GRUPO DE PESQUISA E A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA: O ITINERÁRIO DO HISTEDBR – GT CASCAVEL João Carlos da Silva UNIOESTE 1 André Paulo Castanha UNIOESTE 2 Paulino José Orso UNIOESTE 3 Marco Antonio Batista Carvalho UNIOESTE 4 Cláudio Afonso Peres UNIOESTE 5 Introdução Em se tratando de história da educação brasileira, ainda restam muito por ser feito. Seu conhecimento efetivo demanda muita pesquisa e não pode ser pensada como sendo uma tarefa de responsabilidade de apenas um ou alguns pesquisadores individuais ou grupos. Esta é uma tarefa que deve ser enfrentada coletivamente. Entendemos que o HISTEDBR vem dando uma contribuição significativa nesta direção. Sua forma de organização em GTS espalhados pelo país a fora, articulados entre si propicia a ampliação da pesquisa e do conhecimento. Aliam-se a isto, a realização dos seminários, jornadas, as publicações de coletâneas, reunindo as reflexões acumuladas, potencializam o alcance do conhecimento desta história. A pesquisa em história da educação está ganhando dia-a-dia mais importância, visto que, cada vez mais, novos objetos estão sendo trabalhados na sua historicidade. A história da educação hoje, não é mais apenas legislação e administração. Ela é história de instituições, de leitura, de professores, de disciplinas, de didáticas, de métodos, de políticas, da relação professor-aluno, da cultura escolar. Constituiu-se, portanto, numa variedade de objetos que enriquecem a história da educação. Esses novos objetos, por sua vez ampliaram consideravelmente o conceito de fontes, ou documentos relevantes ao trabalho do historiador da educação6. Como os alicerces da pesquisa histórica são as fontes ou documentos é fundamental fazer um levantamento e catalogação dessas fontes para preservar a historicidade da educação. O levantamento e a catalogação de tais fontes, além de possibilitarem a preservação da memória histórica, permitem chegar a um conhecimento mais acertado sobre o passado, bem como abrir caminho para a realização de outras pesquisas. A investigação histórica, muitas vezes justifica-se por um problema colocado pela realidade presente. No entanto, se o ponto de partida é a realidade atual, (ou os desafios colocados pela educação de hoje), a resolução 2 deles encontra-se no passado, na compreensão de seus determinantes. Daí o papel e a importância da pesquisa histórica. Nesse sentido, portanto, é que o HISTEDOPR vem se estruturando, e está procurando integrar ensino, pesquisa e extensão, articulando primeiro, segundo e terceiro graus e com a comunidade para garantir um melhor conhecimento sobre a história da educação, principalmente a regional. É sempre bom lembrar que a região Oeste do Paraná é relativamente nova, se tomarmos como referência a história do Paraná e do Brasil. No entanto, apesar de ser de colonização recente, sua localização geográfica nas proximidades com a Argentina e com o Paraguai e pela facilidade de deslocamento para a região Sul, para o Sudeste e Centro-Oeste, bem como para a capital do Estado, tem facilitado o encontro e o convívio de culturas permitindo a realização de experiências bastante ricas e diversificadas. Infelizmente, grande parte dessa história, tem sido perdida em função da ausência de acervos documentais que possibilitem sua preservação e reconstrução. Mas, não é apenas isto que nos preocupa. Se persistirmos neste caminho, também acabaremos perdendo a história que ainda está por ser realizada. Julgamos ser de fundamental importância a execução de um projeto que vise levantar, catalogar e preservar a documentação e as fontes de informação que possibilitem resgatar e compreender a história. Assim, como parte desse projeto, implantamos um curso de especialização em história da educação brasileira, cujo, foco das pesquisas é a temática regional, e desta forma, também estamos preservando a história da educação regional. E assim, também pretendemos contribuir no sentido de melhor conhecer a história da educação brasileira. Breve histórico do grupo Tendo em vista que a História da Educação Brasileira ainda é uma disciplina que carece de fontes que possibilitem uma melhor compreensão da mesma, o Grupo de História da Educação Brasileira – HISTEDBR –, coordenado pelo Professor Dermeval Saviani, a partir de 1986, decidiu desenvolver um esforço no sentido de resgatar as fontes primárias e promover sua catalogação para possibilitar um melhor conhecimento da própria Educação Brasileira. Assim nasceu o HISTEDBR, que de lá para vem se organizado nacionalmente, através de uma rede de Grupos de Trabalho – GTs – que, em suas regiões e/ou Estados, promovem pesquisas com o objetivo de realizar o levantamento e a catalogação de fontes 3 relacionadas à Educação Brasileira em sua área de abrangência, e em outras frentes de pesquisa. No Paraná atualmente o HISTEDBR conta com grupos de pesquisa na região Oeste do Paraná (Unioeste) – HISTEDOPR –, Ponta Grossa (UEPG), Maringá (UEM), Palmas (FACEPAL), Curitiba (PUC-PR). Todos os grupos desenvolvem projetos visando o levantamento e a catalogação de fontes no campo da educação. O GT Oeste do Paraná – HISTEDOPR, nasceu com o objetivo de promover pesquisas e estudos na área história da educação. Está vinculado ao Grupo de Pesquisa em "História, Sociedade e Educação no Brasil" - HISTEDBR – que tem abrangência nacional e organiza-se por meio de Grupos de Trabalho (GTs) regionais. O HISTEDOPR tem como um de seus principais objetivos, promoverem o "Levantamento, a Organização e a Catalogação de Fontes Primárias e Secundárias para a História da Educação na região Oeste do Paraná", contribuindo assim, com os demais grupos que integram o HISTEDBR, para ampliar o levantamento, a organização e a catalogação das fontes em âmbito nacional. Por um lado, isto se faz necessário em função da carência da historiografia educacional na região Oeste do Paraná e, por outro, tendo em vista que se as fontes historiográficas não forem preservadas e catalogadas, futuramente não teremos nem fontes nem História e continuaremos sem a possibilidade de construir algo novo e diferente em decorrência de não podermos conhecer nosso passado. Uma primeira tentativa de organização do GT na região se deu em 2002, mas as ações tiveram poucos resultados práticos. Mas o grupo se organizou, cresceu e estruturou-se a partir de 2003, a partir da iniciativa de alguns professores do Colegiado de Pedagogia da Unioeste – Campus de Cascavel, sob a coordenação do professor Paulino José Orso, que tinha retornado de seu doutorado na Unicamp. De lá para cá vem desenvolvendo atividades ligadas à pesquisa, ensino e extensão, sempre procurando articular a Unioeste com a comunidade. No final de 2003 organizou um grande evento, (provavelmente tenha sido o de maior participação do público na história da Unioeste) para discutir os desafios da educação na sociedade contemporânea, com a presença de Dermeval Saviani, Paolo Nosella e José Luiz Sanfelice. As ações do grupo nos anos de 2004, 2005 e 2006, se concentraram na realização de encontros mensais denominados de grupos de estudos, ciclos de debates, ou jornada cientifica, onde se discutiu vários temas de interesse regional. Dentre eles se destacaram a questão da colonização, da migração, a problemática da terra, da luta das mulheres, dos deficientes, da organização dos trabalhadores, da história da educação regional, enfim uma 4 série de temas foram debatidos entre a comunidade acadêmica e a sociedade em geral. Os palestrantes tiveram a oportunidade de expor suas pesquisas e debater com a comunidade. A filosofia do grupo é desenvolver e estimular a pesquisa e o conhecimento da ou sobre a região. Nesse sentido, se empenhou em organizar um Curso de Especialização Lato Sensu em História da Educação Brasileira, com 40 vagas, a partir de 2004, e nele privilegiando no processo seletivo, os candidatos que pretendiam e pretendem desenvolver pesquisa, específicas sobre a História da Educação da e/ou na região Oeste do Paraná, ou mais especificamente na área de abrangência da Unioeste. A primeira turma iniciou em 2004 e concluiu em 2006, com a defesa de 30 monografias sobre aspectos da educação regional. Uma nova turma foi oferecida em 2006 e tem até o final deste ano para defender seus trabalhos. Pelo que tudo indica vamos ter, nessa turma a defesa de um número maior de monografias. Isto deverá incrementar ainda mais a pesquisa e o conhecimento da história da educação regional e, também contribuir para o melhor conhecimento da História da Educação Brasileira, tendo em vista que, pela sua localização geohistórica, deverá trazer à tona muitos aspectos desconhecidos pela maioria dos pesquisadores. Nossa meta é transformar o Curso de Especialização em História da Educação Brasileira num curso regular da Unioeste, e dessa forma podermos lançar a carga horária dos professores no PIAD, pois até o momento o trabalho é voluntário. O trabalho de levantamento de fontes vem sendo desenvolvido a partir de 2003, mas a partir de 2005 recebeu um novo ânimo com o início das pesquisas monográficas dos alunos do curso de especialização nas bibliotecas e arquivos na região. O trabalho nas bibliotecas, arquivos e escolas está sendo desenvolvidos por alunos de graduação e pós-graduação. Eles receberam uma formação específica, na forma de curso de extensão, com um conteúdo teórico e prático sobre documentação e a prática de pesquisa. Estamos fazendo um levantamento bibliográfico de tudo o que já foi escrito sobre a região, na forma de artigos, monografias, dissertações, teses e livros. Já estamos acertados para fazer o levantamento nos jornais da região e estamos fazendo o levantamento nas escolas, nos arquivos municipais. Internamente o grupo organizou um regimento interno, o qual foi discutido e aprovado por todos os membros. Nele estão