A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DE UMA POPULAÇÃO SOBRE A
HOMOSSEXUALIDADE NO ANO DE 2014
Francisco Medeiros Andrade 1 - UNISAL Lorena/SP
Sonia Maria Ferreira Koehler 2 - UNISAL Lorena/SP
Joviane Marcondelli Dias Maia3 - UNISAL Lorena/SP
Grupo de Trabalho – Educação e Direitos Humanos
Agência Financiadora: CNPq
Resumo
O presente trabalho faz parte de um conjunto de projetos integrados e em andamento sobre “A
representação social da homofobia na cidade de Lorena/ SP” realizados pelo Observatório de
Violências nas Escolas, do Núcleo UNISAL, Lorena/SP, desde 2006. A pesquisa trata-se de
um survey longitudinal, pois engloba uma determinada população, representada por diferentes
indivíduos, é sondada em ocasiões diferentes, o que permite acompanhar as possíveis
mudanças no pensamento e no comportamento desta mesma população. A Homofobia se
constitui em um tema atual e complexo, que se representa por diversas maneiras de
expressões, muitas vezes sutis (FLEURY; TORRES, 2007). O objetivo desse estudo foi
compreender as representações sociais de uma população na Cidade de Lorena/SP no ano de
2014, sobre homossexualidade e o relato referente sua aceitação ou não, categorizando tais
respostas segundo proposta de Lacerda, Pereira e Camino (2002) com as cinco escalas de
explicações para a homossexualidade: biológicas, ético-morais, religiosas, psicológicas e
psicossociais, bem como: categorizando tais respostas como conotação homofóbica,
conotação não homofóbica e resposta neutra. Participaram 156 pessoas, sendo 85 homens, 70
mulheres e um não especificado. As idades variaram de 18 a 79 anos. Destaca-se que 30% de
respostas foram de conotação homofóbica, 53% de conotação não homofóbica e 17% foram
1
Graduando em Psicologia no Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL/Lorena. Bolsista do
Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC -CNPq
2
Professora Orientadora. Doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano IPUSP (2003).
Mestrado em Psicologia da Educação PUC/SP (1995). Especialização na área de Violência Doméstica contra
Crianças e Adolescentes (IPUSP/1998). Especialização em Psicopedagogia UNITAU (1993). Graduação em
Pedagogia pela Faculdade de Educação de Guaratinguetá (1984). Graduação em Licenciatura e Formação de
Psicólogo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (1976). Coordenadora do Observatório de Violências na
Escola desde 2006.
3
Professora Coorientadora. Doutorado e Mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Educação Especial pela
Universidade Federal de São Carlos, e Especialização em Terapia Familiar pela Faculdade de Medicina de São
José do Rio Preto (FAMERP). Graduação em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos Professora no
Curso de Psicologia da UNISAL/ Lorena. Atua como Psicóloga Clínica com enfoque em Terapia Conjugal e
Familiar e professora em Cursos de Capacitação e Pós-Graduação. Coordenadora do Observatório de Violências
nas Escolas – UNISAL/LORENA de Agosto de 2014 a Julho de 2015.
ISSN 2176-1396
38900
neutras. 43,60% dos participantes afirmaram serem indiferentes a aceitação do homossexual,
e 41,70% disseram aceitar. Os resultados reiteram a necessidade de Políticas Públicas e ações
educativas que visem a propagação dos Direitos Humanos, e dessa forma a promoção da
igualdade e respeito às diversas formas de expressões afetivas.
Palavras-Chave: Representação Social. Homofobia. Homossexualidade.
Introdução
Este trabalho é um recorte de uma pesquisa longitudinal que vem sendo desenvolvida
desde 2006 pelo Observatório de Violências nas Escolas, do Unisal Lorena/SP. Como ponto
principal de estudo, a homofobia é um fenômeno social que vem apresentando um novo
caráter. O conceito refere-se a atos ou comportamentos hostis que expressam preconceito,
aversão e não aceitação da homossexualidade.
O preconceito tem tomado formas cada vez mais sutis de expressão segundo Fleury e
Torres (2007), a fim de satisfazer às normas do igualitarismo, e, ao mesmo tempo, às
necessidades de expressão de comportamentos discriminatórios. Culturalmente o preconceito
ainda não foi banido; ele está presente em diversos aspectos sociais de forma que,
principalmente por meio da linguagem, continua sendo alimentado e transmitido entre as
pessoas.
