UM NOVO MAPA 22 | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | diga lá | nº 45 A PARA O BRASIL Com o perdão dos geógrafos, dividir o Brasil em Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Norte e Nordeste é coisa do passado. Pelo menos quando o assunto são os atrativos turísticos do país, o novo mapa nacional tem nada menos do que 219 regiões. A multiplicação não é um milagre e sim um dos primeiros passos do Programa de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil, um projeto ambicioso apresentado pelo governo federal em 2004. que podem ser apreciadas pelos próprios turistas, como maior qualificação da mão-de-obra do setor, diversificação da oferta de roteiros e atrações, entre outros. Pautado nas sete metas do Plano Nacional de Turismo (PNT) (veja quadro), o Programa de Regionalização do Turismo está, de certa forma, redescobrindo o Brasil. Um destino consagrado como Porto Seguro, por exemplo, não é mais visto como um município isolado, mas como parte de uma das quatro regiões turísticas baianas, a Costa do Descobrimento, que inclui também Santa Cruz de Cabrália e Belmonte. No Estado do Rio, os olhos não são voltados apenas para o mar: são seis as regiões turísticas mapeadas. Uma delas, por exemplo, é dedicada ao Ciclo do Café e passa pelos municípios de Rio Claro, Barra do Piraí, Engenheiro Paulo de Frontin, Mendes, Miguel Pereira, Paracambi, Pati do Alferes, Piraí, Rio das Flores, Valença e Vassouras. nº 45 | diga lá | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | 23 ILUSTRAÇÕES ALÊ ABREU Valquíria Daher O s objetivos vão desde uma mudança na forma de gestão do turismo no país, tornando-a mais integrada e, ao mesmo tempo, descentralizada, até modificações Por que criar roteiros? A criação de roteiros, segundo o Ministério do Turismo, é uma forma de integrar a oferta turística nacional. Os roteiros também facilitam outra das metas do Programa de Regionalização, que é ampliar o tempo de permanência do turista, conseqüentemente aumentando os seus gastos no local. Como integram diferentes municípios e atrações, os roteiros também favorecem o desenvolvimento econômico das regiões. “No nosso trabalho de mapeamento, vimos quais são as regiões que podem fazer parte de uma grande cadeia. Se não tivermos essa excelência, não seremos competitivos. Mas isso tudo é parte de um processo. Muitas regiões têm uma capacidade que ainda não conhecem. Os gestores têm que se perguntar: “O que tem aqui? Como articular isso?”, explica Tânia Brizolla, diretora do Departamento de Estruturação, Articulação e Ordenamento Turístico do Ministério do Turismo. Ela cita como bons exemplos a Costa dos Coqueirais, no Sergipe, o Caminhos dos Príncipes, em Santa Catarina, e Do Ouro à Biosfera, que passa por Pirenópolis (DF) e Goiás. “Em 18 dias, nós fizemos um mapeamento turístico do país e chegamos a 219 regiões e 3.203 municípios. Algumas regiões já estão prontas para o turismo, outras estão em fase de desenvolvimento e ainda há aquelas que estão muito longe do que é necessário. O país já se apresentava dessa forma, nós não inventamos as regiões, mas precisamos ser mais competitivos. Temos que estabelecer uma rede, ter uma visão de política pública no turismo. Quem está envolvido no setor tem que discutir como se produz o turismo”, explica Tânia Brizolla, 24 | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | diga lá | nº 45 Das 219 regiões mapeadas inicialmente, o Ministério do Turismo, juntamente com os órgãos de turismo dos estados, definiu 111 regiões, em estado mais avançado de desenvolvimento, para serem trabalhadas em 2005. No entanto, na elaboração dos roteiros turísticos foram identificadas mais 23 regiões, totalizando atualmente 134 regiões em todos os estados e no Distrito Federal. “Até 2007, a meta é termos três produtos de qualidade por estado, o que totaliza 81 produtos turísticos que podem ser negociados internacionalmente. Isso não significa, porém, que vamos obrigar o Acre a chegar aos três produtos ou a Bahia e o Rio de Janeiro a terem somente três produtos. Também é importante dizer que não vamos abandonar as outras regiões, do total de 219 estabelecidas, que não estão sendo trabalhadas neste momento”, conta Tânia. A novidade é que o Brasil não é só litoral “Uma notícia está chegando lá do