Ocorrência de Deoxinivalenol em Bebida
Fermentada Artesanal Produzida com Cevada
Cervejeira Comercializada no Brasil
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Karim Cristina Piacentini1, Geovana Dagostim Savi1,
Vildes Maria Scussel1
RESUMO
A qualidade da cerveja e dos ingredientes utilizados em sua produção são e
tendem a ser cada vez mais relevantes, uma vez que o consumo atual é significativo
e há uma indiscutível tendência de crescimento. Nesse sentido, vale destacar os
aspectos relacionados aos grãos de cevada e sua qualidade quanto à contaminação
por fungos e/ou micotoxinas e seus consequentes impactos no produto final. Portanto,
o objetivo do presente trabalho foi determinar a ocorrência de DON em cervejas
artesanais produzidas com cevada cervejeira no ano de 2014 por cromatografia
líquida, utilizando colunas de imunoafinidade para limpeza e detecção por ultravioleta. Foi observada, a presença de DON em 32% (17 amostras de 53) das amostras
analisadas, apresentando níveis de 127,11 a 500,77 µg/l (media 243,66 µg/l). Os
resultados obtidos indicam utilização de grãos de cevada de baixa qualidade, ou
seja, contaminados por fungos de campo, do gênero Fusarium e produtor da toxina
DON (F. graminearum).
Palavras chave: Cevada, cerveja, contaminação, micotoxinas, deoxinivalenol.
INTRODUÇÃO
A cerveja é uma bebida alcoólica bastante popular no contexto mundial
por razões que transcendem os aspectos sociais e econômicos. No Brasil, o
Laboratório de Micotoxinas e Contaminantes Alimentares (LABMICO), Departamento de Ciências e Tecnologia
de Alimentos, Centro de Ciências Agrárias, 1346, CEP: 88040-900, Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis, SC, Brasil. Email: [email protected]
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consumo médio de cerveja registrado em 2008 foi de aproximadamente 57 L
por habitante (Sindicerv, 2014). Uma vez que o consumido atual é significativo
e há uma indiscutível tendência de crescimento, a qualidade da cerveja e dos
ingredientes utilizados em sua produção são e tendem a ser cada vez mais
relevantes. Nesse sentido, vale destacar na matéria prima fermentescível
(carboidrato: amido da cevada), os aspectos relacionados à contaminação por
fungos e/ou micotoxinas e seus consequentes impactos no produto final, como
o consumo futuro da bebida.
As micotoxinas são metabólitos secundários de fungos filamentosos as
quais podem ser produzidas em uma ampla gama de matérias-primas agrícolas
(Bertuzzi et al, 2011), principalmente associada a culturas de cereais, em
particular de milho, trigo, cevada, centeio, arroz e aveia (Osmurtag et al, 2006;
Goyarts et al, 2007).
Como a produção de cerveja requer a utilização de grãos de cevada e
estes podem ter sido expostos a fungos e micotoxinas durante o processo de
armazenamento, vários estudos têm sido realizados em cervejas comercialmente
disponíveis, bem como em grãos utilizados para a produção (Scott, 1996;
Kawashima et al 2007; Benesova et al 2012; Rubert et al 2012). De uma maneira
geral, esses estudos demostraram que deoxinivalenol (DON), nivalenol, T-2,
HT-2, diacetoxiscirpenol, zearalenona, aflatoxinas, ocratoxina A e fumonisinas
têm sido detectados em cerveja em níveis traço (ppb), bem como na matéria
prima utilizada.
DON é uma das micotoxinas mais encontradas em cevada e é produzida
principalmente pelo fungo de campo Fusarium graminearum (Petska, 2007).
Convém comentar que a exposição de humanos e animais ao DON por meio de
alimentos contaminados pode causar efeitos agudos e crônicos, tal como, efeitos
imunossupressores, neurotóxicos, embriotóxicos e teratogênicos (Pestka, 2007;
Rotter et al., 1996; Wijnands & Van Leusden, 2000).
Além disso, outro problema frequentemente encontrado no que diz respeito
ao DON presente nas matérias primas para cerveja (cevada/trigo/milho) é o
gushing, que consiste na formação excessiva de espuma na abertura da garrafa
(pós-fermentação, ou seja, no produto final). Tal problema vem sendo reportado
frequentemente nos últimos anos e pode comprometer a qualidade de cervejas
e, por conseguinte, a reputação de cervejarias.
Pelas razões supracitadas, o objetivo do presente estudo foi determinar a
possível ocorrência de DON em cervejas artesanais produzidas no Brasil.
