FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO APRENDIZ COMO INSTRUMENTO DE QUALIFIÇÃO LABORATIVA SOB A NOVA ÓTICA DOS DIREITOS HUMANOS GALINDO, Cleusy Araújo1 Resumo: O tema central do trabalho é o estudo a legislação a nível mundial com ênfase no Brasil e Argentina acerca da inserção irregular dos menores e jovens no mercado de trabalho em atividades impróprias para a assistência financeira familiar, prejudicando o desenvolvimento físico e mental, minimizada com a proteção e regularização por meio da Lei do Aprendiz que insere o jovem no campo profissional para que ele possa ter uma profissão e exercer sua cidadania sem que seja abalada a sua dignidade como pessoa de direito e de deveres. A forma de conscientização do empregador e sua responsabilidade social de proporcionar aos jovens oportunidades de aprendizagem para enfrentarem a competitividade que o mercado exige. Abordagem a partir da teoria crítica dos direitos humanos na qual os direitos são processos de luta pelo acesso aos bens, materiais e imateriais. Palavras-chave: 1- Adolescente Aprendiz; 2 - Formação profissional; 3 – Dignidade e cidadania; The central theme of the work is to study the legislation worldwide with emphasis on Brazil and Argentina on irregular insertion of minors and young people in the labor market in improper activities for the family financial assistance, impairing physical and mental development, minimized with the protection and regulation through the Apprentice Act which inserts the young professional in the field so he can have a profession and exercise their citizenship without being shaken his dignity as a person in law and duties. The form of employer awareness and social responsibility to provide learning opportunities for young people to face the competitiveness that the market demands. Approach to the critical theory of human rights in which rights are processes of struggle for access to goods, material and immaterial. Abstract: Key - Words: 1 - Young Apprentice; 2 - Training; 3 - Dignity and citizenship; Introdução Partindo da premissa de que o menor, desde sempre, se vulnerabilizou ao ingressar no mercado de trabalho sob uma mão opressora e exploradora minimizando possibilidades de crescimento intelectual, pervertendo a sua profissionalização, arrancando dele qualquer 1 Graduada em Engenharia Civil pela UFRN/RN, Graduada em Direito pela UNICAP/PE, Especialista em Direito Judiciário e Magistratura do Trabalho pela ESMATRA6/PE, Especialista em Direito Previdenciário pela ESMATRA6/PE, Pósgraduanda em Direito Processual Trabalhista pela Faculdade Damas/PE e Doutoranda em Direito do Trabalho na Universidade de Buenos Aires/Argentina. possibilidade de sonhar, transformando-o num adulto jogado a míngua sem chance alguma de se firmar como pessoa passível de ideais. A Lei de Aprendizagem – Lei n. 10.097, de 19 de dezembro de 2000 no Brasil teve como base argumentativa para sua aprovação o benefício à cerca de sete milhões de jovens com idade entre 14 e 16 anos, haja vista a necessidade dos jovens em obter renda, educação de formação para ingressar no mercado de trabalho tão competitivo, dada a exigência crescente no mercado para uma melhor qualificação pessoal e profissional. Anote-se que a profissionalização tem como fundamento precípuo a luta pela desigualdade e exclusão social estampada no perfil brasileiro contemporâneo. As inovações trazidas pelas leis ns. 11.180, de 23 de setembro de 2005 e 11.788, de 25 de setembro de 2008 fortalecem e encorajam a extinção do desemprego e subemprego para o aprendiz. Representa, além do aumento da idade máxima, o ingresso do adolescente no mercado de trabalho com o propósito de que o jovem possa ter acesso ao seu primeiro emprego. Frise-se que a faixa etária para portadores de necessidades especiais poderá ser ultrapassada. Percebe-se o esforço do legislador com essa inserção no mercado de trabalho do jovem aprendiz., como contas no art. 277 da Constituição Federal brasileira de 1988 e o Estatuto das Crianças e dos Adolescentes, Lei n.º 8.069/90, vislumbram todos esses direitos como a profissionalização e o trabalho, como o objetivo de fortalecer sua aprendizagem técnico-profissional, estimulando os aprendizes, como também mostrar ao empresariado sua função social e responsabilidade em inserir o jovem no mundo do trabalho. Será feita análise dos pressupostos jurídicos e características principais deste tipo especial de contrato de emprego. Em contra partida, os Serviços Nacionais de Aprendizagem, cumprindo dever que resultar das contribuições que recebem para tanto, devem proporcionar vagas suficientes para atrair e absorver os aprendizes, facilitando, com isso a contratação. Tem que haver também uma ação conjunta com as Escolas Técnicas de Educação e as entidades sem fins lucrativos, par que possam suprir a deficiência de vagas dos Serviços Nacionais de Aprendizagem. Observa-se certo descaso par o aprendiz com idade superior a 18 anos, dando maior suporte ao adolescente. Ademais, para que o trabalho do menor se mostre salutar, há de se ter bases e princípios sólidos de ordem cultural, moral fisiológico e de segurança, sem qualquer comprometimento de sua instrução, devendo todo o processo ocorrer em ambiente seguro e que não sejam submetidos a jornadas penosas, insalubres. A saúde do menor deve ser monitorada para não comprometê-la em nome de qualquer argumento falível. Deve haver também uma parceria de ações entre o Ministério do Trabalho e Emprego e do Ministério Público do Trabalho, o primeiro atuando no cumprimento da lei, onde o trabalho inicial deva ser orientado propiciando o seu aprendizado, enquanto que o segundo, juntamente com a Justiça do Trabalho, identifique focos de resistência, promova inquéritos civis públicos que resultem em termo de ajustamento de conduta ou, em última análise, em ações civis públicas que visem coibir fraudes como o desvirtuamento da aprendizagem, a compelir a contratação de aprendizes, ou ainda, a disponibilização de vagas em cursos de formação e quantidades suficientes ao suprimento da demanda. Os direitos humanos num sentido crítico inusitado, sob uma perspectiva inovadora, revela um produto cultural que surge num contexto e momento histórico, com possibilidade de mudança. Assim, será feira análise do contrato de trabalho do aprendiz sobre o manto da legislação argentina em especial a Lei 25.013 que o regulamenta, bem como no panorama brasileiro. Comparações inevitáveis serão identificadas. Assim, serão abordadas questões referentes às principais características do contrato do aprendiz, os quesitos de validade e sua natureza jurídica tanto no Brasil como na Argentina. Também, serão tratadas questões referentes ao trabalho insalubre, penoso e a possibilidade de compensação pelos aprendizes. 