estabelecidos os objetivos, as metas e toda a organização do funcionamento de comissões, dos encontros para discutir os problemas e planejar as atividades, dos grupos de estudos. Constatamos no decorrer dos trabalhos, e em virtude do crescimento do mesmo, que era necessário organizar-se, também burocraticamente, pois toda estrutura montada pela instituição, Estado ou pelos grupos de fomento cobram 5 números e resultados práticos, daí a necessidade de organizar-se internamente, estabelecendo regras, princípios, direitos e deveres de seus membros. Recentemente tivemos a aprovação de um projeto pelo Governo do Estado para adquirirmos equiparmos para a infra-estrutura do grupo e para a publicação de livros, visando divulgar as pesquisas produzidas. A partir de 2008 o grupo terá mais estrutura para promover e estimular a realização de pesquisas coletivas e/ou individuais dos integrantes, ou junto a alunos e professores da rede de ensino. Além da problemática das fontes, os membros do HISTEDOPR, também desenvolvem pesquisas e atividades em outras frentes ou linhas de pesquisa, tais como, História da Escola Pública, Historiografia da Educação Brasileira, Educação Especial, Educação à Distância, Marxismo e Educação, etc. Estas atividades estão articuladas ao Grupo de Pesquisa Nacional em História da Educação Brasileira, ao HISTEDBR. Dessa forma, o HISTEDOPR pretende dar a sua contribuição para facilitar a realização de novas pesquisas e também para o enriquecimento dos conhecimentos em história da educação regional e nacional. Caracterização do grupo de pesquisa O HISTEDOPR é um grande coletivo de pesquisadores, no qual participam Doutores, Mestres, Especialistas, Graduados e discentes. Parte-se do princípio da heterogeneidade do conjunto dos membros do grupo. Na verdade é um grupo "maior" que articula e reúne outros grupos "menores". Seu vínculo maior está relacionado à pesquisa e a extensão em torno da História da Educação Brasileira, articulado teórico-metodologicamente ao enfoque materialista histórico como referencial. No âmbito da pesquisa, temos um grande projeto de pesquisa coletivo (Levantamento e Catalogação de Fontes em História da Educação na Região Oeste do Paraná) no qual quase todos os integrantes do grupo estão envolvidos. Dentro dele articulam-se diversos subprojetos: o de Levantamento e Catalogação de fontes, o de História Regional, o de História da Escola Pública, epistemologia e ensino de história, o de Educação Especial e o de Educação à Distância. Além destas pesquisas, os integrantes do grupo também desenvolvem pesquisas individuais, de acordo com sua área de atuação, com seus interesses profissionais e com seus projetos de vida e de luta política e social7. 6 Entretanto, as atividades do HISTEDOPR não se limitam à realização de pesquisas. Parte do tempo é dedicada à organização e estruturação do grupo, organização de grupos de estudo, organização e promoção de debates com o intuito de promover a socialização de conhecimentos, pesquisas e experiências realizadas por docentes, líderes comunitários, sindicalistas e outros, através de seminários, ciclos de debates e jornadas. Além disso, o grupo vem realizando encontros com objetivo de realizar um estudo sistemático das principais obras de Marx e Engels, que teve início em outubro de 2003, com a apresentação da bibliografia destes dois autores, seguindo-se com o estudo de suas obras principais seguindo a ordem cronológica de sua publicação, chegando em O Capital. Até o momento já foi percorrida uma etapa completa. Em 2007, estaremos realizando uma nova etapa reiniciando coma biografia destes autores. Julgamos que a realização da pesquisa referente à catalogação das fontes, ao longo do tempo, também permitirá aos pesquisadores da região, não apenas resgatar e compreender parte de sua história, mas, sobretudo formar e contar com um acervo documental, científico e cognitivo que permitirá a realização de outras pesquisas a partir daquelas realizadas. Além disso, a importância desta pesquisa está na sua vinculação com o Grupo de Trabalhos sobre História da Educação Brasileira, coordenada pelo Dermeval Saviani, que visa promover o levantamento de fontes sobre a educação brasileira, bem como sua catalogação a nível nacional. Por isso, acreditamos que o projeto de levantamento e catalogação de fontes sobre a história da educação do Oeste do Paraná é relevante tanto para esta instituição quanto para a História da Educação Brasileira. Entendemos que uma das funções mais importantes da universidade é a produção e socialização do conhecimento. Uma das formas de encontrar caminhos para a solução de determinados problemas é através da realização de debates e discussões. Neste sentido, o Grupo de Pesquisa em História, Sociedade e Educação no Brasil – GT da região Oeste do Paraná – HISTEDOPR – promoveu ao longo de 2004, 2005 e 2006, debates mensais, inicialmente sob a denominação de