Hipersuperfı́cies de rotação compactas de uma forma espacial Ion Moutinho O objetivo é apresentar uma caracterização para as hipersuperfı́cies de rotação compactas de uma forma espacial, definidas num sentido mais amplo onde os paralelos podem ser subvariedades da hipersuperfı́cie de codimenso maior do que 1. O resultado generaliza um teorema devido a Podestà e Spiro ([PS]) que garante que uma hipersuperfı́cie compacta do espaço euclidiano sob a ação isométrica de um subgrupo fechado e conexo de isometrias da hipersuperfı́cie com cohomogeneidade 1 e órbitas principais umbı́licas é uma hipersuperfı́cie de rotação. A generalização se dá ao permitir que o ambiente seja uma forma espacial qualquer e a cohomogeneidade seja suficientemente grande. Mais precisamente, temos o seguinte Theorem 1 Seja f : M n → Qn+1 , com n ≥ 3, se c < 0, e n ≥ 4, se c > 0, uma hiperc superfı́cie compacta. Suponha que exista um subgrupo fechado e conexo G ⊂ Iso(M n ) agindo de modo localmente polar sobre M n com cohomogeneidade k satisfazendo 1 ≤ k ≤ n − 2 e com órbitas principais umbı́licas em M n . Então f é uma hipersuperfı́cie de rotação (do tipo elı́ptico se c < 0) e G é isomorfo a um dos subgrupos fechados de SO(n − k + 1) que agem transitivamente sobre Sn−k . Na verdade, o caso em que o ambiente é plano já foi estudado e apresentado em [MT]. Neste artigo, tal situação aparece como uma simples conseqüência de um estudo mais geral para as hipersuperfı́cies compactas do espaço euclidiano sob a ação localmente polar de um grupo de Lie fechado. Contudo, este estudo não pode ser generalizado para as formas espacias não planas, o que torna o resultado acima um pouco mais interessante, pois a sua justificativa não é uma simples adaptação de argumentos do caso de ambiente plano para as forma espaciais não planas, isto é, sua justificativa tem que seguir por outros meios. O Teorema 1 faz parte de minha tese de Doutorado ([Mo]). Algumas preliminares Uma ação isométrica de um grupo de Lie fechado G sobre uma variedade riemaniana M é dita localmente polar se existe uma subvariedade imersa e completa que intercepta n 1 ortogonalmente todas as órbitas da ação. Tal subvariedade é chamada uma seção; se existe uma seção fechada e mergulhada, a ação é dita polar. Em particular, qualquer ação isométrica de cohomogeneidade 1 é localmente polar. Toda ação localmente polar sobre uma forma espacial é de fato polar. A cohomogeneidade de uma ação de um grupo de Lie é a codimensão de uma órbita de dimensão máxima. Para se definir as hipersuperfı́cie de rotação de uma forma espacial é necessário trabalhar alguns conceitos antes e, pelo caminho escolhido para provar o teorema, estas serão caracterizadas como hipersuperfı́cies invariantes por um tipo especial de ação polar sobre a forma espacial. Lembre que o produto warped N1 ×ρ N2 das variedades riemannianas (N1 , h, iN1 ) e (N2 , h, iN2 ), com função warping ρ: N1 → R+ , é a variedade produto N1 × N2 munida da métrica h, i = π1∗ h, iN1 + (ρ ◦ π1 )2 π2∗ h, iN2 , onde πi : N1 × N2 → Ni , 1 ≤ i ≤ 2, denota as projeções canônicas. Uma decomposição como produto warped de uma forma espacial Qnc , no caso de dois fatores, é uma isometria sobre um aberto denso de Qnc da forma n φ: V n−m (⊂ Qn−m ) ×σ Qm c c̃ → Qc . Uma isometria assim é chamada uma representação como produto warped da forma espacial Qnc e uma descrição completa destas isometrias se encontra em [No]. Em particular, o Teorema 7 de [No] garante que uma subvariedade umbı́lica N n−k ⊂ Qnc e um ponto p ∈ N determinam uma isometria φ: V k ×σ N n−k → Qnc sobre um