Este arquivo faz parte do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação Social, que disponibiliza para consulta a Dissertação abaixo. O exemplar impresso está disponível na Biblioteca da Universidade. Livros Grátis http://www.livrosgratis.com.br Milhares de livros grátis para download. 1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL ÂNGELA LOVATO DELLAZZANA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL: UMA VISÃO COMPLEXA DO DISCURSO DAS ORGANIZAÇÕES Dissertação apresentada como requisito para obtenção do título de Mestre em Comunicação Social, no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Orientadora: Prof. Dra. Maria Helena Steffens de Castro PORTO ALEGRE 2005 2 ÂNGELA LOVATO DELLAZZANA COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL: UMA VISÃO COMPLEXA DO DISCURSO DAS ORGANIZAÇÕES Dissertação apresentada como requisito para obtenção do título de Mestre em Comunicação Social, no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. APROVADO PELA BANCA EXAMINADORA PORTO ALEGRE, 11 DE JANEIRO DE 2006. BANCA EXAMINADORA Orientadora: Profª. Drª. Maria Helena Steffens de Castro Profª Drª. Cleusa Maria Andrade Scroferneker (PUCRS) Profª. Drª. Karla Maria Müller (UFRGS) 3 Aos meus pais. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus, pela minha vida e por me guiar até aqui; À minha família pelo suporte necessário; Às amigas do grupo Nova Aliança, pelas frutíferas orações; Ao pessoal da AGCO; Aos colegas, professores e funcionários do “pós” da Famecos; Em especial, à minha orientadora, Profª Maria Helena Steffens de Castro, pela dedicação e constante disponibilidade. Ao Gustavo, pela presença, carinho e estímulo. A todos os amigos a quem eu não pude dar a atenção que queria. 5 Recomenda a Iahweh tuas obras e teus projetos irão se realizar. Provérbios 16, 3 6 RESUMO Este trabalho focaliza o discurso da publicidade de maneira a possibilitar uma análise atenta da comunicação organizacional enquanto comunicação institucional e mercadológica. Neste sentido, insere-se a perspectiva da comunicação integrada que visa, entre outros objetivos, a criação de uma imagem positiva da organização. Amparada no paradigma metodológico do pensamento complexo, a análise de discurso contribui para demonstrar como é estruturado o texto publicitário em seu contexto social, a partir dos múltiplos sujeitos que agem e interagem neste circuito apresentado por Patrick Charaudeau, como um contrato de comunicação. Incluem-se ainda as técnicas de estudo de caso e pesquisa exploratória, que reuniram o aporte teórico e documental necessário para a análise transdisciplinar com base no paradigma proposto por Edgar Morin. Buscando demonstrar como a comunicação organizacional é empregada de maneira integrada numa campanha publicitária, foram analisadas as peças da Caravana 500 mil pelo Brasil, promovida pela marca de tratores Massey Ferguson - AGCO, à luz do pensamento complexo. Constatou-se a presença de aspectos tanto mercadológicos quanto institucionais nas peças analisadas, evidenciando o caráter complexo, ambíguo e até mesmo contraditório da comunicação organizacional, o que possibilita múltiplas leituras. Palavras-chave: organizações; comunicação; discurso; pensamento complexo. 7 ABSTRACT The present research focuses the advertisement speech to allow an attention analysis of the organizational communication as institutional communication and marketing communication. This way, it is introduced the perspective of the integrated communication, that aims, among other objectives, the creation of a positive image of the organization. Supported by the method of the paradigm of the complex thought, the speech analysis contributes to show how the advertisement text is structured in its social context, starting from the multiple subjects, that act and interact on the circuit presented by Patrick Charaudeau as a communication contract. It is also included the techniques of case study and exploratory research, that combine the theoretical and documental subvention needed on the transdisciplinary analysis, based on the paradigm proposed by Edgar Morin. Aiming to demonstrate how the organizational communication is used in a integrated way in an advertisement campaign, the pieces of the Caravana 500 mil pelo Brasil, promoted by the brand Massey Ferguson-AGCO, were analyzed at the light of the complex thought. The presence of both institutional and marketing communication aspects was noticed in the analyzed pieces, proving the organizational communication to have a complex, ambiguous and even contradictory nature, what enables multiple understandings. Key-words: organization; communication; speech; complex thought 8 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Construção da imagem............................................................................................. 