ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DA UFS: DISCUTINDO A DIVERSIDADE E FORMAÇÃO PEDAGÓGICA Carlos Alberto Vasconcelos (UFS)1 Bruno dos Santos Andrade (UFS)2 INTRODUZINDO A QUESTÃO A Constituição de 1988 trouxe importantes mudanças políticas para a sociedade brasileira, especialmente rumo à democratização. No campo da educação, houve avanços significativos, dentre eles a garantia da gestão democrática no ensino público (Art. 206; IV), oportunizando a prática democrática no cotidiano escolar. Nos últimos anos, em cumprimento à LDB a maioria das instituições escolares elaboraram suas propostas pedagógicas dos estabelecimentos de ensino da Educação Básica em suas diferentes modalidades. Entendemos que toda proposta pedagógica é também política, em razão disto, ela tem o mesmo significado de Projeto Político-Pedagógico, enquanto que currículo é um termo clássico utilizado para designar os conteúdos, matérias que compõem um curso nas diversas áreas do conhecimento. Os componentes do currículo são aqueles que respondem as questões: O que ensinar? (conteúdos); Para que ensinar? (os objetivos pretendidos em relação aos conteúdos); Quando ensinar? (Organização seqüencial e temporal dos conteúdos) e Como ensinar? (metodologia utilizada para atingir os objetivos). Outro aspecto a ser observado na construção ou reformulação dos Projetos PolíticoPedagógicos diz respeito à legislação em vigor sobre a Inclusão de Pessoas com Necessidades Especiais, a cultura Afro Brasileira e Africana, a cultura Indígena, aos conteúdos curriculares relacionados aos estudos sobre o nosso Estado, ao Ensino Fundamental de nove anos, a Educação Infantil, a Educação Profissional, a Educação de Jovens e Adultos, a oferta de estágio obrigatório ou não. Enfim, é necessário observar a legislação pertinente aos cursos e modalidades que a instituição de ensino oferta. Com este juízo o Projeto Pedagógico (PP) é o documento que orienta os docentes no planejamento das suas disciplinas, de modo a concretizar a política educacional da instituição. Neste 1Prof. do Depto de Educação do Campus Prof. Alberto Carvalho/UFS [email protected] 2Mestrando do Núcleo de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática [email protected] NPGECIMA/UFS 1 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. texto optou-se por definir e denominar o documento/estudo como Projeto Pedagógico, entendendo que o aspecto político encontra-se expresso no ato pedagógico enquanto fazer educativo. O Projeto Pedagógico dos cursos de graduação deve ser elaborado observando as diretrizes do Projeto Pedagógico Institucional (PPI) e do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), além das especificidades próprias de cada curso, da comunidade escolar e da região, dando uma visão de totalidade, que represente, de fato, a instituição, sem perder de vista a articulação e a relação de complementaridade entre esses documentos, essenciais e indispensáveis, como apoio e diretrizes ao processo ensino e aprendizagem. Com este entendimento, busca-se analisar a proposta curricular do curso de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Federal de Sergipe, na modalidade presencial apontando o espaço pedagógico de suas disciplinas incluso nas suas matrizes curriculares que estão direcionadas, em caso específico, para o ensino de ciências, bem como sobre a diversidade, contribuindo para a formação do indivíduo, em caso especial do professor, em uma sociedade múltipla, intercultural e globalizada. Nesta ótica algumas indagações são pertinentes para conduzir-nos a reflexões: Que indagações o trato pedagógico da diversidade traz para o currículo? Como a questão da diversidade tem sido pensada nos diferentes espaços sociais, principalmente, nas universidades? Como podemos lidar pedagogicamente com a diversidade? Ao realizar-se esta discussão, a nossa primeira tarefa poderá ser o questionamento sobre a presença ou não dessas indagações na nossa prática docente, nos projetos pedagógicos e nas propostas educacionais e como o currículo vem lidando com essas questões. No tocante à diversidade, do ponto de vista cultural, pode ser entendida como a construção histórica, cultural e social das diferenças. A construção das diferenças ultrapassa as características biológicas, observáveis a olho nu. As diferenças são também construídas pelos sujeitos sociais ao longo do processo histórico e cultural, nos processos de adaptação do homem e da mulher ao meio social e no contexto das relações de poder. Sendo assim, mesmo os aspectos tipicamente observáveis, que aprendemos