vii-congresso-saude-pp-1-84:VI-CONGRESSO-SAUDE-um.qxd 14-01-2008 10:41 Page 57 Actas do 7º Congresso Nacional de Psicologia da Saúde Organizado por Isabel Leal, José Luís Pais Ribeiro, Isabel Silva, e Susana Marques 2008, Porto: Universidade do Porto Factores de personalidade, comportamento alimentar e imagem corporal na obesidade mórbida ANA REBELO (*) ISABEL LEAL (*) A obesidade é uma doença crónica de génese multifactorial sendo considerada pela Organização Mundial de Saúde a epidemia do século XXI. Com esta investigação pretendeu-se estudar os Factores de Personalidade, o Comportamento Alimentar e a Imagem Corporal dos sujeitos com Obesidade Mórbida candidatos a cirurgia bariátrica. Utilizou-se como referência teórica ao nível da Personalidade o Modelo dos Cinco Factores de Costa & McCrae; e ao nível do comportamento Alimentar a teoria da Externalidade de Schachter e a Teoria da Restrição de Herman & Polivy. O Modelo dos Cinco Factores organiza hierarquicamente os traços de personalidade em cinco dimensões básicas: Neuroticismo (N), Extroversão (E), Abertura à Experiência (O), Amabilidade (A) e Conscienciosidade (C) (Lima, 1997). A Teoria da Externalidade afirma que os obesos são mais sensíveis aos indícios externos face aos internos, sendo que esta sensibilidade acrescida aos estímulos externos era responsável pelo desenvolvimento da obesidade (Carmo, 2001; Viana, 2002; Ogden, 2004; Straub, 2005). A Teoria da Restrição sugere que a restrição da alimentação pode constituir um melhor preditor da ingestão de comida do que o peso (Ogden, 2004; Straub, 2005). Participantes MÉTODO A investigação envolveu 56 sujeitos (85,7% do sexo feminino e 14,3% do sexo masculino) diagnosticados com Obesidade Mórbida (Índice de Massa Corporal>40) que aguardavam a realização de cirurgia bariátrica, ou a efectuaram há menos de cinco anos, com idades compreendidas entre os 23 e os 70 anos de idade (M=42,50; SD=11,1). Material Os factores de Personalidade foram avaliados com o Inventário de Personalidade NEO Revisto na Forma S (NEO-PI-R de Costa & McCrae, 1992, aferido para a população portuguesa por Lima, 1997); o Comportamento Alimentar com o Questionário Holandês do Comportamento Alimentar (DEBQ de Van Strien, Fritjers, Bergers & Defares, 1986, aferido para a população portuguesa por Viana & Sinde, 2003); e a Imagem Corporal com o Desenho da Figura Humana. Utilizou-se ainda um questionário de caracterização da amostra. Procedimento Utilizou-se um método exploratório com um desenho descritivo-transversal e um modelo de amostragem não-casual com um método de amostragem por conveniência. A análise estatística foi (*) Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa, Portugal, Portugal. 57 vii-congresso-saude-pp-1-84:VI-CONGRESSO-SAUDE-um.qxd 14-01-2008 10:41 Page 58 7º CONGRESSO NACIONAL DE PSICOLOGIA DA SAÚDE efectuada com recurso ao software SPSS (V.14, SPPSInc., Chicago, IL): alpha de cronbach, correlação de Pearson, Teste t-Student para uma amostra; MANOVA e Análise de Correlação Canónica. Para o Desenho da Figura Humana recorreu-se à Análise Categorial e Análise de Conteúdo. RESULTADOS O NEO-PI-R obteve um bom índice de fiabilidade (α=0,85) e o DEBQ excelente (α=0,93). Existe uma correlação positiva e estatisticamente significativa entre a dimensão Ingestão Emocional e a dimensão Ingestão Externa (r(56)=0,74; p<0,001; α<0,01) e entre a dimensão Restrição Alimentar e a dimensão Ingestão Emocional (r=0,30; p<0,001; α<0.01). A significância da diferença entre os scores médios nos domínios e facetas do NEO-PI-R e do DEBQ obtidos nesta amostra