45 Figura 2 - Processo da identidade e da imagem. ...................................................................... 46 Figura 3 - Contrato de comunicação publicitária .....................................................................65 Figura 4 - Elementos presentes no texto publicitário. ..............................................................68 Figura 5 - Contrato de comunicação publicitária – Campanha Caravana 500 mil pelo Brasil87 Figura 6 - Anúncio 1................................................................................................................. 89 Figura 7 - Anúncio 2................................................................................................................. 90 Figura 8 - Outdoor.................................................................................................................... 91 Figura 9 - Proposta do discurso argumentativo. ..................................................................... 100 9 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Concepção de comunicação organizacional...........................................................27 Quadro 2 - Concepção de comunicação institucional .............................................................. 36 Quadro 3 - Valores da AGCO .................................................................................................. 79 Quadro 4 - Anúncio 1. .............................................................................................................. 89 Quadro 5 - Anúncio 2. .............................................................................................................. 90 Quadro 6 - Frases das peças da campanha ............................................................................... 93 10 SUMÁRIO INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 12 1 A COMUNICAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES ............................................................... 18 1.1 A COMUNICAÇÃO COMO OBJETO ................................................................... 18 1.2 COMUNICAÇÃO NO ESPAÇO ORGANIZACIONAL........................................24 1.2.1 1.3 Um olhar sobre as teorias organizacionais .......................................................29 AFINAL, O QUE É COMUNICAÇÃO INTEGRADA?......................................... 34 1.3.1 2 Comunicação institucional X comunicação de marketing: .............................. 35 A COMUNICAÇÃO INTEGRADA E A IMAGEM ORGANIZACIONAL.................. 42 2.1 Construção da imagem organizacional NA PERSPECTIVA da comunicação integrada ............................................................................................................................... 43 2.1.1 2.2 3 A responsabilidade social a serviço da imagem institucional ..................................48 O DISCURSO ORGANIZACIONAL ............................................................................. 52 3.1 O paradigma da complexidade ................................................................................. 52 3.1.1 3.2 4 Imagem, identidade e identificação. .................................................................44 Três princípios da complexidade...................................................................... 54 A necessidade do pensamento complexo nas organizações .....................................56 A ORGANIZAÇÃO DISCURSIVA ................................................................................ 60 4.1 O discurso PUBLICITÁRIO .................................................................................... 62 4.1.1 Organizações do discurso publicitário.............................................................. 67 4.1.2 Estratégias do discurso publicitário.................................................................. 70 4.2 Campanhas publicitárias........................................................................................... 72 11 4.2.1 4.3 5 6 As peças publicitárias ....................................................................................... 73 A relação da imagem com o TEXTO ....................................................................... 76 ESTUDO DE CASO: A CAMPANHA CARaVANA 500 MIL PELO BRASIL ...........78 5.1 Caracterizando a organização pesquisada ................................................................ 78 5.2 A CAMPANHA .......................................................................................................80 5.3 O contexto - Programa Fome Zero ...........................................................................82 APLICAÇÃO DA ANÁLISE: O ENCONTRO DE CHARAUDEAU COM A COMPLEXIDADE................................................................................................................... 86 6.1 A análise das peças ................................................................................................... 