Copyright 1995 © Patricia E. Deegan PhD
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RECUPERAÇÃO COMO UMA VIAGEM DO CORAÇÃO
Patricia E. Deegan, PhD
Este artigo apareceu no Psychiatric Rehabiliction Journal, 1956 19(3) e foi reproduzido com
permissão
Este artigo foi originariamente apresentado na Aliança para a Saúde Mental de
Massachusetts/Departamento de Saúde Mental de Massachusets Conferência do Comitê de
Curriculum e Treinamento da Prefeitura de Massachusets em 10 de maio de 1995.
Eu gostaria de agradecer por esta oportunidade para falar com vocês hoje. Eu estou
especialmente satisfeita por estar falando para muitos universitários e supervisores desta esfera.
Sua tarefa é muito importante. Vocês estão ensinando estudantes os quais tornar-se-ão amanhã
profissionais de saúde mental. A mensagem que eu gostaria de trazer a vocês hoje é que não é o
bastante ensinar a eles fatos, formas e conhecimento. Nós devemos, também, ajudar os estudantes
a buscar sabedoria.
Existe uma diferença entre conhecimento e sabedoria. A raiz etmológica da palavra
knowledge (conhecimento) vem do Inglês Antigo , recognize (reconhecer).E de fato estudantes
das várias disciplinas relacionadas com saúde mental são exigidos reconhecer e dominar um
específico campo de conhecimento. É exigido deles saber como conduzir uma inquirição
empírica, formular descobertas, contribuir para modelos teóricos, aprender experiências clínicas,
etc. Contudo os estudantes não são estimulados a procurar sabedoria. Wisdon (sabedoria) vem do
Greco eidos e idein o que significa ver a forma ou essência do que é. Portanto a maioria dos
estudantes emerge dos seus estudos cheios de conhecimento ou a habilidade para reconhecer as
coisas, mas eles são faltos de sabedoria ou habilidade para ver a forma ou a essência do que isto é.
Por exemplo, quando nós ensinamos nossos estudantes sobre o coração nós os ensinamos
que o coração é uma bomba: um tipo de máquina orgânica com válvulas e câmaras. E realmente,
na mesma hora eles aprendem a reconhecer a anatomia do coração em todos os seus detalhes.
Depois passando com sucesso por seu exame final de anatomia nós dizemos, "Este estudante sabe
sobre coração.” Mas em sabedoria nós teríamos que duvidar desta colocação.
Sabedoria procuraria a forma ou a essência do coração. Dentro da sabedoria nós veríamos que o
coração anatômico que nós temos dado a nossos estudantes para estudar, é um coração sem dono
(is a nobody heart). Este é um coração que poderia não pertencer a ninguém e que, portanto,
pertence a corpo algum. Sabedoria teria nos feito entender que existe um outro coração. Existe
um coração que nós conhecemos de muito antes que fôssemos ensinados que o coração é uma
bomba. Eu estou falando aqui do coração que pode quebrar; o coração que se torna fraco, o
coração endurecido; o sem coração; o coração gelado; o coração que dói; o coração que para; o
coração que bate com alegria e alguém que perdeu seu coração. Sabedoria pede que nós
ensinemos aos estudantes de ciências humanas sobre a essência do coração. O coração humano.
Não a bomba que bate em qualquer corpo, mas a única que vive em meu corpo e no seu corpo.
De maneira similar nós passamos adiante o conhecimento sobre a doença mental.
Estudantes saem das escolas com conhecimento sobre neurotransmissores e esquizofrenias e
bipolares e borderlines and multiples e OCDs. Eles se tornaram especialistas em reconhecer
doença e enfermidade. Mas isto é onde nós tão freqüentemente falhamos. Nós falhamos por não
os termos ensinado a procurar a sabedoria para mudar além do mero reconhecimento, de forma a
buscar a essência do que isto é. Nós temos falhado em ensiná-los a reverenciar o ser humano o
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Tanto quanto o genérico, anatômico coração não existe, nem o esquizofrênico ou o múltiplo ou o
bipolar existem, fora de um genérico livro didático. O que existe, no verdadeiro existencial
sentido, não é uma doença ou enfermidade. O que existe é um ser humano e a sabedoria exige que
nós vejamos e reverenciemos este ser humano antes de tudo mais. Sabedoria pede que nós
entremos sinceramente num relacionamento com seres humanos de forma a entendê-los e à
experiência deles. Somente então seremos capazes de ajudá-los em uma forma que é experenciada
como de ajuda.