Segundo Koehler (2009) o comportamento/sentimento que engendram a “homofobia”
apresenta-se como um complexo assunto para os pesquisadores que estudam as violências na
escola, pois historicamente envolve preconceito e discriminação, inclusão/exclusão, educação
para a sexualidade, orientação sexual, identidade sexual, estudos sobre gênero e
homossexualidade, como apresenta o Conselho Nacional de Combate à Discriminação
(BRASIL, 2004). O desafio é enorme. Há um silêncio velado dentro da própria universidade,
o que demonstra a diversidade de opiniões, conceitos e crenças tanto no discurso acadêmico
quanto no senso comum.
Considerando que as representações sociais são uma modalidade de conhecimento
particular que tem por função a elaboração de comportamentos expressa, principalmente, pela
comunicação entre indivíduos (MOSCOVICI, 2007) escolhemos tal conceito como base para
a realização deste projeto, a fim de analisar o que a população entende por “homofobia”.
38901
A teoria das Representações Sociais
A teoria das representações sociais de Moscovici busca compreender como o
conhecimento científico afeta a cultura e como ele é absorvido pelo discurso do senso comum
(MOSCOVICI, 2007). Ainda segundo Moscovici (1978), a função das representações sociais
seria elaborar comunicações e comportamentos entre os indivíduos e transformar aquilo
definido como não familiar em familiar. As representações sociais guiam, constroem e
remodelam o ambiente de comportamentos dos indivíduos (LACERDA, et al, 2002).
Moscovici (2007) usou como base conceitual para sua teoria uma crítica à teoria de
Durkheim sobre representações coletivas, cujo conceito era o de que as experiências e saberes
sociais eram construídos através da mistura das ideias e sentimentos dos indivíduos, sendo
eles estáveis e irredutíveis. Seu intuito era abordar não só a influência dos contextos sociais
sobre o comportamento, mas a participação desses nas realidades sociais. Dessa forma, surge
o conceito “representações sociais”, cuja função é a constante elaboração e reelaboração de
conhecimentos e comportamentos através da comunicação informal entre indivíduos,
construindo, assim, uma realidade comum a um conjunto social. Sendo assim, a sociedade é
pensante, na qual os indivíduos pensam juntos sobre os mesmos assuntos, recebem
informações e ideias de fora e as processam para transformá-las em julgamentos, opiniões e
assim por diante. Trata-se processo cognitivo, contendo aspectos inconscientes, emocionais e
afetivos, tanto em sua produção quanto em sua representação (JODELET, 1984 apud
SPINK,1993). Elas são equivalentes, em nossa sociedade, aos mitos e sistemas de crenças das
sociedades tradicionais; são a versão contemporânea do senso comum, que enquadra o saber
científico numa realidade social (SPINK, 1993).
A essencialização é um exemplo prototípico do que Moscovici descreveu como
“objetivação”, explicando como as pessoas naturalizam conceitos científicos e os
transformam em conhecimento de senso comum. De acordo com Pereira et al (2011 apud
PEREIRA, et al 2013), as crenças essencialistas sobre a homossexualidade são mais bem
analisadas no contexto das relações sociais sobre grupos sociais, na medida em que são
princípios organizadores das crenças e explicações socialmente elaboradas.
Lacerda, Pereira e Camino (2002) observaram em sua pesquisa sobre representação
social sobre a homossexualidade, que existem cinco categorias que as pessoas
38902
costumeiramente usam para explicar a homossexualidade, são elas: ético-moral, religiosa,
biológica, psicológica e psicossocial.
Sendo assim, faz-se importante a análise das representações sociais da homofobia que
pode proporcionar material para a elaboração de meios de como lidar com o assunto em
divergentes ambientes, inclusive no escolar. O estudo das representações sociais é uma
ferramenta importante no que diz respeito à compreensão da homofobia, uma vez que estão na
base das atitudes e dos comportamentos dos atores sociais (MOSCOVICI, 1976 apud
PEREIRA et al 2013). Assim, o desenvolvimento e aplicação de Políticas Públicas,
principalmente na área da educação, com o objetivo de reduzir o preconceito e promover a
inclusão social dos homossexuais devem ter em conta o papel das concepções e teorias de
senso comum sobre a natureza da homossexualidade, procurando combater as que promovem
preconceito e valorizar as que promovem abertura e inclusão social (PEREIRA et al 2013).
