MARIA INÊS REINERT AZAMBUJA, PAULO TSCHIEDEL, MIRIAM DABDAB DOMINGUES KOLLINGER,
PAULO ANTONIO BARROS OLIVEIRA, JUSSARA MARIA ROSA MENDES, SÉRGIO LUIZ BASSANESI
ARTIGO
Síndrome Miofascial e Síndrome de Dor
Regional Complexa em uma Amostra de
Casos de LER/DORT Atendidos em um
Ambulatório de Saúde do Trabalhador do SUS
(CIAST) em Porto Alegre: Fatores de Risco
Ocupacionais Associados às Síndromes de
Dor Regional
Maria Inês Reinert Azambuja* **
Paulo Tschiedel**
Miriam Dabdab Domingues Kollinger**
Paulo Antonio Barros Oliveira***
Jussara Maria Rosa Mendes****
Sérgio Luiz Bassanesi*****
RESUMO
Introdução: A síndrome miofascial (SMF) e a síndrome de dor regional complexa (SDRC) são condições
pouco reconhecidas, cuja associação com o trabalho ainda está sendo construída. A OS 606 do INSS as
exclui da lista de patologias potencialmente associadas ao trabalho. Neste artigo analisamos a associação
entre a prevalência de SMF e de SDRC e exposições a fatores ergonômicos referidas na anamnese
ocupacional. Metodologia: Estudamos 101 mulheres em acompanhamento ambulatorial por LER/DORT
(excluídos sete casos de fibromialgia) no CIAST, um ambulatório do SUS (Sistema Único de Saúde) que
atende portadores de doenças do trabalho em Porto Alegre. Identificamos casos de possível SMF e de
SDRC com base em critérios clínicos. Comparamos as prevalências das duas síndromes conforme referências
à repetição, força, sobrecarga estática, posição inadequada, vibração e a acidente do trabalho prévio entre
os casos de LER/DORT. Adicionalmente, comparamos a ocorrência destas síndromes em três grupos de
* Profa. Adjunta do Departamento de Medicina Social, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; CEDOP – Centro de
Documentação e Pesquisa em Saúde do Trabalhador, Departamento de Medicina Social, FAMED, UFRGS, Rua Ramiro
Barcelos 2600/420, Porto Alegre, RS – Brasil. Cep.: 90035-003. E-mail: [email protected].
** CIAST – Centro Integrado de Atenção à Saúde do Trabalhador, Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre, RS.
*** CEDOP – Centro de Documentação e Pesquisa em Saúde do Trabalhador, Departamento de Medicina Social, FAMED,
UFRGS.
**** NEST – Núcleo de Estudos e Pesquisas em Saúde e Trabalho; Pós-Graduação em Ciências Sociais, PUC/RS.
***** Departamento de Medicina Social, FAMED, UFRGS.
s
Este estudo foi parcialmente financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) –
Auxílio 02/2544.0, de 2002.
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SÍNDROME MIOFASCIAL E SÍNDROME DE DOR REGIONAL COMPLEXA EM UMA AMOSTRA DE CASOS DE LER/DORT
ATENDIDOS EM UM AMBULATÓRIO DE SAÚDE DO TRABALHADOR DO SUS (CIAST) EM PORTO ALEGRE: FATORES DE
RISCO OCUPACIONAIS ASSOCIADOS ÀS SÍNDROMES DE DOR REGIONAL
ocupações com diferentes composições de força e repetição na atividade laboral. Resultados: Nesta amostra,
a SMF foi significativamente mais prevalente em pacientes com relação à sobrecarga estática e posição
inadequada. A SDRC mostrou-se positiva e significativamente associada a acidente do trabalho prévio e
negativamente associada à posição inadequada. Não houve diferença na ocorrência de SMF em ocupações
com diferentes níveis de exigência de força e de repetições. Já a SDRC mostrou uma relação de doseresposta na exigência crescente de força relativamente à repetição no desenvolvimento das tarefas.