Aqueles de nós que têm sido rotulados com doença mental são primeiramente e antes de
tudo, seres humanos. Nós somos mais do que a soma da atividade eletroquímica de nossos
cérebros. Nossos corações não são meramente bombas. Nossos corações são tão reais e tão
vulneráveis e valiosos quanto os vossos. Nós somos pessoas. Nós somos pessoas que têm
experenciado grandes aflições e que encaramos o desafio da recuperação.
O conceito de recuperação está enraizado na simples mas profunda compreensão de que as
pessoas diagnosticadas com doença mental são seres humanos. Como um pedregulho atirado no
centro de uma piscina imóvel, este simples fato irradia em sempre mais largas ondulações até que
cada canto da acadêmica e aplicada ciência de saúde mental e prática clínica são afetadas.
Aqueles de nós que têm sido diagnosticados não somos objetos parta agirem sobre nós. Nós
somos sujeitos humanos completos, que podem agir e, em agindo, mudar nossa situação. Nós
somos seres humanos e podemos falar por nós mesmos. Nós temos uma voz e podemos aprender a
usá-la. Nós temos o direito de sermos ouvidos e de ouvirmos. Nós podemos nos tornar
autodeterminados. Nós podemos nos erguer em direção ao que está nos afligindo e não
precisamos ser vítimas passivas de uma doença. Nós podemos tornar-nos "experts" em nossa
própria viagem de recuperação.
O objetivo da recuperação não é alcançar a corrente principal. Nós não queremos ser a
corrente principal. Nós falamos em deixar a corrente principal tornar-se uma larga corrente que
tenha lugar para todos nós e que não deixe ninguém encalhado nas margens.
O objetivo do processo de recuperação não é tornar-se normal. A meta é abraçar nossa
vocação humana de nos tornarmos mais profundamente , mais inteiramente humanos. A meta não
é a normalização. A meta é nos tornarmos únicos, impressionantes, jamais sermos seres humanos
repetidos como nós somos ditos ser. O filósofo Martin Heidegger disse que ser humano significa
ser uma questão a procura de uma resposta. Aqueles de nós que têm sido rotulados com doença
mental não são o fato desculpado da tarefa mais fundamental de tornar-se humano. De fato porque
muitos de nós têm experenciado nossas vidas e sonhos estilhaçados no despertar da doença
mental, um dos maiores desafios que encaramos é perguntar, "Quem posso eu me tornar e porque
eu diria SIM para a vida?"
Ser humano significa ser uma questão em busca de uma resposta. Contudo, muitos de nós
que temos sido rotulados psiquiátricamente temos recebido mensagens de profissionais as quais
em efeito dizem-nos que, em virtude do nosso diagnóstico, a questão do nosso "ser" já foi
respondida e nossos futuros já estão selados . Por exemplo, eu posso relembrar de uma vez
durante minha terceira hospitalização. Eu estava com dezoito anos de idade.
Eu perguntei ao psiquiatra que estava me atendendo, "O que está errado comigo?" Ele disse
"Você tem uma doença chamada esquizofrenia crônica. É uma doença como a diabete. Se você
tomar medicações pelo resto de sua vida e evitar o estresse, então, talvez você possa enfrentá-la."
E quando ele falou aquelas palavras eu pude sentir o peso delas esmagando minhas já frágeis
esperanças, sonhos e aspirações para minha vida. Mesmo vinte-e-dois anos depois, aquelas
palavras ainda ecoam como uma assombrada memória que não se apaga.
Hoje eu entendi porque esta experiência foi tão danosa para mim. Em essência o psiquiatra
estava dizendo que minha vida, em virtude de ser rotulada com esquizofrenia, era já um livro
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Quando o futuro é fechado desta maneira, então, o presente perde sua orientação e torna-se nada
senão uma sucessão de momentos sem relação. Hoje eu sei que este psiquiatra tinha pouca
sabedoria naquele tempo. Ele tinha meramente algum conhecimento e reconheceu-me como "a
esquizofrênica" que tinha sido manejada através das gerações por Kraeplin e Bleuler. Ele não me
viu. Ele viu uma doença. Nós devemos incitar nossos estudantes a procurar sabedoria, mover-se
além do mero reconhecimento da doença e com entusiasmo encontrar o ser humano que vem por
socorro. É imperativo que nós ensinemos estudantes que relacionamento é a mais poderosa
ferramenta que eles têm no trabalho com as pessoas.
Além do objetivo da recuperação, existe a questão do processo de recuperação. Como
alguém entra num processo de recuperação? Hoje eu diria que como começar uma
conceitualização de recuperação como uma viagem do coração. Nós começaremos neste lugar
onde muitas pessoas se encontram, naquele lugar de ser duro de coração e não cuidar de nada
mais.