87 6.1.1 Organização enunciativa................................................................................... 92 6.1.1.1 Comportamento Alocutivo ........................................................................... 94 6.1.1.2 Comportamento Delocutivo ......................................................................... 97 6.1.2 Organização argumentativa ............................................................................ 100 6.1.3 Organização narrativa..................................................................................... 101 6.1.4 Relação da imagem com o texto..................................................................... 102 6.2 ANÁLISE DAS FALAS – entrevista.....................................................................105 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................109 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 115 ANEXOS ................................................................................................................................ 119 12 INTRODUÇÃO A adaptação da conduta organizacional perante a sociedade é cada vez mais necessária para que a empresa possa crescer e se desenvolver num mercado competitivo e exigente. Para ilustrar essa realidade, pode-se citar a recente preocupação das organizações com as suas relações sociais e com os acontecimentos políticos e econômicos mundiais. No que tange à comunicação, muitas mudanças já ocorreram em função da globalização. A adoção de ações e programas de comunicação com vistas à construção de uma imagem organizacional positiva deixou de ser apenas um diferencial, assumindo papel fundamental no planejamento estratégico das empresas. Contudo, na prática, percebe-se que as organizações enfatizam apenas algumas ferramentas, e não exploram o poder que a comunicação exerce sobre toda a estrutura organizacional, e conseqüentemente sobre seus diversos públicos. O interesse por essa área surgiu desde a especialização em administração, com ênfase em marketing, quando se constatou a falta de uma abordagem mais ampla da comunicação por parte dos professores e dos autores de marketing. Durante o curso percebeu-se uma grande disparidade entre a concepção de comunicação vista na graduação em comunicação social, e a concepção de comunicação na pós-graduação em marketing. Foi com surpresa que se deparou, na especialização, com uma abordagem superficial da comunicação organizacional, restrita aos processos de promoção e divulgação. Nesta ocasião, desenvolveuse uma monografia onde era proposta uma nova concepção de comunicação para o marketing, tornando essa área mais abrangente. 13 Ao longo dos estudos, buscando justificar a necessidade de se tratar a comunicação com maior ênfase no âmbito organizacional, deparou-se com o termo comunicação integrada que justamente se propunha abordar a comunicação de maneira mais ampla, alçando-a a patamares mais altos na hierarquia dos tradicionais organogramas das empresas. Porém, esta nova atenção que foi dispensada à comunicação parece não ter gerado a transformação que se esperava. Bueno (2005) argumenta que os profissionais de comunicação acreditam e pregam que a comunicação integrada é a melhor solução para as organizações, mas não a estão praticando. Nesse sentido, surgiu a necessidade de se estudar como é praticada a comunicação dentro das organizações, verificando se esta é realmente apenas uma ferramenta do marketing, ou se ela é utilizada através da perspectiva da comunicação integrada. A comunicação integrada, segundo a visão de Kunsch (2003), é uma filosofia que direciona a convergência das diversas áreas da comunicação, numa união que permite uma ação sinérgica, formando um mix, um composto de comunicação organizacional. Já para Bueno (2005) fazer comunicação de maneira integrada significa que as atividades de comunicação estão articuladas, se integram ao processo de gestão, de planejamento, de marketing e obedecem a uma política de diretrizes comuns. Assim, entende-se que a comunicação integrada busca ser uma aliada das organizações para que cada mensagem desta, mesmo que em linguagens diferentes (discursos organizacionais), seja harmônica e coerente, criando a legitimidade da organização e projetando na mente do público exatamente a imagem do que a organização é, busca, e parece ser. Dentre essas manifestações da empresa, estão as ações de responsabilidade social, que também foram implantadas como resposta a uma tendência mundial. A responsabilidade social interessa tanto à empresa, por questões mercadológicas, quanto à comunidade em geral, 14 por questões éticas. A preocupação em realizar essas ações socialmente responsáveis apresentou-se como uma das “adequações” que a globalização, de uma certa maneira, impôs às organizações. Para divulgar estas ações, é necessário o desenvolvimento de uma comunicação de cunho institucional, mas sem deixar de lado o objetivo final de