Conclusões: A SMF e SDRC foram muito freqüentes nesta amostra de casos crônicos. A repetição, a
sobrecarga estática e a força, possivelmente, associam-se a diferentes patologias osteomusculares. É necessário
revisar os critérios para a inclusão de patologias entre as reconhecidamente associadas ao trabalho, e
valorizar a força, mesmo na ausência de repetição, ao longo de toda a jornada de trabalho, como fator de
risco para o desenvolvimento de DORT e mau prognóstico para a sua evolução.
Palavras-chave: Doenças Ocupacionais; Transtornos Traumáticos Cumulativos; Neuralgia Facial ; Causalgia; Medicina Clínica; Epidemiologia.
INTRODUÇÃO
A síndrome miofascial (SMF) e a síndrome de dor
regional complexa (SDRC) são consideradas patologias não ocupacionais na Norma Técnica de Avaliação
da Incapacidade Laborativa (OS 606) do INSS1. Já o
Ministério da Saúde as inclui, adicionalmente às entidades neuro-ortopédicas definidas (tendinites, tenossinivites, síndromes compressivas), entre os distúrbios
osteomusculares relacionados ao trabalho (LER/DORT)2.
Ambas as síndromes são diagnosticadas com base
eminentemente clínica e sua principal manifestação é
a dor regional.
A SMF caracteriza-se por dor crônica, contratura
muscular e ponto gatilho, associada à redução de força e parestesias na região afetada, fadiga, insônia e
freqüentemente depressão3. O ponto-gatilho miofascial é um achado característico. É descrito como um
ponto sensível sobre uma banda muscular tensa. Sua
compressão provoca uma reação de retirada, e reproduz a dor regional referida pelo paciente4.
A SDRC é descrita como dor excruciante, alodinia
(dor devida a estímulo mecânico ou térmico que normalmente não provoca dor) ou hiperalgesia (resposta
exagerada a um estímulo normalmente doloroso), associada, episodicamente, a edema, alterações no fluxo sangüíneo da pele ou atividade sudomotora anormal
na região afetada, na ausência de outra condição que
possa explicar a dor e a disfunção5-7. É mais freqüentemente descrita após traumatismo com lesão de nervo
periférico, mas também é reconhecida em portadores
de neuropatia diabética e esclerose múltipla, e também
é descrita após acidente vascular cerebral e infarto do
miocárdio6-8. É uma condição severamente incapacitante6. Seu reconhecimento em portadores de LER/
DORT é recente9-10 e ainda pouco generalizado.
Para ampliar o conhecimento sobre estas síndromes, especialmente no que se refere à sua associação
com manifestações de dor osteomuscular incapacitante, desencadeada ou agravada pelo trabalho, estudamos 108 mulheres com diagnóstico de DORT atendidas
no Centro Integrado de Atenção à Saúde do Trabalhador (CIAST), um ambulatório do SUS que atende portadores de doenças do trabalho em Porto Alegre.
Em publicação anterior11, descrevemos este grupo
de pacientes do ponto de vista sociodemográfico e
ocupacional; identificamos possíveis portadoras destas duas síndromes em nossa amostra; e descrevemos
sintomas, evolução clínica e comorbidades associadas
a estes diagnósticos.
Mesmo com as limitações reconhecidas para a caracterização destas condições no contexto exclusivo da
clínica, os critérios utilizados conseguiram individualizar três grupos de pacientes nesta amostra: um com
queixas localizadas e melhor prognóstico; outro com dor
em membro superior e pescoço, com mais tempo decorrido desde o início dos sintomas e cuja manifestação mais característica, além da dor, era a perda de força
em membro superior (SMF); e um terceiro, com dor
mais localizada em um membro superior, freqüentemente de caráter flutuante, e que assume, após esforço
leve a moderado, caráter excruciante com alguns dias
de duração, acompanhando-se de edema em punho,
região medial do cotovelo e choques nos dedos (DSR)
– este foi o grupo com pior evolução entre os casos11.
O conjunto de fatores específicos reconhecidos
como de risco para a ocorrência de LER/DORT são os
biomecânicos – força, postura, repetição, sobrecarga
muscular, exposição ao frio e às vibrações; os psicossociais – relacionados à organização do trabalho, como
exigência de alta produtividade e qualidade do produto, fragmentação das tarefas, invariabilidade das tarefas, pressão de tempo e falta de controle pelo
trabalhador sobre o modo e ritmo de trabalho; e os
ligados à psicodinâmica do trabalho, gerados em certas situações especiais de trabalho12-13.