a ver como diferentes desde o nosso nascimento, só passaram a ser percebidos dessa forma, porque nós, seres humanos e sujeitos sociais, no contexto da cultura, assim os nomeamos e identificamos. Então, mapear o trato que já é dado à diversidade pode ser um ponto de partida para novos equacionamentos da relação entre diversidade e currículo. A primeira constatação talvez seja que, de fato, não é tarefa fácil para nós, educadores e educadoras, trabalharmos pedagogicamente com a diversidade. Mas não será essa afirmativa uma contradição? Como a educação escolar pode se 2 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. manter distante da diversidade sendo que a mesma se faz presente no cotidiano escolar por meio da presença de professores/as e alunos/as dos mais diferentes pertencimentos étnico-raciais, idades e culturas? Diante desta contextualização, o presente texto apresenta como fonte principal de análise a Resolução nº 188/2009/CONEPE (Conselho da Pesquisa, do Ensino e da Extensão) que aprova alterações no projeto pedagógico dos Cursos de Graduação em Ciências Biológicas (Licenciatura) e a Resolução nº 50/2011/CONEPE que aprova alterações no Projeto Pedagógico dos cursos de graduação em Ciências Biológicas, licenciatura e bacharelado, amplia o número de vagas do curso de Graduação em Ciências Biológicas, licenciatura e dá outras providências. Este texto integra, a priori, parte de uma pesquisa maior desenvolvida na UAB/UFS, buscando identificar e analisar diversos enfoques na formação de professores dos cursos da UAB/UFS. Priorizamos para este, o enfoque sobre diversidade e o pedagógico, previsto no referido curso a partir da legislação e de seus componentes curriculares. PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO: DISCUTINDO CONCEITOS E CURRÍCULO O termo projeto indica plano, intento; vem de projetar que significa lançar-se, precipitarse. Neste sentido, o projeto é redação preliminar das intenções da escola. Conforme LIBÂNEO, OLIVEIRA & TOSCHI (2003, p. 345), “é um documento que reflete as intenções, os objetivos, as aspirações e os ideais da equipe escolar, tendo em vista um processo de escolarização que atenda a todos os alunos”. Vejamos também o que pensa Gadotti sobre projeto: Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função de promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autores [...] (GADOTTI, 1994, p. 579). O termo político relaciona-se ao sentido de exercer a política de cuidardo que é público, ter habilidade no trato das relações humanas, bem governar. Politizar nas instituições de ensino é inculcar nos alunos e demais membros que aconstitui a consciência dos direitos e deveres dos cidadãos. Segundo Aristóteles, “o homem é um ser político”, portanto,todas as suas ações se dão de forma intencional e nas relações sociais. A educação sendo uma construção humana e ocorrendo nas 3 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. relações sociais de forma intencional, passa a ser um ato político. A educação engendra desde sua gênese uma contradição histórica em sua práxis, com interesses antagônicos construídos e desenvolvidos nas relações sociais do meio onde a escola está inserida. A administração escolar, nela incluída o ato de planejar as ações educacionais, pode ser feita de forma centralizada e autoritária, como participativa e democrática, includente ou excludente. Quando a mesma assume a forma participativa e includente, permite uma maior eficiência social e educacional. Para tanto, segundo (DIAS, 2003, p.1), [...] necessitamos de um instrumento de planejamento que permita a participação de todos os atores de forma democrática, para isso surge o Projeto PolíticoPedagógico, que quando elaborado e executado de forma participativa, tem se mostrado um importante instrumento de inclusão social e de gestão democrática da escola pública. A relevância deste tema se dá, por ser o Projeto Político-Pedagógico o documento base dos trabalhos escolares, cujo elemento primordial é o currículo. Ele precisa ser conhecido, discutido, reformulado, sempre em consonância com as políticas públicas educacionais vigentes, o período histórico vivido, as manifestações culturais presentes na comunidade, e principalmente os conhecimentos científicos historicamente produzidos pela humanidade, sem perder de vista a análise crítica da realidade que se manifesta a nível micro na instituição escolar, mas que é reflexo da realidade globalizada. No tocante ao currículo, elemento pedagógico indissociável ao PPP, ainda ressalta-se que as discussões se fazem mais do que nunca