Ano 3 n Número 26 n Novembro de 2013 Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial Erros do INPE e MCT ameaçam empregos Fernanda Soares Protesto de funcionários do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE), que podem perder seus postos de trabalho se suas contratações não forem regularizadas. P. 4 e 5 CT & Inovação Página 6 Nosso Trabalho Página 11 Saúde Página 9 PL 2.177/2011,que institui Código Nacional de CT&I, ataca nossos direitos Falhas foram superadas. CBERS-3 está quase pronto para ser lançado na China Idosos e idosas estão expostos ao risco de contrair DST, inclusive Aids. Cuide-se! 2 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Editorial Código de C&T prejudica a carreira e fragiliza institutos públicos de pesquisa O Fórum das Entidades Sindicais da Carreira de C&T – Fórum de C&T, o SindCT congregado, tem sido voz dissonante nas audiências públicas da PEC-290 e do PL 2.177, eixos do “Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação”, celebrado por muitos como a panaceia para os males que afligem a atividade científica no Brasil. O Código cria um “Regime Diferenciado de Contratação”, que contorna as dificuldades da atual lei de contratações e traz incentivos fiscais à atividade científica inovadora. Entretanto, prejudica a Carreira de C&T, desestimula a renovação da força de trabalho dos institutos públicos de pesquisa. Pressionados pela dinâmica dos projetos, os gestores contratarão através das fundações de apoio, evitando a eterna luta contra o paredão do Ministério do Planejamento. Enquanto isso, os institutos seguem perdendo pessoal para a aposentadoria. O DCTA perdeu a metade do efetivo desde 1987, encolhendo de 3.409 para 1.709 servidores, número que cairá para 890 em 2020. O INPE enfrenta ameaça de interrupção da previsão do tempo e climática porque a Justiça Federal ordenou a demissão de 111 temporários. Neste processo, o Tribunal de Contas da União indica que o instituto precisaria ter o dobro dos atuais 1.041 servidores para bem conduzir sua missão. Em 1987 o INPE tinha mais de 1.850 servidores. Em outras ins- Charge do Mês tituições ecoa a mesma precarização: na pesquisa nuclear 1 em cada 3 servidores já cumpriu os requisitos para aposentadoria, em três anos a metade estará em condições de se aposentar; até 2020, 2 em cada 3 servidores receberão abono permanência! O “Código” também quebra o regime de dedicação exclusiva, ofertando aos pesquisadores oportunidade de melhorar a renda. No entanto, a dificuldade de negociar aumentos salariais será maior, na medida em que a carreira continue enco- lhendo. Os adicionais que receberão dos projetos não comporão seus proventos de aposentadoria. Enfim, o abandono dos institutos criará, em curto prazo, um óbice também aos resultados potenciais do “Código”. Os projetos não perenizam as capacidades e o conhecimento, é preciso cuidar da renovação dos quadros, sob pena de logo se alcançar a total incapacidade de atendimento a qualquer demanda. Décadas sem concursos levarão muitas instituições ao colapso em menos de uma década. Diz-se que ciência e religião não se misturam. Entretanto, não havendo uma política de renovação da força de trabalho estabelecida, estando os institutos públicos tão desprestigiados, parece que só resta mesmo pedir a intercessão de São Judas Tadeu, patrono do servidor público e também das causas impossíveis, inspiração no 28 de outubro, Dia do Servidor Público, quando se finalizou a redação deste editorial. Segurança e soberania nacional Soberania nacional pode ser definida como o fato de uma nação optar por seu destino, e por garantir seu território e patrimônio, seja material, intelectual ou cultural. Segurança é o nível de proteção que se deve ou se pode ter. No caso de uma nação é a proteção do território, do seu povo e patrimônio. Desde o Brasil Colônia, a submissão da maioria de nossos governantes é clara. Quase sempre se aceitou a ingerência externa. Nos dias de hoje somos um país com soberania e segurança ameaçadas por ações de outros, atentos às nossas riquezas, capacidade criativa e intelectualidade. Os entreguistas de plantão não hesitam em desqualificar nossa capacidade, submetendo o país a opções lamentáveis. Recentemente a presidenta Dilma e a Petrobras foram espionados pelos governos dos Estados Unidos e Canadá. Por que espionar a Presidenta? Por suas posições políticas internacionais. Por que a Petrobras? Pelo Pré-Sal, leilões de petróleo e tecnologias em águas profundas. Quando o Brasil criou o Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), buscava ter um mecanismo de proteção. Regras da empresa estrangeira vencedora eram tais que nossos técnicos não teriam acesso aos programas-fonte nem aos núcleos de controle. Controle ZERO. Ora, que vigilância é esta? Um novo governante cancelou este desperdício de US$ milhões. A mesma situação ocorre hoje com o satélite geoestacionário e de defesa, SGDC, comprado no exterior. Os técnicos brasileiros não participarão do projeto. Transferência de tecnologia ZERO. Será um equipamento fechado, lacrado e desconhecido de nossos especialistas em defesa. Pode-se por exemplo colocar uma “porta secreta” de entrada e saída alia- da a um bom controle de fluxos, tudo devidamente disfarçado. Mais uma vez, poderemos ser espionados e enganados. E que dizer da ACS, parceria com a Ucrânia, sem transferências de tecnologias ou controles de processos, e que devora o dinheiro negado ao VLS do DCTA? E em detrimento da tecnologia que lutamos por desenvolver. A soberania nacional e a segurança continuam no lixo. EXPEDIENTE Jornal do SindCT é uma publicação do Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial, fundado em 30 de agosto de 1989 • Matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição da entidade • Sede: Rua Santa Clara, 432, Vila Ady Anna • CEP 12.243-630 (8h30 às 17h30) • São José dos Campos - SP • Tel/fax: (12) 3941-6655 • Responsabilidade editorial: Diretoria do SindCT • Tiragem: 6.000 exemplares (2.500 assinantes eletrônicos) • Editor responsável: Pedro Pomar (MTB 14.419-SP) • Reportagem: Fernanda Soares Andrade (MTB 29.972-SP) e Shirley Marciano (MTB 47.686-SP) • Diagramação: Sergio Bastos (MTB 585-PA)• Foto da capa: Fernanda Soares • http://www.sindct.org.br • [email protected] 3 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Nossa Pauta ORGANIZAÇÃO E LUTA COLETIVA Sindicalismo na berlinda Perseguidos pelo patronato, os sindicatos são alvo de preconceitos disseminados pela mídia. Mas ainda são a melhor forma de organização dos trabalhadores Moacyr Pinto* Sindicato é coisa para peão”. Certo? Errado! Assim como na sociedade escravista brasileira o quilombo se constituiu na única real saída para o conjunto dos trabalhadores subjugados naquele sistema social... Assim como na sociedade feudal ocorreram a luta pela reforma agrária no campo (como na Revolução Francesa) e a demanda pelas cidades, onde os trabalhadores puderam avançar na organização das guildas e corporações de ofícios, com o objetivo de se livrarem do jugo dos senhores... Na sociedade capitalista, sistema baseado na compra e venda de mão-de-obra no mercado “livre”, a experiência do estica-e-puxa das lutas e conflitos entre as classes sociais, e entre estas e o próprio Estado, terminou engendrando o sindicalismo como principal instrumento de organização e