1 Esboço Histórico Legislativo Em 13.10.1896, Rui Barbosa já demonstrava sua inquietação com o labor da criança e do adolescente ao mencionar em seu discurso no Senado brasileiro: “Creio no governo pelo povo; creio, porém, que o governo do povo pelo povo tem a base de sua legitimidade na cultura da inteligência nacional pelo desenvolvimento nacional do ensino, para o qual as maiores liberalidades do Tesouro constituirão sempre o mais reprodutivo emprego da riqueza pública (...)”.2 As primeiras leis que tratavam do contrato de aprendiz foram inseridas no parágrafo 188 do Código de Hamurabi, que data de mais de dois mil anos antes de Cristo, segundo notícia histórica de alguns autores renomados, sendo o primeiro diploma legislativo que contém em seu bojo medidas de cunho protetivo aos menores que exerciam atividades de ajudantes-aprendizes. Em Roma, na antiguidade haviam as Corporações de Ofício, onde o trabalhador começa com o objetivo de aprender y poder realizar um trabalho, sendo uma ação reconhecida como de grande importância social. No século III os collegia no período colonial eram constituídos somente pelos trabalhadores de ofício, suas mulheres e filhos do produtor. 2 BARBOSA, Rui. Discurso no Senado Federal brasileiro, 13.10.1896. Era uma forma de manter viva a profissão do pai aos seus descendentes, transmitindo de geração a geração. Acredita-se hoje que um dos objetivos dos collegia romanos consistia na tutela moral do trabalhador artesão e adestramento dos jovens trabalhadores. 3 O aprendiz na Roma antiga teve grande importância para o desenvolvimento do instituto. Na Europa Ocidental nos séculos XI e XII houve uma ampliação no número de aprendizes. Na França, as corporações de ofício e a aprendizagem se davam por meio de um pacto entre os pais e o professor geralmente por escrito e registrado na comunidade na idade de 10 aos 12 anos e em 1813 foi proibida a labuta de menores em minas. Nos anos de 1841 e 1848 outras leis emergiram com o intuito de vedar quaisquer modalidades de emprego para menores de 8 (oito) anos, fixando também, a jornada máxima de 8 horas para menores e 12(doze) anos e de 12 horas para menores de dezesseis anos. A Lei de 19.03.1874 assevera o resguardo aos trabalhadores menores, estabelecendo a idade mínima de admissão ao emprego e cerceando a possibilidade de trabalho do menor em minas subterrâneas.4 No ano de 1802 a Inglaterra editou o Moral and Health Act a primeira manifestação concreta que demonstrava o espírito contemporâneo da época acerca do Direito do Trabalho. Essa ação teve como principal conquista a redução da jornada de trabalho diária do menor para 12 horas, como noticia Glauber Moreno Talavera.5 Todavia, até a Revolução Industrial a força de trabalho era exclusivamente de homens diante da exigência de força bruta, sendo o marco histórico menos longínquo levada a efeito no século XVIII com a invenção da máquina a vapor de James Watt, que fez com que toda a mão de obra disponível fosse aproveitada inclusive a força de trabalho das crianças e adolescentes de forma indiscriminada, inclusive em atividades de natureza penosa com jornadas diárias semelhantes a dos adultos, criou-se uma real dependência do trabalho infantil e do adolescente que, em momentos de crise econômica, passaram a competir com o emprego do adulto. Foi nesse período o surgimento de propostas concretas de proteção ao trabalho da criança e do adolescente. As “meias força”, como denominavam a mão de obra feminina e infantil se mostravam atrativas aos empregadores por terem seus valores remuneratórios chegando a um terço do valor pago aos homens adultos. O que se parecia uma melhoria de condição para o menor e adolescente, já que o mercado de trabalho passaria a introduzir tal mão de obra no seu ciclo de produção devido ao aumento da necessidade da mão de obra, isso trouxe uma situação de total desproteção à criança e ao adolescente. 3 GOMES, Orlando. Op. cit., p. 466. TALAVERA, Glauber Moreno. Rev. TST, Brasília, vol. 72, n. 1, jan/abr 2006. 5 TALAVERA, Glauber Moreno. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Vol. 72, n. 1, jan/abr 2006. 4 Cite-se que no período de 1802 a 1867 leis inglesas foram editadas para fazer valer a proteção legal ao trabalho das crianças e jovens. Mesmo com o avanço do direito positivado, ainda no ano de 1814 era possível encontrar crianças de cinco a seis anos labutando em atividades empresarial, graças à ganância de empresários inescrupulosos e desprezo total aos direitos humanos, este colocado em segundo plano diante dos grandes lucros auferidos na esfera industrial. Só em 1819 um projeto de lei no País de Gales vetava o emprego de crianças menores de 09 (nove) anos e qualificava essa prática como sendo contrária ao ordenamento jurídico vigente, e ainda, restringia a jornada dos adolescentes com idade abaixo de 16 (dezesseis) anos para 12 horas diárias nas atividades ligadas a produções algodoeiras, inferindo teor de ilicitude a esses comportamentos sendo, inclusive, passíveis de sanção. Nesse mesmo ano foi aprovado o Employment of Children in Cotton Mills Act, geralmente referenciada como Cotton Mills Act.6 Se tratava de uma norma chave para o direito laboral britânico, porque deixava claro que o Estado iria intervir de manera regular e sistemática no ámbito laboral e que o ato de 1802 não havia sido um mero caso isolado. A Cotton Mills Act proibia o trabalho das crianças menores de 9 (nove) anos e limitava aos menores de 16 (dezesseis) anos uma jornada de 10 horas diárias, mas só no ámbito das fábricas de algodão. Por volta da década de 1820, sucesivas normas utilizaram esses preceitos a outros tipos de estabelecimentos fabris.7 A aprendizagem se revestia por um caráter voluntário e derivava da vontade do patrão em aceitar aprendizes para o desenvolvimento de tarefas de aprendizagem em oficinas, lojas e fábricas. Já em 1833, também no País de Gales, houve a expressa proibição do emprego de crianças com menos de 09 (nove) anos, como também o trabalho de menores de 13 (treze) anos com carga de trabalho superior a 9 horas diárias, bem como a exposição e emprego ao trabalho noturno. Outro fato marcante ocorreu na Alemanha em 1839 quando houve a deliberação pelo Legislativo de lei que proibia o labor de menores de 9 (nove) anos, fixando também a jornada de trabalho dos menores de 16 (dezesseis) anos para 10 horas diárias. Graças à forte pressão social, em 1891 a idade mínima para contratação como sendo de 12 (anos), e não mais 9 (nove), sendo expedido um Código Industrial contemplando todos os direitos e interesses do menor trabalhador. Na Itália, porém, em 1886, promulgou-se a lei que lastreou em 9 (nove) 6 El promotor de estas primeras actas británicas fue Robert Pell (GUENEAU, L., La législation restrictive du travail des enfants. La loi francaise du 22 mars 1841. Paris, 1925, p. 2). 