necessárias. Que formação estamos proporcionando aos nossos alunos, que conteúdos a escola trabalha e qual a sua real função na sociedade atual? Como tem sido elaboradas as propostas curriculares dos cursos superiores, em especial os de Ciências Biológicas da UFS? O currículo é um importante elemento constitutivo da organização escolar. Currículo implica, necessariamente, a interação entre sujeitos que têm um mesmo objetivo e a opção por um referencial teórico que o sustente. Currículo é uma construção social do conhecimento, pressupondo a sistematização dos meios para que esta construção se efetive; a transmissão dos conhecimentos historicamente produzidos e as formas de assimilá-los, portanto, produção, transmissão e assimilação são processos que compõem uma metodologia de construção coletiva do conhecimento escolar, ou seja, o currículo propriamente dito. 4 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. Nesta ótica, o currículo refere-se à organização do conhecimento escolar. Então, deve ser dinâmico e não uma mera simplificação do conhecimento científico, que se adequaria à faixa etária e aos interesses dos alunos. Daí, a necessidade de se promover, nas instituições escolares, uma reflexão aprofundada sobre o processo de produção do conhecimento escolar e o que se ensina nas universidades, uma vez que ele é, ao mesmo tempo, processo e produto. Discutindo a correlação do currículo com a concepção de PPP, reforça-se que é um instrumento balizador para o fazer pedagógico, concebido coletivamente, orientado, em caso específico, para determinado Curso de Graduação. É o documento definidor dos princípios orientadores que expressam o sentido do processo de formação de profissionais de nível superior. Consiste numa proposta de formação profissional caracterizada como um conjunto de ações e estratégias que expressam as diretrizes políticas, pedagógicas e técnicas de um Curso de Graduação (ForGRAD, 1999). NA CONCEPÇÃO DE FUSARI (1998) E VEIGA (1998) TAMBÉM ASSUMEM A EXPRESSÃO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO. Os adjetivos político e pedagógico a ele acrescentados garantem de um lado a não neutralidade dessa documentação e de outro o compromisso com o pedagógico, isto é, ‘com a pedagogia como ciência da e para a educação’. Em outras palavras, ciência que orienta a prática profissional dos docentes (FUSARI, 1998, p. 102). É político no sentido de compromisso com a formação do cidadão para um tipo de sociedade. [...] Pedagógico, no sentido de definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de cumprirem seus propósitos e sua intencionalidade (VEIGA, 1998, p. 13). Saviani (1984, p.85), esclarece que “[...] corre-se o risco de se identificar educação com política, a prática pedagógica com a prática política, dissolvendo-se, em consequência, a especificidade do fenômeno educativo”. Então se entende que tanto a ação pedagógica como a ação política são práticas distintas que devem ser entendidas no seu sentido histórico, ou seja, como manifestações da prática social. Nesta perspectiva, acredita-se que a terminologia Projeto Pedagógico expressa que “A função política da educação se cumpre na medida em que ela se realiza enquanto prática especificamente pedagógica” (SAVIANI, 1984, p. 93). Logo, quando se utiliza o termo pedagógico nele está expresso o caráter político da ação, pois nenhuma ação é neutra. Ainda acrescenta-se o que Vasconcellos (2007, p.20), aponta sobre as denominações do documento,"É evidente que não queremos cair num nominalismo (achar que o uso do nome já é 5 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. garantia de alguma coisa) ou sectarismo (achar que a denominação que usamos é a única correta); mas é importante deixar o alerta: nem tudo quer dizer a mesma coisa; é preciso examinar os pressupostos!”. DISCORRENDO SOBRE O PROJETO PEDAGÓGICO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: A DIVERSIDADE E O ENFOQUE PEDAGÓGICO Situando o currículo como a parte operacional do projeto pedagógico e estando diretamente relacionado ao trabalho do professor, uma vez que se pretende superar a fragmentação, a inflexibilidade das disciplinas, é indispensável um olhar mais extenso do processo educacional e as características psicopedagógicas que acompanham a aprendizagem e a aquisição de conhecimentos. Desta forma, o currículo adotado deve superar as propostas reprodutivistas, “integrando o enfoque prático e de processo ao foque de reconceituação e teoria crítica do currículo” (EYNG, 2002,p.60). Com esta concepção uma proposta pedagógica deve se orientar nos