Antes de tudo, para tornar-nos participantes ativos em nosso próprio processo de
recuperação, muitos de nós nos encontramos em um momento de grande apatia e indiferença. É
um tempo de ter um endurecido coração. De não: cuidar de mais nada. Esta é uma hora em que
nos sentimos estar entre os vivos-mortos: sozinhos, abandonados e à deriva sobre um mar morto e
silencioso sem curso ou sustento. Se eu voltasse meu olhar para trás poderia ver a mim mesma aos
dezessete anos, diagnosticada com esquizofrenia crônica, drogada com Haldol e sentada em uma
cadeira. Como eu conjuro a imagem, a primeira coisa que posso ver são os dedos amarelos
manchados de nicotina daquela garota. Eu posso ver seu arrastado, rijo e drogado caminhar. Seus
olhos não dançam. A dançarina colapsou, seus olhos são escuros e fitam interminavelmente em
lugar nenhum.
Pessoas vêm e pessoas vão. Pessoas estimulam-na a fazer coisas para se ajudar a si própria,
porém seu coração está duro e ela não cuida de mais nada, exceto dormir, sentar e fumar cigarros.
Seus dias consistem disto: às oito da manhã ela força a si mesma para fora da cama. Em um a
drogada neblina ela senta em uma cadeira, a mesma cadeira todos os dias. Ela começa fumando
cigarros. Cigarro após cigarro. Cigarros marcam a passagem do tempo . Cigarros são a prova de
que o tempo está passando e este fato, ao menos, é um alívio. Desde as nove horas da manhã ela
senta e fuma e olha. Então ela tem almoço. À uma hora da tarde ela vai de volta para a cama
para dormir até `as três horas. Nesta hora ela retorna para a cadeira e senta e fuma e olha. Então
ela tem janta. Então retorna para a cadeira às seis da tarde. Finalmente são oito horas da noite, a
longamente esperada hora, o tempo de ir de volta para a cama e colapsar em um sono drogado e
sem sonhos.
O cenário que se desdobra no próximo dia e no próximo e então, no próximo, até que os
meses passam em entorpecida sucessão, marcada somente pelo próximo cigarro e o próximo...
Durante este tempo pessoas tentaram me motivar. Lembro-me de pessoas tentando fazer
com que eu participasse na compra de comida às quartas-feiras ou ajudar a fazer pão ou ir em uma
corrida de barcos. Mas nada nem ninguém me tocava ou mudava ou importava. Eu tinha desistido.
Desistir era uma solução para mim. O fato que eu era "desmotivada" era visto como um problema
pelas pessoas que trabalhavam comigo. Mas para mim, desistir não era um problema, era uma
solução Era uma solução porque me protegia de querer alguma coisa. Se eu não quisesse coisa
alguma, então não poderia ser levada fora. Se eu não tentasse, então eu não teria que sofrer por
outro fracasso. Se eu não cuidasse, então nada poderia ferir-me outra vez. Meu coração tornou-se
endurecido. A primavera veio e foi e eu não cuidei. Feriados vieram e foram e eu não cuidei.
Meus amigos acabaram o colégio e começaram novas vidas e eu não cuidei. Uma amiga a quem
eu tinha uma vez amado muito veio me visitar e eu não cuidei. Eu relembro sentada e fumando,
não dizendo quase nada. E tão logo o relógio bateu oito horas eu relembro de interromper minha
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mesmo dizer adeus eu dirigí-me para minha cama. Meu coração estava duro. Eu não cuidava a
respeito de coisa alguma.
Eu confio que o retrato que eu estou pintando aqui é familiar para muitos. Nós
reconhecemos este quadro de apatia, retiramento, isolação e falta de motivação. Mas se nós vamos
além do mero reconhecimento a procura da sabedoria, nós devemos cavar mais profundo. O que é
esta apatia, indiferença, dureza de coração que mantém tantas pessoas em um modo de
sobrevivência e previne-os de entrarem inteiramente na sua própria viagem de recuperação? São,
simplesmente, os sintomas negativos da esquizofrenia? Eu penso que não. Eu acredito que
tornarem-se duros de coração e não cuidarem de coisa alguma é uma estratégia que pessoas
desesperadas que estão à beira de perder a esperança, adotam para permanecerem vivas.