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Neste estudo, a investigação limitou-se à associação potencial entre os diagnósticos de SMF e SDRC e
exposição aos fatores ergonômicos mais freqüentemente investigados durante o atendimento clínico e a acidentes do trabalho (AT) prévios.
MET
ODOL
OGIA
METODOL
ODOLOGIA
Todas as pacientes com LER/DORT que se encontravam em acompanhamento no serviço durante o
período de recrutamento foram convidadas a participar. Foram recrutadas 113 pacientes sendo 108 efetivamente incluídas no estudo.
Todas receberam esclarecimento sobre a finalidade do estudo e foram convidadas a responder um questionário e realizar exames e medições de rotina que
faltassem nos prontuários médicos. Todas foram submetidas a um exame físico orientado pelo histórico
clínico e ocupacional registrado em prontuário e revisado no momento da avaliação clínica. Em 90% dos
casos a avaliação clínica foi realizada em conjunto pelos
dois médicos pesquisadores do serviço. O protocolo
de investigação foi submetido ao Comitê de Ética da
Secretaria Municipal da Saúde de Porto Alegre e aprovado. As pacientes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.
Os critérios diagnósticos3-4 utilizados para a identificação da SMF entre os casos de LER/DORT são apresentados na Tabela 1.
Foram inicialmente classificados como suspeitos de
SMF casos que apresentavam dor, hipertonia regional
e ponto doloroso à palpação, mas sem o padrão de
dor referida característico do ponto gatilho. Após a
Tabela 1
Critérios para a Categorização Diagnóstica
de Síndrome Miofascial (SMF)
Diagnóstico positivo de SMF
• Dor regional
• Hipertonia regional
• Ponto gatilho (ou ponto doloroso à palpação
– ver abaixo)
• Pelo menos dois dos sinais e sintomas abaixo
– Parestesias distais na área afetada
– Sensação de peso no braço
– Deixa cair objetos
– Descoordenação de movimentos finos
– Tremor ao esforço
– Força reduzida ao exame, na comparação com
o outro membro
• Adicionalmente,
– Alteração no padrão de sono
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análise inicial dos dados, optamos por aglutinar positivos e suspeitos, já que não havia diferença significativa entre os dois grupos, e não há consenso com relação
à importância desta distinção na literatura14.
Os critérios diagnósticos utilizados para a categorização da ocorrência de SDRC entre os casos de LER/
DORT são apresentados na Tabela 215:
Tabela 2
Critérios para o Diagnóstico de Síndrome
Dor Regional Complexa (SDRC)
Diagnóstico positivo de SDRC
• Dor regional difusa excruciante
• Pelo menos dois dos sinais e sintomas abaixo:
– Diferença na cor da pele relativa ao outro membro
– Edema
– Diferença de temperatura na pele, relativa ao outro
membro
– Limitação na amplitude do movimento ativo
• Adicionalmente,
– Ocorrência ou exacerbação dos sinais/sintomas
acima com o uso
Foram considerados suspeitos os diagnósticos em
que houve dúvida sobre o caráter excruciante da dor.
Para a análise utilizamos a categoria possível SDRC,
que incluía casos positivos e suspeitos.
Os casos de fibromialgia também foram individualizados, com base em critérios da Associação
Americana de Reumatologia: dor crônica difusa,
generalizada e pelo menos 11 de 18 pontos dolorosos à palpação digital (força equivalente a 4 kg), localizados próximo à inserção de músculos, nos lados
direito e esquerdo do corpo e acima e abaixo da linha da cintura – freqüentemente acompanhada por
fadiga e distúrbio do sono16. Optou-se por excluí-los
desta análise, já que a fibromialgia não tem sido considerada LER/DORT.
Foram coletadas informações sobre variáveis sociodemográficas (idade, escolaridade) e ocupacionais
(ocupação, setor de atividade, condição de atividade).