vs. Os scores médios obtidos na população portuguesa foram avaliados com o teste t-student para uma amostra (Quadro 1). Quadro 1 Comparação de médias no NEO-PI-R e no DEBQ com o Teste t-student para uma amostra M SD df t p N-Neuroticismo 100,750 23,040 55 -07,45*** 0,001 N1-Ansiedade 20,27 4,58 55 -94,11*** 0,001 -00,27*** 0,790 N2-Hostilidade 14,66 4,53 55 N3-Depressão 17,04 6,50 55 -01,08*** 0,290 N4-Auto-Consciência 16,39 4,40 55 -00,33*** 0,740 N5-Impulsividade 19,25 4,63 55 -05,42*** 0,001 -00,37*** 0,710 N6-Vulnerabilidade 13,14 4,91 55 E-Extroversão 107,380 17,280 55 0-0,79*** 0,430 E1-Caloroso 22,73 4,37 55 -01,77*** 0,080 E2-Gregariedade 16,75 5,44 55 -00,34*** 0,730 E3-Assertividade 15,13 4,23 55 -02,17*** 0,040 E4-Actividade 16,70 3,12 55 0-0,73*** 0,460 E5-Procura Excitação 16,82 4,01 55 0-1,42*** 0,160 E6-Emoções Positivas 19,25 5,02 55 -01,57*** 0,120 O-Abertura à Experiência 112,590 13,700 55 -02,45*** 0,010 O1-Fantasia 18,63 3,87 55 -03,14*** 0,001 -00,65*** 0,520 O2-Estética 20,20 4,54 55 O3-Sentimentos 20,61 3,51 55 -02,57*** 0,010 O4-Acções 15,86 3,45 55 0-0,53*** 0,600 O5-Ideias 18,04 4,60 55 -01,69*** 0,090 O6-Valores 19,27 3,14 55 -04,21*** 0,001 A-Amabilidade 121,040 16,530 55 0-1,03*** 0,310 A1-Confiança 19,07 4,71 55 -00,91*** 0,360 A2-Rectidão 19,30 3,80 55 -00,60*** 0,550 A3-Altruísmo 24,00 3,95 55 -03,98*** 0,001 A4-Complacência 18,04 4,66 55 0-1,23*** 0,230 A5-Modéstia 19,04 4,98 55 0-1,45*** 0,150 A6-Sentimental 21,59 3,01 55 -00,97*** 0,330 C-Conscienciosidade 120,360 19,890 55 0-3,36*** 0,001 -02,65*** 0,010 C1-Competência 21,30 3,69 55 C2-Ordem 20,21 4,01 55 -02,45*** 0,010 C3-Ordem 23,43 3,78 55 -01,25*** 0,210 C4-Realização 19,68 4,82 55 0-0,34*** 0,730 C5-Auto-disciplina 19,18 4,71 55 0-0,03*** 0,970 C6-Deliberação 16,55 4,87 55 0-2,68*** 0,010 Restrição Alimentar 02,92 0,70 55 -09,09*** 0,001 Ingestão Externa 02,99 0,78 55 -02,26*** 0,020 Ingestão Emocional 02,98 1,18 55 -06,53*** 0,001 Nota. N=56; M-Média Amostral; SD-Desvio-padrão amostral; ***p<0,01 Diferença muito significativa; **p≤0,05; *p≤0,10. 58 vii-congresso-saude-pp-1-84:VI-CONGRESSO-SAUDE-um.qxd 14-01-2008 10:41 Page 59 FACTORES DE PERSONALIDADE, COMPORTAMENTO ALIMENTAR E IMAGEM CORPORAL NA OBESIDADE MÓRBIDA No NEO-PI-R existe uma diferença muito significativa ao nível do Neuroticismo, Conscienciosidade, Ansiedade, Impulsividade, Altruísmo e Deliberação; e, uma diferença significativa na Abertura à Experiência, Assertividade, Fantasia, Valores e Sentimentos. No DEBQ existe uma diferença muito significativa ao nível da Ingestão Emocional e da Restrição Alimentar; e, uma diferença significativa na Ingestão Externa. Com base na Análise de Correlação Canónica a variável mais importante na dimensão 1 é a faceta C5 enquanto que na dimensão 2 é a Restrição Alimentar. Na dimensão 1 a Ingestão Emocional e a Ingestão Externa estão próximas sendo opostas à Restrição Alimentar, sendo que a Ingestão Emocional se encontra no extremo oposto de C4. Na Dimensão 2 a Restrição Alimentar está no extremo oposto de A4. No set 1 a Restrição Alimentar apresenta uma discriminação maior na dimensão 2, enquanto que a Ingestão Externa apresenta uma discriminação maior na dimensão 1. No set 2 a faceta N3 apresenta uma discriminação maior na dimensão 2 enquanto que N5 apresenta uma discriminação maior na dimensão 1 (Figura 1). Figura 1. Análise de Correlação Canónica NEO-PI-R e DEBQ O Desenho da Figura Humana revela uma figura grande estereotipada, em posição vertical, frontal, simétrica e sem movimento. DISCUSSÃO Esta amostra revela mais características Neuróticas, de