luta coletiva dos trabalhadores, além de dar origem a códigos legais que regulam a relação entre capital e trabalho, ou entre patrões e trabalhadores (no Brasil, esse código é a Consolidação das Leis do Trabalho, ou CLT; voltaremos a ela em outra oportunidade). A luta pelo fim do próprio capitalismo, apesar de poder também passar pelo sindicalismo, já é outra história. Do mesmo modo, nos três sistemas (até no escravista) houve/há gente que tentou/tenta se dar bem individualmente. Isso também é uma outra boa história, cheia de mitos! Não haveria nenhuma novidade e o “blábláblá” Jornalistas e radialistas da EBC entraram em greve em 7/11 acima apresentado seria compleorganização independente bem, ainda que por outras tamente desnecessário, no dos trabalhadores, forjando razões, em artigo postado Brasil de 2013, não fossem estereótipos negativos e re- recentemente no seu blogue os seguintes senões: forçando preconceitos. em www.cartamaior.com. 1. As escolas não en3. Por uma série de in- br. Com ironia, Emir, entre sinam/não debatem seria- junções — inclusive por outras coisas, escreveu o semente esses assuntos no termos amargado 21 anos guinte, em relação à direita período de formação básica de Ditadura Militar, que política e à elite conservada nossa juventude; menos estimulou e ajudou a for- dora brasileira: ainda no período de for- jar um sistema nacional de “O que fazer diante do mação superior, principal- comunicação (TV à frente) sucesso do Lula, dentro e mente nos cursos voltados conservador e altamen- fora do Brasil? Diante da para o “mercado”, como os te alienante — saímos da sua capacidade para eleger de Engenharia, Medicina, roça, a partir dos anos 1950, e reeleger sua sucessora? Direito, Jornalismo etc. Os diretamente para a socieda- Refugiar-se na melancolia. destaques são para a com- de de consumo de massas. (...) Fazer o discurso escapetição, o individualismo, Viramos consumidores sem tológico de que o mundo o “empreendedorismo”, o nos tornarmos cidadãos. É está pior do que nunca, que sucesso no mercado profis- assim que nos tratam na es- o Brasil vai pro brejo, que sional. cola, no serviço público de o povo nunca aprende, que 2. Como a maioria es- saúde, no Sesi, Sesc etc. tudo pode ainda ficar pior... magadora da população 4. Quinhentos anos de Desencontrados do Brasil brasileira saiu da roça nos colonialismo, reforçados que melhora, da América últimos 50 a 60 anos, aque- por décadas de um deter- Latina que avança — na les que entre nós e, mais minado comportamento nas contramão dos seus queainda entre os nossos filhos, universidades mais elitiza- ridos EUA e Europa — só avançaram nos estudos, das do país (onde tem gente lhes resta um final resignacompondo uma pretensa que já pensa em inglês, gos- do e resmunguento...” elite de formação superior ta de falar na Europa e nos (mesmo que tenham fre- EUA com intimidade, mas Resumo da ópera quentado péssimas faculda- não conhece o Nordeste des), não querem ser con- brasileiro, do qual tem andaQuem pertence à classe fundidos com gente “feia”, do com certa má impressão, trabalhadora, ou seja, vive de macacão, que fala alto, depois que o governo criou uma relação de emprego no obstrui o trânsito e bate pa- essa tal de “Bolsa Família”), mercado de trabalho, seja nela. Daí a rejeição ao sindi- moldaram em boa parcela ele público ou privado, e calismo e outras formas de da minoria melhor situada ainda que o empregador se lutas coletivas. A mídia co- social e economicamente disfarce de “organização mercial, por sua vez, aborda da nossa sociedade um tipo não governamental” (ong) o mundo sindical com des- de avaliação que o soció- ou “organização social” prezo, atacando a ideia de logo Emir Sader resumiu (OS) e o trabalhador seja obrigado a passar-se por “pessoa jurídica” (PJ), não adianta pensar pela cabeça dos “especialistas” da mídia, nem achar que a Internet veio para substituir, magicamente, a velha e boa organização dos trabalhadores nos locais de trabalho. As novas tecnologias e mídias devem ser utilizadas sim, mas para reforçar, amplificar e qualificar a mobilização e a luta das categorias. Quem não pensa assim patina, como infelizmente estão patinando, por exemplo, os empregados da Embraer, que desde 1985 não tiveram uma hora sequer de redução na sua jornada de trabalho; situação muito diferente dos empregados das concorrentes pelo mundo afora. Nos Estados Unidos, centro maior do capitalismo, trabalhadores que ganham altos salários não têm vergonha de sair às ruas para lutar por seus direitos. Os controladores de vôo americanos, muito melhor remunerados do que os seus colegas brasileiros (que, diga-se de passagem, travaram uma luta heróica em 2007 e foram implacavelmente perseguidos e punidos pela Aeronáutica), sempre que necessário se mobilizam e entram em greve. Em 2007, os roteiristas de Hollywood fizeram passeatas, empunharam cartazes, e após quatro meses de luta conseguiram derrotar os poderosos estúdios. Um movimento histórico, liderado pelo sindicato da categoria. No Brasil, porém, quem ganha salários melhores tem aversão a sindicato e acha que manifestação de rua é baderna. Ou seja: pensa pela cabeça do patrão. *Moacyr Santos é sociólogo, educador e escritor 4 Jornal Vida e do SindCT n Novembro de 2013 Trabalho CRISE NO INPE Contratações temporárias irregulares no CPTEC viram caso de polícia Fernanda Soares Justiça anula 111 contratações temporárias realizadas na gestão de Gilberto Câmara, e Polícia Federal investiga supostos crimes praticados pela direção do INPE contra a gestão pública. Trabalhadores ameaçados entraram em greve em defesa de seus direitos Demissões no CPTEC podem comprometer serviço de previsão de tempo Fernanda Soares A contratação de trabalhadores especializados para ocupar cargos de servidores públicos no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) está sendo investigada pela Polícia Federal de São José dos Campos (SP). A requisição de inquérito fundamenta-se na prática de crime de prevaricação, previsto no artigo 319 do Código de Processo Penal: “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício ou praticá-lo contra a disposição expressa da lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. A investigação corre em sigilo e a Polícia Federal não fornece detalhes para não atrapalhar o andamento dos trabalhos. O crime passou a ser investigado após a Justiça Federal julgar procedente ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF) e declarar nulas 111 contra- tações temporárias de trabalhadores do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), fixando inicialmente o dia 11 de outubro como prazo fatal para demissão desses funcionários. O autor da ação, procurador Fernando Lacerda Dias, considera que o INPE realizou manobras jurídicas proibidas, pois realizou as contratações recorrendo a uma lei que permite dispensa de concurso para funções que não sejam de rotina, incompatível, portanto, com o trabalho desenvolvido pelos contratados no CPTEC. A ação do MPF questiona, ainda, um possível favorecimento ilegal aos profissionais vinculados à Fundação de Ciência, Aplicações e Tecnologia Espaciais (Funcate), entidade privada, supostamente sem fins lucrativos, dita “de apoio a organizações governamentais de pesquisa e desenvolvimento” (http://goo.gl/CNe3zg). De acordo com o procurador Dias, o