ANÁLISE FÍLMICA Ensaio sobre a Análise Fílmica, Vanoye e Goliot-Lété Efectua-se em duas fases: (1) analisar um filme ou um fragmento é, antes de mais nada, no sentido científico do termo, assim como se analisa, por exemplo, a composição química da água, decompô-lo nos seus elementos constitutivos. É despedaçar, descosturar, desunir, extrair, separar, destacar e denominar materiais que não se percebem isoladamente “a olho nu”. Parte-se, portanto, do texto fílmico para “desconstruí-lo” e obter um conjunto de elementos distintos do próprio filme. Através desta etapa, o analista adquire um certo distanciamento do filme. Essa desconstrução pode naturalmente ser mais ou menos aprofundada, mais ou menos selectiva segundo os desígnios da análise. ANÁLISE FÍLMICA (2) estabelecer elos entre esses elementos isolados, compreender como estes se associam e se tornam cúmplices para fazer surgir um todo significante: reconstruir o filme ou o fragmento. É uma “criação” totalmente assumida pelo analista, é uma espécie de ficção, enquanto a realização continua sendo uma realidade. O analista traz algo ao filme; pela sua actividade, à sua maneira, faz com que o filme exista. ANÁLISE FÍLMICA na química, quebra-se um fragmento de matéria para se chegar a uma molécula e, daí, aos seus átomos, e destes átomos aos seus electrões, neutrões e protões... Mas e, quanto à análise de filmes? Segundo os autores, podemos proceder da mesma maneira e, portanto, já intuímos que podemos começar o trabalho “quebrando” o filme na suas “partes constituintes”: as sequências, as cenas, os planos, os elementos dos planos, a banda sonora, etc. As partes isoladas necessariamente terão que ser articuladas com as outras partes da obra; afinal, é a totalidade, o conjunto, o fluxo da obra que nos toma e arrebata. ANÁLISE FÍLMICA Três posições: (1) o sentido do autor, do seu projecto, das suas intenções: analisar um texto é, portanto, reconstruir o que o autor quer dizer; (2) o sentido do texto: este apresenta uma coerência interna, não necessariamente conforme às intenções explícitas do seu autor; (3) o sentido do leitor, do analista: é ele que descobre no texto significações que se referem aos seus próprios sistemas de compreensão, valores e afectos. ANÁLISE FÍLMICA Linguagem e Cinema, Christian Metz : (2 análises): (1) o analista de filmes interessa-se em observar, estudar e investigar como se apresenta, em diversos filmes, um certo tipo de código cinematográfico. Este código é um determinado procedimento técnico traduzível numa configuração imagética no filme. ANÁLISE FÍLMICA (2) análise fílmica: o filme é tomado na sua totalidade e não somente no seu código cinematográfico. Os elementos (códigos) não especificamente cinematográficos (figurinos, interpretação dos actores, cenários, etc.) não são menos importantes do que os cinematográficos (movimentos de câmara, decupagem, figuras de transição entre as cenas, montagem, etc.). O filme é visto como uma realização única, enquanto distintivo comparativamente a qualquer outro filme e mesmo outro produto cultural. O sistema a que se intenta chegar é a estrutura do seu texto. ANÁLISE FÍLMICA O texto é aquilo que consiste num desenvolvimento manifesto, num objecto concreto, que preexiste à intervenção do analista, é aquilo que precisa ser compreendido. O sistema (do filme), aquilo que o analista procura encontrar e que é sempre uma construção sua, é um objecto ideal construído pela análise. O sistema não tem existência material, nada mais é que uma lógica, um princípio de coerência, é a inteligibilidade do texto: o que é preciso supor para que o texto seja compreensível (Metz, Christian). ANÁLISE FÍLMICA “Da obra ao texto”, Roland Barthes: Diferencia a obra do texto: a obra é um fragmento de substância, ocupa alguma porção do espaço dos livros, enquanto que o texto é um campo metodológico. A obra pode ser vista (nas livrarias), enquanto que o texto demonstra-se; a obra segura-se na mão, o texto mantém-se na linguagem. ANÁLISE FÍLMICA A visão de Barthes sobre a obra aproxima-se da de Metz sobre o texto: quer dizer, em ambos trata-se de algo material, palpável, concreto e de existência prévia à intervenção do analista. Por outro lado, chamar o texto de “ campo metodológico”, no caso de Barthes, explicita uma atitude de intervenção na obra, segundo um programa pré-definido, uma determinada maneira de olhar e tratar o filme. ANÁLISE FÍLMICA TEXTO (Roland Barthes): Também nos evoca a construção daquilo a que Metz designa de “sistema do filme”, aquilo que o analista procura construir para a obra, a sua lógica interna. Novamente, em ambos os casos, o sistema (para Metz) e o texto (para Barthes) devem ser demonstrados e justificados. Elementos objecto de análise num filme (1) Elementos visuais representados; (2) Fragmentação: uma história contada em bocados: a montagem; (3) Tratamento do tempo: “o presente ominipresente”, a magia da ideia do tempo: lento, rápido, passagem do tempo, dos dias, anos, da noite para o dia e inverso, conjunção do passado real da gravação e do presente aparente no filme, construção de analepses, elipses… (4) Escala dos planos, incidência angular, profundidade de campo, objectiva utilizada; (5) Movimento da câmara: no campo, dos actores ou outros; (6) Passagens de um plano a outro: olhares, movimentos, cortes, fusões ou escurecimentos, outros efeitos; (7) Trilha sonora: diálogos, ruídos, música, escala sonora, intensidade, transições sonoras, continuidade/ruptura sonora; (8) Relações sons/imagens: sons in/off/fora de campo, sincronismo ou assincronismo entre imagens e sons. Análise fílmica (códigos) (1) Códigos antropológico-culturais – absorvemolos com a educação e socialização desde o nascimento – código perceptivo, de reconhecimento e icónicos; (2) Códigos tecnicamente mais complexos e especializados que presidem à combinação das imagens (códigos iconográficos, gramáticas de enquadramento, regras de montagem, etc.). Estes dois conjuntos estudam-se combinados, mesclados: não podem ser estudados dissociados. Movimentos da Funções básicas câmara – 1) Descritivas: acompanhamento de uma personagem ou objecto em movimento (reframing), criação da ilusão de movimento num objecto estático; descrição de um espaço ou de uma acção, possuindo um conteúdo dramático único e unívoco; (2) Dramáticas: definição de relações espaciais entre dois elementos da acção, acentuação dramática de uma personagem ou objecto, expressão subjectiva do ponto de vista de uma personagem, expressão da tensão de uma personagem.