Esperança não é apenas um sonoro eufemismo. Esperança e vida biológica são inextricavelmente
interligadas. O trabalho de Martin Seligman (1975) no campo de ensino ao desamparado oferecenos uma grande visão dentro da química da interferência entre a esperança e a vida biológica. Ele
vê dois exemplos. O primeiro e uma reportagem publicada pelo Dr. H .M. Lefcourt (1973):
Este escritor testemunhou um caso de morte devida a uma perda de vontade dentro de um hospital
psiquiátrico. Um paciente do sexo feminino que havia permanecido em um estado de mudez por
aproximadamente dez anos foi transferida para um piso diferente de sua construção junto com suas
companheiras do andar, enquanto sua unidade estava sendo redecorada. O terceiro andar da
unidade psiquiátrica aonde as pacientes em questão tinham estado vivendo era conhecido entre os
pacientes como o andar dos crônicos, sem esperança. Em contraste, o primeiro andar era mais
comumente ocupado por pacientes que mantinham privilégios, incluindo a liberdade de ir e vir no
pátio do hospital e nas ruas ao redor dele. Encurtando , o primeiro andar era uma enfermaria de
saída do qual os pacientes poderiam antecipar a dispensa bastante rapidamente. Todos os pacientes
que foram temporariamente mudados do terceiro andar foram examinados medicamente antes da
mudança, e os pacientes em questão foram julgados gozar de excelente saúde, embora ainda mudos
e isolados. Pouco depois de transferida para o primeiro andar, esta paciente psiquiátrica crônica
surpreendeu o pessoal da enfermaria transformando-se em socialmente responsável, assim que
dentro do período de duas semanas ela deixou de ser muda e estava já se tornando gregária. Como
era de se esperar, a redecoração do terceiro andar foi logo completada todos os residentes
anteriores foram retornados para lá. Dentro de uma semana ela havia retornado para a unidade sem
esperança, e esta paciente... colapsou e morreu. A subsequente autópsia não revelou nenhuma
patologia digna de nota e foi excentricamente sugerido, naquele momento, que a paciente havia
morrido de desespero. (p.l82-l83).
O segundo exemplo é o de um oficial médico do exército chamado Major F. Harold
Kushner. Major Kushner foi atingido por um disparo no Vietnam do Norte e estava internado em
um campo de prisioneiros de guerra desde 1968 até 1973. Aqui é como o Dr. Selingman relata a
estória:
Quando o Major Kushner chegou ao Primeiro Campo, Robert já estava cativo pôr dois anos. Ele
era um acidentado e inteligente cabo de uma fendida unidade da marinha, austero, estóico e
preparado para a dor e sofrimento. Ele estava com vinte e quatro anos de idade... Como o restante
dos homens, ele estava fraco para um peso de vinte pounds e era forçado a fazer longas
caminhadas descalço, diariamente, com noventa pounds de raízes marinhas nas costas. Ele nunca
reclamou. A despeito da má nutrição e da terrível doença de pele, ele permaneceu em muito boa
saúde física e mental. A causa da suja relativamente boa forma era clara para (major) Kushner.
Robert estava convencido de que logo seria libertado. Os vietcongs tinham executado uma prática
para libertação, por exemplo, uns poucos homens que tinham colaborado com eles... e Robert tinha
feito assim e, o comandante do campo havia indicado que ele era o próximo na fila para a soltura,
que viria em seis meses...
O (designado) mês chegou e foi e (Robert) começou a sentir uma mudança nas atitudes dos
guardas em relação a ele. Finalmente caiu em sí que havia sido enganado, que não estava para ser
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trazê-lo de volta. Eles o abraçavam, embalavam e como isto não funcionava, tentaram trazê-lo para
fora do seu estupor usando os seus punhos. Ele defecava e urinava na cama.
Depois de poucas semanas foi evidente para Kushner que Robert estava moribundo, e, embora, por
outro lado, sua forma física ainda estivesse melhor do que a da maioria dos outros, ele estava
sombrio e cianótico. Nas primeiras horas da manhã de novembro ele deitou e morreu nos braços de
Kushner. Pela primeira vez em dias, seus olhos focalizaram e ele falou: “Doc, Post Office Box
161, Texarkana, Texas. Mamãe, papai, eu amo vocês muito...” Dentro de segundos ele estava
morto. (p.168).
Esperança de liberdade era o que mantinha Robert. Quando ele desistiu da esperança,
quando ele acreditou que todos os seus esforços tinham falhado e continuariam a falhar, ele
morreu. Pode um estado psicológico ser letal? Eu acredito que pode. Quando animais e homens
aprendem que suas ações são fúteis e que não existe nenhuma esperança, eles se tornam mais
suscetíveis para a morte. Contrariamente a crença no controle sobre o ambiente pode prolongar a
vida.