edital garantia pontuação a título de “experiência profissional específica”, concedendo assim extrema vantagem aos candidatos que já haviam prestado serviços à Funcate como temporários. A ação levanta também questionamento ao fato de que o INPE não cumpriu compromisso que assumira em 2006, de promover a Ivanil Barbosa, presidente do SindCT substituição gradativa dos contratados temporários por servidores públicos, e que até o presente momento não realizou esforços para efetivar essa promessa. Se não houvesse questionamento na Justiça, os contratos seriam encerrados entre 2014 e 2015. Novo prazo No dia 4 de outubro, reunidos em assembleia em frente ao CPTEC, os contratados temporários deliberaram pela realização de greve por tempo indeterminado. O objetivo da greve era sensibilizar o diretor do INPE, Leonel Perondi, a buscar uma solução para a reversão da decisão da Justiça, diante do prazo previsto para as demissões, 11 de outubro. Após reunião com a direção do instituto, os funcionários decidiram, em nova assembleia, encerrar a greve no dia 7. “A participação do grupo foi grande, porém, por viverem uma situação absurda, com contrato suspenso até sexta, os dias parados seriam descontados do pouco salário que recebem. Por estratégia de sobrevivência, decidiram por encerrar a greve e continuar tentando a autorização para o concurso, que facilitaria alguns encaminhamentos judiciais”, afirma o vice-presidente do SindCT, Fernando Morais. A Advocacia Geral da União (AGU) entrou com um recurso no Tribunal Regional Federal de São Paulo para tentar impedir a imediata demissão dos trabalhadores. O recurso alegava que o prazo poderia causar sérios danos aos serviços prestados pelo INPE, mas foi negado pela desembargadora federal Mônica Nobre. Em 12 de outubro, porém, a Justiça prorrogou o prazo para o INPE cumprir a suspensão dos contratos de trabalho questionados. O novo prazo foi concedido após o Inpe encaminhar uma documentação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) demonstrando a intenção do governo de realizar concurso público para a substituição dos contratados temporários. Preocupação O diretor do INPE informou que o concurso realizado em 2012 possibilitou a substituição de alguns temporários, e que atualmente apenas 71 servidores se mantêm na situação irregular sustada pela Justiça. Dos 71 temporários, 52 atuam 5 Jornal Vida e do SindCT n Novembro de 2013 Trabalho DEPOIMENTO: GIOVANNI NETO “O que a direção do INPE fez ao longo desses 4 anos, para garantir que não haja prejuízos para a sociedade?” O Jornal do SindCT entrevistou Giovanni Dolif Neto, meteorologista que atua no Inpe desde 2002, mas está ameaçado de demissão em função de ter sido contratado irregularmente pela direção do INPE. Quantas pessoas trabalham em seu grupo? Trabalho no grupo de previsão de tempo, onde somos oito meteorologistas. Sete são temporários e sairiam. De que forma a saída dos servidores temporários afetaria os serviços prestados pelo INPE? No grupo de previsão de tempo, dificilmente um único meteorologista conseguiria manter o serviço que hoje é feito por oito, de forma que grande parte dos serviços de previsão de tempo seria comprometida, os na previsão de tempo e nove no Laboratório de Combustão e Propulsão. São meteorologistas, engenheiros e técnicos cuja dispensa colocará em risco a previsão de tempo, o monitoramento de queimadas e desmatamentos, os alertas de desastres naturais fornecidos ao Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemadem) e a manutenção do supercomputador Tupã (único no país). A preocupação do presidente do SindCT, Ivanil Elisiário Barbosa, vai além da demissão dos trabalhadores. “Esses trabalhadores são apontados como réus no processo. Alguns deles foram aprovados em concurso público e não poderão assumir a vaga por haver esse impedimento. O mesmo impedimento ocorrerá caso haja abertura de concurso público no INPE para suprimento das vagas que eles ocupam atualmente”. alertas meteorológicos poderiam perder qualidade. Há alguma expectativa de reversão desta situação? Esperamos que sim, pois seria inadmissível a direção deixar o país sem esse serviço essencial e de utilidade pública. Os trabalhadores são apontados como réus no processo, isso tem gerado algum problema pessoal? Sim, há pessoas que precisam tirar certidões negativas e não conseguem porque aparecem como réus em ação civil pública. Há algo que gostaria de acrescentar? Dos 71 funcionários temporários em atividade hoje no INPE, 18 são pesquisadores. O prazo máximo de renovação dos contratos temporários é diferente entre tecnologistas e pesquisadores, de tal forma que se limita a cinco anos para os primeiros e apenas quatro anos anos para os últimos. Assim, os pesquisadores temporários estão cumprindo a terceira e última renovação de seus contratos temporários, segundo o edital n° 2 do MCTI, de 13 de janeiro de 2010. Esse fato não tem relação com a sentença de 29 de agosto de 2013 em questão e já era conhecido desde que estes pesquisadores foram nomeados, há quase quatro anos. Portanto, gostaria de perguntar à direção: o que ela fez ao longo desses quase quatro anos, e o que pretende fazer nesses próximos seis meses, para garantir que as atividades executadas por estes funcionários sejam mantidas a partir de maio de 2014, e que não haja prejuízos para a sociedade devido à falta dos serviços prestados por estes? GILBERTO CÂMARA NEGA PREVARICAÇÃO “Como diretor, por diversas vezes expressei a necessidade de vagas RJU para o CPTEC” Procurado pelo Jornal do SindCT, o ex-diretor do INPE Gilberto Câmara nega enfaticamente que tenha cometido crime de prevaricação, acusação que lhe é feita pelo MPF. “A prevaricação consiste em retardar, deixar de praticar ou praticar indevidamente ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Para que tivesse cometido o crime de prevaricação, eu teria de ter deixado de atender aos dispositivos legais e ao disposto no RJU [Regime Jurídico Único], enquanto diretor do INPE”. Na resposta enviada por e-mail, o ex-diretor lembra que o CPTEC “foi criado como unidade do INPE em 1987, com a missão de estabelecer no Brasil um centro moderno de previsão numérica de tempo”, e que recebeu “investimentos que em valores atualizados somam mais de R$ 300 milhões, incluindo a compra de quatro gerações de supercomputadores para previsão do tempo”. Contudo, “apesar dos bons resultados do CPTEC, o MCT nunca alocou um quadro de servidores adequado”, diz Câmara. “Assim, de 1990 até 2010, o CPTEC operava com 70% de seu quadro mantido por contratos de terceirização de mão-de-obra. Eram mais de 100 pessoas que trabalhavam no CPTEC sem pertencer ao RJU. Esta situação persistiu por duas décadas”. Para atestar que, na condição de diretor do INPE, “por diversas vezes expressei ao MCT a necessidade de vagas RJU para suprir as carências do INPE em geral e do CPTEC em especial”, Câmara anexou ofícios do INPE ao MCT de 30/9/2007 e 30/10/2009, reiterando a necessidade de alocar vagas RJU. “Em 2010, depois de várias sentenças e manifestações duras da AGU e do TCU, o INPE foi impedido de continuar com os contratos de terceirização de mão-de-obra para o CPTEC. A solução encontrada pelo MCT foi solicitar ao MPOG a con- tratação de 111 servidores públicos temporários para o CPTEC”. Para ilustrar, ele anexou à mensagem ofício do MCT ao MPOG. “O MPOG concedeu as vagas temporárias, e o INPE fez um processo seletivo simplificado e contratou as pessoas para manter o CPTEC funcionando”. Esta concessão é que foi questionada em ação do MPF. “Depois de deixar a direção do INPE, fui arguido pela Justiça, dentro do processo. Foi somente naquele momento que manifestei minha opinião de que o ‘RJU não é adequado para o INPE’. É uma opinião pessoal, fruto de minha experiência como gestor, e resultante de minhas reflexões sobre a situação do INPE após deixar o cargo de diretor. Não existe crime de opinião no Código Penal Brasileiro. Enquanto diretor do INPE, fiz tudo o que foi pertinente para que as vagas RJU para o INPE e o CPTEC fossem concedidas. Não há qualquer base legal para sustentar que eu teria cometido o crime de prevaricação”. 