interior/ Ficar de frente para o mar e de costas para o Brasil/ Não vai fazer deste lugar um bom país”. A música Notícias do Brasil, de Milton Nascimento e Fernando Brant, bem que poderia ser o mote das diretrizes e dos conceitos do Programa de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil. Uma das ações mais importantes propostas é justamente diversificar a oferta turística do país. Mas se a dobradinha sol-mar seduz turistas por todo o mundo, por que a urgência em olhar para o interior? “Se o Brasil não tivesse outras atrações, não seria problema. Não temos nada contra sol e praia. Mas, se o país tem outros atrativos, tem que mostrá-los. É assim que se fideliza o turista e ele volta 10, 20, 50 vezes porque sabe que vai sempre encontrar algo novo para ver. É assim em países com territórios bem menores do que o nosso, como França e Itália”, explica o secretário nacional de Políticas de Turismo, Milton Zuanazzi. E nós temos uma grande oferta dos chamados produtos turísticos, diz Zuanazzi, explicando que “produto é tudo aquilo em que podemos pôr um preço e que o turista pode consumir e pagar”. Nos Roteiros do Brasil, essa diversidade de produtos pode ir, por exemplo, do Caminho Chico Mendes – nos municípios de Rio Branco e Xapuri, que tem atrativos culturais, ecológicos e religiosos – ao Roteiro Histórico e Pré-histórico da Paraíba, que envolve 28 municípios e vende ecoturismo e turismo rural. “Não podemos só chegar com sol e praia porque assim ficamos com poucas condições de disputar mercados. E nosso público fica mais restrito a famílias, por exemplo. Ou então, caímos no estereótipo de biquínis reduzidos e exploração da sensualidade, sem falar no problema do turismo sexual”, diz Tânia, para, em seguida, acrescentar: “Vimos, por exemplo, que é importante desenvolver atividades como pesca, golfe, mergulho. Assim poderíamos criar um público cativo.” Para Zuanazzi, é importante que os setores envolvidos com o turismo percebam que ninguém vai perder com a diversificação das atrações e dos roteiros: “Não é A versus B versus C. É uma complementação. É um absurdo ficar competindo e isso acontece. É o turista que vai decidir o que ele vai comprar. Nós temos que mostrar: este é o meu país e ele tem tudo isso.” Roteiros que transcendem fronteiras Essa visão de somar e não pensar o turismo como simplesmente um destino é a espinha dorsal da concretização das diretrizes do Programa de Regionalização. A diretora do Departamento de Estruturação, Articulação e Ordenamento Turístico explica que por regionalizar, PRINC IPAIS OBJETI VOS DO PROGR AMA D E REGIO NALIZA | Dar q ÇÃO ualidad ea brasile iro | Diver si o produ to turís tico ficar a o ferta tu | Estru rística turar o s desti nos tur | Ampli ísticos ar e qua l i f i c ar o me trabalh rcado d o e | Aume ntar a i nserção produto compet turístic itiva do o n o m interna e r c a do cional | Ampli ar o con sumo d no mer o produ cado na to turís cional e tico perman a u m e ntar a t ência e axa de gasto m édio do turista nº 45 | diga lá | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | 25 neste caso, entende-se integrar e não separar, ser regionalista. “Hoje identificamos 102 diferentes roteiros, que não são destinos e sim indicações de possíveis roteiros. Eu não quero simplesmente pensar no destino Porto Seguro. Tem que ser Porto Seguro com algo mais, Porto Seguro cultural, por exemplo”, diz Tânia Brizolla. “E o país tem essa vocação. Veja, por exemplo, a Serra Gaúcha. As regiões interagem entre si, gerando diferentes fluxos de turistas”, completa a diretora. Foi justamente a partir da experiência do Rio Grande do Sul que nasceu o Programa de Regionalização – Roteiros do Brasil. Milton Zuanazzi explica que em nível federal, esse tipo de gestão toma outras dimensões. “No Rio Grande do Sul, o nosso objetivo era fazer o gaúcho conhecer o estado. O gaúcho viajava para a serra e para o litoral e isso acontecia somente nas férias. Queríamos que o turismo interno do estado acontecesse durante o ano todo e conseguimos melhorar muito isso lá por meio de uma integração maior entre os setores público governamental, público não governamental e privado. Todos têm que fazer parte do núcleo de gestão”, diz Zuanazzi. Considerado uma evolução em relação ao antigo Programa de Municipalização do Turismo, o Programa de Regionalização quer justamente integrar e descentralizar a gestão. O turismo tem que ir além de um município ou de um estado. A construção de um produto passa por interagir entre diferentes locais – municípios, estados e até países. A Serra da Mantiqueira, por exemplo, está em três estados. 