Para parafrasear eu diria que, quando aqueles de nós com incapacidades psiquiátricas
vimos a acreditar que todos os nossos esforços são inúteis; quando nós experenciamos que não
temos nenhum controle sobre nosso envolvimento; quando nada do que parece nos preocupar ou
fazer, faz a situação melhor; quando nós seguimos os termos das instruções do tratamento e
alcançamos os seus objetivos de tratamento para nós e nem mesmo assim existe lugar algum para
nós na comunidade; quando nós tentamos uma medicação após outra, após outra e nenhuma delas
parece ser de qualquer ajuda; quando nós descobrimos que o pessoal do hospital não nos ouve e
que ainda tomam todas as maiores decisões por nós; quando o pessoal decide aonde nós
viveremos, com quem nós viveremos, sob quais papéis nós viveremos, como nós gastaremos
nosso dinheiro, se nos for permitido gastar nosso dinheiro; quando nós teremos de deixar o grupo
de casa, e, a que horas nos permitirão voltar para lá, etc., etc.; etc., então, um profundo sentido de
desesperança, de desespero começa a assentar sobre o coração humano. E em um esforço para
desviar os biologicamente desastrosos efeitos da profunda falta de esperança, pessoas com
incapacidades psiquiátricas fazem o que outras pessoas fazem.
Nos tornamos duros de coração e tentamos parar de cuidar. É mais fácil tornar-se desamparado do
que tornar-se sem esperança.
Naturalmente, o grande perigo é que o pessoal não reconheça a intensidade da luta
existencial que a pessoa que é dura de coração está se debatendo. O perigo é que o pessoal dirá
simplesmente, "Oh, esta pessoa tem somente um pouco de sinais negativos e sintomas e isto é um
pobre prognóstico e não devemos esperar muito dessa pessoa." Ou o pessoal pode tornar-se
judicioso e dispensar-nos sendo relaxados e desmotivados .Ou o pessoal pode sucumbir ao seu
próprio desespero: e simplesmente escrever sobre nós como sendo "baixo funcionamento”.
É imperativo que os instrutores e treinadores da próxima geração de profissionais de saúde
mental ajudem os estudantes de hoje a desviar destas ciladas. É imperativo que os estudantes
sejam auxiliados a entender que seres de coração endurecido e descuidados são altamente
motivados, adaptativas estratégias usadas por pessoas desesperadas que estão em grande risco de
perderem a esperança. Nós devemos ajudar nossos estudantes a entender e enfatizar com a
profunda luta existencial que está no coração desta escura noite de desespero.
Existem um número de coisas que eu falo para os estudantes sobre como trabalhar com
pessoas que aparentam ser duras de coração, apáticas e desmotivadas. Primeiro eu ajudo o
estudante a compreender o comportamento nos termos de sua significância existencial. Eu quero
que o estudante agarre a magnitude do que ele está pedindo a uma pessoa para arriscar quando
pede a ela que comece a cuidar de qualquer coisa novamente. Eu quero que eles compreendam
que sob um endurecido coração jaz um coração quebrado. Quão muito sofrimento, quão muita
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tal vulnerável coração. Estudantes devem ser ajudados a honrar a estratégia de desistir e entender
que talvez essa pessoa nunca se arriscará outra vez.
Em todo o caso, é somente a pessoa a qual nós estamos tentando ajudar que tem o poder para
assumir o risco, para cuidar de alguma coisa, alguma coisa tão simples talvez quanto cuidar
bastante colocar um pôster na parede do seu quarto, ou cuidando bastante para vestir algumas
novas roupas ou tentar uma colocação num trabalho. Estas podem parecer pequenas coisas mas se
nós entendermos sua completa significância existencial, tais atos serão pequenos passos em
direção ao cuidado, em direção a admitir que eu posso querer participar da comunidade humana
outra vez. Em segundo lugar eu peço aos estudantes para que suspendam suas percepções das
pessoas como pacientes mentais crônicos e tentem ver o indivíduo como um herói. Eu pergunto a
eles, poderiam vocês ter sobrevivido ao que este indivíduo tem sobrevivido? Talvez este
indivíduo tenha feito o que vocês não pudessem fazer. Talvez eles não sejam fracos e frágeis
pessoas doentes. Talvez aqueles de nós com incapacidades psiquiátricas sejamos incrivelmente
mais fortes e tenhamos espíritos ferozmente persistentes. Poderiam vocês viver com $5,30 ao mês
e negociar com uma incapacidade ao mesmo tempo? Se um estudante puder momentaneamente
escorregar fora da sua distanciada postura profissional e, com verdadeira humildade, vier a ver
esta pessoa que tem uma incapacidade psiquiátrica como um herói sobrevivente, então eu digo
que lá está um bom prognóstico para aquele estudante. Este estudante tem a chance de ser
humano de coração enquanto trabalha nos serviços humanos e isto não é nenhum pequeno
talento.