Com relação à caracterização ergonômica do tipo de
exposição, as pacientes foram questionadas sobre a
exigência de força, repetição, posições inadequadas,
esforço estático e exposição à vibração na execução
das atividades. Responderam também sobre a ocorrência de acidentes do trabalho no passado. Para superar a limitação de utilizar apenas uma abordagem
categórica para avaliar a exposição à força e à repetição neste grupo de casos, e por entender que força e
repetição contrapõem-se e limitam uma à outra, construiu-se uma variável com conteúdo semiquantitativo,
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SÍNDROME MIOFASCIAL E SÍNDROME DE DOR REGIONAL COMPLEXA EM UMA AMOSTRA DE CASOS DE LER/DORT
ATENDIDOS EM UM AMBULATÓRIO DE SAÚDE DO TRABALHADOR DO SUS (CIAST) EM PORTO ALEGRE: FATORES DE
RISCO OCUPACIONAIS ASSOCIADOS ÀS SÍNDROMES DE DOR REGIONAL
para capturar a composição relativa de força e repetição nas atividades dos pacientes. A partir da análise
qualitativa das atividades das pacientes no trabalho,
classificou-se as ocupações em três categorias: predomínio de repetição, repetição e força, predomínio
de força.
Utilizou-se o EPI-INFO versão 6.4 para criar o banco de dados e realizar as derivações e análises. Empregou-se a razão de prevalências como medida da
associação entre exposição ocupacional e desfechos
(SMF e SDRC) e o x2 (ou o teste exato de Fisher quando indicado) como teste de significância estatística de
associação. Utilizamos o x2 para tendência linear para
testar a existência de dose-resposta na participação
relativa de força e repetição na ocorrência da SDRC.
Tabela 3
Descrição da Amostra conforme os Diagnósticos
de SMF, Excluídos os Casos de SDRC e de SDRC
(com ou sem SMF)
Idade média
Cor (%)
Branca
Não-branca
Escolaridade (%)
≤ 8 série
> 8 série
Meses de tratamento
episódio atual (média)
RESUL
TADOS
RESULT
A amostra final foi de 101 casos (excluídas sete
pacientes com diagnóstico de fibromilagia). A amostra de mulheres estudada tem em média 40,7 ± 9,7
anos (Mediana 42; 18-61), é majoritariamente branca (70,3%) e tem menos de oito anos de escolaridade (77%). Tem baixa rotatividade no emprego (tempo
na última ocupação: mediana: 2,7 anos; 0-22). É
constituída por trabalhadoras celetistas (93,1%), e em
benefício previdenciário (87%), sendo 75% em auxíliodoença por acidente do trabalho e 12% em auxílio-doença comum.
Para 23% das pacientes este não é o primeiro episódio de incapacidade relacionada à LER/DORT. A
maior parte dos casos é crônica. O tempo médio desde o início dos sintomas foi de 743 dias (mediana =
365). O tempo de tratamento no episódio atual variou entre 7 e 813 dias (mediana = 175,5).
Adicionalmente a diagnósticos localizados de tendinites e síndromes compressivas, eram possíveis portadoras de SMF, 89 de 101 pacientes (88%) e, de SDRC,
41 de 101 pacientes (41%). A soma dos diagnósticos
excede o número de pacientes porque várias pacientes atendiam os critérios para ambos os diagnósticos.
A descrição da amostra conforme os diagnósticos de
SMF e SDRC é apresentada na Tabela 3. O tempo
de tratamento no episódio atual era mais alto nos casos de SDRC (p = 0,10). Embora a proporção de nãobrancas e menor escolaridade fosse mais alta nos casos
de SDRC, a diferença não foi significativa.
Cinqüenta e dois por cento das pacientes trabalhavam na indústria, da qual estavam mais representados
os ramos metalúrgico (21,82%) e da alimentação
(11,9% ). As demais (48%) provinham principalmente
da área de serviços, em ramos de atividade variados:
serviços de saúde (12,9%); hotéis e restaurantes
(5,6%); serviços de limpeza (4,6%); lavanderias, organizações sindicais e serviços pessoais.
SMF
(s/SDRC)
n = 50
SDRC
n = 41
p
39,6
41,8
NS
76
24
63
34
73,5
26,5
83
17
7,6
11,6
NS
NS
p = 0,10
Referências a fatores de riscos ergonômicos e acidente do trabalho (AT) prévio são apresentadas na
Tabela 4.