26 | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | diga lá | nº 45 Participativo sempre Na prática, uma das formas desse tipo de integração se dá por meio dos Fóruns Estaduais de Turismo, que coordenados pelo Ministério do Turismo, estão atualmente em permanente diálogo. Zuanazzi diz que, a aceitação do Programa de Regionalização tem sido até maior do que o previsto. “A receptividade foi muito além do esperado. O Brasil tem um turismo diverso e complexo. Temos cidades de Primeiro Mundo como São Paulo e outras ainda pouco desenvolvidas. Mas essa integração é altamente positiva”, diz o secretário, explicando que o objetivo é criar “alicerces” para o projeto. “Não adianta pensar nisso apenas como um programa de governo porque os governos são passageiros. Por isso, estamos criando governanças, que envolvem o público e o privado, para que o programa continue permanentemente.” Além da participação dos setores público e privado, há um outro elemento-chave para os objetivos do Programa de Regionalização: a sociedade. Sem a mobilização da população nos grandes ou pequenos pólos turísticos, dificilmente o chamado produto terá a qualidade esperada. “O turismo tem que ser pensado do ponto de vista da sociedade. A cidade tem que querer receber esse turista e isso tem que ser vinculado ao trade e a outros setores”, explica o secretário. Para Tânia Brizolla, no desgaste ou na re- novação do turismo o mais importante é a gestão: “É importante integrar o trabalho de empresários, população e poder público. Precisamos de qualificação e de preparação para sermos competitivos. É preciso reconhecer o que se tem de melhor e nisso a educação é essencial. O comprometimento com o turismo de qualidade tem de ir desde o barraqueiro até o gestor máximo. O país precisa de novas atividades para crescer e o turismo é uma delas. A sociedade entende que isso é importante.” PREMI SSAS D O PLANO NACIO NAL DE TUR ISMO | Parcer | Desco regiona Turismo interno incentivado Aumentar o número de brasileiros que viajam por seu próprio país, e não somente em épocas de alta do dólar e do euro, é uma das metas do Ministério do Turismo e também está entre as missões do Programa de Regionalização. Zuanazzi acredita que o aproveitamento do potencial turístico do Brasil ainda é baixo, mesmo nos destinos já estabelecidos. “Nós brincamos que queremos fazer com o turismo um plano de metas de Juscelino. Até 2010, esperamos ter aumentado em 100% o turismo interno. Isso é plenamente possível por meio da qualificação e da formatação de produtos que visem a alguns mercados específicos. A classe A viaja pouquíssimo pelo Brasil, mas a classe média alta também prefere o status de viajar para o exterior. Nós ia e ges ncentra tão des central izada ção de renda p or meio , i da n terioriz segmen a ç ão e tação d a ativid ade tur ística | Divers ificação dos me destino rcados s; inova , produ tos e ç ã o na form conteú a do das e n o relaçõe arranjo s e inte rações s produ dos tivos | Adoçã exigind | O turis cidadan o de pe o plane e inform do turis lização ações c mo inte mo com ia e de nsamen jament o, anál onsiste rno o fator integra to estra tégico, ise, pes quisa ntes; in cremen to de cons ção soc trução da ial nº 45 | diga lá | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | 27 NÇAS E R E F I D S A A ENTEND co que paço geográfi Es : a ic st rí Região tu cialidades ísticas e poten er ct ra ca a nt aprese es de serem entares capaz m le p m co e similares io, delimitado em um territór in ef d ue q e articuladas ssim, a to e gestão. A en m ja ne la p para fins de estados, e um ou mais d s io íp ic un m integração de tituir uma ses, pode cons aí p s ai m ou ou de um a. região turístic erizado por inerário caract It : o ic st rí Roteiro tu nferem tos que lhe co en em el s ai m um ou para fins de e estruturado o id in ef d e, identidad mercialização promoção e co o, tã es g , to planejamen turística. do e : Percurso continua Rota turística atribuída é reforçada ou ja identidade delimitado cu turística. pela utilização gião ou re Local, cidade, : o ic st rí tu o rísticos. Destin m os fluxos tu país para ond e se movimen ta tivos, ra o: Conjunto de at ic st rí tu to u d Pro scido de turísticos, acre e serviços equipamentos izada por um de forma organ o d ta er of , es facilidad destinos as, roteiros e ot R . ço re p o determinad , por dutos turísticos ro p em ir tu ti podem se cons exemplo. 