Finalmente, eu tentarei ajudar os estudantes a entenderem que, embora eles não tenham o
poder para mudar ou motivar a pessoa com incapacidade psiquiátrica que é dura de coração, eles
têm o poder para trocar o ambiente, incluindo o meio humano interativo, no qual esta pessoa é
sobrevivente. Quando trabalhando com pessoas com incapacidades psiquiátricas com dureza de
coração, que desistiram de lutar e que não é motivada nem cuida de mais nada, nós devemos
entender que esta é uma pessoa que sente que não tem poder algum. Elas experenciam que todo o
poder está nas mãos de outros.
Elas experenciam o que os psicólogos chamam de uma fonte de controle externa. Para tais pessoas
é importante criar um ambiente no qual existam escolhas a serem feitas. Eu estou falando aqui,
não de escolhas forçadas tais como, ou você toma sua medicação ou você vai de volta para o
hospital (isto é pouco mais do que coerção), mas, de reais escolhas. Eu estou falando aqui de
todos os tipos de escolhas, das pequenas preocupações tais como qual sabor de sorvete você quer,
para qual cafeteria você quer ir, para a espécie de objetivos vocacionais que você quer perseguir,
etc.
A pessoa com um endurecido coração rejeita, rejeita e rejeita novamente esta insistência
para escolher. Contudo, o pessoal não deve cair em desespero, sentir como se seus esforços
fossem inúteis, tornar-se duro de coração e parar de preocupar-se ele próprio Se eles fizerem isto,
então eles estarão fazendo exatamente o que a pessoa incapacitada psiquiátricamente está fazendo.
O assistente deve desviar-se desta armadilha. Eles devem fazer o que a pessoa não pode, ainda,
fazer. O pessoal deve desempenhar um modelo de esperança e continuar a oferecer opções e
escolhas, mais e mais vezes, mesmo que elas sejam rejeitadas..
Adicionando, o ambiente deve incluir oportunidades para as pessoas terem acuradas
informações. Informação é poder e informação compartilhada é poder compartilhado. Pessoas que
se sentem sem poder podem aumentar seu senso de auto-eficiência tendo acesso a informação.
Pessoas que se sentem sem poder também sentem que o que elas dizem não importa. Tomar
tempo para ouvir as pessoas e ajudá-las a encontrar sua própria e única voz é importante. Ter uma
voz em desenvolvendo papéis, também quanto ter uma palavra na contratação e avaliação dos
assistentes empregados, são importantes modos de exercitar uma voz que por muito longo tempo
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trabalhando com o pessoal pago. Papéis modelo suprem esperança, que talvez eu, também possa
surtir deste endurecido coração e comece a cuidar novamente.
Pessoas que se estão defendendo a si mesmas contra a possibilidade dos efeitos letais da profunda
desesperança devem ver que existe um meio fora do comum e que esta ação que eles fazem
podem empurrá-los mais perto do seu desejado objetivo. Eles necessitam ver que a qualidade de
vida pode se tornar melhor para as pessoas que tenham sido similarmente diagnosticada. Eles
precisam enxergar que existem oportunidades para melhorar sua situação. É por isto que contratar
pessoas com incapacidades mentais, como profissionais de saúde mental e enfermagem é tão
importante. É este também o porquê o comprometimento para apoio de iguais, auto-ajuda e apoio
mútuo são tão importantes.
Escolhas, opções, informação, papéis modelo, serem ouvidos, desenvolver e exercitar uma
fala, oportunidades para melhorar a vida da gente: estas são as feições de um ambiente interativo
que sustenta a transição do descuido para o cuidado, de sobreviver para tornar-se um participante
ativo no seu próprio processo de recuperação. Criar tal meio-ambiente é a experiência que,
amanhã, os profissionais de saúde mental devem ensinar.
Como por mim mesma eu não posso recordar do momento específico, quando eu dobrei
aquela esquina da sobrevivência para me transformar numa ativa participante do meu próprio
processo de recuperação. Meus esforços para proteger meu espatifado coração tornando-o duro e
sem preocupar-me com nada durou por um longo tempo. Uma coisa que eu posso recordar é que
as pessoas ao meu redor não desistiam de mim. Eles se mantiveram convidando-me a fazer coisas.
Eu lembro de um dia, por nenhuma razão particular, eu disse sim para ajudar com as compras de
comida. Tudo o que fiz foi empurrar o carrinho. Mas isto foi um começo. E verdadeiramente, foi
através de pequenos passos como este que eu, vagarosamente comecei a descobrir que eu poderia
rebelar-me contra o que me estava afligindo.