6 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Ciência, Tecnologia & Inovação PERIGO À VISTA Congresso Nacional propõe lei que permite cessão de servidores à iniciativa privada O PL 2.177/2011, que se propõe a instituir o Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, transfere à iniciativa privada o pouco que resta dos institutos públicos de pesquisa e ameaça agravar as condições de trabalho do setor público D esde 2011 tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) de número 2.177, de autoria dos deputados Bruno Araújo (PSDB-PE), Antonio Imbassahy (PSDB-BA) e Carlinhos Almeida (PT-SP), atual prefeito de São José dos Campos, dentre outros. O projeto propõe-se a instituir o “Código Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação”, reunindo em uma só lei todo o ordenamento jurídico que se relacionar direta ou indiretamente à área de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), como a Lei 10.973, de 2/12/2004, conhecida como Lei da Inovação, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo; a Lei 11.196, de 21/11/2005, também conhecida como Lei do Bem, que consolidou os incentivos fiscais a pessoas jurídicas que realizarem pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica; e a Lei 8.666, de 21/06/1993, conhecida como Lei de Licitações, que regulamenta a contratação de bens e serviços no âmbito da administração pública. O texto original do PL 2.177/2011 é bastante amplo, abordando temas como o financiamento das atividades de CT&I com recursos públicos por meio de fundações de apoio; estímulo à participação das Entidades de Ciência, Tecnologia e Inovação (ECTI) públicas no processo de inovação; estímulo à inovação nas ECTI privadas com fins lucrativos; estímulo ao inventor independente; acesso à biodiversidade para fins exclusivos de pesquisa e desenvolvimento nas áreas biológicas e afins; simplificação do processo de importação de máquinas, equipamentos, matérias primas e produtos intermediários destinados à pesquisa científica, tecnológica e à inovação; simplificação dos processos licitatórios para aquisições e contratações de bens e serviços relacionados à área de CT&I; e outros. Desde que foi proposto, o PL vem angariando apoios entre os mais variados partidos políticos com representação na Câmara dos Deputados, assumindo um caráter “suprapartidário”, supostamente em defesa do desenvolvimento científico e tecnológico do país. Também fora do parlamento, várias instituições públicas e privadas ligadas à área de CT&I universidades, institutos de pesquisa e desenvolvimento, entidades como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Academia Brasileira de Ciências (ABC) etc. foram praticamente unânimes em apoiar a iniciativa de criação de uma lei que se proponha a simplificar e desburocratizar as atividades ligadas à área de CT&I no país. Alguns dos principais pontos aborda- tente a pesquisadores e inventores de instituições públicas; incentivar estes inventores para que criem suas próprias empresas, afastando-se de suas funções no serviço público; permitir a contratação de novos funcionários públicos em regime temporário para substituir os servidores que eventualmente se licenciarem para montar suas empresas; etc. Em abril de 2013, dando sequência ao trâmite do projeto de lei na Câmara dos Deputados, foi instituída uma Comissão EsSob o argumento de pecial destinada a se desburocratizar e proferir parecer ao PL-2177/2011. Reaumentar a eficiência forçando o caráter das atividades de CT&I suprapartidário do projeto, foi designo país, defende-se nado presidente da muitas vezes o comissão o deputado Gabriel Chalita liberalismo total no (PMDB-SP), como trato da coisa 1º vice-presidente o deputado Izalpública, em benefício ci (PSDB-DF) e, unicamente de como relator, o deputado Sibá Mainteresses privados chado (PT-AC). Esta comissão prodos pelo PL incluem os moveu inúmeras audiênprocessos de contratação cias públicas em Brasília e aquisição de bens e ser- e junto a várias ECTI e viços; facilitar a emissão universidades do país, code vistos de permanência lhendo críticas e subsídios no país para pesquisado- para o “aprimoramento” res visitantes estrangeiros; do projeto. permitir o uso de verbas De fato, estas audiênpúblicas no financiamen- cias explicitaram a grande to de atividades de pes- insatisfação de pesquisaquisa e desenvolvimento dores e professores uni(P&D) desenvolvidas em versitários com a burocrainstituições privadas; ga- cia estatal que, na opinião rantir os direitos de pa- de muitos, é a principal Mobilização sindical no Laboratór responsável pela baixa eficiência das atividades de CT&I tanto nas instituições públicas quanto privadas. Dentre as várias críticas, a que mais se destacou foi a relacionada à lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações), que segundo seus críticos, praticamente inviabiliza a aquisição de equipamentos e matérias primas para as atividades de pesquisa e desenvolvimento. Argumentam ainda que esta lei, criada justamente para tornar o processo de contratação de bens e serviços na administração pública mais transparente e impessoal, ajusta-se mais aos casos de fornecimento dos chamados bens e serviços “comuns”, como limpeza, segurança, equipamentos e materiais de escritório, etc., sendo pouco adequada aos casos de contratação de bens e serviços altamente complexos e especializados, como 7 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Ciência, Tecnologia & Inovação SinTPq io Nacional de Luz Síncrotron, gerido pela OS ABTLuz, que desrespeita direitos trabalhistas na área espacial, pesquisas em nanotecnologia, novos materiais, pesquisas biomédicas, etc. As audiências públicas, no entanto, acabaram revelando que nem tudo o que a comunidade científica e tecnológica almeja no âmbito do PL 2.177/2011 é necessariamente bom para a Administração Pública e para o país. Muitos gestores (e ex-gestores) de ECTI públicas argumentam que é muito difícil ter de se submeter à fiscalização dos órgãos de controle do Estado (como o Tribunal de Contas da UniãoTCU e o Ministério Público-MP), que se aferram ao cumprimento estrito das leis, e não permitem que os institutos públicos executem seu orçamento da forma que melhor lhes aprouver. Estes gestores vêem os institutos públicos que são geridos por “organizações sociais” (OS), como o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), como sonho de consumo, onde se pode contratar quem quiser, demitir a quem quiser e comprar de quem se quiser, sem se sujeitar à Lei de Licitações