Sexualidade e Homofobia
A noção de relações de afeto e amor faz parte do cotidiano do homem moderno, pois
remete à noção de sujeito psicológico, o que inexistia em tempos passados. Na antiguidade, os
relacionamentos eram com o propósito de se formar famílias, uma vez que estas eram base da
sociedade e da política. No entanto, havia envolvimentos sexuais entre os homens com
propósitos sagrados, políticos e até mesmo vínculos em situações de guerra (há poucos
registros de práticas homoeróticas entre mulheres, uma vez que estas eram excluídas da
sociedade). Na Idade Média há poucos registros sobre práticas homoeróticas, no entanto, o
casamento como prática social e política permanece, juntamente com o controle da igreja
católica sobre o casamento e a sociedade (GUEDES, 2010).
Uma característica marcante da modernidade é a influência médica e da mídia sobre a
vida das pessoas, que dita os padrões e define os conceitos de bonito, saudável, aceitável,
disciplinando os corpos e mentes e colocando os indivíduos em constante controle e
moldagem de seus comportamentos, para que sejam aceitos na sociedade (SOARES;
MEYER, 2004). A heterossexualidade é concebida como “natural”, universal e normal,
colocando outras normas de sexualidade como antinaturais, peculiares, anormais, erros
cometidos na “fabricação” da sexualidade. Dessa forma, existe uma compaixão e, ao mesmo
tempo, uma culpabilização sobre o sujeito considerado desviante da norma (LOURO, 1999
38903
apud SOARES; MEYER, 2004). A prática homoerótica, então, passa a ser tratada como
doença, patologia, algo que não se deve nomear e nem expor publicamente. O sujeito que
desenvolve afeto e possui desejo erótico por outro do mesmo sexo não se enquadra no perfil
adequado ao fim maior das interações humanas: a conjugalidade (e reprodução), portanto é
anormal e deve ser recolhido, controlado, tratado ou, simplesmente, excluído (seja pela morte
física, seja pela morte social) (GUEDES, 2010). Além disso, há uma combinação errônea
entre a homossexualidade e a condição sorológica positiva para o vírus HIV, que coloca os
homossexuais ora como violões, propagadores da doença, ora como vítimas doentes e
vulneráveis (TERTO, 2002 apud RIOS, 2009).
Há três orientações sexuais preponderantes: a homossexualidade, a heterossexualidade
e a bissexualidade, no entanto, alguns estudos demonstram que as características da
orientação sexual variam de pessoa para pessoa (REIS; ROMÃO, 2010 apud KOEHLER;
SOUSA, 2013). Pode-se afirmar que a masculinidade é uma disputa social por meio da
ascendência de uns e degradação de outros. No entanto, é possível perceber que a
homossexualidade faz-se necessária para a própria afirmação da masculinidade, pois é
colocada como o “não ser”, determinando assim a existência do ser, que é a masculinidade,
idealizada pela heteronormatividade. O mesmo princípio da necessidade da existência do “não
ser” é trazido por Frayze (1984) no livro “O que é loucura”, no qual fala que o próprio
conceito de loucura faz-se necessário para a afirmação da razão, que também é vista como
norma social e tudo o que dela foge sofre algum tipo de discriminação como, no caso, a
loucura. Por meio dessa analogia podemos refletir sobre a rigidez da nossa sociedade, que
discrimina e exclui o diferente, desconsiderando as diversidades humanas.
Picazio (1998) mostra que a única composição diferente que existe do homossexual
para o heterossexual é a orientação do desejo. O homossexual tem sua identidade sexual bem
definida, ou seja, ele aceita sua condição de masculino ou feminino, tem os mesmos papéis
sociais e comportamentos sexuais, porém, seu desejo sexual está voltado para as pessoas do
mesmo sexo. Muitos deles até se envolvem em relacionamentos heterossexuais, mas acabam
frustrados e procuram assumir sua verdadeira identidade. Ressalta que a sociedade tem a
mania de misturar minorias e maiorias sociais, valores e palpites pessoais com o que é certo e
errado.
38904
Scardua e Souza Filho (2006) colocam que as experiências homossexuais estão
diminuindo as chances de reconhecimento social pois estão sendo vividas no espaço privado.