Eu sei que a raiva, especialmente a raiva indignada, joga um grande papel nesta transição.
Quando aquele psiquiatra falou-me que o melhor que eu poderia esperar era tomar minha
medicação, desviar-me do estresse e enfrentar, eu tornei-me enraivecida (Contudo eu era esperta o
bastante para manter minha irada indignação para mim mesma porque, a regra n° 1 é nunca ficar
enraivecida no consultório de um psiquiatra se você foi rotulada com esquizofrenia crônica!). Eu
também relembro que exatamente depois daquela visita eu pus na cabeça de tornar-me uma
médica. Eu estava tão ultrajada pelas coisas que tinham feito comigo, contra a minha vontade, no
hospital, quanto as que vi acontecerem às outras pessoas, que eu decidi que eu queria alcançar um
poderoso degrau e ter bastantes credenciais para dirigir um lugar de cura, eu mesma. Com efeito,
eu tinha uma missão de sobrevivente sobre a qual eu cuidava apaixonadamente.
Eu estava, também cuidadosa em não compartilhar minha recém descoberta inspiração
com ninguém. Imagine o que meu psiquiatra diria para mim se eu tivesse anunciado aos dezoito
anos, tendo virtualmente levado bomba do segundo grau. Com um combinado GRE placar abaixo
de 800, com um diagnóstico de esquizofrenia crônica, que eu estava planejando em alcançar meu
Ph. D, em psicologia clínica."Delírio de grandeza!". Mas, em essência, isto foi precisamente o que
eu fiz. Começando com um curso de Redação Inglesa no colégio local da comunidade, eu
vagarosamente fiz meu caminho. Arrastando meus livros didáticos para dentro do hospital
psiquiátrico, comigo, ou tentando ler com a visão dupla, devida ao Prolixin, eu avancei meu
caminho para adiante. Eu tinha uma forte espiritualidade que realmente ajudou. Eu tinha uma
forte ligação terapêutica com o psicoterapêuta. Eu vivi com realmente estranhos hippies, os quais
tinham tolerância por montes de estranhos comportamentos, incluindo meus episódios psicóticos.
Depois de alguma experimentação em minha precoce adolescência eu, de alguma maneira, intuí
que drogas e álcool eram novidades más para mim e eu não as usava, embora as pessoas em volta
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mim mesma e minha situação. Eu estava sempre tentando novas maneiras de lutar com os
sintomas, incluindo minhas incansáveis alucinações auditivas.
E talvez, o mais importante de tudo, quando eu levantava da cama pela manhã eu sempre sabia a
razão, porque eu tinha um propósito na vida, eu havia sido chamada, eu tinha uma vocação e eu
me mantive dizendo sim para isto. Mesmo no presente eu devo fazer uma afirmação diária da
minha vocação para me manter prosseguindo. A tentação de desistir é ainda forte, às vezes.
Minha viagem de recuperação está ainda em andamento. Eu ainda luto com sintomas,
choro as perdas que eu tenho sustentado, e, eu tenho conseguido me envolver no tratamento de
seqüela de abuso infantil. Eu sou também envolvida em auto-ajuda a suporte mútuo e eu ainda uso
serviços profissionais, inclusive medicação, psicoterapia e hospitais. Contudo, agora eu não
somente tomo a medicação ou vou para o hospital. Eu tenho aprendido a usar a medicação e a usar
o hospital. Esta é a ativa postura que é a marca do contraste do processo de recuperação.
Existe mais para o processo de recuperação do que simplesmente recuperar-se da doença
mental. Nós devemos, também, nos recuperar dos efeitos de pobreza e de cidadãos de segunda
classe. Nós devemos aprender a erguer nossa consciência e encontrar nosso orgulho coletivo, para
sobrepujar o estigma internalizado. Finalmente, muitos de nós emergimos do tratamento de saúde
mental incrustrados com traumáticos distúrbios aflitivos, relacionados com haver sofrido ou
testemunhado abuso físico, sexual, e/ou emocional nas mãos dos funcionários.
Como um veterano de longo período nos serviços de saúde mental escreveu:
A coisa através da qual eu tenho estado era como um pesadelo. Algumas vezes eu vou de
volta dentro dele. Eu choro a noite toda por disto. Relembrar é como estar outra vez no pesadelo...
Algumas vezes eu berro à noite porque causa eu sonho sobre o hospital! Eu fui estuprado em um
ou outro hospital onde eu tenho estado. (La Lime 1990)
Algumas vezes a recuperação da doença mental é a parte fácil. Recuperação daqueles
profundos ferimentos para o coração humano toma muito mais além.