e, mais importante, sem observar o Regime Jurídico Único (RJU), que além de proibir a demissão sem justa causa de servidores, estabelece que estes sejam contratados apenas via concurso público. Ou seja, sob o argumento de se desburocratizar e aumentar a eficiência das atividades de CT&I no país, defende-se muitas vezes o liberalismo total no trato da coisa pública, em benefício unicamente de interesses privados. Outra iniciativa que vem tramitando em paralelo ao PL 2.177/2011 na Câmara dos Deputados é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de número 290, de autoria da deputada Margarida Salo- mão (PT-MG), que se propõe a “alterar e adicionar dispositivos na Constituição Federal para atualizar o tratamento das atividades de ciência, tecnologia e inovação”. Este projeto traz em seu artigo 7º uma proposta de alteração dos artigos 219-A e B da Constituição Federal, que passariam a ter a seguinte redação: PEC 290 - Artigo 7º. Adicione-se ao Capítulo IV do Título VIII os seguintes artigos: Art. 219A. Para a execução das atividades previstas neste capítulo [atividades de ciência, tecnologia e inovação], a União, os Estados e Municípios poderão efetuar a cessão temporária de recursos humanos, sem prejuízo dos direitos do servidor, de equipamentos e de instalações a entes públicos e privados, na forma da lei. Art. 219-B. O Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação será organizado em regime de colaboração entre entes públicos e privados, com vistas a promover o desenvolvimento científico e tecnológico e a inovação. (destaques nossos) Aqui mais uma vez a proposta evidencia como poderia se dar a “colaboração” entre os entes públicos e privados na área de CT&I. Trata-se da possibilidade de cessão de servidores públicos para atuarem nas ECTI privadas, com o pagamento de pró-labore a estes servidores, sem prejuízo de sua remuneração e demais benefícios proporcionados por sua instituição de origem. Prevendo que tal dispositivo traria uma corrida de servidores que solicitariam dispensa para atuar nas ECTI privadas, o PL2177/2011 toma o cuidado de garantir no § 3º do seu artigo 17 o seguinte expediente: § 3º Caso a ausência do servidor licenciado acarrete prejuízo às atividades da ECTI integrante da administração direta ou constituída na forma de autarquia ou fundação, poderá ser efetuada contratação temporária nos termos da Lei no 8.745, de 9 de dezembro de 1993, independentemente de autorização específica. (destaque nosso) Sabe-se que uma década de governos neoliberais trouxe, dentre tantos prejuízos à atuação do Estado, uma forte carência de recursos humanos aos órgãos públicos, que ficaram proibidos de realizar concursos públicos para a reposição de seus quadros. Apesar da retomada dos concursos a partir de 2003, esta escassez de recursos humanos ainda hoje é muito sentida especialmente nas ECTI públicas. Não há dúvida de que uma legislação desta natureza somente faria agravar a situação destas instituições, que veriam seus parcos recursos humanos serem transferidos para as instituições privadas. Para “compensar” a perda de servidores experientes, caberia à Administração Pública a contratação de pessoal inexperiente por meio de contratos temporários de trabalho. Governos, parlamentares e gestores públicos parecem fugir, neste debate, dos reais empecilhos que impedem a C&T de avançar no país, como a carência de recursos humanos, a não criação de políticas de Estado para áreas estratégicas, a escassez de recursos e a falta de cadência nos investimentos para os projetos de pesquisa nas ECTI públicas. Transferir à iniciativa privada o pouco que resta dos institutos públicos de pesquisa, além de não fazer avançar a pesquisa junto à iniciativa privada, ainda contribuirá para o agravamento das condições de trabalho no setor público. Não é demais lembrar, ainda, que a história de décadas de privatização das instituições públicas de ensino, pesquisa e saúde, por intermédio das fundações privadas ditas “de apoio” ou, mais recentemente, pela via das OS ou das “organizações da sociedade civil de interesse público” (Oscips), tem sido marcada por graves conflitos de interesses e por ilegalidades que preocupam o MP Federal e o TCU — e que, com com alguma frequência, têm chegado às páginas do noticiário policial, resultando em condenações, prisões e até decretação de perda de bens pela justiça. 8 Jornal Educação e do SindCT n Novembro de 2013 Cultura MARCIO SONNEWEND e a paixão que o transformou em escritor Aposentado do Inpe dedica-se à literatura automobilística Quinze anos depois de deixar a ativa, o desenhista projetista dedicase à literatura especializada em veículos automotores, atividade em que enveredou por mera curiosidade dos sobrinhos Fernanda Soares F oi após uma conversa com seus sobrinhos que Marcio Antonio Sonnewend começou a pesquisar carros. Durante o bate-papo, Marcio percebeu que os meninos pouco conheciam sobre automóveis esportivos fabricados no Brasil. Decidiu, então, fazer uma pesquisa e criar um catálogo de carros. A pesquisa foi se aprofundando e o que se destinava apenas a satisfazer a curiosidade das crianças terminou por se transformar em um livro digital, ou e-book. Primeira obra de Marcio, Esportivos Brasileiros reúne 35 esportivos fora de linha. O livro traz a ficha técnica dos automóveis, as principais características, uma pequena história de cada carro e muitas fotos. O trabalho durou aproximadamente três anos e é o terceiro livro com mais downloads do site elivros. gratis.net, registrando mais de 120 mil acessos. Marcio conta que os carros esportivos eram muito caros e não havia muita opção no Brasil para os interessados. A solução encontrada pelos brasileiros foi a produção, quase artesanal, dos esportivos. “Quando eu era garoto, um esportivo era um sonho de carro”, conta. Após a publicação do seu primeiro livro digital, ele passou a receber convites para escrever artigos para sites e blogues espe- Fernanda Soares “Estalo” literário de Márcio surgiu na conversa com sobrinhos cializados em automóveis. Sua aposentadoria também proporcionou mais tempo para viagens a feiras automobilísticas, que lhe permitem ampliar o conhecimento do assunto. O gosto pelos carros, “turbinado” pelo tempo livre, deu lugar a quatro novos projetos literários. O primeiro, já publicado pela Editora Alaúde, conta a história do lendário Jeep fabricado pela Willys. “Eu ia escrever sobre todos os jeeps, como fiz com os esportivos, mas a história do Willys foi tão interessante que me apaixonei”. Este segundo livro foi concluído após um ano de trabalho, dedicando à obra seis horas diárias. O livro Clássicos do Brasil - Jeep pertence a uma coleção com 15 títulos diferentes e está a venda nas livrarias de todo o país. Sobre os outros três projetos, Marcio mantém o mistério: “Ainda estou na fase de pesquisa e estudo”, despista ele. O LIVRO DE MARCIO... ... E O E-BOOK Clássicos do Brasil - Jeep Esportivos Brasileiros “Em 1940, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, o exército dos Estados Unidos convidou os maiores fabricantes de automóveis do país a desenvolver um veículo ágil, versátil e capaz de enfrentar qualquer tipo de terreno. Assim surgiu o Willys MB, que depois da guerra alcançou fama mundial e foi adaptado para o uso no dia a dia, sendo rebatizado de Jeep Willys em 1950”, explicam os