seguintes pressupostos reflexivos-aplicativos: proposta pedagógica deve pautar-se e expressar uma visão sistêmica; o aprendiz e a aprendizagem são protagonistas do processo onde o aprendiz é tanto portador como criador da cultura; a construção da proposta deve ser contextualizada permitindo que novos significados sejam construídos a partir de experiências básicas existentes; a autonomia e o desenvolvimento de níveis elevados de consciência no exercício da cidadania são valores essenciais do processo; o respeito à diversidade e ao pluralismo se constituem, tanto fins como meios na efetivação da proposta pedagógica; os integrantes da equipe do centro educativo são atores e autores, que se constituem agentes da inovação; a inovação se concretiza no movimento que integra ação-ação reflexiva-ação crítica; aplicação e análise crítica de novas tecnologias e linguagens no planejamento, gestão e inovação nos projetos educativos. Na análise da concepção da proposta pedagógica apresentada por Eyng e que ainda pode ser aplicada ao Projeto Pedagógico estudado, constata-se que é necessária uma mudança de atitude por parte de alguns professores, que carregam uma ideia errônea do projeto pedagógico como um instrumento elaborado por uma equipe técnica, a portas fechadas, e imposto como lei. A participação de todos, em sua elaboração, implantação e execução é fator essencial para a inovação. Ou seja, coletivo, participativo. A ruptura com o passado, no sentido da construção do futuro reafirmando os acertos e corrigindo e ajustando os equívocos do passado. O planejamento do futuro como um processo de 6 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. transformação e mudança, deve orientar a gestão da inovação que se faz necessária na gestão das IES, para que elas cumpram seu papel na sociedade atual. Cabe ao conjunto dos colaboradores na IES ter clareza da intenção educativa, dos pressupostos que norteiam a ação e participar efetivamente do projeto pedagógico, nas suas fases de concepção, implementação e avaliação. O projeto deve partir, portanto, do conhecimento que se tem da realidade presente para uma visão de futuro com uma perspectiva multicultural e interdisciplinar. No entanto, cabe destacar que as decisões tomadas no processo de planejamento da mudança são naturalmente geradoras de conflitos. Tal questão é definida por Gadotti (1994, p.579) que indica: Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro.Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autores. Neste contexto é imprescindível “quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade” buscando o aperfeiçoamento do processo formativo. É importante identificar as ações que devem ser tomadas na esfera de gestão, para que se possa analisar as reais condições de construção do novo e estabelecer um equilíbrio na transição do presente para o futuro. Com base na proposta pedagógica do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, elencamos alguns pontos a partir da resolução n.188/2009/CONEPE que convergem para os pontos abordados, principalmente com ênfase na diversidade e o pedagógico. No Art. 1º III consta – estimular o acolhimento e o trato da diversidade; No Art. 2º, diz que o curso de Ciências Biológicas (Licenciatura) formará um profissional com o seguinte perfil: II detentor de adequada fundamentação teórica como base para uma ação competente, que inclua o conhecimento profundo da diversidade dos seres vivos, bem como uma organização (...) p. 2 e XI compreensão e respeito à diversidade e ao pluralismo cultural. No Art. 3º relativo às competências que o biólogo deve ter na sociedade, reza: k) orientar escolhas e decisões em valores e pressupostos metodológicos alinhados com a democracia, com o respeito à diversidade étnica e cultural, às culturas autóctones e a biodiversidade. Reforça-se o trato pedagógico no Art. 3º V – quando trata das competências referentes ao domínio do conhecimento pedagógico. Especificamente no item, c) manejar diferentes estratégias de 7 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. comunicação dos conteúdos, sabendo eleger os mais adequados, considerando a diversidade dos alunos, os objetivos das atividades propostas e as características dos próprios conteúdos. A partir do exposto, verifica-se que na grade curricular do Curso de Ciências Biológicas há considerável número de disciplinas optativas, mais que o dobro em relação às obrigatórias, como mostra o (Gráfico1) que denota o enfoque pedagógico do referido curso. Isso revela que os acadêmicos do Curso têm uma gama de disciplinas a dispor para