Abordagem molecular na alergia a veneno de himenópteros Elisa Pedro Assistente Graduada Sénior de Imunoalergologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE – Hospital de Santa Maria. A percentagem de anafilaxia por picada de himenóptero na população geral é superior a 3%, mais frequentemente com abelha ou vespula. O diagnóstico de alergia a veneno de himenópteros é baseado na história clínica, testes cutâneos (TC) positivos e IgE específicas (IgEs) positivas para o veneno de abelha, vespa ou polistes, com o objetivo de identificar o inseto responsável pela reação. A triptase sérica basal deve ser doseada nos casos de reação sistémica (RS) grave. Os TC positivos e a presença de IgEs são devidos a estruturas homólogas primárias (hialuronidase, dipeptidil peptidases IV, vitelogeninas) e a CCDs (cross-reactive carbohydrate determinants) que estão presentes na maioria dos alergénios dos venenos. Estima-se que mais de 30% dos doentes com história de RS têm TC negativos para todos os venenos, geralmente pela limitada sensibilidade dos extratos alergénicos utilizados nos TC, e que destes 57% também têm IgEs negativas. Por outro lado mais de 59% dos doentes com alergia ao veneno de himenóptero revelam dupla positividade nas IgEs para abelha e vespula, nestes casos são necessários exames laboratoriais adicionais e os alergénios recombinantes podem ser úteis para o diagnóstico correto. Os principais alergénios específicos de espécie com reconhecido valor diagnóstico são: Api m 1 para Apis mellifera, Ves v 1 e Ves v 5 para Vespula vulgaris e Pol d 5 para a Polistes dominulus. A fosfolipase A2 (Api m 1) é o principal alergénio da abelha enquanto o antigénio 5 (Ves v 5 e Pol d 5) é o principal alergénio dos vespídeos. A hialuronidase (Api m 2, ves v 2, pol d 2) comum aos três venenos é responsável pela reatividade cruzada. Os CCD (cross-reactive carbohydrate determinants) têm fraca sensibilidade. Nos casos de dupla positividade nos TC e/ou nas IgEs pode tratar-se de verdadeira dupla sensibilização primária ou de reatividade cruzada. Existe reatividade cruzada imunológica significativa entre Apis e Bombus, e entre Vespides (Vespula, Vespa e Dolichovespula). A reatividade cruzada entre Vespides, Apis e Polistes é reduzida e não há reatividade cruzada entre polistes europeia e polistes americana. 1 No diagnóstico de alergia ao veneno de abelha a determinação de um único alergénio recombinante pode ser limitada porque a Api m 1 deteta apenas 72% dos casos de alergia, a Api m 10 (icarapina) está presente em 61% dos casos e a Api m 3 em 50%. Isto pode explicar também a ausência ou fraca resposta á imunoterapia (IT) com veneno de abelha, apenas 80-90% dos doentes ficam totalmente protegidos e 20-40% têm efeitos secundários com a vacina. A icarapina que é um alergénio relevante exclusivo da abelha existe apenas em quantidades reduzidas nos extratos para IT. Conclusão: A análise de um painel de alergénios recombinantes aumenta a sensibilidade do diagnóstico de alergia ao veneno de himenópteros, comparativamente com um alergénio isolado e permite distinguir entre dupla sensibilização primária e reatividade cruzada nos casos de dupla positividade nos testes cutâneos e IgE específicas. Bibliografia 1- Mittermann I, Zidarn M, Silar M, Markovic-Housley Z, Aberer W, Korosec P, Kosnik M, Valenta R. Recombinant allergen-based IgE testing to distinguish bee and wasp allergy. J Allergy Clin Immunol 2010;125:1300-7. 2- Sastre J. Molecular diagnosis in allergy. Clin Exp Allergy. 2010;40(10):1442-60. 3- Monsalve RI, Vega A, Marqués L, Miranda A, Fernández J, Soriano V, Cruz S, Domínguez-Noche C, Sánchez-Morillas L, Armisen-Gil M, Guspí R, Barber D. Component-resolved diagnosis of vespid venom-allergic individuals: phospholipases and antigen 5s are necessary to identify Vespula or Polistes sensitization. Allergy 2012;67:528–536. 