editores. “No Brasil, o veículo começou a ser produzido em 1954, contribuindo de forma pioneira para o desenvolvimento da indústria automobilística nacional”. O autor relata os bastidores da criação dos primeiros protótipos e muitas curiosidades sobre o modelo. O objetivo principal da obra é “apresentar as novas gerações dos carros esportivos que foram produzidos no Brasil” entre as décadas de 1970 e 1990, na forma de um catálogo detalhado destes esportivos. “O livro é um álbum para folhear com prazer, composto de informações técnicas básicas e um breve histórico acompanhado de fotos”, e está disponível para download gratuito em http:// goo.gl/IzFK9Y. 9 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Saúde ALERTA IMPORTANTE Doenças sexualmente transmissíveis em idosos e idosas O fato de as pessoas estarem vivendo mais tempo, de disporem de acesso às redes sociais, e o uso indiscriminado de remédios contra déficit de ereção, contribuem para maior exposição ao perigo das doenças sexualmente transmissíveis João Batista Alves de Oliveira* O s contatos em redes sociais e salas de bate papo criam muitas fantasias e favorecem o encontro e a relação sexual entre desconhecidos, o que traz vários perigos, os quais vão desde colocar em risco a segurança pessoal (por existir a possibilidade de roubos, agressões, crimes) até a contaminação por doenças sexualmente transmissíveis (DST), entre elas a AIDS ou Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Além da gravidade em si dessas doenças, habitualmente há o problema de seu não diagnóstico, pois o paciente e o médico não abordam a sexualidade durante a consulta, passando o problema despercebido trazendo, então, sérias complicações para a saúde. O uso de medicamentos para o déficit de ereção tem feito com que homens pratiquem sexo extraconjugal e com múltiplos parceiros, o que eleva o risco de contrair doenças. Há também o risco da medicação em si, a qual não pode ser associada a alguns remédios cardiológicos, os quais comumente são usados por idosos. Pior ainda é a compra clandestina desses remédios, de qualidade e segurança duvidosa, o que mais uma vez põe em risco a saúde. Uma doença sexualmente transmissível no idoso pode ser confundida com sintomas habituais nessa faixa etária. Por exemplo, a dificuldade para urinar no homem pode ser interpretada como sendo decorrente de problema na próstata, já identificado; ou uma infecção urinária na mulher pode ser Realidade alarmante interpretada como aquela infecção urinária que sempre aparece. Por vergonha, um idoso contaminado com doença sexualmente transmissível pode não procurar o médico, ou não relatar o contato sexual, o que pode dificultar ou atrasar o diagnóstico, favorecendo complicações graves. Dentre todas as doenças sexualmente transmissíveis, a pior, por não ter cura, é a AIDS, uma realidade alarmante entre idosos. Vale lembrar que quanto maior o número de parceiros, maior a chance de contaminação, e que mesmo tratado o indivíduo pode se contaminar novamente caso tenha novo contato sexual. Importante saber que os sintomas das doenças sexualmente transmissíveis são variados, e que podem ser alterados pelas condições do organismo do idoso ou ainda pelo uso de remédios por conta própria. Se precisar de orientação, procure o Programa DST/AIDS A Prefeitura de São José dos Campos mantém, com apoio dos governos estadual e federal, duas unidades especializadas em DST/AIDS, o Centro de Referência de Moléstias Infecciosas (CRMI) e o Centro de Orientação e Apoio ao Soropositivo (COAS). Nelas os interessados recebem orientação médica, diagnóstico com aconselhamento, fornecimento de preservativos com todas as orientações necessárias, e podem realizar testes gratuitos para o HIV, hepatite B e C e sífilis, de forma sigilosa. Pré-natal das gestantes portadoras do HIV e acompanhamento ginecológico das mulheres portadoras do vírus também são oferecidos. As unidades dispõem de ambulatórios especializados, masculinos e femininos, para atendimento de DST. Mais dados Telefones (12) 3922-7849 (12) 3924-8500 (CRMI) (12) 3924-8508 (Coas/CTA) Expediente Segunda a sexta-feira, das 7h às 19h. No Coas/CTA a realização de testagem às 8h e às 13h. No CRMI é de segunda-feira a sexta-feira das 7h às 18h Atendimento 156 Ligue gratuitamente Endereço Avenida Amin Assad, 200, São Dimas Pior do que a contaminação de uma pessoa que se expõe a uma relação sexual insegura é a contaminação da parceira ou parceiro que fica em casa, fiel. Vale ainda lembrar que sexo oral também transmite doenças sexualmente transmissíveis. Precauções Se você teve um contato sexual desconhecido e começou com: - lesão genital, mesmo sem dor ou secreção; - algum corrimento; - coceira genital; - dor ou dificuldade ao urinar; - lesões na boca; - lesões como furúnculo na região de virilha, procure um médico e relate o seu contato sexual – você pode estar com uma doença sexualmente transmissível. Então: - não tome remédio para déficit de ereção sem prescrição médica; - se receitado, não o compre de forma clandestina; - não faça sexo com desconhecidos; - não tenha vida extraconjugal; - lembre-se que sexo oral transmite doenças. Cuide-se. Cuide da sua parceira ou do seu parceiro. *O médico João Batista Alves de Oliveira (doctor-jb@ hotmail.com) é clínico geral, especialista pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica, e mestre em Gerontologia pela PUC-SP. Atua em Cuidados Paliativos. 10 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Nossas Cidades TRANSPORTE E SUSTENTABILIDADE Mobilidade urbana x caos e poluição: já fez sua escolha? Shirley Marciano Novidades no trânsito e no transporte coletivo de São José dos Campos refletem planejamento de mudança conceitual de mobilidade, dando prioridade ao transporte coletivo Shirley Marciano D esde que a nova gestão municipal assumiu, houve diversas alterações no transporte em São José dos Campos. Entretanto, é pouco divulgado que tudo isso é parte de um planejamento de mudança conceitual de mobilidade, no qual se define, por exemplo, que no futuro a maioria dos munícipes opte por andar de ônibus e metrô por questões ambientais e de fluidez do trânsito, já que a cada ano ingressam mais mil carros nas ruas da cidade. A imprensa local tem tratado o assunto de uma maneira muito simplista, apostando até mesmo na criação de situações que fogem ao bom senso, como trazer um piloto de corrida para questionar as sinalizações de trânsito de São José dos Campos. Quem conhece outras cidades e estados, porém, sabe que a cidade tem uma boa sinalização e que qualquer questionamento deve ser feito com base comparativa. No mundo, fatores como imensos congestionamentos e demora para chegar em seus destinos, além da poluição ambien- Faixa exclusiva de ônibus na Av. Adhemar de Barros. Imagem captada em 25/10 (10h30) tal, fizeram os países desenvolvidos mudarem a forma de utilização dos meios de transporte nos grandes centros urbanos. A nova orientação é deixar o carro em casa e andar de ônibus, trem, bicicleta ou até mesmo a pé. Artigo dos pesquisadores Peter Newman e Jeff Kenworthy, do Instituto de Sustentabilidade da Universidade de Perth na Austrália, aponta que nos EUA, Europa e Austrália o uso de carro teria chegado ao seu pico a partir de 2004 e, por essa razão, os governos vem desenvolvendo políticas públicas para diminuir o número