formação complementar a sua grade curricular estabelecida, contribuindo para sua formação e exercício do magistério. Gráfico 1: Dados referentes a quantidade de disciplinas do Curso Disciplinas do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas 160 140 120 100 Total 80 Enfoque Pedagógico 60 Enfoque na Diversidade 40 20 0 Obrigatórias Optativas Fonte: Resolução nº 188/2009/CONEPE O número de disciplinas com enfoque pedagógico (direcionadas ao processo ensinoaprendizagem), obrigatórias e optativas é maior em comparação com as de enfoque na diversidade. Algo interessante é que no total de disciplinas, bem como as com foco na diversidade, as optativas tem um maior número como ilustra os dados mencionados anteriormente. Período 2º 3º 4º 5º Quadro 1: Dados referentes as disciplinas do Curso Disciplinas Obrigatórias do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas Enfoque Pedagógico Enfoque na Diversidade Introdução à Psicologia da Aprendizagem Didática Esp. Ens. de Ciênc. e Biologia I Didática Esp. Ens. de Ciênc. e Biologia II Didática Esp. Ens. de Ciênc. e Biol. III, Instrumentação Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS para o Ensino de Ciências, Estágio Supervisionado no 8 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. Ensino de Ciências I. 6º 7º 8º Introdução à Pesquisa em Educação, Estágio Supervisionado no Ensino de Ciências II. Prát. de Pesq. em Ens. Ciênc. e Biol. I, Instrumentação para o Ensino de Biologia, Estágio Supervisionado no Ensino de Biologia I, Estágio Supervisionado em Educação Ambiental. Enfoques CTS no Ensino de Ciências e Biologia, Prát. Estudos Culturais da Biologia e Pesq. em Ens. de Ciênc. e Biol. II, Estágio Supervisionado Educação, Etnobiologia. no Ensino de Biologia II. Fonte: Resolução nº 188/2009/CONEPE A partir das informações contidas no (Quadro 1), percebe-se que o foco nas disciplinas é o Ensino, perpassando por diversos campos, tais como a aprendizagem e seus entraves, a pesquisa na área educacional, questões científicas e suas inter-relações com a sociedade e o ambiente e a prática de ensino. Outro fato relevante é que estão bem distribuídas ao longo de todo o curso, mesmo que em alguns períodos haja um número pequeno de disciplinas, como nos quatro primeiros períodos. As disciplinas com enfoque na Diversidade, abrangem aspectos culturais de uma forma geral e inclusivos, como observa-se no (Quadro 1). Tais aspectos configuram uma relevância na formação do profissional docente, uma vez que o âmbito escolar é composto pela diversidade de cor, religião, sexualidade, crenças, valores, etc. Nesse sentido, Gomes (2007, p. 18) assinala: Como a educação escolar pode se manter distante da diversidade sendo que a mesma se faz presente no cotidiano escolar por meio da presença de professores/as e alunos/as dos mais diferentes pertencimentos étnico-raciais, idades e culturas? Esse desafio é enfrentado por todos nós que atuamos no campo da educação, sobretudo, o escolar. Ele atravessa todos os níveis de ensino desde a educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio) até a educação superior incluindo a EJA, a Educação Profissional e a Educação Especial. Nesta concepção, o curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFS, especificamente do Campus de São Cristóvão, apresenta em seu ementário disciplinas obrigatórias relacionadas à diversidade e também optativas, como ilustra os dados seguintes. Salientando que, mesmo não estando explícita nos currículos dos diversos cursos, desde a educação básica a educação superior, a diversidade pode ser trabalhada pelos professores em todas as disciplinas e níveis. Quadro 2: Dados referentes as disciplinas optativas do Curso. Disciplinas Optativas do Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas Com enfoque pedagógico Fundamentos Biológicos da Educação, Tópicos Especiais de Ensino de Ciências e Biologia I, II e III, Com enfoque na Diversidade Bioantropologia, Sexualidade Humana, Tópicos Especiais em Etnobiologia I, II e III 9 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. Tópicos Especiais de Ensino e Pesquisa I, II e III Fonte: Resolução nº 188/2009/CONEPE As disciplinas relacionadas à Diversidade abordam temáticas direcionadas, entre outros temas à sexualidade e evolução dos seres vivos, inclusive do homem. Incorporam aspectos relevantes envolvendo o homem e sua relação com a diversidade biológica, levando em consideração os aspectos históricos e socioculturais inerentes a essa relação. A esse respeito Gomes (2007, p. 20) corrobora ao afirmar que: [...]ao refletirmos sobre