Recuperação não significa cura. Recuperação é antes uma atitude, uma postura, uma
maneira de se aproximar dos desafios do dia. Não é uma perfeitamente viagem linear. Existem
momentos de rápidos ganhos e desapontantes recaídas. Existem momentos de apenas viver,
apenas estar quieto, descansando e reagrupando. A viagem de recuperação de cada pessoa é única.
Cada pessoa deve encontrar o que funciona para ela. Isto significa que nós devemos ter a
oportunidade para tentar, e tentar, e tentar novamente. Para sustentar o processo de recuperação
mental profissionais não devem nos roubar a oportunidade de falhar. Profissionais devem abraçar
o conceito de dignidade do risco e o direito à a falha se eles são nosso suporte.
Fechando, eu gostaria de acrescentar que todos ao redor do mundo, pessoas que têm sido
rotuladas psiquiatricamente, estão se organizando. Estamos nos organizando em nível local,
estadual, nacional e internacional. Estamos desenvolvendo uma voz coletivas lutando para
sobrepujar opressão, pobreza, discriminação e estígma. Nós estamos dizendo não para o
tratamento de segunda classe, pobre ou não existente abrigo e todas as indignidades que tão
freqüentemente vem com as hospitalizações psiquiátricas, incluindo o barbárico uso de restrição e
reclusão. Nós estamos sentados à mesa em diálogo com provedores de saúde e fazedores de
política para encontrar alternativas para o tratamento involuntário. Estamos nos juntando a outros
grupos de incapacitados para formar uma larga coalizão de 40 milhões de americanos com
incapacidades para alcançar igualdade em cuidados de saúde, serviços de suporte e direitos.
Nós estamos também começando a definir nossas experiências em nossos próprios termos e
educar os profissionais de saúde mental sobre nossa experiência e o que ajuda. Nós somos
afortunados por ter o Centro Nacional de Capacitação em Lawrence, Massachusets. O Centro
Nacional de Capacitação é um completo pesquisador dos usuários e controlador nacional do
Copyright 1995 © Patricia E. Deegan PhD
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Ouvindo vozes que são aflitivas: Um Treinamento de Experiência Simulada e Estratégias de
Auto-ajuda.
Neste Workshop destinado a praticantes e estudantes de Saúde Mental, os participantes
ouvem em um toca-fitas que foi projetado por pessoas que ouvem vozes, para simular a
experiência de ouvir vozes que são angustiantes. Os participantes ouvem a fita enquanto passam
por uma série de tarefas, incluindo exame de estado mental, uma comunidade do lado de fora, um
dia de tratamento de grupo e de testes psicológicos. Depois do tratamento simulado os
participantes têm a oportunidade de aprender muitas estratégias que ajudam a controlar ou a
eliminar as vozes que afligem.
Uma nova era está sobre nós. Devemos ensinar os estudantes de hoje a compreender que
pessoas com inabilidades psiquiátricas são seres humanos com humanos corações. Nossos
corações são tão reais, tão vulneráveis e tão valiosos quanto os deles são. Compreender que
pessoas com incapacidades psiquiátricas são, primeiramente e acima de tudo, pessoas que estão
em processo, crescendo e mudando, é o alicerce da compreensão do conceito de recuperação. Nós
não devemos deixar nossos corações tornarem-se duros e calejados em direção às pessoas com
incapacidades psiquiátricas. Nosso papel é não julgar quem irá ou não se recuperar.
Nosso trabalho é criar ambientes nos quais as oportunidades de recuperação e capacitação
existam. Nosso trabalho é estabelecer um forte e sustentativo relacionamento com aqueles com os
quais lidamos. E talvez, acima de tudo, nosso maior desafio é buscar um meio de recusar ser
desumanizado na idade de negociar os lucros e ser ousado e bravo e audacioso o bastante para
permanecer um humano coração enquanto trabalha nos serviços humanos.
Referências
 LaLime, W. (1990). Discurso sem título usado como parte de Lowell
MPOWER’s Workshop anti-estígma, Lowell Masssachusets.
 Deegan, P. (1990). Espírito quebrado: quando as profissões de ajuda ferem. A
Psicologia Humanística, 18 (3), 301-313.
 Lefcourt, H. M. (1973). A função das ilusões de controle e liberdade. Psicólogo
Americano, 28, 417-425.
 Seligman, M. E. P. (1975). Desespero: Sobre depressão, desenvolvimento e
morte. San Francisco: Freeman.
Traduzido por: Dulce Edie Pedro dos Santos – membro da Associação Franco Basaglia
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RECUPERAÇÃO COMO UMA VIAGEM DO CORAÇÃO