7 GREER y NICOLSON, The factory acts in Ireland, p. 6. In https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CDAQFjAA&url=http%3A%2F%2Feci encia.urjc.es%2Fbitstream%2F10115%2F5779%2F1%2FLa%2520ley%2520Benot.doc&ei=D2E8UcHyKIY8gSog4D4CQ&usg=AFQjCNFWytr0tAakpcn4wRtR0w5_jvi4AQ&sig2=2mD71CzEVkCzuhsGZg_2kQ . Acesso em 23.03.2013 às 14:00 h. anos a idade mínima para se contratar, afastando o menor de certas atividades ali especificadas. A evolução do sistema protetivo ao menor se fez presente em vários outros países, como: a Suíça em 1877; Portugal em 1882; Áustria em 1885; Bélgica em 1888 e Holanda em 1889. Orlando Gomes complementa dizendo que no ano de 1840 com o aumento do número de fábricas de tecidos também aumentou o número de mulheres e menores empregados. Contudo, os salários eram mais baixos que os dos homens. Muitos dos menores eram recrutados dos orfanatos e das instituições beneficentes. Encontravam-se crianças de até cinco anos trabalhando 12 horas por dia na indústria têxtil. Haviam crianças de cinco anos trabalhando até 12 horas por dia nas indústrias têxtil. Na Revolução Industrial o contrato de aprendizagem assumiu um papel de prestígio nos países desenvolvido e em desenvolvimento pela necessidade de formação de quadro de profissionais. Houve uma modificação na mentalidade do século passado, e no momento a habilidade profissional do homem era valorizada, especialmente por ter que operar máquinas maiores. Assim, não era mais econômica, a admissão de menores sem experiência e se passou a precisar de especialistas dentro da profissão, dando oportunidade ao empregado para se especializar-se.8 Na Argentina em 1821 foi imposto como requisito para as oficinas, escritórios e lojas a inspeção dos contratos de aprendizes pela polícia e posteriormente o ingresso de aprendizes a passou a ser básico.9 O trabalho infantil foi originalmente regulada pela lei de 1907, que proíbe o trabalho noturno e trabalho em indústrias insalubres e o trabalho penoso aos menores de 16 anos e proibindo definitivamente o trabalho para menores de 12 anos, estabelecendo a jornada diária de seis horas para os menores de 16 anos.10 Em 1918, com a promulgação do primeiro regulamento do trabalho de casa introduz o conceito de trabalhador doméstico aprendiz. Posteriormente, o contrato de aprendizagem é regulamentado pelos decretos 14.358/44 e 6.648/45 ratificado pela Lei 12.921, que declarou no contrato de aprendizagem como um sistema cuja organização trabalha com o menor possível para garantir a eficácia do ensino de um comércio ou pré-determinada de trabalho. Quanto à natureza jurídica do contrato de aprendizagem é um contrato de trabalho mesmo porque o aprendiz trabalha sob as ordens de um empregador para que haja uma relação de subordinação ou dependência entre eles. Por isso atualmente discute-se se deve ou aprendizado contrato não é um contrato de trabalho, pois, que abrange uma distintamente fraudulenta. Assim, em 1995, a Lei 24.465 é punível na regulação do contrato de 8 GOMES, Orlando. Curso de Direito do Trabalho. 19. Ed. São Paulo: forense, 2012, p.467. Disponível em http://www.salta21.com/Los-Contratos-de-Aprendizaje-en-el.html. Acesso em 09.03.2013 . Acesso às 17:50 h. 10 BARROS, Alice Monteiro. Op.cit., p.543. 9 aprendizagem, depois de sofrer várias modificações posteriores pelas leis 25.013 e 25.250 que reduziu o período de avaliação conhecido até agora prevista nessa legislação. 11 As Convenções Internacionais se ocuparam do problema e os países em desenvolvimento e os subdesenvolvidos têm regulamentação própria sobre a matéria. A OIT em sua Regulamentação de n. 187 dispõe sobre a assistência a uma pessoa para decidir questões relacionadas a uma profissão ou um processo de acordo com suas características relacionadas com a oferta do mercado de trabalho.12 Com respeito à formação profissional, a Convenção 117/62 da OIT adota disposições relativas à preparação pré-profissional que devem incluir uma instrução teórica e prática aos jovens para complementar a formação recebida; transmitindo-lhes uma percepção sobre o trabalho e desenvolvê-los na atitude profissional, interesse pelo trabalho e as suas habilidades laborativas.13 No Brasil o ambiente não era favorável às corporações profissionais como ocorreu na Europa, porque a aprovação era menor e se utilizava a mão de obra escrava. A realidade brasileira foi diferente porque buscava a manutenção do mercado manufatureiro e não existiam as corporações de ofício. Logo, não existiu no Brasil Colonial o aprendiz como ocorreu na Europa, pois se tratava de outra realidade como realça o mestre Orlando Gomes. 14 Apenas com a abolição da escravatura é que foram criados os textos jurídicos relativos à proteção das crianças. No regime escravocrata, os grandes proprietários tinham direito sobre a vida e morte de seus escravos. A manutenção do trabalho infantil e adolescente decorreu do subdesenvolvimento e da precária situação econômica da população. Até meados do século XIX, a população brasileira era, em sua maioria, rural. O trabalho de crianças e adolescentes, não como mão de obra individual, mas como mão de obra familiar, era comum. Frise-se que mesmo com o desenvolvimento da legislação trabalhista e com a implantação do salário mínimo, o trabalho juvenil continuou a ser explorado, uma vez que o serviço rural atendia a uma logística peculiar de produção, existindo lacunas nessas normas de regulamentação das relações trabalhistas. Toda a família é envolvida no processo de produção. Importante mencionar que na antiguidade, o trabalho dava-se, via de regra, no âmbito doméstico e tinha fins artesanais, como já mencionados. Logo, o caráter de aprendizagem era sua característica básica e o jovem, sob auxílio do mestre, realizava atividades marcadamente didáticas, segundo as disciplinas da Corporação de Ofícios Medievais.15 11 Disponível em http://www.salta21.com/Los-Contratos-de-Aprendizaje-en-el.html. Acesso em 09.03.2013 às 17:50 h. BARROS, Alice Monteiro. Op. cit., p. 561. 