Ciclo de Debates e, posteriormente, a partir de 2006, sob a denominação de Jornadas de Estudos e Pesquisas, com temáticas de cunho acadêmico-social procurando articular os interesses imediatos e particulares de cada curso ou grupo de pesquisa articulando de forma interdisciplinar com a comunidade externa. Através destes eventos o grupo de pesquisa pretende não apenas articular a comunidade universitária internamente em seus diversos curso e áreas, mas também atingir o ensino Fundamental, Médio cumprindo assim a função social da universidade, que é articular a pesquisa, o ensino e a extensão. Nesta perspectiva, estes eventos visam oferecer elementos 7 para refletir sobre os impasses e desafios da pesquisa sobre a escola pública no Brasil. Objetiva-se com isso entender a escola pública atual a partir de seu contexto histórico, social, político e econômico. A idéia é oferecer aos participantes, subsídios teórico-metodológicos para compreender historicamente a educação no Brasil. Os eventos pretendem contribuir, ainda com as discussões acerca da história da educação brasileira, particularmente sobre a escola pública no Brasil, possibilitando aos alunos da graduação e pós-graduação e demais participante refletir e repensar a história da educação e da região como um todo e neste sentido aprofundar seus estudos sobre o tema. Portanto, a realização destes eventos visa trazer subsídios teóricos e práticos para docentes, discentes, pesquisadores e professores do ensino Fundamental e médio da rede estadual e municipal da Região oeste do Paraná para que possam refletir acerca da educação brasileira possibilitar a integração e articulação com os profissionais e alunos do ensino fundamental, médio e superior permitindo o acesso e a troca de experiências e conhecimentos com importantes pesquisadores da História da Educação Brasileira. O pressuposto básico é de que a realidade, tal como se apresenta, é uma construção de sujeitos históricos, determinados e determinantes, das relações sociais concretas engendradas pela totalidade social na qual se acham inseridos. Na constituição dos objetos, a marca do sujeito histórico que os concebe, pois a sua percepção sobre as dimensões do real guarda nexo com sua trajetória de vida no seio das relações sociais e, conseqüentemente, com os referenciais teórico-metodológicos que o inspira na citada construção. Sob tal pressuposto, o atual estágio da educação brasileira é visto como produto da trajetória de ações e formulações de sujeitos históricos, somadas ao longo do tempo no bojo da totalidade social. Considera-se dessa forma, que o estudo da história da educação é fundamental para o entendimento da educação que se faz no Brasil hoje, visto que, como as demais práticas sociais, o fenômeno educativo não se processa no vazio - temporal ou social mas, pelo contrário, está determinado pelas relações que os homens estabelecem entre si e com a natureza. O grupo de pesquisa e a busca de fontes As fontes ou documentos são indispensáveis para a sistematização de todo conhecimento histórico. O trabalho de identificação, do uso e a interpretação das fontes estão na base da constituição do caráter e da qualidade da pesquisa histórica. As fontes não falam 8 por si, como afirmam os positivistas, mas são, de fato, os vestígios, as testemunhas e manifestam as ações do homem no tempo, por isso respondem como podem por um número limitado de fatos. Segundo Saviani: As fontes estão na origem, constitui o ponto de partida, a base, o ponto de apoio da construção historiográfica que é a reconstrução, no plano do conhecimento, do objeto histórico estudado. Assim, as fontes históricas não são a fonte da história, ou seja, não é delas que brota e flui a história. Elas, enquanto registros, enquanto testemunhos dos atos históricos são fontes do nosso conhecimento histórico, isto é, é delas que brota, e nelas que se apóia o conhecimento que produzimos a respeito da história. (2004, p. 5-6). Lombardi segue o mesmo raciocínio ao afirmar que, As fontes resultam da ação histórica do homem e, mesmo que não tenham sido produzidas com a intencionalidade de registrar a sua vida e o seu mundo, acabam testemunhando o mundo dos homens em suas relações com outros homens e com o mundo circundante, a natureza, de forma que produza e reproduza as condições de existência e de vida. (2004, p. 155). Cabe, portanto ao pesquisador a tarefa de localizá-las, selecioná-las e interrogá-las. O sucesso da empreitada vai depender da qualidade das perguntas que forem feitas aos documentos. Como bem destaca Ragazzini, a fonte é uma construção do pesquisador, isto é, um reconhecimento que se constitui em uma denominação e em uma atribuição de sentido; é uma parte da operação historiográfica. Por outro lado, a fonte é o único contato possível com o passado que permite formas de verificação. Está inscrita em uma operação teórica produzida no presente, relacionada a projetos interpretativos que visam confirmar, contestar ou aprofundar o conhecimento histórico acumulado. A fonte provém do passado, é o passado, mas não está mais no passado quando é interrogada. A fonte é uma ponte, um veículo, uma testemunha, um lugar de verificação, um elemento capaz de propiciar conhecimentos acertados sobre o passado. (2001, p. 14). 