Tabela 4
Freqüência de Relatos de Exposição à Força, Repetições,
Posições Inadequadas, Sobrecarga Estática, Vibração
e AT Prévio em um Grupo de Portadoras de LER/DORT
Atendidas em Ambulatório de Saúde do Trabalhador do
SUS (CIAST) em Porto Alegre
Fator de Exposição
%
Repetição
93
Força
83
Posições inadequadas
75
Esforço estático
59
Vibração
28
AT prévio
11
Entre os AT prévios foram relatados contusão/entorse do cotovelo4, queda3, traumatismo/entorse ombro2, torcicolo1, ferimento na mão1.
Os resultados da análise univariada da associação
entre a exposição aos fatores selecionados e a ocorrência de SMF e SDRC são apresentados nas Tabelas 5 e 6.
As exposições que mostraram associação significativa com a ocorrência de SMF foram o trabalho em
posição inadequada (RP =1,2; p = 0,05) e a sobrecarga estática (RP = 1,34; p = 0,0001). Já para a SDRC,
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Tabela 5
Medida de Associação entre Fatores de Risco
Ocupacionais e a Ocorrência de SMF
nos Casos Estudados
Fator de Risco X SMF
Ainda a ocorrência de AT prévio está significativamente associada à preponderância de força na atividade. Oito de 11 AT ocorreram em ocupações com
mais alta exigência de força (X2 = 7,58; p = 0,023).
Razão de
Prevalência (IC)
p*
Repetição
0,87
NS
Força
0,99
NS
Vibração
1,02
NS
Posição inadequada
1,2
0,05
Esforço estático
1,34
0,0001
AT anterior
0,92
NS
DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
2
* x ou teste exato de Fisher.
Tabela 6
Medida de Associação entre Fatores de Risco
Ocupacionais e a Ocorrência de Possível SDRC
nos Casos Estudados
Fator de Risco X SDRC
Razão de
Prevalência (IC)
p*
Repetição
0,80
NS
Força
1,27
NS
Vibração
0,97
NS
Posição inadequada
0,54
0,02
Esforço estático
1,32
NS
AT anterior
1,68
0,09
A prevalência de SMF e SDRC nos casos atendidos
foi elevada. Cabe ressaltar que esta é uma população
Tabela 7
Ocupações Agrupadas conforme o Predomínio
de Força ou Repetições no Desempenho da Atividade
Exposição
Ocupação
n
Predomínio
de repetição
Secretária, digitadora, outras
atividades administrativas
10
Repetição
e força
Coladora, costureira,
embaladora, gerente de
produção, auxiliar de fábrica,
montadora, operadora de
máquina, operadora de célula,
passadeira, revisora de
qualidade, massoterapeuta,
cabelereira, cozinheira
54
Predomínio
de força
Atendente de enfermagem,
atendente de nutrição,
auxiliar de cozinha, auxiliar de
lavanderia, auxiliar de padaria,
serviços gerais, doméstica,
operadora de trem
37
Total
101
%
* x2 ou teste exato de Fisher.
100
o relato de AT prévio foi positiva e significativamente
associado ao desfecho (RP = 1,68; p = 0,09), enquanto a exigência de posição inadequada teria se mostrado protetora (RP = 0,54; p = 0,02).
A Tabela 7 estratifica as ocupações conforme a exigência predominante de força ou repetição – conforme análise qualitativa das atividades executadas no
trabalho.
As Figuras 1 e 2 comparam a ocorrência de SMF e
SDRC nos três grupos de ocupações.
Como se vê, a ocorrência de SMF é uniforme nos
três estratos. Já para a SDRC, há um nítido efeito de
dose-resposta entre exposição e desfecho para ocupações agrupadas conforme a exigência crescente de
força (x2 para tendência linear 5,11; p = 0,02).
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80
60
40
20
0
Mais
repetição
Força e
repetição
Mais força
Fig. 1 – Prevalência de síndrome miofascial em três grupos
de ocupações com exigência crescente de força (versus repetições) no desempenho das atividades.