Afirmam ainda:
contudo, a visibilidade da homossexualidade afirmativa, através de qualquer
linguagem, ainda constitui-se em algo perturbador na sociedade gerando rigidez de
ambas as partes, devido à dificuldade de negociação (p.483).
Assim, ainda há uma independência entre identidade de gênero, orientação sexual e
práticas sexuais realizadas, mostrando a variedade sexual existente (SOARES; MEYER,
2004), o que é de difícil compreensão para a sociedade, querendo sempre definir uma
causalidade.
Os comportamentos homofóbicos variam de agressão física e/ou psicológica até
assassinato (KOEHLER, 2009), sendo que os crimes homofóbicos são motivados pela
ideologia preconceituosa da sociedade machista (que caracteriza esse grupo como subhumano), vê e trata o homossexual como presa frágil, efeminado, medroso, incapaz de reagir
ou contar com o apoio social quando agredido. Tais crimes são caracterizados por altas doses
de manifestação de ódio: muitos golpes, utilização de vários instrumentos mortíferos e tortura
(MOTT, 2006). Sendo assim, de acordo com Dinis (2008 apud DINIS, 2011), a linguagem é
também um fator de exclusão e de expressão de preconceitos, nos obriga a expressar a fala
utilizando suas formas convencionais.
Orientação sexual e Direitos Humanos
O conceito de discriminação desenvolvido no direito internacional dos direitos
humanos, trata da discriminação como qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência
que tenha o propósito (efeito) de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício da
igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos econômico, social e
cultural ou em qualquer outro campo da vida pública (RIOS, 2009, BRASIL, 2004). “Todos
os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, assim está a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Organização das Nações Unidas, em 1948
(KOEHLER; SOUSA, 2013).
Segundo Rios (2011):
38905
ao longo dos debates sobre diversidade sexual e Direitos Humanos, são invocados
vários direitos: liberdade sexual; integridade sexual; segurança do corpo sexual;
privacidade sexual; direito ao prazer; expressão sexual; associação sexual e
informação sexual. Neste campo, os Direitos Humanos cuja invocação se revelou
mais capaz de proteger homossexuais em face da homofobia e do heterossexismo
foram, basicamente, o Direito de privacidade e o Direito de igualdade (p. 292).
Assim, o autor ainda afirma que apenas o direito à liberdade garante que as pessoas
tenham o poder de escolha quanto ao seu estilo de vida e claramente a opção sexual, também
garantido pelos direitos a privacidade e direitos sexuais, ir contra um homossexual por sua
orientação sexual é ir contra os próprios Direitos Humanos garantidos a todos. Rios (2009)
aponta que dentre as expressões discriminatórias, a homofobia é aquela menos discutida e
vilipendiada pois está diretamente ligada a hierarquização da heteronormatividade. Temos
como exemplo de impossibilidade jurídica atual, a questão do casamento civil de
homossexuais permitido somente em alguns estados, a impossibilidade de adoção, a restrições
de manifestações de carinho em locais públicos além das próprias agressões físicas e verbais,
violando o direito de igualdade ao âmbito dos direitos sexuais (RIOS, 2011).
Mas para melhor atenção dos trabalhadores do universo do direito às questões do
respeito à dignidade humana, seja na esfera sexual, social e pessoal, é preciso uma maior
compreensão dos mesmos sobre a sexualidade humana com uma educação assertiva sobre
esses temas (RIOS, 2011).
A busca pelo pleno exercício dos Direitos Humanos teve um impulsionamento desde a
década de 1980, quando o Conselho Federal de Medicina deixa de considerar
homossexualidade como doença, e em seguida em 1985, retirando-a da Classificação
Internacional de Doenças, e com a proibição do tratamento da homossexualidade pelo
Conselho Federal de Psicologia, em 1991 (KOEHLER; SOUSA, 2013). Segundo Michel
Dorais, 1994 (apud RIOS, 2009), as pesquisas que usam de parâmetro de normalidade a
heterossexualidade para atribuir causas psíquicas à homossexualidade também constituem um
caráter preconceituoso.
No contexto nacional, criado em 2004, tem-se o Programa Brasil sem Homofobia (que
promove apoio a projetos de fortalecimento, promoção da cidadania homossexual e/ou no
combate à homofobia, capacitação de profissionais e representantes na defesa de direitos
humanos, disseminação de informações sobre direitos, de promoção da autoestima
homossexual e o incentivo à denúncia.