empresa que é o lucro, o que implica também em ações de comunicação mercadológica. Entende-se que estes programas de comunicação, para que sejam coerentes, precisam ser planejados de maneira integrada. Durante o período de coleta de dados e investigação foram surgindo muitas indagações, tais como: de que forma as empresas entendem a comunicação organizacional, e como a comunicação organizacional influencia a formação da imagem. A partir destes questionamentos foram traçados os objetivos gerais e específicos que norteiam este trabalho. O objetivo geral foi compreender como a comunicação institucional e mercadológica é trabalhada nas organizações, a partir dos discursos publicitários. Como objetivos específicos buscou-se compreender de que maneira a comunicação influencia a criação da imagem organizacional e discutir as estratégias comunicacionais para legitimar a imagem de uma empresa socialmente responsável. Buscando alcançar estes objetivos, analisou-se o discurso da campanha publicitária intitulada Caravana 500 mil pelo Brasil, da marca Massey Ferguson, a partir do método proposto pelo paradigma da complexidade (MORIN, 2003). Como metodologia, utilizaram-se as técnicas de pesquisa exploratória como o levantamento bibliográfico e documental (GIL, 1999), que permitiram o embasamento teórico, e estudo de caso (YIN, 2005), que se mostrou vantajosa por auxiliar na compreensão de fenômenos sociais complexos dentro de seus contextos, como pode ser caracterizado o objeto deste estudo. A opção por esta técnica está atrelada à sua ausência de fórmulas de rotina, característica pertinente na medida em que 15 permite ao pesquisador a liberdade de traçar seus caminhos, enriquecendo o estudo e estimulando o exercício do pensamento complexo. A Massey Ferguson é uma das marcas produzidas pela empresa multinacional norteamericana AGCO, responsável por 25% da produção mundial de máquinas agrícolas. O nome AGCO não é mais considerado uma sigla, e sim um nome próprio que se formou a partir dos nomes das duas primeiras marcas que compuseram a empresa: Allis, Gleaner Corporation. A corporação não trata mais como sigla porque já tem mais de vinte marcas em seu portfólio, várias delas muito mais representativas que estas duas, a começar pela Massey Ferguson. A AGCO dispõe de um departamento de comunicação bastante atuante, e recentemente promoveu, juntamente com a Associação Nacional dos Distribuidores Massey Ferguson (Unimassey), uma campanha em nível nacional, para divulgar e comemorar o alcance de 500 mil tratores da marca produzidos no país. A campanha é compostas de peças publicitárias com mensagens verbais e icônicas. Entretanto, a análise ficou circunscrita aos textos verbais, num processo empírico-dedutivo proposto por Patrick Charaudeau. Entendeu-se necessário incluir também uma leitura da relação das imagens com o texto e da entrevista, como complementação. Para analisar a campanha selecionada para o estudo – dois anúncios para revista e jornal, um outdoor e um spot de rádio – foi empregada a técnica de análise de discurso, através da dialética da enunciação, que trabalha com práticas sociais da linguagem. Segundo Charaudeau esta técnica permite compreender os contextos e o apelo desses contextos, através da reconstrução de representações. Nessa perspectiva, o lingüista define o ato de linguagem como uma mise-em-sene da significação, da qual participam os parceiros em interação, subordinada a contratos e convenções sobre saberes, normas, valores, universos de referência, partilhados entre os sujeitos da enunciação. 16 Acredita-se que esta análise qualitativa, a partir do método proposto pelo paradigma da complexidade de Edgar Morin, permite perceber o vínculo entre partes contraditórias de um mesmo campo e a interação com outros campos sociais, o que dá um caráter multidimensional ao todo da realidade social, característica inerente a todo processo comunicacional. No primeiro capítulo será abordada a comunicação nas organizações, fazendo-se um breve relato de algumas teorias organizacionais e comunicacionais. A partir das idéias expostas sobre comunicação organizacional, busca-se então a noção de comunicação integrada, dando-se destaque para a comunicação institucional e a mercadológica. No capítulo seguinte faz-se necessário abordar alguns aspectos da imagem organizacional, pois se entende ser esta um produto, sempre inacabado e em constante construção, de todos os meios de interação da organização com os públicos. Como auxiliares na construção desta imagem são enfatizadas então as ações de responsabilidade social, que atraem críticas positivas de toda a sociedade para a organização que as pratica. É pertinente discutir este aspecto, na medida em que a campanha analisada foi concebida pela empresa como uma ação socialmente responsável. Já o terceiro capítulo discorre sobre o discurso organizacional, através da perspectiva de Edgar