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SÍNDROME MIOFASCIAL E SÍNDROME DE DOR REGIONAL COMPLEXA EM UMA AMOSTRA DE CASOS DE LER/DORT
ATENDIDOS EM UM AMBULATÓRIO DE SAÚDE DO TRABALHADOR DO SUS (CIAST) EM PORTO ALEGRE: FATORES DE
RISCO OCUPACIONAIS ASSOCIADOS ÀS SÍNDROMES DE DOR REGIONAL
ferentes podem estar envolvidos nas lesões decorrentes de trabalho físico pesado em comparação ao trabalho monótono17. É possível que a exigência de
repetição ao longo da jornada de trabalho estabeleça
por si só um limite para a força que possa ser dependida em cada movimento. O efeito “protetor” da posição inadequada, estatisticamente significativo na
análise da associação com a SDRC, talvez também
possa ser entendido neste contexto.
%
100
80
60
40
20
0
Mais
repetição
Força e
repetição
Mais força
Fig. 2 – Prevalência de síndrome de dor regional complexa
em três grupos de ocupações com exigência crescente de
força (versus Repetições) no desempenho das atividades (x2
para tendência linear = 5,11; p = 0,02)
de casos crônicos, na qual 50% têm sintomas há mais de
um ano e 25% tiveram episódios anteriores de dor incapacitante. Além disto, o tempo médio de acompanhamento clínico no serviço e a freqüência de consultas
por paciente eram elevados, o que favoreceu a identificação dos casos.
Este estudo procurou caracterizar as síndromes regionais e investigar seus determinantes apenas com
os recursos usuais da clínica médica. A investigação
de fatores de risco ergonômicos foi realizada por resposta do paciente a indagações sobre possíveis exposições: seu trabalho exige força? Seu trabalho exige
movimentos repetitivos?, questões de rotina na anamnese ocupacional de portadores de dor osteomuscular.
No que concerne à força e à repetição, esta abordagem qualitativa não foi suficiente para discriminar, entre
portadores de LER/DORT já diagnosticadas, associações com desfechos específicos, pois o número de respostas positivas é muito alto nestes casos (neste estudo,
93% para repetição e 83% para força). Mas mesmo
uma abordagem crua como esta mostrou associação
positiva e significativa entre tarefas que exigem sobrecarga estática e posição inadequada e SMF, mas não
com SDRC. Ao contrário, o fator posição inadequada
mostrou-se protetor com relação à SDRC.
Como vimos, à medida que aumentava a contribuição da força na atividade laboral, aumentava a
chance de um diagnóstico de SDRC. Também, nas
ocupações com preponderância de força ocorreram
mais AT, também associados ao desfecho SDRC.
Combinações variadas de força e repetição possivelmente resultam em diferentes padrões de desgaste
das estruturas envolvidas. Mecanismos fisiológicos di-
Os resultados apresentados neste estudo confirmam
dados da literatura que associam a SMF à sobrecarga
estática. É possível que a sobrecarga estática também
seja percebida pelas pacientes como posição inadequada (associação significativa entre estes dois fatores
no estudo – p = 0,03), que, por sua vez, também se
mostrou significativamente associada à SMF na análise. Os resultados sugerem ainda que possa haver uma
associação entre a ocorrência de SDRC e traumatismos prévios, bem como com a exigência predominante
do emprego de força na execução das atividades laborais. Como se viu, ocupações com maior exigência
de força também associavam-se significativamente com
relatos de traumas prévios. É possível que, além deles,
a exigência de força ocasione microtraumas de repetição não imediatamente reconhecidos pelas trabalhadoras como agravos agudos, mas também com
potencial para resultar no desenvolvimento de SDRC.
Como a construção nosológica das LER/DORT deuse inicialmente a partir de casos ocorrendo majoritariamente em digitadores, foram, num primeiro
momento, mais associadas a elas as condições decorrentes da repetição de movimentos ao longo da jornada de trabalho (tendinites, tenossinovites, síndromes
compressivas). Daí resultou o primeiro nome pelo qual
a condição tornou-se conhecida: LER ou Lesões por
Esforços Repetitivos. Ao longo dos últimos 15 anos
houve, em todo o mundo, o reconhecimento de que
a associação entre trabalho e patologia osteomuscular
poderia ser mediada não apenas pela repetição, mas
também por posições inadequadas, contraturas estáticas e uso excessivo de força18, o que justificou a
troca na denominação original LER para DORT – Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho.