a presença dos seres humanos no contexto da diversidade biológica, devemos entender dois aspectos importantes: a) o ser humano enquanto parte da diversidade biológica não pode ser entendido fora do contexto da diversidade cultural; b) toda a discussão a que hoje assistimos sobre a preservação, conservação e uso sustentável da biodiversidade não diz respeito somente ao uso que o homem faz do ambiente externo, mas, sobretudo, da relação deste como um dos componentes dessa diversidade. Por isso, é mister que a escola contribua para a formação do indivíduo, como cidadão inserido em uma diversidade biocultural, desempenhado papel fundamental na construção de relações sociais, baseadas na solidariedade, na justiça social, no respeito ao meio ambiente e a própria vida. Sabemos ser tais questões, um esforço para os cursos de formação de professores, um norte em construção, mas a luta pela conquista da autonomia instituições de ensino, de seus conteúdos e de sua prática pedagógica crítica, requer a participação e o compromisso de educadores preocupados com o exercício da cidadania para todos e da valorização das pessoas, a partir da tolerância e da convivência fraterna com a diversidade em todos os sentidos (RODRIGUES et al, 2012) Completando no Curso de Licenciatura em Ciências Biológicas compreende conteúdos, atividades e práticas que permitem uma base consistente para a formação do professor capaz de atender ao perfil descrito em parágrafos anteriores. Com este propósito diversas competências e habilidades devem ser desenvolvidas para concretização do papel do professor e do biólogo na sociedade: competências referentes ao comprometimento com os valores inspiradores da sociedade democrática; competências referentes à compreensão do papel social da escola; ser capaz de desenvolver competências referentes ao domínio dos conteúdos a serem socializados, de seus significados em diferentes contextos e de sua articulação interdisciplinar; desenvolver competências referentes ao domínio do conhecimento pedagógico; desenvolver competências referentes ao conhecimento de processos de investigação que possibilitem o aperfeiçoamento da prática 10 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. pedagógica; ser capaz de desenvolver competências referentes ao gerenciamento do próprio desenvolvimento profissional. CONSIDERAÇÕES FINAIS Discutir currículo, elemento indissociável do projeto político pedagógico, envolve entre outras questões, a de repensar a educação na atualidade, priorizando suas necessidades visando atender a sociedade contemporânea, seja para uma formação acadêmica/intelectual, seja para o trabalho ou, melhor, dirigindo à uma formação integral. É de suma importância a construção do currículo dos cursos de ensino superior de forma plural, atendendo as aspirações da comunidade local e interesses do corpo docente e discente. Acreditamos que a cultura não pode ser transmitida de forma acabada, mas sim como um espaço que está em construção permanente. O currículo tem sido visto como um documento neutro e intocável, o qual pode ser aplicado a qualquer tempo e classe social. Esse conceito precisa ser modificado para que o ensino superior possa contribuir com a formação integral do cidadão, preparando-o para o mercado de trabalho em uma “sociedade multicultural”. O projeto pedagógico (PP) é um documento cuja construção se dá em processo, de modo dinâmico, isto é, não tem um fim, um momento que se dê por acabado. Se isto vier a ocorrer significa que o PP cumpriu mera determinação burocrática, sem aplicabilidade. Este documento deve ser retomado periodicamente pelo colegiado dos cursos, coordenadores, conselhos e docentes do curso, para atualizá-lo registrando a história do curso, seus avanços e dificuldades, suas experiências positivas, os resultados da aplicação de projetos de extensão e pesquisa, das semanas do curso e outros eventos, etc. Recorrendo a Gadotti (apud Veiga, 2001, p. 18), que afirma que “todo projeto supõe ruptura com o presente e promessas para o futuro, ou seja, busca dar visão do que se espera do futuro”. Projetar, portanto significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, na instabilidade para se chegar à outra estabilidade possível e melhor que a atual, a partir do compromisso e empenho dos elementos envolvidos. Na verdade, a elaboração do projeto pedagógico nas instituições de educação superior é uma iniciativa relativamente recente na história da educação brasileira, pois surge aliada ao movimento de mudanças na educação iniciado em meados da década de 1980 com o declínio da