13 BARROS, Alice Monteiro. Op. cit., p. 542. 14 GOMES, Orlando. Op. cit., p.467. 15 ROCHA, E. G.; FREITAS, V. P. - A proteção legal do jovem trabalhador - Revista da UFG, Vol.6, n. 1, jun 2004 on line (www.proec.ufg.br) 12 Na América Latina, com exceção das disposições das Leis das Índias, o Brasil foi o primeiro país que relegou as normas de proteção ao trabalho infantil. Decreto foi publicado n. 1313/1891, assinado pelo Marechal Deodoro da Fonseca trata do trabalho infantil em fábricas localizadas no Distrito Federal, mas pela falta de regulamentação não foi cumprido. Em 1917, a Secretaria Municipal por meio da Lei 1.801 estabeleceu medidas para proteger os menores que trabalham no Rio de Janeiro também não se aplicaram.16 Já em 1923, o Decreto n. 16.300 sancionou a aprovação do Regulamento Nacional de Saúde Pública e no dispositivo contido em seu art. 534 fixando a jornada de trabalho diária para os menores de 18 (dezoito) anos trabalhariam em todo o território brasileiro. Alice Monteiro de Barros 17 Ensina, ainda, Alice Monteiro que só 1927 é que foi aprovado o Código de menores por meio do Decreto n. 17.943-A, que proibiu o trabalho dos menores de 12 anos e o trabalho noturno dos menores de 18 anos. Os Decretos ns. 22.042/1932 alteraram a idade mínima para 14(quatorze) anos de idade para empregos na indústria, e o Decreto n. 423/1935 ratificou a Convenção da OIT de n. 5. Já o Decreto n. 6.029/1940 tratou das instituições de cursos profissionalizantes e o Decreto n. 3.616/1941 introduziu a Carteira de Trabalho para o menor a qual foi extinta em 1969, dando lugar a Carteira de Trabalho e Seguridade Social igual para os adultos e menores. E, em 1943, Getúlio Vargas cedendo à pressão popular, regulamentou a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, a qual tinha um capítulo próprio referente ao menor, complementada por diversas leis sobre o tema, em particular sobre o aprendiz, e, em 1990, com a publicação da lei de n.º 8.069, foi publicado o Estatuto dos menores e dos adolescentes - ECA, onde os artigos 69 e 70 dedicados ao Direito a uma Profissionalização e Proteção do Trabalho, regulamentando os direitos e garantias assegurados às crianças e adolescentes dentre eles o direito ao trabalho, revogou todas as disposições legais contrárias a ele, inclusive os dispositivos da CLT que iam de encontro a seus princípios. Está amparado pelo texto constitucional no art. 227 que tem por princípio a formação integral da criança e adolescente, sendo assegurado o direito à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. A jornada de trabalho deve obedecer aos mesmos princípios norteadores ali dispostos. O direito a formação profissional não pode ser interpretado de maneira isolada, 16 Disponível em: http://www.mte.gov.br/data/files/FF8080812BCB2790012BCFB6475E27BC/aprendizagem_pub_manual_aprendiz_2009.pdf . Acesso em 06.03.2013 às 21:54 h. 17 BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 4. ED. São Paulo: LTr, 2008, p. 543. impermeável a outros ramos do direito. Por isso, sua formação deve garantir condições de tempo e para outras atividades que também são de igual importância.18 Restou estabelecida a idade mínima de 12 anos par o trabalho por meio da lei n. 10.097/00, posteriormente modificada pela nova lei de 11.180/2005 para 14 anos, ambas com objetivo único de preparar o jovem para realizar atividades profissionais e ser capaz de discernimento para enfrentar os desafios do mercado de trabalho. Atuação importante do Ministério do Trabalho na supervisão do cumprimento dos valores mínimos provocaram aumento nos cursos para jovens aprendizes, propiciando oportunidade de inserção no mercado de trabalho. Muito embora ainda se observe muita resistência à contratação desses jovens no Brasil. Aduz Cláudia S.V.Vianna que nesse período só poderiam contratar aprendizes nos seguintes estabelecimentos: a) industriais, transporte, comunicação e pesca, num percentual de 5% (mínimo) a 15% (máximo) do total de empregados existentes nos estabelecimentos com função que demanda formação profissional (Decreto- lei n. 9.576/1946); b) comerciais com até 9 empregados não estavam obrigados a contratar aprendiz; Já os que possuíam de 10 a 18 empregados deviam contratar 01 (um) aprendiz; Os que tinham de 19 a 28 empregados, teria que contratar 2 (dois) aprendizes e os que tinha de 29 a 38 empregados, 3(três) aprendizes etc. (Decreto-lei n. 8.622/46). 19 A lei 10.097/2000 estabeleceu para os jovens de 14 a 18 anos tem direito a estudar e aprender um ofício com o pagamento de um salário se trabalhar em qualquer estabelecimento de qualquer natureza a exceção de entidades sem fins lucrativos com propósito educacional. Micro empresas – ME e Empresas de Pequeno Porte - EPP, tem a obrigatoriedade de matricular de 5% a 15% de trabalhadores existentes em cada estabelecimento, em funções que requeiram formação profissional, excluindo-se da base de cálculo acima os empregados que executem os serviços prestados sob o regime de trabalho temporário, instituído pela Lei nº 6.019/73, bem como os aprendizes já contratados. No caso de empresas que prestem serviços especializados para terceiros, independentemente do local onde sejam executados, os empregados serão incluídos na base de cálculo da prestadora, exclusivamente. Entende-se por estabelecimento todo complexo de bens organizado para o exercício de atividade econômica ou social do empregador, que se submeta ao regime da CLT (Art. 1.142, 18 ROCHA, E. G.; FREITAS, V. P. A proteção legal do jovem trabalhador - Revista da UFG, Vol.6, n. 1, jun 2004 on line (www.proec.ufg.br). 19 VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Manual Prático das Relações Trabalhistas. 10ª. ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 133. Novo Código Civil Brasileiro - Lei nº 10.406/2002).20 Porém, ficam de fora da base de cálculo os seguintes casos: a) funções que requeiram formação técnica de capacitação ou superior e função de direção, gestão ou função de confiança (artículo 10, § 1, do Decreto nº 5.598/05); b) empregados em regime de trabalho temporal, estabelecido pela lei nº 6.019/1973 (art. 12, Decreto Nº 5.598/05); c) aprendizes já contratados.31 Em comparação com a Argentina o percentual que se contrata não pode exceder a 10% dos trabalhadores por tempo indeterminado, logo divergindo do patamar fixado aqui no Brasil. 2 Os Direitos Trabalhistas e o Recolhimento Fundiário em Favor dos Aprendizes Outra medida importante que a lei 10.097/2000 trouxe foi o aumento remuneratório pagão ao aprendiz, garantindo a percepção do salário mínimo por hora, revogando a norma do art. 80 da CLT, que limitava o quantum devido ao aprendiz a meio salário mínimo regional durante a primeira metade do aprendizado e a dois terços na segunda, como também redução do percentual do depósito de FGTS (fundo de garantia por tempo e serviço) de 8% da remuneração para 2 %. Abre-se um parêntesis para dizer que o FGTS não existe na legislação argentina. Contudo, no Brasil, todo brasileiro que tenha vinculação contratual de trabalho formal, regido pela CLT e, também, trabalhadores rurais, temporários, avulsos, safreiros e atletas profissionais têm direito ao FGTS. O diretor não empregado e o empregado doméstico podem ser incluídos no sistema FGTS, a critério do empregador. Este fundo foi criado em 1967 pelo Governo Federal com o objetivo de proteger o trabalhador demitido sem justa causa. É constituído de contas vinculadas, abertas em nome do trabalhador, quando o empregador efetua o primeiro depósito. O saldo da conta vinculada é formado pelos depósitos mensais efetivados pelo empregador, equivalente a 8% do salário pago ao empregado, no caso dos aprendizes este percentual é de 2% na legislação atual, acrescido de atualização monetária e juros. O saque desse fundo é possível em momentos especiais como: aquisição da casa própria ou da aposentadoria e em situações de dificuldades, que podem ocorrer com a demissão sem justa causa ou alguma doença grave. O trabalhador pode utilizar os recursos do FGTS também para a aquisição de imóvel novo ou usado, 20 http://www.administradores.com.br/artigos/administracao-e-negocios/trabalhador-aprendiz-e-contrato-deaprendizagem/32997/. Acesso em 18.03.2013 às 10:38 h. construção, liquidação ou amortização de dívida vinculada a contrato de financiamento habitacional. Dessa forma, o FGTS é visto como a mais importante fonte de financiamento habitacional, beneficiando o cidadão brasileiro, principalmente o de menor renda. O uso do FGTS ultrapassa os benefícios da moradia digna, uma vez que financia também obras de saneamento e infraestrutura, gerando melhorias significativas na qualidade de vida, quando leva água de qualidade, coleta e tratamento de esgoto sanitário às comunidades, tornando-se a maior fonte de recursos para a habitação popular e saneamento básico. A partir de 2008, o Fundo de Investimento FGTS – FI- FGTS, amplia a atuação do fundo, ao direcionar recursos para outros segmentos da infraestrutura, com a construção, a reforma, a ampliação de empreendimentos de infraestrutura em rodovias, portos, hidrovias, ferrovias, obras de energia e de saneamento.21 Nessa contratação há a incidência de FGTS como da contribuição devida à seguridade social de forma regular fazendo do aprendiz um novo segurado sujeito ao enquadramento na tabela de contribuição de acordo com o art. 6o., inciso II, da Instrução Normativa RFB n. 971/2009. Os direitos trabalhistas e previdenciários do empregado aprendiz são os mesmos dos demais empregados (13º salário, repouso semanal remunerado, auxílio-doença, aposentadoria etc.). Com relação à extinção do contrato de aprendizagem dar-se-á na data prevista para seu término (anteriormente fixado) ou quando o aprendiz completar 24 anos de idade, salvo no caso de aprendiz portador de deficiência, situação em que não há limite de idade. O art. 433 da CLT elenca várias situações para a rescisão do contrato de aprendiz antecipadamente22: 1) quando o desempenho for insuficiente ou a não adaptação do aprendiz. Esta hipótese somente ocorrerá mediante manifestação da entidade executora da aprendizagem, a quem cabe a sua supervisão e avaliação, após consulta ao estabelecimento onde se realiza a aprendizagem; 2) quando ocorrer falta disciplinar grave. É necessário que a falta grave praticada constitua justa causa para a rescisão do contrato de trabalho pelo empregador, portanto, que esteja arrolada entre as hipóteses previstas na CLT, art. 482; 3) quando ocorrer à ausência injustificada à escola regular que implique perda do ano letivo. A ausência injustificada que cause a perda do ano letivo deve ser comprovada por meio da apresentação de declaração do estabelecimento de ensino regular; 4) quando for a pedido do aprendiz. Nota-se, portanto, que a rescisão antecipada do contrato sem 21 http://www.fgts.gov.br/trabalhador/index.asp . Acesso em 20.03.2013 às 9:56 h. http://www.administradores.com.br/artigos/administracao-e-negocios/trabalhador-aprendiz-e-contrato-deaprendizagem/32997/. Acesso em 18.03.2013, às 11:16 h. 22 justificativa e por iniciativa do empregador não poderá ocorrer. Nas hipóteses em que é permitida a rescisão antecipada do contrato de aprendizagem, seja por iniciativa do empregador ou do aprendiz, será devida a indenização, pela metade da remuneração devida até o termo final do contrato, prevista na CLT, arts. 479 e 480, não se aplicando quando da ocorrência do contido no parágrafo 2º, art. 433, CLT, por tratar-se de extinção do contrato de aprendiz quando completar 24 anos, ressalvada a hipótese prevista no § 5 o do art. 428 desta Consolidação. Para que ocorra a extinção do contrato de aprendiz, o empregador deverá contratar outro aprendiz, de acordo com o art. 428 da CLT. A não observância do que consta na lei resultará em uma imposição de uma multa pelo Ministério do Trabalho e também não haverá a necessidade de efetuar o pagamento de indenização ao aprendiz como disposto no art. 479 e 480 da CLT. Mesmo assim, a redução de pessoal na empresa ainda que seja por questões financeiras não autoriza a rescisão antecipada dos contratos de aprendiz que devem ir até o seu final. Salienta a Doutora Liliana Hebe que na Argentina o contrato se extingue apenas quando se extingue o prazo, cabendo ao empregador avisar antes no período de 30 dias do término do contrato. Se não houver o pré-aviso o empregador deverá indenizar o aprendiz com meio salário. Se ocorrer a omissão, o empregador não terá que arcar com esse ônus.23 As inovações trazidas pela nova lei consolidaram no corpo da CLT o Princípio da Proteção Integral e diversas normas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, inclusive, preceitos contidos na Lei n. 