Esta modificação na nomenclatura, no entanto, não
resultou em ampliação equivalente da gama de patologias ou de ocupações de risco potencialmente
associadas a estas exposições. A OS 606, do INSS,
explicitamente exclui a Síndrome Miofascial e a Distrofia Simpático-Reflexa das condições abarcadas pelo
denominação DORT. Da mesma forma, os peritos
ainda hesitam em considerar a etiologia ocupacional
na ausência de repetição do gesto laboral ao longo
da toda a jornada de trabalho.
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MARIA INÊS REINERT AZAMBUJA, PAULO TSCHIEDEL, MIRIAM DABDAB DOMINGUES KOLLINGER,
PAULO ANTONIO BARROS OLIVEIRA, JUSSARA MARIA ROSA MENDES, SÉRGIO LUIZ BASSANESI
A elevada prevalência de SMF e SDRC entre os
casos de LER/DORT em acompanhamento clínico em
ambulatório especializado de doenças do trabalho
em Porto Alegre sugere que a exclusão destas duas
condições da lista de patologias e distúrbios osteomusculares potencialmente decorrentes do trabalho
deva ser revista.
A identificação da SDRC em trabalhadoras em ocupações onde a exigência de força era mais importante
que a de repetição recomenda a revisão da exigência
de repetição ao longo de toda a jornada de trabalho
para a caracterização de DORT. As ocupações com
mais alta exigência de força são, provavelmente, as mais
danosas para os trabalhadores no longo prazo. Elas não
só associam-se a relatos de traumas agudos como também a quadros de dor regional mais severos e de pior
prognóstico. Ainda, a mesma baixa qualificação que
faz de atividades com o uso de força a única opção de
inserção no mercado de trabalho impede a reabilitação na eventualidade de lesão. Talvez este seja na verdade o grupo com maior vulnerabilidade com relação
à má evolução dos DORT.
Para concluir, sugere-se aos clínicos e ortopedistas que frente a casos de dor regional em membro
superior, especialmente em pacientes que usam força
excessiva ao longo da jornada de trabalho, tenham
sempre em vista a possibilidade de SDRC. O primeiro
passo em direção a um diagnóstico clínico é considerar sua possibilidade.
AGRADECIMENT
O
AGRADECIMENTO
À secretária do CIAST Naura Morais, sem a
qual esta pesquisa não teria sido possível.
SUMMARY
Miofascial Pain Syndrome and Complex Regional Pain Syndrome Among Patients with Work-Related
Musculoskeletal Conditions Attending a Public Outpatient Clinic of Worker’s Health in Porto Alegre,
Brazil – Ergonomic Risk Factors Associated with Regional Pain Syndromes
Introduction: Miofascial Pain Syndromes (MPS) and Complex Regional Pain Syndromes (CRPS) are frequently
not recognized in clinical settings, and their work-relatedness is still being built. This study intends to investigate
associations between specific ergonomic exposures and Regional Pain Syndromes identified among cases of
work-related musculoskeletal conditions. Methods: 101 female patients attending a Public Outpatient Clinic
of Worker’s Health due to work-related musculoskeletal conditions were studied. After identifying MPS and
CRPS among those cases, the association between each syndrome and references to specific ergonomic
exposures made during the occupational history were measured. The cases were also distributed in three
groups, according to the relative preponderance of force versus repetition in the execution of the patients’
occupational tasks. Results: In this sample, MPS showed a positive significant association with static strength
and awkward positions. CRPS showed a significant positive association with previous work-related accidents,
and a significant negative association with awkward positions. CRPS also showed a dose-response dependence
on the necessary level of strength relative to repetition in the job-tasks. Conclusions: Different ergonomic
exposures may lead to different pathogenetic consequences upon the musculoskeletal system. A high strength
requirement may lead to a significant risk for work-related musculoskeletal conditions, and may be the cause
of definitive disability associated with the development of CRPS.
Key Words: Occupational Diseases; Cumulative Trauma Disorders; Facial Neuralgia; Causalgia; Clinical
Medicine; Epidemiology.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
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