de carros particulares nas ruas, e isso já está dando resultado. O estudo publicado por eles mostra que, na década de 1960, a quantidade de quilômetros rodados por carro aumentou 42% em relação à década anterior; na década de 1970, 26%; na de 1980, 23%. O período de 1995-2005 mostra um aumento global de 5,1%, mas apresenta que- da em várias metrópoles de países desenvolvidos: Londres (-1,2), Estocolmo (-3,7), Viena (-7,6). Nos EUA teve redução de 15% e em Atlanta 10%. Na Europa, muitos países estão colocando dificuldades para os carros intencionalmente, como em Viena, onde diversas ruas foram fechadas ao uso de veículos particulares. Em Londres e Estocolmo taxas de congestionamento passaram a ser cobradas; em cidades alemãs, foram criadas zonas nas quais podem circular carros com baixa emissão de poluentes. Cenário brasileiro No Brasil, a tendência tem sido inversa. De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica (IPEA) nas 12 principais regiões metropolitanas do país, na última década aumentou 8% ao ano o uso de carros particulares e 15% o de motos. Concomitantemente, houve uma redução de 30% no uso de transporte público. O pesquisador Carlos Henrique Carvalho, do IPEA, explicou, em entrevista concedida à revista Época, que as pessoas entendem esse fenômeno como sendo uma melhora da qualidade de vida, quando na realidade estão gerando poluição, congestionamento e mais acidentes de trânsito. Ainda segundo o IPEA, o usuário de carro polui 36 vezes mais o meio ambiente que o passageiro de metrô e nove vezes mais que os cidadãos que utilizam o serviço de ônibus. A questão das emissões poluentes é uma preocupação mundial e, infelizmente, muitos países tardam a combater esse mal, chegando a índices alarmantes, como o da cidade de Harbin, uma fria metrópole no nordeste chinês, que praticamente parou no mês de outubro quando o índice de poluição atmosférica chegou a cerca de 50 vezes o limite máximo tolerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com a Secretaria de Transporte, objetivo das mudanças é priorizar o transporte coletivo, promovendo melhorias no sistema, para mais pessoas utilizarem o serviço, e também para buscar uma maior fluidez. Dentre as principais mudanças ocorridas estão o Bilhete Único, a implantação dos corredores exclusivos de ônibus nos principais acessos ao centro, a reformulação dos sentidos das ruas de alguns bairros, o aumento da frota de ônibus, a alteração de itinerários, um plebiscito para definir o destino da ECO (estação de baldeação), financiamento de R$ 800 milhões para a primeira fase de implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), além de um reforço na fiscalização para que os ônibus cumpram os horários. “É um trabalho duro que mexe muito com o cotidiano e costume das pessoas, mas estamos motivados por saber que esse projeto garantirá condições melhores a todos”, explica Wagner Balieiro, secretário municipal de Transporte. No dia 21 de outubro foi realizada uma audiência pública na Câmara Municipal para discutir o projeto VLT, e na ocasião a Prefeitura anunciou que a implantação do VLT terá início na região central (e não na região Sul, conforme divulgado inicialmente), em função do maior fluxo de pessoas no centro da cidade. Cabe à população, agora, acompanhar e fiscalizar as mudanças. 11 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Nosso Trabalho SATÉLITE ESTÁ NA BASE DE Taiyuan Após superação de falhas, CBERS-3 será lançado em dezembro na China INPE Após as atividades de Revisão de Prontidão (SRR), o satélite será transferido para a torre de lançamento e acoplado ao foguete Longa Marcha-4 para testes de prélançamento Shirley Marciano D epois de muito vaivém em decorrência de falhas técnicas, finalmente foi agendado para a primeira quinzena de dezembro de 2013 o lançamento do quarto satélite de sensoriamento do Programa CBERS (Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres), que no Brasil é desenvolvido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e na China pela Academia Chinesa de Tecnologia Espacial (CAST). As falhas ocorridas nodispositivo de energia DC/ DC causaram um atraso de mais de um ano no lançamento do satélite, inicialmente previsto para acontecer em novembro de 2012. Mesmo assim, foi considerado um tempo razoavelmente pequeno, levando em conta que chegou a haver previsão de até dois anos de atraso, tempo que poderia variar dependendo da decisão que fosse tomada para solucionar o problema. O caminho mais longo, defendido pelos mais conservadores, era o de trocar a empresa fornecedora, a americana Modular Device Técnicos chineses testam CBERS em Beijing, na China, em outubro de 2013 Incorporated (MDI), que entregou o lote com pelo menos 20% dos dispositivos defeituosos. Além disso, para eles não havia mais confiança nesta empresa porque ela estava com seu histórico bastante manchado por ter fornecido dispositivos com problemas também para o satélite Chandrayaan-1, o que teria comprometido a missão indiana, conforme divulgado no Jornal do SindCT 19. Sendo assim, se a opção fosse a de substituir a empresa, seria necessário encontrar outro fornecedor para os componentes e reprojetar todos os equipamentos para que pudessem receber os novos componentes. Então criou-se um impasse: trocar o fornecedor de componentes DC/DC, substituindo todos os componentes semelhantes instalados no satélite por outros equivalentes, correndo-se assim o risco de se postergar muito o lançamento do satélite, ou substituir os componentes defeituosos por outros idênticos, do mesmo fabricante, correndo-se o risco de o sa- télite vir a apresentar novas falhas, seja em solo, seja no espaço. O INPE estava mais criterioso, querendo buscar uma opção que não deixasse margem para eventuais falhas no satélite quando este estivesse em órbita. Já o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) queria uma solução mais rápida para evitar desgaste com a China e com o Palácio do Planalto. Fontes que não quiseram se identificar afirmaram que houve muita pressão ministerial sobre o INPE para que optasse pelo caminho mais curto: manter a empresa MDI e corrigir os dispositivos fabricados por ela. Ao final, a saída encontrada foi reprojetar os equipamentos mais críticos para que passassem a utilizar novos conversores, mantendo os conversores da MDI apenas nos equipamentos onde uma eventual falha não levasse à perda de toda a missão do satélite. “Erro de fábrica” Dessa forma, em se- guidas viagens aos EUA, técnicos e engenheiros do INPE buscaram entender onde realmente estavam os problemas. Chegaram à conclusão de que não havia um padrão nas falhas técnicas e tiveram, portanto, que trabalhá-los um a um. Porém, é fato também que os erros eram mesmo de fabricação, ou seja, da MDI. “Embora o erro seja mesmo da empresa contratada, entendo que só se arrastou a questão e atrasou o lançamento do satélite porque houve no mínimo uma certa omissão da direção anterior do Inpe e do MCTI, porque desde 2009 os dispositivos já apresentavam falhas e nada foi feito. Por que não resolveram essa questão antes? E ainda resta a dúvida de quanto custou esse retrabalho e quem vai pagar esta conta”, desabafa uma fonte que não quis se identificar. Em pelo menos três expedições (17/7, 7/8 e 4/10), engenheiros e técnicos do INPE foram à China para realização de