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (bem como do Decreto n. 2.208/97, que a regulamentou), todos já adequados à nova realidade constitucional. 24 As empresas só passaram a contratar o aprendiz só após a edição da lei nº 11.180/2005, sendo ela também responsável pelo aumento da idade máxima do aprendiz para 24 anos. 3 A Teoria Crítica dos Direitos Humanos e o Adolescente Os direitos humanos num sentido crítico inusitado, sob uma perspectiva inovadora, revela-se um produto cultural que surge num contexto e momento histórico. Observa-se uma 23 LITTERIO, Liliana Hebe. Op. cit., p. 357. OLIVA, José Roberto Dantas. Criança, adolescente, trabalho/ Andrea Saint Pastous Nocchi, Gabriel Napoleão Veloso, Marcos Neves Fava, organizadores. São Paulo: LTr, 2010, p. 153. 24 estrutura retilínea onde o conceito é construído no curso da história, podendo ser inclusive modificado, uma vez que surge de um contexto e não o inverso. É fundamental que a ideia de neutralização dos conceitos e dos valores seja colocada de lado, pois os valores se constroem a partir de um consenso, preferências sociais que se generalizam. A valoração de algo no entorno das relações humanas é que se destaca nessa nova ótica. Dulce Martini Torzecki25 chama a atenção para posturas jus naturalistas que se contrapõem ao fato da capacidade de ser humano de transformar constantemente as coisas como imerso no contexto dos direitos humanos. Assim, não se pode ter um pensamento estático de total inércia diante dos acontecimentos identificados como pontos neufrágicos que buscam novas posições, posturas, tratamentos anti-impotência cultural que se conforma e não busca transformações. Aponta a Mestra em direitos humanos outro aspecto importante para a compreensão da teoria crítica dos direitos humanos e a atenção à diferença textual existente entre os bens e direitos. Estes sendo o meio de obtenção daqueles, garante para que se tenha tanto os bens materiais como os imateriais necessários a uma viva com dignidade. Logo, os bens (saúde, educação, moradia, liberdade religiosa etc.) são satisfativos das necessidades de cada indivíduo e eles veem a frente do próprio direito, se posicionando hierarquicamente em patamares superiores ao próprio direito. Numa visão crítica dos direitos humanos, o adolescente e o seu direito à formação profissional é visto como sendo um agente social e protagonista de sua própria cidadania, e não um subcidadão. Tem-se na verdade os direitos humanos como sendo um processo, um resultado de lutas sociais pelo atingimento de espaços que possibilite a todos lutar por sua própria dignidade, partindo da premissa da existência de uma igualdade material que permita colocar em prática uma liberdade positiva e uma fraternidade emancipadora, não esquecendo que esta realidade hoje é deveras susceptível a mudanças, já que a capacidade humana de transformar o mundo é inata a cada indivíduo. Significa, na verdade romper paradigmas existentes como o discurso e o conhecimento jurídico tradicional, refletir e questionar a “legalidade tradicional mitificada” nas palavras de Wolkmer.26 Afirma, ainda, que no caso do adolescente, a proposta é criar condições para que ele seja empossado nesse processo de luta pelo acesso a um bem imaterial – formação para o trabalho – e, assim, poder buscar uma vida com dignidade. Segundo o autor, é imperioso se considerar que a evolução constante do mundo se faz com que cada período ou momento 25 MANETE, Ruben Rockenbach Manente. Instituto de Direitos Humanos, Intercultural e Desenvolvimento. Teoria crítica dos direitos Humanos: Das lutas aos direitos. Rio de janeiro: Edditora Lumen Juris, 2011, p. 133-134. In Dulce M. Torzecki A formação Profissional do Adolescente Sob Uma Nova Ótica dos Direitos Humanos. 26 WOLKMER, Antonio Carlos. Introdução ao pensamento jurídico crítico. 4ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 79. histórico possua um conjunto de verdades que se identificam se estruturam e se extinguem. Buscar um pensamento crítico, segundo o autor, representa “buscar outra direção ou outro referencial epistemológico que atenda ä modernidade presente, pois os paradigmas da fundamentação não acompanham as profundas transformações sociais e econômicas por que passam as modernas sociedades políticas industriais e pós-industriais” 27. Em resumo, partindo de uma visão crítica acerca dos direitos humanos, pode-se definir como sendo um processo no qual a provisoriedade é uma constante dada à necessidade de estarem sempre se travando lutas sociais galgando espaços que permita uma igualdade material a todos, colocando em prática uma liberdade positiva e uma fraternidade emancipadora para o fortalecimento da dignidade individual ou coletividade a cada indivíduo, como expõe Dulce M. Torzecki28. Citando Herrera Flores no processo de luta pela dignidade, ele elenca três possibilidades: a primeira é que não existe apenas uma teoria sobre os direitos; a segunda trata da análise da aplicação pelos agentes sociais; e a última diz respeito ao espelho dessas práticas culturais no seio da sociedade. A sua prodigiosa inteligência o fez desenvolver a figura do diamante ético para facilitar o processo educativo e a compreensão por parte dos atores sociais, realinhando a realidade dos direitos e a interdependência entre os elementos que compõem esta realidade. Enfim, pretendeu mostrar a interdependência entre os diversos componentes dos direitos humanos no mundo contemporâneo, vendo-os em sua real complexidade.29 A revelação quando se volta ao tema adolescente no meio social é que a possibilidade de profissionalização seja passível de realização com o intuito de tirar o adolescente da rua dando-lhe condições de modificar o seu próprio futuro por meio do trabalho digno, buscando recuperar o valor da riqueza humana para superar o sentimento de vazio e da falta de critérios sólidos para se viver nos propomos a estudar o tema da formação profissional do adolescente sob uma ótica, qual seja do exercício pelo da cidadania para gozar de uma vida com dignidade, sob a ótica da teoria crítica dos direitos humanos, como argumenta Dulce M. Torzecki.30 Importante relato acerca do conhecimento como instrumento de emancipação e transformação social dado por Júlio Barreiro quando mencionar que a trajetória da educação como processo de aperfeiçoamento da existência humana em seus diferentes graus de 27 WOLKMER, Antonio Carlos. Op. Cit., p. 78. MANETE, Ruben Rockenbach Manente. Op. cit., p. 131. 