38906
Em 2011, foi entregue ao presidente da OAB da Câmara dos Deputados e do Senado
Federal o Anteprojeto do Estatuto da Diversidade Sexual, que criminaliza a homofobia e a
violência motivada pelo preconceito de sexo, orientação sexual e identidade de gênero.
Contudo, a lei será concretizada somente com um baixo assinado que contenha no mínimo um
milhão e quatrocentas assinaturas (KOEHLER; SOUSA, 2013). Enquanto isso, a população
LGBT tem como meio de defesa apenas o Código Civil, no que diz respeito a danos morais e
físicos. Assim, a homofobia, por não ser considerada como crime, ainda é expressa de forma
aceita na sociedade, em vista de que a homossexualidade é vista como falta de valores, de
moral, diferente de fatores como o racismo ou o sexismo, que ainda existem, mas as pessoas
têm medo de expressar devido à criminalização que lhes pode ser acarretada.
Segundo Pereira et al (2013), as representações mostram que as relações entre as
crenças sobre a homossexualidade e a discriminação contra homossexuais são mediadas pelo
preconceito flagrante contra esse grupo.
Parece preferível a adoção de estratégias mais universalistas, uma vez que elas
parecem ser capazes de suplantar as dificuldades de uma concepção meramente formal de
igualdade, desde que atenta às diferenças reais e às especificidades que se constroem a cada
momento, sem nelas se fechar; trata-se de reconhecer a diferença sem canonizá-la, trabalhar
com as identidades auto atribuídas sem torná-las fixas e rejeitar a alienação do outro (RIOS,
2011).
Cabe salientar a suma importância da investigação e discussão de tais temas
para como subsídios o levantamento de alternativas que amenizam o preconceito
compartilhado socialmente. Assim, o presente estudo buscou compreender as
representações sociais de uma população na Cidade de Lorena/SP no ano de 2014,
sobre homossexualidade e o relato referente sua aceitação ou não, categorizando
tais respostas segundo proposta de Lacerda, Pereira e Camino (2002) com as cinco
escalas de explicações para a homossexualidade: biológicas, ético-morais,
religiosas, psicológicas e psicossociais, bem como: categorizando tais respostas
como conotação homofóbica, conotação não homofóbica e resposta neutra,
Metodologia
Tipo de pesquisa
38907
A presente pesquisa de levantamento, também configurando-se em um survey
longitudinal abrangendo dados quantitativos e análise qualitativa, uma vez que uma
determinada população está sendo estudada em ocasiões diferentes e representada por
diferentes indivíduos o que permite a análise do processo de mudança de consciência sobre
um determinado fenômeno e possibilita a elaboração de projetos na área educativa.
Caracteriza-se pela interrogação direta a pessoas cujo comportamento se deseja conhecer.
Procede-se à solicitação de informações a um grupo significativo de pessoas acerca do
problema estudado para análise quantitativa (GIL, 1996).
A análise qualitativa permitiu detectar os valores, as crenças, as representações sociais,
opiniões e atitudes que deverá fornecer subsídios para sugerirmos e/ou elaborarmos
estratégias de ação em dois níveis de intervenção que podem ser adaptados às ações junto à
escola:
Participantes
Os participantes deste estudo foram 156 pessoas entre 18 a 79 anos, cidadãos e cidadãs
transeuntes da praça principal da Cidade de Lorena, na ocasião de uma ação do Curso de
Psicologia da UNISAL.
Os transeuntes eram convidados a participarem por adesão
espontânea após explicação dos objetivos da pesquisa, constituindo, assim, estatisticamente,
amostras de conveniência.
Local, materiais e equipamentos
Cidade de Lorena, SP. Praça principal e bairros da cidade. Materiais utilizados:
folhas de sulfite, impressão e canetas; Equipamentos: computador e impressora.
Instrumentos e coleta de dados
Foi utilizado um questionário semi-estruturado dividido em duas partes. A primeira
parte identificava o participante: sexo, idade, religião, profissão, etnia, escolaridade. A
38908
segunda parte do questionário consta duas questões abertas: O que você imagina que seja
homofobia? O que você imagina que seja homossexualidade?
Procedimentos
Foram feitas previamente uma formação para os aplicadores da entrevista, para que
seguissem a metodologia correta de aplicação, proporcionando dados fidedignos para análise.
A análise foi feita em equipe para maior assertividade e consenso quanto as
conotações traçadas nos resultados.