ditadura militar e prolongado nos anos de 1990, até a sua legalização por meio da (LDBEN), n° 9394/96. Porém, se tornou documento obrigatório para todas as instituições, fazendo parte, inclusive, dos elementos considerados nas avaliações internas e externas, na medida em que 11 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. organiza e possibilita a melhoria da qualidade do trabalho pedagógico. Para tanto, sua elaboração deve considerar as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), observando o Parecer n. 776/97 e o Edital do referido Parecer, que estabelecem que essas Diretrizes devem: “a) se constituir em orientações para a elaboração dos currículos; b) ser respeitadas por todas as IES; e c) assegurar a flexibilidade e a qualidade da formação oferecida aos estudantes”. Além dos aspectos legais, é preciso considerar determinados elementos, por exemplo, a análise dos conflitos internos e externos; a neutralização das relações corporativas e autoritárias; o rompimento da burocracia excessiva que permeia a prática escolar; a reformulação da divisão do trabalho com o objetivo de romper com o modelo fragmentado das tarefas; valorizar e ampliar o processo de participação favorecendo a responsabilidade compartilhada e direcionada a resultados de interesse da maioria; definir o referencial e pressupostos teóricos, dentre outros. A luta política pelo direito à diversidade: a inserção da diversidade nos currículos implica compreender as causas políticas, econômicas e sociais de fenômenos como etnocentrismo, racismo, sexismo, homofobia e xenofobia. Falar da diversidade e diferença implica posicionar-se contra processos de colonização e dominação. É entender como algumas diferenças foram naturalizadas e interiorizadas, sendo tratadas de forma desigual e discriminatória. É incorporar no currículo, nos livros didáticos, no plano de aula, nos PP os saberes produzidos pelas diversas áreas e ciências articulados pelos movimentos sociais e pela comunidade. A diversidade é norma da espécie humana: seres humanos são diversos em suas experiências culturais, são únicos em suas personalidades e são também diversos em suas formas de perceber o mundo. Seres humanos apresentam, ainda, diversidade biológica. Algumas dessas diversidades provocam impedimentos de natureza distinta no processo de desenvolvimento das pessoas (as comumente chamadas de ‘portadoras de necessidades especiais’). Como toda forma de diversidade é hoje recebida na escola, há a demanda óbvia, por um currículo que atenda a essa universalidade. Desta feita, o Projeto Pedagógico do curso analisado, especificamente a partir de sua Resolução 188/2009, trata no Art. 3º II das competências referentes ao comprometimento com os valores inspiradores da sociedade democrática: reconhecer e respeitar a diversidade manifestada por seus alunos, em seus aspectos sociais, culturais e físicos, detectando e combatendo todas as formas de discriminação. Em fim, a partir da análise dos documentos como o Projeto Pedagógico, as Resoluções e as ementas do curso de Ciências Biológicas da UFS, constata-se que há elementos suficientes, como a distribuição de disciplinas voltadas para as questões discutidas ao longo do texto, que propiciarão a 12 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. discussão e implementação de forma mais explicita, reflexiva, coletiva e objetiva, correspondendo às necessidades universais de cultura e biodiversidade de nossa sociedade, a partir da prática pedagógica. REFERÊNCIAS BRASIL, MEC. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9394/1996. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília: Gráfica do Senado Federal, 1998. BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares dos Cursos de Graduação. 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Aprova alterações no Projeto Pedagógico dos cursos de graduação em Ciências Biológicas, licenciatura e bacharelado, 13 ANAIS DO VI FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES E II CONGRESSO NACIONAL EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE ISSN 2176-7033 28 a 30 de novembro de 2013 UFS–Itabaiana/SE, Brasil. amplia o número de vagas do curso de Graduação em Ciências Biológicas, licenciatura e dá outras providências. VASCONCELOS, C. S. dos. Planejamento, projeto de ensino-aprendizagem e projeto político pedagógico. São Paulo: Libertad, 2007. VEIGA, I. P. A (Org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 10º ed. Campinas, SP: Papirus, 2001 ______. Escola: espaço do projeto político-pedagógico. 4. ed. Campinas: Papirus, 1998. 14