29 HERRERA, Joaquim Flores. La reinvención de los derechos humanos. Sevilla: Atrapassueños, 2008, p. 107-138. 30 MANETE, Ruben Rockenbach Manente. Op. Cit., p. 139. 28 desenvolvimento e formações sociais passou por diferentes concepções tendo como variantes as necessidades ou valores prevalentes naquele contexto histórico. E, também, menciona que houve tempo em que se dizia ser a educação um privilégio da “classe ociosa”, em outro em face da escassez da mão de obra especializada estendendo às “classes menos favorecidas”, e hoje é tida como um investimento econômico, maior ou menor, de acordo com a retribuição ao sistema capitalista que a sustenta.31 Nessa linha de processo de aprendizado, não deve deixar a margem a ideia de que esse processo se efetiva de diferentes modos de conhecimento, a pluralidade de saberes. Preservando todas as culturas que estão por detrás desses conhecimentos, importa construir um modo verdadeiramente diálogo de compromisso permanente, articulando as estruturas do saber moderno/científico/ocidental com as formações nativas/locais/tradicionais de conhecimento, desfiando a monocultura do saber por meio de práticas constante do processo de estudo, de investigação-ação, como cita Dulce Martini Torzecki o professor Arriscado Nunes32. Não desviando o caminho da concepção humana sobre educação, deve-se ressaltar a ideia pedagógica do pernambucano Paulo Freire, para o qual a desumanização do oprimido é atualmente o problema central, cujo enfrentamento se dará com a recuperação de sua “humanidade roubada”.33 Ensina o pedagogo Paulo freire que a tarefa humanista e histórica dos oprimidos é uma estrada de via dupla onde o oprimido liberta-se a si e aos opressores. Isso porque a classe dominante para mostrar-se superior e não querer abrir mão do seu status superioridade intelectual entende por bem manter o desequilíbrio entre ela e a classe oprimida. Assim, a proposta pedagógica do oprimido vai de encontro a esta postura inerte desta classe submissa que se curva ao opressor permitindo-o estar em posição hierarquicamente superior a nível intelectual, despertando de sua real situação inferiorizada e identificando de forma transparente o seu opressor. Dessa estratégia de condutas, inicia uma luta por sua libertação cujo ponto de partida é a alfabetização, iniciando um caminho de conhecimento crítico da realidade e enfrentamento de posturas frente ao mundo. É a partir da reflexão que se reconhecerá a ação de inserção crítica do oprimido na realidade opressora, transformando as posturas existentes e fazendo com que o opressor passe a reconhecer o oprimido, e, não apenas a solidarizar-se com ele, deve haver uma ruptura desse pensamento de prática dominante desenvolvida por ele até então. A UNESCO defende a ideia 31 BARREIRO, Júlio. Educação Popular e Conscientização. Porto Alegre: Sullina, 2000, p. 24-25. João Arriscado Nunes é professor do Programa de Máster Oficial/Doctorado em Derechos Humanos, interculturalidad y Desarrollo, da universidade Pablo de Olavide de Sevilha (Espanha). 33 FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005, p. 34. 32 de educação permanente ao longo da vida, construindo valores para melhor adaptação as mudanças geradas pelo progresso da ciência e da técnica, aprofundando os conhecimentos já adquiridos e acompanhar os novos rumos dados pelas inovações já que o mundo do saber está em constante mudança. O novo conceito de educação delineado pela Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI se forma a partir de quatro pilares do conhecimento: “aprender a conhecer”, que parte da premissa de uma cultura geral trabalha-se um ponto de uma área específica; “aprender a fazer” onde se insere no contexto específico brasileiro em que é ampla a economia informal, razão pela qual a qualificação deverá ser mais na área social do que meramente profissional; “aprender a viver junto”, em desalinho ao que sugere a competitividade, na verdade se reconhecer como indivíduo para poder respeitar o seu limite diante do próximo, configurando de forma singular a harmonia; e o aprender a ser onde é fruto do desenvolvimento de todas as potencialidades do indivíduo. 4 Ordenamento Jurídico Brasileiro – O Sistema “S” e a Aprendizagem “Supletiva” Criada pela Lei 10.097/2000 As condições necessárias para a realização da aprendizagem realiza-se através de atividades teóricas e práticas (art. 428, § 4º), conforme vier a ser programado em plano de curso próprio (currículo), não devendo haver a prevalência da parte prática na empresa. A parte prática pode ocorrer tanto na instituição que oferece o curso (oficinas ou laboratórios, por exemplo) quanto na empresa. No entanto, a parte prática na empresa sempre deverá ser direcionada para o aspecto educativo, não devendo prevalecer o aspecto produtivo, pois o aprendiz é considerado um empregado-aluno. Não deve ser negligenciada a segurança e saúde no trabalho de forma que sempre estará sujeita às proibições da Portaria n.0 6, de 05 de fevereiro de 2001 (art. 405, inciso I). Nesse sentido, a aprendizagem nas indústrias deverá ter especial atenção, havendo casos em que ela se tomará impraticável no estabelecimento do empregador. Do mesmo modo, prevalece a norma do inciso II do art. 405 do texto consolidado, que veda o trabalho dos adolescentes em locais ou serviços prejudiciais à sua moralidade. Logo, as entidades que realizam a aprendizagem também são responsáveis pelo fiel cumprimento das normas de segurança e saúde nas atividades do curso, não só nos próprios estabelecimentos quanto também nas empresas, pois quando o aprendiz está na empresa suas tarefas também estão vinculadas ao curso de aprendizagem, sob a responsabilidade da entidade que ministra o curso. A inovação trazida pela lei possibilitou a realização de aprendizagem por entidades outras que não as vinculada ao Sistema “S”, sistema deformação profissional constituído pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT) e Serviço Nacional de Aprendizagem do Corporativismo (SES-COOP). Ou seja, nos casos em que o Sistema “S” não ofereça cursos ou vagas necessárias para suprir a demanda de estabelecimentos interessados. Restou implementada a aprendizagem “supletiva” a ser realizada pelas Escolas Técnicas de Educação, inclusive as agrotécnicas, e pelas entidades sem fins lucrativos que tem por finalidade a assistência ao adolescente e a educação profissional, registradas em Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. Atente-se que estas entidades devem aplicar o previsto no art. 430 da CLT. Fica a cargo do Ministério do Trabalho e Emprego avaliar a competência das entidades sem fins lucrativos. Enfim, os direitos trabalhistas e previdenciários cabem aos órgãos responsáveis fiscalizar na tentativa de evitar o desrespeito a tais direitos legalmente albergados. O custeio dessa aprendizagem é por meio das contribuições parafiscais, exigidas por lei e arrecadadas e pelo Instituo Nacional da Seguridade Social (INSS). Logo, os recursos ficam condicionados à realização de convênios com o Sistema ”S” quando se tratar de Escolas Técnicas e Educação e entidades sem fins lucrativos (ONGs), mostrando-se deveras frágil tal forma de arrecadação. Portanto, para que se obtenha a redução da desigualdade de acesso do adolescente ao mundo do trabalho e a ampliação da formação profissional entre jovens de baixa renda, se faz imperioso o fortalecimento da aprendizagem supletiva realizada pelas Escolas Técnicas de Educação e demais entidades sem fins lucrativos. Considerações Finais A Constituição Federal brasileira de 1988 com a Lei 10.097/00 amplia e regula pelo Decreto Federal nº 5.598/2005, representaram um avanço na proteção do menor, do adolescente e do jovem aprendiz. Muito embora se faça necessário algum desenvolvimento mais estruturado de políticas públicas na educação infantil. Já o art. 429 da CLT estabelece para las empresas a obligação de contratar aprendizes, está de acordo com o projeto de desenvolvimento social e o pleno emprego e também com o princípio da proteção integral do adolescente, igualmente previsto pelo art. 227 da CF/88. No entanto, apesar do que a lei do aprendiz faz há mais de uma década, ainda há pouca contratação de aprendizes no Brasil. A maioria das empresas entendem que a Lei do Aprendiz é só uma obrigação, porém há muita resistência de empresas do Brasil na contratação de aprendizes. Cabe ao Ministério do Trabalho e Ministério do Trabalho maior mobilização no sentido de educar as empresas e sociedade civil, de modo que os dados sobre as obrigações e benefícios associados à Lei do Aprendiz resultam em uma taxa efetiva de empregabilidade. Até porque as empresas são beneficiadas com esse tipo de contratação, dada a redução de impostos, qualificação e treinamento de sua força de trabalho, como também, há incentivos na política social, propiciando a expansão e modernização do sistema nacional de aprendizagem, levando a um aumento qualitativo e quantitativo da produtividade, porque os jovens são treinados para as necessidades do mercado e novas tecnologias, o que importa é mais competitiva nos negócios. É importante que as escolas estejam estruturas e adequada para o desenvolvimento de programas de aprendizagem, mantendo o processo de aprendizagem monitorado e com avaliação dos resultados do aluno, com um processo contínuo de atenção voltada ao aprendiz, inclusive com aplicação de testes de aprendizagem para verificar se o aluno absorveu o ensino. Até porque a formação do jovem aprendiz tem a responsabilidade compartilhada entre o Estado e as empresas para proporcionar o desenvolvimento profissional adequado para o aprendiz sem prejuízo para seu desempenho na escola, garantindo a sua integridade física, moral e psicológica. Ademais, a lei de aprendizagem deve ser tratada não só como uma exigência para as empresas, mas como um instrumento de influência social mais profundo, vislumbrando uma benefícios não só para a qualificação de jovens, mas também para um futuro promissor de crianças e jovens e, portanto, negócio e sociedade. Uma educação com alicerces construídos com valores que tenham como crivo a riqueza humana, permitindo o desenvolvimento das capacidades e a apropriação de tais capacidades, consegue o atingimento de seu objetivo dentro dos quatro pilares da educação já mencionados: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver junto e aprender a ser. Como ensina o pedagogo Paulo Freire a tarefa humanista e histórica dos oprimidos é uma estrada de via dupla onde o oprimido liberta-se a si e aos opressores. Isso porque a classe dominante para mostrar-se superior e não querer abrir mão do seu status de superioridade intelectual entende por bem manter o desequilíbrio entre ela e a classe oprimida. Tendo por meta entregar ao oprimido a sua “humanidade roubada”.34 Referências Bibliográficas ANDRADE, Everaldo Gaspar Lopes de. Direito do Trabalho e Pós-Modernidade: Fundamentos para uma Teoria Geral. São Paulo: LTr, 2005. ARGENTINA, CONSTITUCIÓN. Constitución Nacional: Antecedentes Históricos: Tratados y Convenciones sobre Derechos Humanos y Notas de Doctrina sobre Reformas de La Constitución Nacional. – 2. ed. 3. reimp. – Buenos Aires: La Ley, 2007. BARREIRO, Júlio. Educação Popular e Conscientização. Porto Alegre: Sullina, 2000. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 4. ed. São Paulo: LTR, 2008. BRASIL. 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Acesso às 14h58. Disponível em: <http://www.salta21.com/Los-Contratos-de-Aprendizaje-en-el.html>. Acesso em 17de mar. 2013. Disponível 34 FREIRE, Paulo. Op.cit., p.32. em: <https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CDAQ FjAA&url=http%3A%2F%2Feciencia.urjc.es%2Fbitstream%2F10115%2F5779%2F1%2FLa %2520ley%2520Benot.doc&ei=D2E8UcHyKIY8gSog4D4CQ&usg=AFQjCNFWytr0tAakpcn4wRtR0w5_jvi4AQ&sig2=2mD71CzEVkCz uhsGZg_2kQ>. Acesso em 10 de mar 2013. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de janeiro: Paz e Terra, 2005. GOLDÍN, Adrían O. Curso del Derecho del Trabajo y la Seguridad Social/ coordinado por Jorgelina F. Alimenti: dirigido por Adrían O. Goldín. Buenos Aire: La Ley, 2009. GOMES, Orlando. Curso de Direito do Trabalho. 19. ed. Forense, São Paulo: 2012. GRISOLIA, Julio A. Manual de Derecho Laboral. 7. ed.- Buenos Aires: AbeledoPerrot, 2011. HERRERA, Joaquim Flores. La reinvención de los derechos humanos. Sevilla: Atrapassueños, 2008. LITTERIO, Liliana Hebe. 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