aberto denso de Qnc , onde V k ⊂ Qnc é uma subvariedade totalmente geodésica ortogonal a N n−k que contém p. A ação polar de uma forma espacial usada para caracterizar as hipersuperfı́cies de rotação é obtida a partir de uma subvariedade esférica do ambiente. Assim, seja N n−k uma subvariedade esférica de uma forma espacial Qnc . Seja φ: V k ×σ N n−k → Qnc uma representação como produto warped determinada a partir de N . Dado g ∈ Iso(N ), a correspondência φ(x, y) 7→ φ(x, g(y)), ∀(x, y) ∈ V ×σ N, determina uma isometria τ (g) ∈ Iso(Qnc ). A aplicação τ : Iso(N ) → Iso(Qnc ) é um monomorfismo de grupo de Lie. Seja GN = im(τ ). Como N ⊂ Qnc e GN deixa N invariante, pode-se identificar Iso(N ) com GN . Assim, GN é o subgrupo de Iso(Qnc ) cujos elementos são descritos por g(φ(x, y)) = φ(x, g(y)), ∀(x, y) ∈ V ×σ N, onde φ: V ×σ N → Qnc é uma representação de Qnc como produto warped determinada por N . Vale que GN age polarmente sobre Qnc e as seções sendo as subvariedades totalmente geodésicas que estendem as imagens por φ das fibras horizontais. 2 Definição: Uma hipersuperfı́cie f : M n → Qn+1 é dita uma hipersuperfı́cie de rotação c n+1 se existe uma subvariedade esférica N de Qc (não totalmente geodésica se c = 0) tal que f (M ) é invariante por GN . As órbitas de GN sobre f (M ) são chamadas paralelos da hipersuperfı́cie. A interseção de uma componente conexa da parte regular de uma seção da ação de GN com a hipersuperfı́cie é chamada um meridiano da hipersuperfı́cie. No caso hiperbólico, a classe das hipersuperfı́cies de rotação é mais rica e pode ser dividida em três, de acordo com um dos três tipos de paralelos possı́veis. Se os paralelos forem esferas geodésicas, a hipersuperfı́cie de rotação é chamada do tipo elı́ptico; se os paralelos forem espaços hiperbólicos, é chamada do tipo hiperbólico; se os paralelos forem horosferas, é chamada do tipo parabólico. Observação: Se a hipersuperfı́cie f : M n → Rn+1 é tal que f (M ) é invariante por GN com N sendo totamente geodésica então f é um cilindro. Num modelo padrão, o grupo GN é caracterizado por ser formado pelas isometrias lineares de Qn+1 (O(n + 1), O(n + 2), ou O+ (n + 1, 1), dependendo se c = 0, c > c 0, ou c < 0) que deixam fixo pontualmente o subespaço W ortogonal ao fecho afim de N . Se C é um meridiano da hipersuperfı́cie, então GN (C) é um aberto denso de f (M ). Mais ainda, C está contido num subespaço afim que contém W , é ortogonal aos paralelos e tem uma dimensão a mais que W . Assim, a definição de hipersuperfı́cie de rotação apresentada, admitindo meridianos com dimensão maior do que ou igual a 1, coincide com a definição introduzida em [dCD] quando os meridianos tem dimensão 1 e naturalmente a generaliza. Dada uma hipersuperfı́cie de rotação f : M n → Qn+1 , tem-se que o grupo GN , sec gundo o qual f (M ) é invariante, induz uma ação isométrica sobre M . Vale também que a ação induzida é localmente polar, além de ter órbitas principais umbı́licas. O Teorema 1 mostra que vale a recı́proca para hipersuperfı́cies compactas de formas espaciais não planas e de dimensão n ≥ 3, se c < 0, e n ≥ 4, se c > 0, desde que as órbitas tenham dimensão maior do que 1, isto é, se a cohomogeneidade k satisfaz 1 ≤ k ≤ n − 2. Uma hipersuperfı́cie de rotação f : M n → Qn+1 pode ser vista como um produto c warped de imersões isométricas. Para isto, seja N o paralelo de f que contém um como produto warped a representação de Qn+1 ponto f (p) e seja φ: V ×σ N → Qn+1 c c determinada por N e f (p). Seja g: L → V uma hipersuperfı́cie tal que g(L) coincide é uma parametrização