Conscienciosidade, Ingestão Emocional e Restrição Alimentar face à população portuguesa. Para Larsen et al. (2004) o neuroticismo pode ser um preditor de uma menor perda de peso pós-cirúrgica. Esta amostra não apresenta valores de Depressão (N3) estatisticamente significativos contrariando assim as conclusões dos estudos de Castelnuovo-Tedesco e Schiebel (1975); Bull et al. (1983); Black et al. (1992), Hernâni (2001) e Segal 59 vii-congresso-saude-pp-1-84:VI-CONGRESSO-SAUDE-um.qxd 14-01-2008 10:41 Page 60 7º CONGRESSO NACIONAL DE PSICOLOGIA DA SAÚDE (2002). Relativamente ao Comportamento Alimentar esta amostra exerce regularmente um esforço adicional para controlar o apetite e ingestão de alimentos envolvendo-se em dietas; existe maior perda de controlo da ingestão por exposição a factores de stress emocional com consequente desinibição ou perda de controlo devido a factores externos intrínsecos aos alimentos ou à situação social em que são ingeridos. O acto de comer pode ser encarado como um mecanismo compensatório da solidão e frustração acompanhado de um desconhecimento de controlo interno e dos limites sendo esta mesma frustração uma referência ao mundo interno a que se foge. Procura-se no exterior o que não se quer procurar no interior. Esta investigação confere-nos informação adicional de modo a providenciar a possibilidade de planear um tratamento mais acurado para cada sujeito. REFERÊNCIAS Black, D.W., Goldstein, R.B., & Mason, E.E. (1992). Prevalence of mental disorder in 88 morbidly obese bariatric clinic patients. American Journal of Psychiatry, 149(2), 227-234. Bull, R.H., Engels, W.D., Engelsmann, F., & Bloom, L. (1983). Behavioural changes following gastric surgery for morbid obesity: A prospective, controlled study. Journal of Psychosomatic Research, 27, 457-67. Carmo, I. (2001). Doenças do Comportamento Alimentar. Lisboa: Instituto Superior de Psicologia Aplicada. Castelnuovo-Tedesco, P., & Schiebel, D. (1975). Studies os superobesity: I. Psychological characteristics of superobese patients. International Journal of Psychiatry Medicine, 6(4), 465-480. Hernâni, K.N. (2001). Aspectos psiquiátricos de la obesidad. In E. Garcia-Camba (Ed.), Avances en transtornos de la conduta alimentaria. Anorexia nerviosa, bulimia nerviosa, obesidad (pp. 347364). Barcelona: Masson. Larsen, J.K., Geenen, R., Maas, C., Pieter de Wit, Tiny van Antwerpen, Brand, N., & Bert van Ramshorst (2004). Personality as a predictor of weight loss maintenance after surgery for morbid obesity. Obesity Research, 12, 1828-1834. Lima, M.P. (1997). NEO-PI-R, Contextos Teóricos e Psicométricos. “OCEAN” ou “iceberg”? Dissertação de Doutoramento apresentada à Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Coimbra. Ogden, J. (2004). Psicologia da Saúde (2ª ed.). Lisboa: Climepsi. Segal, A., & Fandiño, J. (2002). Indicações e contra-indicações para realização das operações bariátricas. Revista Brasileira Psiquiatria, 24(Supl. III), 68-72. Straub, R. (2005). Psicologia da Saúde. Porto Alegre: Artmed. Van Strien, T., Frijters, J. Berger’s, G., & Defares, P. (1986). The Dutch Eating Behavior Questionnaire (DEBQ) for assessment of restrained, emotional, and external eating behaviour. International Journal of Eating Disorders, 5(2), 295-315. Viana, V. (2002). Psicologia, saúde e nutrição: Contributo para o estudo do comportamento alimentar. Análise Psicológica, 4(20), 611-624. Viana, V., & Sinde, S. (2003). Estilo Alimentar: adaptação e validação do Questionário Holandês do Comportamento Alimentar. Psicologia: Teoria, Investigação e Prática, 1, 059-071. 60