testes, principalmente com objetivo de verificar se realmente os componentes elétricos estavam funcionando bem. No dia 26 de agosto foi realizado o teste final, no qual tudo deu certo, e o satélite foi liberado. O satélite já está na base de lançamento de Taiyuan (TSLC) desde o dia 18 de outubro, quando foi transportado do centro espacial de Beijing, na China. “O transporte foi realizado por trem e a viagem durou aproximadamente 15 horas. No centro técnico do TSLC, os especialistas do INPE e da CAST farão a integração dos módulos de serviço e de carga útil do satélite, que serão submetidos novamente a testes elétricos para verificar se não houve danos durante o transporte. Em seguida serão realizadas as atividades de preparação final do satélite e a instalação do painel solar. Ao término destas atividades será feita a Revisão de Prontidão do Satélite (SRR), que autoriza o enchimento dos tanques de combustível do satélite”, explica Antonio Carlos de Oliveira Pereira Junior, engenheiro do INPE. Após as atividades de SRR, o satélite será transferido para a torre de lançamento e acoplado ao foguete Longa Marcha-4 para testes de pré-lançamento. Em 1988, os dois países criaram o Programa CBERS para juntar esforços pela capacitação na área de observação da Terra. Já foram lançados três satélites: CBERS-1, em 1999; CBERS-2, em 2003; e CBERS-2B, em 2007. Após o lançamento do CBERS-3, ainda em 2013, será lançado, até 2015, o CBERS-4. 12 Jornal do SindCT n Novembro de 2013 Mundo Movimento social em peso repudia leilão de Libra. Já a direita queria privatização ainda maior do Pré-Sal... César França/ANP Shirley Marciano O Pré-Sal parece começar a sair do papel, em meio a um grande conflito entre o governo brasileiro de um lado, a sociedade civil de outro, e por fim uma terceira ala, que reúne as forças políticas derrotadas na eleição presidencial de 2010. No dia 21 de outubro, um consórcio formado por cinco empresas — a Petrobras, a anglo-holandesa Shell, a francesa Total, as chinesas CNPC e CNOOC — venceu o leilão do Campo de Libra, a maior reserva de petróleo conhecida do Brasil. Foi o primeiro leilão a envolver a exploração de petróleo e gás natural na camada do Pré-Sal sob o regime de partilha. O consórcio vencedor ofereceu proposta de repassar à União 41,65% do excedente em óleo extraído do campo, que era o valor mínimo do leilão em edital, já que não houve disputa, pois nenhum outro consórcio se apresentou — apesar de, inicialmente, 11 empresas terem esboçado interesse. Gigantes do petróleo, como as norte-americanas Exxon e Chevron e as britânicas BP e BG, ficaram de fora. O movimento social em peso se colocou contra o leilão de Libra. O arco de oponentes da partilha incluiu a Central Única dos Trabalhadores (CUT, politicamente próxima ao governo), e personalidades ligadas ao PT, como o ex-presidente da Petrobras, José Gabrielli, e o geólogo Guilherme Estrella, ex-diretor da estatal e apontado como um dos principais responsáveis pela descober- Representante da Petrobras deposita lance vencedor no leilão de Libra ta do Campo de Libra. Trabalhadores, sindicalistas, ambientalistas, representantes de movimentos sociais diversos protestaram diante do Hotel Windsor, na Barra da Tijuca (Rio de Janeiro), onde o leilão foi realizado. Na linha de frente estavam os petroleiros, representados pelo Sindicato dos Petroleiros (Sindipetro-RJ), Federação Nacional dos Petroleiros (FNP) e Federação Única dos Petroleiros (FUP). Também a Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet) colocou-se terminantemente contra o leilão. A categoria é contra a partilha da exploração e dos lucros do Pré-Sal com empresas estrangeiras. A Força Nacional e o Exército, cuja presença foi previamente solicitada, reprimiram os manifestantes. Pela Constituição brasileira, as riquezas minerais do país pertencem à União. O proprietário do solo não é dono do subsolo e nem do que nele se encontra. Em zonas marítimas, os recursos naturais também pertencem ao país. Desde o governo FHC e até 2010, o regime de exploração de novos campos petrolíferos era de concessão, que continua valendo para campos fora do Pré-Sal. No regime de concessão, os consórcios ou empresas vencedoras apropriam-se de todo o óleo de um bloco arrematado em leilão, pagando ao governo apenas impostos, royalties e participação especial. “Valor estratégico” Num leilão de regime de partilha, por sua vez, vence o consórcio ou a empresa que oferecer à União a maior parte do petróleo que será extraído. No caso do Campo de Libra, o percentual mínimo era de 41,65%. O consórcio vencedor terá que pagar também à União um bônus de assinatura do contrato, no valor de R$ 15 bilhões. O edital prevê, ainda, que a Petrobras será a operadora do campo, com participação mínima de 30%. Ou seja, mesmo que a empresa brasileira não fizesse parte do consórcio vencedor, teria de ser aceita como sócia do projeto com 30% de participação. O prazo do contrato é de 35 anos sem prorrogação. Desse modo, o regime de partilha implica menor grau de privatização e maiores receitas para o Brasil e para a Petrobras. Esta é uma das razões que levaram a direita, e suas vozes na mídia, a bradar contra o leilão de Libra: queriam que o governo entregasse a maior parte da receita ao setor privado. Mas, enquanto partidos como o PSDB (e comentaristas econômicos) se apressavam a decretar o “fracasso” do leilão, o mercado financeiro dava sinais de satisfação com o resultado obtido. Em 2010, o governo brasileiro adotou o regime de partilha como modelo para os leilões do Pré-Sal exatamente com o objetivo de exercer maior controle do processo de exploração das reservas. O modelo também permite compartilhar os riscos, sejam eles geológicos, regulatórios ou financeiros. Porém, no caso de Libra, o risco é baixíssimo, o que suscitou fortes críticas ao governo. Quanto maior a certeza de haver petróleo, maior deveria ser a parte da União (ou da Pe- trobras). Melhor: a União poderia, em vez de leiloar a exploração, ter contratado a Petrobras diretamente, como defende Estrella. “Trata-se de gigantesco volume de petróleo, agora compartilhado com sócios que representam interesses de potências estrangeiras, sobre cujo alinhamento com o posicionamento geopolítico de um país emergente da importância do Brasil não temos a menor garantia. A Petrobras, que mapeou a estrutura de Libra e perfurou o poço descobridor, como empresa controlada pelo Estado brasileiro, deveria ter sido contratada diretamente, como permite o marco do Pré-Sal”, declarou o géologo à Folha de S. Paulo. “Aliás, a inclusão desta alternativa teve como causa a eventualidade de se tratar com reservas cujas dimensões tivessem valor estratégico para o Brasil, e este é inquestionavelmente o caso de Libra”. É o que se faz em países do Oriente Médio, cujas empresas estatais contratam outras empresas para prestar o serviço de extrair o petróleo, que é destinado integralmente aos governos daqueles países. Libra fica na Bacia de Santos. Tem cerca de 1,5 mil km2, maior área de exploração do mundo, segundo a ANP. A estimativa é que o volume de óleo recuperável seja de 8 bilhões a 12 bilhões de barris, enquanto as reservas nacionais são hoje de 15,3 bilhões de barris. As reservas de gás somam atualmente 459 bilhões de m3 e também devem duplicar com Libra. O início da produção pode levar de 5 a 10 anos.