo informações dos moradores. Os esgotamentos das águas servidas ou pluviais são muitas vezes jogados Com base nos problemas encontrados foram apresentadas diversas soluções para a ocupação da área, tais como: Realizar a pavimentação das vias internas ou execução de escadarias, minimizando a infiltração das águas pluviais; Promover a limpeza do lixo jogado nas encostas e vias internas, com a participação da comunidade e da companhia de limpeza urbana, bem como realizar campanhas de limpeza e coleta seletiva, e atividades sócio-educativas com os moradores; Definir os limites de construção em cada lote, como também, campanhas de esclarecimento junto à comunidade para evitar cortes com elevada declividade; Executar rede de drenagem onde necessário, principalmente valetas ao longo das escadarias, verificado a necessidade ou não da quebra de energia referente a velocidade de escoamento. Necessário também prever os dimensionamentos dos encontros destas valetas com a caixa da drenagem profunda. Outra providencia junto às valetas de drenagem é a captação do lixo através de grades ou similares, evitando que o mesmo desça junto com a água; Conscientizar a comunidade quanto à impermeabilização da área dos seus lotes com a condução das águas pluviais correspondentes para o sistema de drenagem a ser implantado; Retirar toda a vegetação inadequada e se promover o replantio de cobertura vegetal com gramínea, ou outra espécie de vegetação característica da região. Estimular a participação das crianças, em atividades lúdicopedagógicas cujo tema seja Meio Ambiente; Implantar um programa de Educação Sanitária e Ambiental, conscientizando a população sobre as condutas a serem adotadas, com o objetivo de possibilitar maior iteração, sem danos ao meio ambiente, minimizando riscos e preservando a integridade dos moradores. Estas ações são de importância fundamental para a área em estudo, pois a persistência da má ocupação do uso do solo, fatalmente será o grande causador de deslizamentos no futuro próximo. Além das recomendações gerais, foram apresentadas, para determinados pontos em situações críticas, opções para estabilização local. As opções de estabilização apresentadas foram de: conformação geométrica (necessitando de relocação de habitações), proteção superficial do talude com vegetação e/ou contenção. Em apenas um ponto foi prevista a adoção de uma contenção de maior valor, sendo esta em solo grampeado. Foi sugerida a execução de pequena alvenaria de pedra, na base dos cortes, não com efeito de contenção e sim para evitar a escavação do terreno para ampliação das habitações. 7 CONCLUSÕES Após avaliação do problema, muitas das sugestões para estabilização da área estão relacionadas com a melhoria da qualidade de vida dos moradores. Obras como drenagem das águas pluviais, interligação das águas servidas ao sistema de esgotamento sanitário já existente, coleta de lixo, pavimentação das vias, execução de escadarias, dentre outras, levam a uma minimização da infiltração de água e conseqüentemente da estabilização dos taludes, evitando investimento em obras de contenções. Apenas em alguns locais há necessidade de pequenas intervenções de baixo custo, como relocação de habitações em pequena quantidade, retaludamento, impermeabilização e reforço do terreno através de grampeamento. O desenvolvimento do trabalho, em conjunto com a comunidade, trouxe um ganho de aprendizagem para ambos. No próximo estudo, será promovida a participação dos alunos de graduação, para uma maior integração entre a graduação, pósgraduação, órgãos governamentais e comunidade, visando a realização de estudos com levantamento topográfico, sondagens e ensaios especiais, para melhor avaliação das condições de estabilidade e apresentar a comunidade um projeto para recuperação. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a Conder – Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia pela escolha da área e fornecimento de levantamento planialtimétrico e fotografia área, e à comunidade da Vila Nova de Pituaçu pela possibilidade de realizar o trabalho. REFERÊNCIAS Campos, L. E. P.; Menezes, M. S. S.; Presa, E. P. e Fonseca, E. C. (1994) "Considerações sobre a Análise de Estabilidade de Taludes em Solos não Saturados", II Simpósio sobre Solos não Saturados, Recife - PE. Codesal – Coordenadoria Especial de Defesa Civil da Prefeitura Municipal de Salvador (1998) “Mapeamento das Áreas de Risco de Salvador. Área: Vila Nova de Pituaçu”, Relatório interno. Elbachá, A. T.; Campos, L. E. P. e Bahia, R. F. C. (1992) “Tentativa de Correlação entre Precipitação e Deslizamento na Cidade de Salvador”, I COBRAE, Rio de Janeiro. Gonçalves, N. M. S. (1992) “Impactos pluviais e desorganização do espaço urbano em Salvador – BA”. São Paulo. Tese de Doutorado em Geografioa – USP, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Guidice, D. S. (1999) “Impactos ambientais em área de ocupação espontânea – O exemplo de Calabar”. Salvador. Dissertação de Mestrado – UFBA, Instituto de Geociências.