9 Os documentos que provêm do passado certamente não foram elaborados pensando no trabalho dos futuros historiadores, mas sim visavam atender às exigências ou necessidades específicas de um determinado momento histórico. É evidente que nem todas as ações humanas ficaram registradas para a posteridade, pois a grande maioria acabou se perdendo no tempo e não poderão mais ser recuperadas e contadas. Mas os “homens produziram (e ainda produzem) artefatos, documentos, testemunhos, monumentos entre outros, que tornam possível o entendimento do homem sobre sua própria trajetória”. (LOMBARDI, 2004, p. 1556). Os registros históricos são as peças usadas pelos historiadores para produzir determinadas explicações históricas. Fica claro, portanto, que a qualidade do conhecimento histórico depende da relação dos historiadores com as fontes. E uma relação mais sólida com as fontes, só vai ser possível, quando ele não precisar gastar boa parte do tempo de pesquisa para localizá-las nos arquivos. Sendo assim, ao localizar, catalogar e as fontes está se investindo na qualidade das pesquisas futuras. Por fonte primária e secundária entende-se todo o conjunto de documentos registrados em arquivos, bibliotecas, museus e centros de documentação, e todo e qualquer documento, desmembrado, originário de locais dispersos, que se tornam objeto de estudo, se colocam a serviço da pesquisa educacional e servem como testemunho dos homens que os objetivaram historicamente. Por catalogação o projeto entende descrição em fichas impressas próprias dos elementos constitutivos, que permita a identificação dos documentos por parte do usuário. Uma vez registrados em fichas próprias, os dados básicos das fontes documentais, serão informatizados, produzindo, desta forma, uma catalogação digitalizada. Adam Shaff ao indagar a razão de sempre estarmos reescrevendo a história considerava que este processo deve-se basicamente em função das necessidades do presente e dos efeitos dos acontecimentos do passado no presente: A primeira explicação da reinterpretação da história está em relação com as posições do presentismo e é principalmente defendida pelos representantes desta corrente[...] o presentismo levado às últimas conseqüências conduz à negação da verdade história objetiva, e portanto, à negação da história como ciência (1995, p. 270). Uma concepção de educação e da sua história, produzida em termos abrangentes, deve ser desenvolvida e aplicada nas relações complexas e amplas do contexto cultural. Para permanecer apenas nos exemplos contemporâneos, estudamos e explicamos a educação escolar à medida que estabelecemos as suas relações com a história da família, da infância, do 10 trabalho manual, das profissões, do mercado de trabalho, da política, da política educacional e do modo de produção da vida social. Assim não é possível explicar a escola do século XIX, na Itália, sem compreender a divisão entre os estratos populares, médios e as elites, sem levar em consideração as classes sociais e profissões com as quais estas se articulavam e que determinavam demandas educativas diferenciadas. Não explicamos a escola humanista italiana do século XIX sem os problemas de unificação da língua, de uniformização nacional da burocracia e das profissões. Segundo Kosik (1986), visitar as fontes tem sentido na medida em que visa destruir no cotidiano a pseudoconcreticidade, desvendando a essência de sua aparência. Para, além disso, o contato, a análise e a crítica das fontes e o exame dos arquivos significa uma crítica da civilização e da cultura. O estudo do cotidiano ou da totalidade deve desvendar por trás de sua aparente neutralidade, a autêntica realidade do homem concreto. O estudo do cotidiano desvinculado da história é uma mistificação, da mesma forma que estudar a totalidade ausente de um rigor dialético fica reduzido a uma especulação vazia, sem sentido. A investigação do fenômeno deve realizar a passagem do pensamento mítico (o aparente) para o pensamento dialético (a essência). O esforço filosófico, desvalorizado pelas abordagens pós-modernas consiste neste desafio. José Carlos Reis, referindo-se à Escola dos Annales, considera que esta se constitui uma renovação teórico-metodológica em história partindo de uma nova representação do tempo histórico. Não foi propriamente a interdisciplinaridade que acarretou esta renovação, mas a nova representação do tempo, com uma aproximação das ciências sociais. O que haveria de comum entre todas as gerações dos Annales seria a perspectiva da longa duração. A renovação dos