28 | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | diga lá | nº 45 não temos fobia de exterior, mas queremos que eles experimentem o Brasil”, comenta o secretário, que também aponta o incentivo ao turismo interno como uma forma de inclusão social. “Queremos dar oportunidade de mais brasileiros conhecerem o seu país, por isso estuda-se baixar tarifas de passagens, de hotéis e tornar o turismo mais acessível a todos”, diz Zuanazzi, explicando que o tema foi motivo de debates durante o Fórum Mundial de Turismo, realizado em outubro no Rio de Janeiro, e que durante o Congresso Brasileiro da Associação de Agências de Viagens (Abav) foi lançado um programa de incentivo ao turismo doméstico de baixa temporada, com pacotes turísticos a preços populares. O Ministério do Turismo tem estimativas otimistas para o setor este ano, esperando completar um total de 5,5 milhões de turistas internacionais e 44 milhões de desembarques domésticos, com um crescimento entre 5% e 6%. Para alcançar esse sucesso, o secretário explica que não há uma preferência por um perfil específico de turista: “Todo turista nos interessa. Não podemos ter uma visão compartimentada. O programa é mais amplo, pensamos desde os pequenos nichos até o turismo de massa.” Um dos mercados a serem desenvolvidos dada a natureza do nosso país é o ecoturismo, mas uma das preocupações do programa é explorar o turismo com responsabilidade, tanto no âmbito do interior como dos destinos já consagrados. A diversificação é uma aliada nisso: “É preciso haver responsabilidade com o ecossistema. Por exemplo, até onde Porto Seguro suporta o fluxo de visitantes.” “Temos que pensar um turismo com sustentabilidade, sem que as populações percam sua identidade cultural”, diz Tânia, destacando que o programa pode ajudar a trocar experiências entre os estados e também a gerar modelos de gestão. “Por exemplo, Mamirauá foi considerado o melhor destino de ecoturismo do mundo. Todos sabem que Mamirauá é uma referência, mas o que fizeram para chegar até aí? Podemos ampliar isso, trocar experiências. Muitos ainda não sabem que ter um destino de ecoturismo não é levar um turista para uma cachoeira com lixo em volta.” A Reserva de Mamirauá fica no Amazonas e abrange uma área de, aproximadamente, 1 milhão de hectares. É a maior área de florestas inundadas protegida do mundo. Sucesso no Salão de Turismo Tanto os nichos a serem explorados como os roteiros já existentes puderam ser vistos pelo público no Salão do Turismo – Roteiros do Brasil, no Expo Center Norte, em São Paulo. Para um programa que espera, até 2007, ter 81 produtos de qualidade para negociar no mercado, chegou a ser uma surpresa ver apresentados 451 produtos. “Como salão, conseguimos enxergar o que está sendo feito. E os próprios estados estão fazendo os seus salões. Antes a gente ouvia as pessoas dizerem que não tinham dinheiro para produzir, mas elas saíram produzindo. Hoje existe uma série de projetos”, elogia Tânia, admitindo, no entanto, que muitos produtos ainda precisam ser mais desenvolvidos. “Talvez 50% dos produtos apresentados ainda não estejam adequados.” Passaram pelo salão cerca de 100 mil pessoas. Uma pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas durante os quatro primeiros dias do evento mostrou que 82,6% do público conheceu novos roteiros por lá. Outros 95,9% disseram que pretendem visitar a próxima edição do salão, que acontecerá no próximo ano. Outra novidade revelada pela pesquisa é que os destinos praianos ainda são os preferidos, mas já têm concorrência: 36% dos entrevistados disseram que preferem os roteiros com sol e praia; 25,5% querem ecoturismo; 24,5% procuram roteiros culturais; e 7,8% gostam das festas populares. Para o Salão de Turismo 2006, a expectativa é ainda maior. nº 45 | diga lá | OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2005 | 29