4- Shin YS, Liu JN, Hur GY, Hwang EK, Nam YH, Jin HJ, Lee SM, Ye YM, Nahm DH, Park HS. Clinical Features and the Diagnostic Value of Component Allergen-Specific IgE in Hymenoptera Venom Allergy. Allergy Asthma Immunol Res. 2012;4(5):284-9. 5- Eberlein B, Krischan L, Darsow U, Ollert M, Ring J. Double positivity to bee and wasp venom: Improved diagnostic procedure by recombinant allergen– based IgE testing and basophil activation test including data about crossreactive carbohydrate determinants. J Allergy Clin Immunol 2012;130:155-61. 2 6- Canonica GW, Ansotegui IJ, Pawankar R, Schmid-Grendelmeier P, van Hage M, Baena-Cagnani CE, Melioli G, Nunes C, Passalacqua G, Rosenwasser L, Sampson H, Sastre J, Bousquet J, Zuberbier T. A WAO - ARIA - GA2LEN consensus document on molecular-based allergy diagnostics. World Allergy Organization Journal 2013;6(1):17. 7- Köhler J, Blank S, Müller S, Bantleon F, Frick M, Huss-Marp J, Lidholm J, Spillner E, Jakob T. Component resolution reveals additional major allergens in patients with honeybee venom allergy. J Allergy Clin Immunol 2014;133:13839. 8- Ollert M, Blanc S. Anaphylaxis to Insect Venom Allergens: Role of Molecular Diagnostics. Curr Allergy Asthma Rep 2015;15(5):26. 9- Golden DBK. New directions in diagnostic evaluation of insect allergy. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2014;14:334–339. 10- Perez-Riverol A, Justo-Jacomini DL, Zollner RL, Brochetto-Braga MR. Facing Hymenoptera Venom Allergy: From Natural to Recombinant Allergens. Toxins 2015;7:2551-2570. Alergia a veneno de Himenóptero - Diagnóstico e Tratamento História Clínica Testes Cutâneos Testes In vitro Abelha, Vespa, Polistes IgEs: Abelha, Vespa, Polistes Triptase sérica CCD Api m 1, Ves v 1 e 5, Pol d 5 Diagnóstico Imunoterapia com veneno 3 Alergia a veneno de Himenóptero - Algoritmo de Diagnóstico IgEs Abelha + Vespa - Apis m 1 + Ves v 1, 5 - Sensibilização a veneno Abelha IgEs Abelha + ou Vespa + ou - Apis m 1 + Ves v 1, 5 + IgEs Abelha Vespa + Apis m 1 Ves v 1, 5 + Dupla sensibilização Sensibilização a veneno Vespa 48 MENSAGEM PARA MEDICINA GERAL E FAMILIAR Várias espécies de insetos podem provocar reações alérgicas, no entanto as picadas de himenópteros (abelhas, vespas e polistes) podem desencadear reações sistémicas graves ou mesmo fatais. A presença de patologia cardiovascular ou respiratória (asma) pode contribuir para o aumento da prevalência de casos fatais. O diagnóstico baseia-se na história clínica, com ênfase para o tipo de reação, fatores de risco individuais e a identificação do inseto responsável que nem sempre é fácil. Todos os indivíduos com história de reação sistémica devem efetuar testes diagnósticos para avaliar a sua sensibilização e para isso devem ser referenciados à consulta de Imunoalergologia. O estudo destes doentes inclui testes cutâneos em picada e intradérmicos e a determinação das IgE específicas aos vários venenos. No tratamento das reações sistémicas graves o fármaco de primeira linha é a Adrenalina intramuscular na dose de 0,30 – 0,50 mg no adulto e 0,01 mg/Kg nas crianças. Os doentes com história de reações sistémicas devem ser portadores de um dispositivo de Adrenalina (Anapen® Adulto – 0,3 mg e Júnior 0,15 mg) para autoadministração e ser ensinados como e quando o devem utilizar. A imunoterapia com veneno de himenóptero está indicada em doentes com história de reações sistémicas graves e sensibilização documentada ao inseto agressor. 4 MENSAGEM PARA A POPULAÇÃO EM GERAL Uma picada de abelha ou vespa pode provocar uma reação alérgica grave que pode ser fatal. O seguimento em consulta de Imunoalergologia permite estabelecer um diagnóstico correto através de testes cutâneos e análises de sangue. A vacina antialérgica com o veneno do inseto ao qual o doente é alérgico é o único tratamento capaz de prevenir futuras reações. Todos os doentes com história de reação grave devem ser portadores de um dispositivo de Adrenalina para autoadministração. 5