objetos exigiu a mudança no conceito de fonte histórica, em que a documentação passou a ser relativa ao campo econômico, social e mental. O arquivo renovouse e diversificou-se, a partir de uma ampliação e abertura do campo dos objetos, das fontes e técnicas históricas, enfatizando a documentação e não a problematização da pesquisa: O historiador escolhe, seleciona, interroga, conceitua, analisa, sintetiza, conclui. A partir da posição do problema, o historiador distribui as suas fontes, atribui-lhes sentido e organiza as séries de dados que ele terá construído. O texto histórico é o resultado de uma explícita construção teórica e não o resultado de uma narração objetivista de um processo exterior organizado em si pelo final. A organização da pesquisa é feita pelo problema que a suscitou; este vai guiar na seleção dos documentos, na seleção e construção das séries de eventos relevantes para a construção de hipóteses. Rompendo com a narração, a história tornou-se uma empresa teórica, que segue o caminho de toda ciência: põe problemas e levanta 11 hipóteses e demonstra-as com uma documentação bem criticada e com uma argumentação conceitual rigorosa. (REIS, 2000, p. 30). Flamarion Cardoso (1997), por sua vez, aponta para a necessidade de conhecermos os grandes pensadores da modernidade para então compreendermos o tempo presente. Todavia considera que o resultado da pesquisa está relacionado ao preparo do pesquisador, considerando que o êxito e a qualidade da pesquisa estão diretamente relacionados com a bagagem cultural do pesquisador. Somente sobre essa base contextual podemos nos aplicar sobre as fontes escolares, sabendo que elas não são suficientes para fazer uma história integral da escola, sabendo que podemos nos equivocar se concebemos as fontes provenientes da escola como as únicas fontes possíveis para a história da escola. As fontes provenientes das práticas escolares não representam as únicas possibilidades para os estudos histórico-educativos, portanto não são auto-suficientes, ainda que sejam importantes e significativas. Existem fontes específicas para o estudo de um autor, de um professor, existem fontes para o estudo de uma instituição local, uma escola, um lugar, um ambiente. Na história local e específica de uma escola, estão dispostos todos os problemas conexos à história desse local, não obstante eles ganhem significação colocada em relação à história nacional. Muitos temas de pesquisa histórica, tais como: histórias de cultura docente, das profissões, são particularmente sensíveis à história dos contextos operativos, sem os quais não compreendemos nem a história da didática, nem a história da administração, nem a história das profissões. Sem saber quantos alunos havia por classe, sobre que bancos, por quantas horas e como se distribuíam essas horas, com quais livros, com quais cadernos, com quais objetivos, não compreendemos os programas nacionais, não compreendemos as reivindicações sindicais dos professores, não compreendemos o que era a instituição escolar. (Cf. RAGAZZINI, 2001). Se buscarmos o significado da palavra “fonte” veremos que “contêm uma dimensão de origem e também de surgimento, o que se relaciona a uma idéia de espontaneidade” (LOPES, p.78), nos mostrando assim que ocorre um engano, pois o material com que trabalha o historiador está ao mesmo tempo disponível e indisponível. “As fontes estão aí, disponíveis, abundantes ou parcas, eloqüentes ou silenciosas, muitas ou poucas, mas vemos, pelos trabalhos que são realizados, que existem”, mas também indisponíveis, pois compete ao pesquisador ir atrás delas, fazendo isto após a escolha e problematização de um problema, que irá determinar quais as fontes a serem buscadas. (Idem). É preciso identificar no conjunto de materiais produzidos por uma determinada pessoa, grupo ou época que poderão dar sentido ao 12 problema que se propôs inicialmente, que devidamente trabalhados poderão servir de base à operação propriamente historiográfica. A perspectiva enunciada serve desse modo, como o principal argumento que, socialmente, justificam um projeto investigativo direcionado ao levantamento e à catalogação de fontes primárias e secundárias da educação brasileira. Buscar fontes é antes de tudo, responder a questões previamente colocadas, atender a insatisfações. Assim sendo, indagações e problematizações colocadas pelos educadores, pesquisadores, historiadores da educação e outros profissionais, os quais buscam, no passado mais remoto ou mais recente, indicadores críticos para pensar a trajetória da educação no país, podem ficam obstaculizadas pelo desconhecimento dos acervos e das fontes pertinentes. Ciente dos limites das tarefas de levantamento e catalogação de fontes julga-se, entretanto, importante efetuá-la, no sentido de lançar as bases fundamentais para se escrever as diferentes histórias que poderão reconstruir a trajetória da educação no Brasil. Esse