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MATERIAIS E MÉTODOS
Amostra: foram disponibilizadas pelas empresas fabricantes, 53 amostras de
cervejas artesanais. De posse das cervejas, elas foram inicialmente separadas de
acordo com algumas características, tais como cor (claras-32 ou escuras-21) e marca. Método: as amostras foram analisadas com o intento de verificar a presença
de DON usando colunas de imunoafinidade para etapa de limpeza e cromatografia
líquida de alta eficiência com detecção por luz ultra-violeta (LC/UV). A metodologia
foi realizada de acordo com o protocolo do fabricante Vicam DON Test, No G1005
USA (VICAM, 2013), com algumas modificações, utilizando padrões de DON (Sigma
Aldrich) em diferentes concentrações. Para análise, o extrato (20 µL) foi injetado
dentro do sistema LC/UV selecionando o comprimento de onda de 218 nm.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
DON é uma das micotoxinas frequentemente encontradas em cereais
no mundo, especialmente em grãos de inverno, incluindo a cevada. Portanto,
o estudo realizado pôde demonstrar, que os níveis de DON encontrado
nas amostras de cerveja fabricados com esses cereais de baixa qualidade
(especialmente a cevada) não foram afetados pelo processamento (resistentes
a temperaturas >260°C) e por isso, foram transferidas para as amostras.
Nesse estudo, a presença de DON foi detectada em aproximadamente
32% ( 17 amostras de 53) das amostras analisadas, apresentando níveis de
127,11 até 500,77 µg/l (média: 220,90 µg/l). Os resultados estão expressos na
Tabela 1. Similarmente, um estudo realizado por Schothorst e Jekel (2003) na
Holanda, demonstrou contaminação em aproximadamente 6% das 51 amostras
analisadas. Os níveis de DON no estudo foram baixos e apresentaram valores
entre 26 e 41 µg/l. Adicionalmente, em 2007, não foram encontrados níveis
detectáveis da micotoxina em um estudo realizado por Omurtag e Beyoglu na
Turquia (2007).
Vale ressaltar que, atualmente, não há uma legislação brasileira ou
internacional que determine níveis mínimos de DON para cerveja. Contudo, há
valores regulamentados para cevada malteada. Os níveis determinados pela
legislação brasileira para cevada e cevada malteada estão apresentados na
Tabela 2, e podem, de uma forma superficial, servir como um parâmetro de
comparação.
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Tabela 1. Níveis de DON detectados em amostras de cervejas artesanais provenientes
de matéria prima (cevada cervejeira) de baixa qualidade.
DON (µg/kg)
CERVEJA
(n° total)
DISTRIBUIÇÃO
FREQUÊNCIA (%)
AMOSTRAS POSITIVAS
Nível
Média
NÃO CONTAMINADAS
36
<119.1a
67,9
<LOQ a
<LOQ
120 - 300
26.41
127.11
187.05
CONTAMINADAS
14
129.94
138.11
142.05
146.51
149.10
155.26
155.27
176.68
196.35
222.47
234.17
234.43
294.19
3
300 - 501
5.67
365.08
417.58
386.9
500.77
Total: 53
DON: deoxinivalenol
100
a
127.11 –
500.77
< método LOQ 119.1 µg/kg.
Vale aqui comentar que a contaminação da cerveja deriva da matéria
prima de baixa qualidade usada na produção. Dito de outro modo, se a matéria
prima já chega contaminada para produção da cerveja, fatalmente o produto
final, a cerveja, também estará. Ainda é conveniente lembrar que os níveis de
micotoxina não diminuem durante o processo de produção da cerveja.
No caso específico da região Sul do Brasil, as condições climáticas,
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como chuva e períodos de alta umidade podem aumentar substancialmente a
incidência de contaminação por fungos, especialmente pelo F. graminearum, e
a produção de DON, como já comentado. Essa toxina é resistente ao calor e ao
processamento e, por essa razão, são inevitavelmente ingeridas pelos humanos
consumidores.
Logo, convém finalizar ressaltando que as boas práticas de cultivo no campo
bem como a segregação de lotes importados, podem minimizar os problemas
de contaminação da matéria prima e sua transferência ao produto final; assim
como, o constante monitoramento e cuidado nas condições de armazenamento
podem contribuir para a redução do risco de contaminação por micotoxinas em
grãos de cevada.
Tabela 2. Legislação brasileira para deoxinivalenol em cevada (grãos e malteada)
LMT - APLICAÇÃO
(a partir de 2014)
(a partir de 2016)
LMT: limite máximo tolerável
CEVADA
DON (µg/kg)
Grão
1500
Malteada
1250
Grão
1000
Malteada
750
DON: deoxinivalenol Brasil, 2016/2017
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BRASIL. ANVISA. Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC no.
59, de 26 de dezembro de 2013. Ficam prorrogados até 1º de janeiro de 2017
os prazos para adequação estabelecidos nos artigos 11 e 12 e respectivos
anexos III e IV da Resolução - RDC nº7, de 18 de fevereiro de 2011, publicada
no Diário Oficial União, Seção 1, nº 46, p. 66, 9 março 2011. ftp://ftp.saude.sp.gov.
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Ocorrência de Deoxinivalenol em Bebida Fermentada