Plano de análise dos dados
Os dados foram tabulados e analisados de forma quantitativa e qualitativa.
As
respostas dos participantes foram categorizadas através de cinco modelos explicativos
propostas por Lacerda, Pereira e Camino (2002) para classificar o discurso sobre a
homossexualidade representada por uma amostra populacional, são elas: biológicas, éticomorais, religiosas, psicológicas e psicossociais. A organização dos dados foi realizada por
meio de agrupamento e sistematização de respostas emitidas no discurso dos participantes,
onde foram identificadas e classificadas as emissões mais significativas e a frequência com
que aparecem.
Resultados
O total de participantes foi de 156 pessoas. No que concerne ao sexo, 54,49% (85)
eram do sexo masculino, 44,87% feminino (70) e apenas 0,64% não foi especificado (1). A
idade variou de 18 a 79 anos, onde 36,54% representaram idades de 18 a 29 anos, 39,74% de
30 a 59 anos, 23,08% de 60 a 79 anos.
O Gráfico 1 a seguir apresente as respostas emitidas pelos participantes agrupadas nas
categorias referentes as explicações sobre homossexualidade criadas por Lacerda, Pereira e
Camino (2002). As explicações se apresentam nas perguntas ‘O que você imagina que seja?’
em relação ao homossexual, ‘porquê?’ sobre a aceitação ou não do indivíduo e por fim a
pergunta ‘Qual a sua opinião sobre a homossexualidade?’, que foram analisadas
38909
conjuntamente em virtude de haver respostas repetidas e incoerência de respostas com o que
foi questionado, respondendo assim em outro momento.
Entre as partes que mais se destacam, a Explicação Psicossocial teve 48 respostas de
conotação não homofóbica, e apenas uma com conotação homofóbica, e também foi a
explicação mais usada, por 49 pessoas. As que não puderam ser categorizadas obteve o
segundo maior número de respostas, com 45, essas respostas não foram possíveis identificar
uma explicação que fique dentro das outras cinco, porém foi possível classificar quais tinham
conteúdo homofóbica ou não.
Gráfico 1: Explicações sobre Homossexualidade no ao de 2014
60
50
40
30
20
10
0
Resposta Neutra
Conotação não Homofóbica
1
1
1
0
1
Não
Categorizado
22
8
12
0
48
3
14
Conotação Homofóbica
7
13
5
1
17
9
Biológica
Conotação Homofóbica
Éticos-Moral Psicólogica
Psicossocial
Religiosa
Conotação não Homofóbica
Resposta Neutra
Fonte: Os autores.
A Explicação Religiosa teve a maior frequência envolvendo respostas de conotação
preconceituosa, com 17 de 21 do total. Uma explicação que obteve 5 respostas de conotação
homofóbica e uma resposta neutra foi a Explicação Psicológica, as demais explicações como
a Biológica e a Ético-Moral, ficaram equilibradas em termos de respostas de conotação
preconceituosa ou não.
Para maior clareza de quantas respostas de conotação homofóbica, conotação não
homofóbica e as respostas neutras, segue Gráfico 2:
38910
Gráfico 2: Conotação das Respostas apresentadas no Ano de 2014.
17%
30%
Conotação
Homofóbica
Conotação Não
Homofóbica
Resposta Neutra
53%
Fonte: Os autores.
O maior número de respostas dos participantes foi classificado como Conotação Não
Homofóbicas, com 53%, as respostas com Conotação Homofóbica tiveram um percentual de
30% e por fim 17% das respostas foram neutras.
Sobre a aceitação da homossexualidade no ano de 2014, segue o Gráfico 3 logo
abaixo, referente à pergunta “Você aceita?”:
Gráfico 3: Aceitação referente a Homossexualidade
Você aceita?
43,60%
41,70%
12,20%
Aceita
Não aceita
2,50%
É indiferente
Não
responderam
Fonte: Os autores.
Destaca-se que as opções ‘Aceita’ e ‘É indiferente’ foram as mais escolhidas, tendo a
porcentagem muito próxima, com 41,70% e 43,60% respectivamente. A opção ‘Não aceita’
foi pouco escolhida e a ‘Não responderam’ obteve o menor número dentre elas.