passo inicial - a busca e catalogação das fontes documentais e bibliográficas dos acervos que as abrigam - se justifica pela economia de grandes energias dos pesquisadores, cujo esforço poderia ser empregado de forma mais produtiva na análise dos materiais. Justifica-se, portanto, o esforço de contribuir para o levantamento e catalogação das fontes documentais da educação no Brasil. A metodologia que vem sendo utilizada para o desenvolvimento dos trabalhos segue as mais atuais orientações do trabalho arquivístico e bibliográfico, obedecendo às especificidades locais de acesso aos Arquivos e Bibliotecas escolares. O trabalho consiste no levantamento e catalogação das fontes, tendo como objetivo a produção de pequenos resumos, destacando os termos básicos para sua localização. Ao lado do trabalho de levantamento e catalogação de fontes, outras atividades são necessárias, a fim de que, se crie as condições favoráveis à realização da pesquisa, tais como, leituras técnicas e teóricas para dar fundamentação à pesquisa. Os documentos catalogados são basicamente oficiais (relatórios, legislação, ofícios, requerimentos, projetos pedagógicos, regimentos, atas, jornais, entre outros.). Além disso, estão incluídas entrevistas com professores aposentados, pessoas idosas, intelectuais que exerceram atividades administrativas na região. Visitas às escolas, entidades, grupos, núcleos, secretarias e arquivos. Para tanto será necessário buscar informações sobre os autores, entidades e documentos, bem como o estudo e contexto de sua elaboração e realização. O objetivo principal visa problematização as fontes, e não apenas descrevê-las, contextualizando-as dentro de um espaço e tempo geral e não como fator local e isolado. 13 Inicialmente realizamos levantamento de obras bibliográficas relacionadas ao objeto de pesquisa, fazemos estudos sobre levantamentos e catalogação de fontes. Depois identificamos os arquivos (públicos e escolares), bibliotecas, professores aposentados e outros intelectuais (memória histórica viva) para a partir daí atuar sobre um plano de trabalho consistente. Os trabalhos de pesquisa, coleta, levantamento, catalogação e transcrição de documentos primários e elaboração de resumos indicativos de obras existentes nessas instituições desenvolvem-se paralelamente à avaliação dos acervos. A referência teórica norteadora do trabalho entende por fonte primária e secundária todo o conjunto de documentos registrados em arquivos, bibliotecas museus, centros de documentação e todo e qualquer documento desmembrado originário de locais dispersos, que se tornam objetos de estudo, se colocam a serviço da pesquisa educacional e servem como testemunho dos homens que os objetivaram historicamente. Por catalogação entende a organização em fichas em um programa de computação, que podem ser impressas separadamente e por tipos de fontes, assunto, etc.8 Com base no exposto acima pretendemos oferecer uma contribuição aos estudos e levantamento das fontes primárias acerca da história da educação regional, visando, sobretudo colocar esta mesma história a disposição da sociedade local e regional através de publicações de artigos, elaboração de monografias, organização de catálogos, permitindo refletir e repensar a história da educação e da região como um todo. Neste sentido queremos enriquecer a história da educação brasileira. Este é um trabalho que pretendemos seja de longa duração, ganhar mais realidade à medida que também iremos acumulando mais experiências no decorrer do processo da pesquisa. O processo de pesquisa deve colocar o pesquisador sempre em situação de incertezas, devendo ficar atento ao rigor dos conceitos teóricos e à procura de respostas para a problemática por ele formulada. Entender a complexidade do real significa levar em consideração as dúvidas, incertezas e erros que aparecem pelo caminho, sobretudo em relação às questões teórico-metodológicas e aos objetos investigados, em uma sociedade cada vez mais diversa e pluralista. Parece ser este o desafio atual daqueles que se enveredem pela historiografia educacional. Se as fontes são o ponto de origem, a base e o sustentáculo para a produção do conhecimento histórico em educação brasileira e regional cabe a nós, enquanto indivíduos, grupos ou instituição criar, organizar, manter formas e instrumentos para a preservação e disponibilização das múltiplas formas de fontes para a história da educação. Da mesma forma, é de grande importância trabalharmos para desenvolver uma consciência e uma prática 14 documentária de individualização, catalogação e conservação dos documentos nas diversas instituições regionais, sejam elas: prefeituras, escolas, associações, sindicatos, cooperativas, etc. Por outro lado, essa nova cultura arquivística-documentária não poderá se desenvolver sem os instrumentos adequados de difusão e circulação das informações, tais como: catálogos e coletâneas para a divulgação dos dados e dos resultados obtidos nas pesquisas históricas. Preservar a memória histórica é um grande desafio que precisamos enfrentar, pois um povo sem memória é um povo sem História. E um povo sem História é um povo sem Identidade. Referências Bibliográficas ARIES, Philippe. "A História das mentalidades" In: LEGOFF, Jacques. História Nova. Trad. de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1990. p. 154-179. BOSI, Ecléia. Memória e sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Companhia das Letras 1998. CARDOSO, Ciro Flamarion. “História e Paradigmas Rivais”. In: CARDOSO, Ciro Flamarion e VAINFAS, Ronaldo (orgs.) Domínios da história: ensaios de teoria e metodologia. 5ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1997. CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1982. CINTRA, A. M. N. "Estratégia de leitura em documentos". In: SMITH, J. (org.) A análise documentária: análise da síntese. Brasília: IBICT,1987. FARIA FILHO, Luciano M. de. (org.). Arquivos, fontes e novas tecnologias. Campinas: Autores Associados, 2000. FREITAS, Marcos C. (org.). Memória intelectual da educação brasileira. Bragança Paulista: EDUSF, 2002. FREITAS, Sônia Maria de. História oral: possibilidades e procedimentos. São Paulo: Humanitas, 2002. LOMBARDI, José Claudinei. “História e historiografia da educação: atentando para as fontes”. In: LOMBARDI, J. C. e NASCIMENTO, M. I. M. (Org). Fontes, História e Historiografia da Educação. Campinas: Autores Associados, 2004. p. 141-176. LOMBARDI, J, C. (Org). Pesquisa em educação: história, filosofia e temas transversais. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 2000. 15 LOPES, Eliane M. T.; GALVÃO, Ana M. de O. História da educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. LOPES, Marcos A (org). Espaços da memória, fronteiras. Cascavel – Pr: Edunioeste, 2000. MARX, K. & ENGELS, F. Ideologia alemã. São Paulo: Martins Fontes, 1999. MORI, Nerli N. R. Memória e identidade: travessias de velhos professores. Maringá: Eduem, 1998. RAGAZZINI, Dário. “Para quem e o que testemunham as fontes da história da educação?”. In: Educar em revista n. 18/2001. Curitiba: Editora UFPR, 2001 p. 13-28. SAVIANI, Dermeval. “Breves considerações sobre fontes para a história da educação”. In: LOMBARDI, J. C. e NASCIMENTO, M. I. M. (Org). Fontes, História e Historiografia da Educação. Campinas: Autores Associados, 2004. p. 3-12. SAVIANI, D. LOMBARDI, J. C. SANFELICE, J. L. (Org). História e história da educação. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 2002. SCHAFF. Adam. História e Verdade. SP: Martins Fontes, 1995. WACHOWICZ, Ruy C. História do Paraná. 7. ed. Curitiba: Editora e Gráfica Vicentina, 1995. 1 Professor no Colegiado de Pedagogia/UNIOESTE.Doutorando pela Faculdade de Educação/UNICAMP. Professor no Colegiado de Pedagogia/ UNIOESTE, Campus de Cascavel. Doutorando pela Ufscar 3 Prof. Dr. no Colegiado de Pedagogia e do Programa de Mestrado em Educação/UNIOESTE, Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus de Cascavel. Líder do Grupo de Pesquisa HISTEDOPR – História, Sociedade e Educação – Oeste do Paraná. 4 Professor no Colegiado de Pedagogia/ UNIOESTE, Campus de Cascavel. 5 Aluno do Programa de Pós-graduação – Mestrado em educação/UNIOESTE, Campus Cascavel. 6 Outros temas também ganharam importância como: História de escolas, (instituições de ensino), trajetórias de professores, projetos pedagógicos, registros iconográficos, práticas educativas, políticas educacionais, educação rural, educação indígena, educação especial, educação à distância, pesquisas temáticas, e outros são alguns temas que devem ser buscados, catalogados e preservados. 7 Dentre as pesquisas realizadas individualmente ou em pequenos grupos pelos integrantes do HISTEDOPR constam temáticas envolvendo: história da educação, historiografia, levantamento de fontes, positivismo, materialismo histórico, educação no período imperial, epistemologia educacional, educação à distância, educação especial, ensino de história, dentre outras. 8 O instrumento básico para a catalogação das fontes consiste na utilização de uma ficha de catalogação de fontes para registro de pesquisa. Os diversos campos da ficha foram elaborados de acordo com as normas técnicas da ABNT e registram as seguintes informações: a) Referência completa do (s) autor (es) e da fonte, segundo as normas da ABNT; b) Resumo indicativo, buscando definir e delimitar de que assunto a fonte trata; c) Palavraschaves: isto são as expressões chaves do conteúdo (será adotado como guias dos cabeçalhos de assunto a bibliografia brasileira de educação, publicada pela IBIVT); d) Biblioteca (s) ou Arquivo (s) em que se encontram disponíveis as fontes; e) Período Histórico abrangido pelas informações que a fonte contém; f) Áreas da Educação que dela podem servir-se (conforme classificação das áreas de conhecimento segundo a CAPES. 2