ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 089 ESTIMATIVA E QUANTIFICAÇÃO DE MATÉRIA ORGÂNICA EM ÁGUAS - UMA AVALIAÇÃO METODOLÓGICA E PROPOSIÇÃO DE MUDANÇAS Carlos Eduardo B. Pereira(1) Bacharel em Química pela Universidade de Brasília (1987). Com especialização em Limnologia e Qualidade de águas. Trabalha atualmente na Cia de Água e Esgotos de Brasília, no controle de Qualidade das unidades de Tratamento de Esgotos e dos corpos receptores de esgotos do FOTO Distrito Federal. Romino Barreto Ornelas Bacharel em Química pela Universidade de Brasília (1980). Mestre em Química Analítica pela UnB (1990). Trabalha atualmente na Cia de Água e Esgotos de Brasília, no controle de Qualidade das unidades de Tratamento de Esgotos e dos corpos receptores de esgotos do Distrito Federal. Paula Frassineti G. de Sá Bacharel em Química pela Universidade de Brasília. Mestre em Físico-química pela UnB. Endereço(1): CAESB - Estação de Tratamento de Esgotos Norte (ETE-Norte) - SCEN Trecho 3 s/no - Brasília - DF - CEP: 70800-130 - Tel: (061) 340-3134 - Fax: (061) 340 3419. RESUMO A determinação indireta de matéria orgânica em águas se dá através da oxidação de uma amostra com agentes oxidantes. Os mais empregados são o dicromato de potássio e o permanganato de potássio, ambos em meio ácido. Esses dois métodos diferem quanto ao poder oxidante e por seus limites de detecção. Para níveis inferiores a 20 mg/l emprega-se o método do KMnO4. Nesse caso a técnica analítica passa a ser chamada de Oxigênio Consumido. Nesse trabalho são apresentados os resultados dos estudos de oxidabilidade de compostos orgânicos, pelo método do KMnO 4 , sendo observados uma baixa eficiência do método na estimativa de matéria orgânica. Diante deste problema metodológico são sugeridas algumas alteração visando a otimização do método em análise que proporcionaria uma aumento de eficiência em torno de 300 %. PALAVRAS -CHAVE: Determinação de Matéria Orgânica, DQO, Oxigênio Consumido, Oxidabilidade de Compostos Orgânicos. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 528 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 089 INTRODUÇÃO A oxidação de uma amostra utilizando o permanganato de potássio em meio ácido, como agente oxidante, tem sido empregada há bastante tempo na determinação indireta da quantidade de matéria, sendo o seu resultado expresso em termos de oxigênio consumido, que reflete uma Demanda Química de Oxigênio. Uma outra estimativa de matéria orgânica é a DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio), que mede o consumo de oxigênio a 20°C, em 05 dias, necessário para a estabilização biológica da matéria orgânica. Esses dois métodos, cujos objetivos são semelhantes, apresentam resultados diferentes, pois o primeiro (DQO) é uma oxidação drástica utilizando temperaturas elevadas, meio fortemente ácido e uso de um oxidante forte. Já o segundo, a DBO, o processo de oxidação da matéria orgânica ocorre lentamente por intermédio de organismos aeróbios, não oxidando completamente todos os compostos orgânicos. Consequentemente os resultados de DBO obrigatoriamente são inferiores aos da DQO. Existem duas técnicas para a análise da DQO, uma que emprega o Dicromato de Potássio e a outra usando o Permanganato de Potássio, sendo esta última, objeto de avaliação neste trabalho, mais conhecida como oxigênio consumido. A diferença entre a aplicação dos dois métodos decorre do limite de detecção de ambos. Enquanto o método do permanganato possui o limite de 0,1 mg/l, a técnica do dicromato de potássio somente é utilizada para níveis de DQO acima de 25 mg/l. Como o Standard Methods (1980) cita que o método do permanganato de potássio não apresenta uma eficiência tão completa quanto o método do dicromato de potássio, foram desenvolvidos alguns estudos de eficiência de oxidação da matéria orgânica usando o KMnO 4, incluindo a proposição de mudanças no método para otimizá-lo. OBJETIVOS O interesse quanto ao poder oxidante do KMnO 4 no método da DQO começou quando os laboratórios de controle de qualidade das ETE’s de Brasília iniciaram o monitoramento de corpos receptores de esgotos do Distrito Federal. Naquela ocasião foi verificado que o incremento da DQO após o lançamento de esgotos não correspondia à carga lançada, apesar dos parâmetros oxigênio dissolvido, fósforo total, turbidez e sólidos em suspensão refletirem estes aportes. Essas observações também se fizeram no Riacho fundo, afluente do lago Paranoá, quando da retirada dos esgotos brutos das cidades do Núcleo Bandeirante e Candangolândia e da desativação das lagoas de oxidação do Guará II, que anteriormente aportavam para esse curso d’água. Enquanto a redução das cargas de fósforo atingiu 70%, a redução de DQO ficou em torno de 55%. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 529 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 089 Nesse sentido objetivou-se com este trabalho uma tentativa de otimização desse método através de algumas alterações analíticas, que proporcionariam uma melhor eficiência dessa técnica de análise. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 530 I - 089 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental RESULTADOS A primeira etapa dos trabalhos consistiu do estudo da oxidabilidade de alguns compostos orgânicos cujas estruturas químicas se assemelhem e/ou até fazem parte da composição dos esgotos domésticos. O quadro 1, a seguir, mostra os compostos utilizados nesse estudo e suas principais características: Quadro 1: Substâncias utilizadas no estudo de oxidabilidade de compostos orgânicos. COMPOSTO Lauril Sulfato de Sódio C12H25NaO4S PESO MOLECULAR 288.38 Citrato de Sódio 294.10 Lactose Biftalato de Potássio Tris Hidroximetil Amino Metano FÓRMULA C6H5Na3O7. 2H2O C12H22O11 H2O C8H5O4K C4H11NO3 . 360.30 FONTE detergentes, sabões, xampus frutas, aditivo de alimentos açúcar, leite, etc. 204.0 121.14 - A figura 1 mostra que a eficiência do método convencional é muito baixa para os compostos lauril, biftalato e tris, situando entre 10 e 20%. Para a lactose, que é uma molécula relativamente fácil de ser oxidada, a eficiência foi de 70%. Já para o citrato a oxidação foi completa. Figura 1: Eficiência do Método Convencional. EFICIÊNCIA (%) 100 80 60 40 20 0 LAURIL CITRATO LACTOSE BIFTALATO TRIS Como tais resultados evidenciaram a baixa eficiência do método, confirmando as expectativas da deficiência analítica, foram estudadas algumas alternativas para melhorar o poder oxidante da análise. A primeira tentativa foi aumentar o tempo de digestão das amostras realizando a oxidação em refluxo. Os resultados obtidos foram totalmente inconsistentes devendo ter ocorrido uma decomposição do KMnO4. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 531 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 089 Optou-se posteriormente pela digestão em autoclave, a uma temperatura de 120°C e alta pressão. Os resultados obtidos, a exemplo do que ocorreu na digestão sob refluxo, apresentaram a mesma tendência, sendo descartados. Utilizou-se também um catalisador, o sulfato de prata, para tornar mais agressiva a oxidação, porém os resultados foram superestimados caracterizando uma interferência positiva no método. Com o insucesso das alternativas citadas anteriormente, tentou-se alterar a estequiometria da mistura oxidante a fim de melhorar a eficiência do método. Foram então avaliados os efeitos do excesso de H2SO 4 na eficiência do método, utilizando volumes maiores de ácido, 100% e 200%. Os resultados obtidos foram bastante elevados, sendo causado provavelmente pela interferência no método de substâncias redutoras presentes no ácido sulfúrico, conforme já era previsto. Uma outra opção seria aumentar a concentração de KMnO4, porém esta alternativa provocaria uma perda de sensibilidade do método, elevando o seu limite de detecção. Assim, a última alternativa seria reduzir em 50% o volume da amostra, o que provocaria um aumento de 100% na concentração da mistura oxidante. Os primeiros resultados gerados com a redução do volume da amostra foram animadores, comprovando em amostras naturais e em padrões, conforme observado nas figuras 2, 3 e 4, que esta modificação melhora significativamente o poder oxidante do método, e consequentemente eleva a sua eficiência. A figura 2 mostra o valor teórico dos padrões, os resultados das análises pelo método convencional (100 ml) e pelo método modificado (50 ml), sendo observado que para o biftalato a eficiência do método passa de 20% para 100%. Já para o lauril e para o tris, a eficiência salta de 10 para 35%. A baixa eficiência do método para esses dois últimos compostos deve-se à elevada estabilidade dos mesmos. Figura 2: Método Convencional x Método Modificado. CONCENTRAÇÃO (mg/l) 10 8 6 4 2 0 LAURIL TEÓRICO CITRATO LACTOSE MET. CONVENCIONAL BIFTALATO TRIS MET. MODIFICADO 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 532 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 089 As figuras 3 e 4 mostram a diferença de resultados entre o método convencional e o método modificado para os tributários do Lago Descoberto e para o ribeirão Sobradinho, confirmando a mesma tendência observada nos padrões. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 533 I - 089 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental Figura 3: Oxigênio Consumido - Tributários do Lago Descoberto. (mg/l) 6 4 2 0 DM CH RP DJ MÉT. CONVENCIONAL RD MÉT. MODIFICADO Figura 4: Oxigênio Consumido - Ribeirão Sobradinho. (mg/l) 15 10 5 0 1 2 3 MÉT. CONVENCIONAL 4 5 MÉT. MODIFICADO Complementarmente foi analisado o efluente da ETE-Norte usando o KMnO 4, a fim de avaliar a real eficiência do método para efluentes tipicamente domésticos. A figura 5 mostra esses resultados evidenciando uma eficiência de 21% para o método convencional e 72% para o método modificado. Figura 5: Oxigênio Consumido – Efluente da ETE Norte. EFICIÊNCIA (%) 72 80 60 21 40 20 0 MÉT. CONVENCIONAL M ÉT. MODIFICADO Finalmente são apresentados os resultados das análises de DBO e DQO (método convencional e modificado) em 06 (seis) pontos no Lago Paranoá e 01 (um) no riacho Fundo. Esses resultados 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 534 I - 089 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (mg/l) mostrados na figura 6 corroboram os resultados subestimados citados anteriormente para o método convencional, quando são observados para os pontos A1 e A3 valores de DBO maiores que os de DQO. Figura 6: Estimativa de Matéria Orgânica para o Lago Paranoá-DF. 12 10 8 6 4 2 0 A1 DBO A2 A3 DQO CONV. A4 A5 A6 RF DQO MOD. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES O método da DQO utilizando o KMnO4 possui uma baixa eficiência de oxidação da matéria orgânica, sendo estimada em 21% para as amostras que apresentam contaminações por efluentes tipicamente domésticos. O aumento da eficiência do método para 72%, a partir da redução do volume da amostra, mostra que a modificação é bastante benéfica para a estimativa de matéria orgânica, porém não atingindo ainda os 100%. Analiticamente, parece que as causas da baixa eficiência do método convencional estão relacionadas ao poder oxidante da mistura KMnO 4 / H2SO4 .Ao utilizarmos um volume reduzido de amostra, a relação entre as concentrações molares de KMnO4 e H2SO4 e a concentração da matéria orgânica é aumentada, permanecendo o número de equivalentes do agente oxidante o que faz com que a digestão das amostras seja mais “agressiva”. Para garantir que a eficiência do método será aumentada pela redução do volume da amostra é necessário ainda que o tempo de digestão da amostra situe entre 10 e 15 minutos, e que o volume final durante a digestão (amostra + mistura oxidante) fique em torno de 40 a 50 ml. Isso é possível realizando a digestão em erlenmeyer de 250 ml, com um aquecimento moderado, sendo aconselhável o uso de pérolas de vidro para tornar a ebulição mais homogênea. Também foi verificado que a redução do volume final para níveis inferiores a 40 ml causa um maior consumo de KMnO 4, não tendo relação com a quantidade de matéria orgânica presente. Durante o desenvolvimento desse trabalho almejou-se encontrar um fator de correção para os valores de DQO do método convencional, porém foi observado que essa relação é variável em um mesmo curso d’água, sendo a diferença mais acentuada para locais mais comprometidos com despejos domésticos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 535 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental I - 089 1. APHA. (1992). Standard Methods for the Examination for Water and Wastewater. American Public Health Association, 18 th, 1980. 2. CETESB, Norma Técnica L5-143, Determinação de Oxigênio Consumido em Águas - Método do Permanganato de Potássio, São Paulo, 1978. 19o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 536