Discussão
Cabe analisar no que se refere à aceitação do homossexual nas questões objetivas
(Gráfico 3), grande parte indicou aceitar os homossexuais e a maior porcentagem afirmou ser
38911
indiferente ao mesmo, com 41,70% e 43,60% respectivamente, muito poucos disseram que
não aceitam. Com o grande número de respostas indiferentes ao homossexual, fica a pergunta
sobre o que seria essa indiferença, se ela seria com uma conotação de que não faz diferença a
questão da sexualidade ou que, se em uma situação de homofobia a pessoa ficaria aquém ao
homossexual. Na tabulação dos mesmos, observa-se que muitos dizem aceitar o homossexual,
porém, nas respostas abertas muitos delimitam a sua aceitação, deixando a suposição que a
aceitabilidade vai até o homossexual se manifestar como homossexual, ou seja, se o
homossexual sai do anonimato, subtende-se pelas respostas que haverá uma resistência a sua
aceitação, configurando-se como um preconceito velado de aceitação. O indiferente seria
indiferente à pessoa homossexual ou à qualquer atitude que seja contra o homossexual?
Dentro da proposta de Lacerda, Pereira e Camino (2002) sobre os cinco conjuntos
explicativos sobre a homossexualidade e seguindo a linha exposta nos resultados, as respostas
classificadas como contendo explicações psicológicas e religiosas tiveram em sua maioria,
conotação homofóbica. Sobre a explicação psicológica, ressalta-se que as respostas tinham
conteúdos relacionando a homossexualidade aos traumas de infância, ausência de atenção dos
pais, distúrbios psicológicos e outros. Já no caso das respostas de cunho religioso, a maioria
relacionava o pecado à homossexualidade, dizendo que Deus fez apenas o homem e a mulher.
De que forma essas duas classificações como pecado e trauma de infância estariam ligadas na
construção do preconceito? Um detalhe importante é que 75,64% dos participantes se
declararam católicos, sendo 93,59% cristãos, juntando católicos e evangélicos/protestante, ou
seja, cada categoria está diretamente ligada a essa esse dado em sua maioria.
Porém, cabe destacar o expressivo número de respostas relacionadas a explicações
psicossociais, e com respostas sem conotação homofóbica, ou seja, reflete uma maior
compreensão da sexualidade humana, abrangendo de forma correta a homossexualidade, não
atribuindo causas religiosas, ético-morais, psicológica e biológica. Exemplo de resposta: “A
pessoa não escolhe, é uma coisa natural para ela, como é natural pra mim ser hétero”.
Contudo, as explicações biológicas e ético-morais apresentaram em média explicações
de conotação homofóbica sobre o que seria a homossexualidade, procurando explicar usando
termos como problemas genéticos, disfunções hormonais, problemas hereditários, falta de
vergonha na cara, pessoa imoral, falta de respeito e etc. Um exemplo de fala que
costumeiramente aparece para a explicação ético-moral: “Acho pouca vergonha”; “é falta de
formação das pessoas”.
38912
Assim, reunindo todas essas afirmações, 53% foram caracterizadas com conotação não
homofóbica, 30% com conotação homofóbica e 17% com resposta neutra. Porém, cabe
questionar que o discurso pode muitas vezes não refletir o real posicionamento dos
participantes, porque, como já descrito à cima, a aceitação é muitas vezes conveniência para o
discurso, no qual respostas como, por exemplo: “cada um faz o que quer desde que não me
atrapalhe”, é constante nas entrevistas, esses discursos não expressam uma verdadeira aversão
ao homossexual, mas à medida que o homossexual “atrapalha” a vida de outrem, fica
subtendido que a ação preconceituosa estaria justificada, configurando como homofobia.
Desta forma, mesmo com o discurso nas entrevistas podendo não refletir o real
posicionamento moral dos participantes, tem-se muitas respostas flagrantes de conotação
homofóbica, além do número expressivo de pessoas indiferentes à aceitação do homossexual.
Essas questões alertam para a necessidade de um maior incentivo a propagação dos Direitos
Humanos, não só com políticas públicas visando o público adulto, como os entrevistados
nesta pesquisa, mas também com uma educação voltada para o ensino básico, com promoção
da igualdade e respeito às diversas formas de expressões afetivas. Só assim, em larga escala,
esses números tenderão a mudar, passando de preconceito velado à aceitação flagrante e
atuante, como proposta de cidadania efetiva a todos.
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A REPRESENTAÇÃO SOCIAL DE UMA POPULAÇÃO SOBRE A