de com um meridiano de f . Então φ ◦ (g × id): L ×σ N → Qn+1 c um aberto denso de f (M ) como um produto warped de imersões isométricas. Vale notar que uma imersão isométrica de codimenão 1 que é um produto warped de imersões isométricas só pode ser de dois tipos, um dos fatores tem de ser uma isometria local. Se isto acontece com o segundo fator, então a imersão é parte de uma hipersuperfı́cie de rotação. Se o primeiro fator é uma isometria local, a hipersuperfı́cie é parte de uma hipersuperfı́cie que generaliza a nocão de cone para formas espacias (cf. [No] e 3 [Ej]). Esboço da prova A demonstração do Teorema 1 começa com a observação de que existe um homomorfismo de grupos de Lie Φ: Iso0 (M ) → Iso0 (Qn+1 ), onde Iso0 (M ) é a componente conexa c da identidade do grupo de isometrias de M , tal que f ◦ g = Φ(g) ◦ f , ∀g ∈ Iso0 (M ) (este também é um resultado que faz parte de minha tese, ver [MT] e também [MPST]). Seja G̃ = Φ(G), donde f (M ) é invariante por G̃. O objetivo, então, é mostrar que as órbitas de G̃ coincidem com as órbitas de um grupo GN , para alguma subvariedade esférica N de Qn+1 . c Para isto, seja N o fecho esférico de G̃(f (x)), isto é, a menor subvariedade esférica que contém G̃(f (x)), para algum x ∈ Mr , subconjunto dos pontos regulares de M . A princípio, G̃(f (x)) pode ser uma subvariedade de N de codimensão arbitrária. Mas, não é este o caso. Primeiro note que se M n tem curvatura seccional constante igual a c, como f é uma hipersuperfı́cie compacta, então c > 0 e f é totalmente geodésica. Em particular, f é uma hipersuperfı́cie de rotação. Assim, pode-se supor que a curvatura seccional de M n não seja constante. Além disso, com as hipóteses sobre G, prova-se que existe uma representação de Mr como uma variedade produto warped. Em particular, f restritia a Mr pode ser vista como uma imersão isométrica de codimensão 1 definida numa variedade produto warped. Num aberto conexo onde a curvatura seccional de M n não é constante igual a c, um resultado de [DT] garante que f restrita a este aberto tem de ser um produto warped de imersões isométricas. Como conseqüência, a subvariedade G̃(f (x)), tomando x no aberto, só pode coincidir com o seu fecho esférico ou então tem codimensão 1. No primeiro caso, é imediato mostrar que as órbitas de G̃ coincidem com as órbitas de GN , donde f é uma hipersuperfı́cie de rotação. No segundo caso, com algumas contas elementares, prova-se que f tem de ser um cone, o que é um absurdo, uma vez que M é compacto. Logo, f tem de ser uma hipersuperfı́cie de rotação. References [dCD] Carmo, M. do, Dajczer, M., Rotation hypersurfaces in spaces of constant curvature. Trans. Amer. Math. Soc., 277 (2) (1983), 685-709. [DT] Dajczer, M., Tojeiro, R., Isometric immersions in codimension two of warped products into space forms. Illinois J. Math. 48 (3) (2004), 711-746. [Ej] Ejiri, N., A generalization of minimal cones. Trans. Am. Math. Soc. 276 (1983), 347-360. 4 [MPST] Mercuri, F., Podestà, F., Seixas, J.A., Tojeiro, R., Cohomogeneity one hypersurfaces of Euclidean spaces. A aparecer em Comment. Math. Helv.. [Mo] Moutinho, I., G-variedades riemannianas como hipersuperfı́cies de formas espaciais. Tese de Doutorado, Universidade Federal de São Carlos. [MT] Moutinho, I., Tojeiro, R., Compact Riemannian G-manifolds as Euclidean hypersurfaces. Preprint. [No] Nölker, S., Isometric immersions of warped products. Diff. Geom. App. 6 (1996), 1-30. [PS] Podestà, F., Spiro, A., Cohomogeneity one manifolds and hypersurfaces of Euclidean space. Ann. Global Anal. Geom. 13 (1995), 169-184. 5