Morin, apontando indícios do paradigma da complexidade nas organizações. Através deste paradigma, o autor propõe a superação dos limites da metodologia ao configurar uma teoria e um imaginário do conhecimento, que surge de um conjunto de novas concepções, de novas visões, de novas descobertas e de novas reflexões que vão relacionar-se em uma constante incerteza. O quarto capítulo aborda a análise de discurso com ênfase no discurso publicitário, priorizando-se a abordagem do circuito semiolingüístico que Charaudeau propõe na 17 construção do texto publicitário. Neste momento, discute-se também a criação de campanhas publicitárias e a escolha de mídias para a veiculação das peças, restringindo-se às mídias usadas na campanha. No quinto capítulo, surge a necessidade de se caracterizar um estudo de caso (YIN 2005), através da descrição do objeto de pesquisa, a campanha Caravana 500 mil, e o contexto social em que foi criado, o Programa Fome Zero do governo federal. Finalmente, no sexto capítulo, estabeleceu-se a interação das idéias do paradigma da complexidade e da análise discursiva de Charaudeau (1986). As abordagens circulares, complexas e multidisciplinares auxiliam a entender o discurso publicitário em si, e a sua interação com o contexto em que ele está inserido. É o momento em que se compreende que as contradições são necessárias e que a imersão na complexidade auxilia na convicção de que nenhuma verdade é definitiva, e o incerto está presente em todo o momento. Acredita-se que a consciência da necessidade de preparar-se para o inesperado, proposta por Morin (2003), é um caminho para tornar as ações organizacionais adequadas às constantes mudanças do mundo globalizado. 18 1 A COMUNICAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES Segundo Putnam, Phillips e Chapman (2004), existe conflito tanto em nível teórico quanto em nível prático, quando o assunto é a relação entre organização e comunicação. Para os autores, ainda não há consenso sobre como efetivamente o contexto organizacional afeta a comunicação e como a comunicação molda o contexto organizacional. Contudo, a relação entre eles é importante, a ponto de fazer da comunicação um termo presente na maioria dos estudos sobre as organizações. Esta relação também é abordada por Littlejohn (1982), que afirma que, em certo sentido, o conceito de organização é semelhante ao de comunicação, pois, em ambos os casos, sabe-se intuitivamente do que se trata, mas é difícil defini-los formalmente. Para o autor, uma parcela considerável da comunicação ocorre no contexto da organização, e, nesse sentido, concorda-se com o autor, quando este cita a importância de se conhecer alguns aspectos tanto das teorias da comunicação quanto das teorias da organização para enriquecer o entendimento da comunicação no âmbito organizacional. 1.1 A COMUNICAÇÃO COMO OBJETO Para Littlejohn (1982), a comunicação consiste num processo ubíquo e complexo de eventos psicológicos e sociais, envolvendo a interação simbólica, através de diversas combinações de codificação, significado, pensamento, informação e persuasão. Para o autor, não é produtivo procurar a melhor teoria da comunicação, pois esta não é um ato singular e 19 unificado, mas um processo constituído por numerosos aglomerados de comportamentos. Portanto, é pertinente uma abordagem multiteórica deste complexo processo. Nesse sentido, buscou-se fazer um breve recorte dos diversos estudos da área que justificam esta visão integrada, formada pela contribuição de diversas disciplinas que discutem a questão da comunicação. De acordo com Cooley (1901): O campo da comunicação abrange não só a expressão do rosto, a atitude, os gestos, a tonalidade da voz, as palavras, o escrito, mas também a imprensa, as estradas de ferro, o telégrafo, o telefone; em suma tudo o que pode ser o resultado do domínio do espaço e do tempo (apud MATTELART 1996, p. 40). Esta frase é citada por Mattelart para frisar que a gama de definições do termo comunicação já estava sendo comentada em 1901, pelo sociólogo americano Charles Horton Cooley na obra Social Organization. Desde então, a polissemia desta palavra só aumentou e Mattelart (1996) afirma que as diversas definições existentes hoje acabam importunando a leitura de obras sobre o tema. O autor procura enfatizar uma visão política nos seus estudos de comunicação, argumentando que a comunicação promove o progresso, como aconteceu a partir de 1980, com o desenvolvimento das tecnologias eletrônicas e informáticas, que fez surgir a “sociedade da informação”. Especialmente nos países do então chamado “terceiro mundo”, a comunicação apresentou-se como saída para o subdesenvolvimento, como um agente da mudança social para auxiliar na racionalização dos comportamentos no domínio do planejamento familiar, dos métodos agrícolas e da alfabetização (MATTELART, 1996). Rabaça e Barbosa (2001) também acreditam que o mundo desenvolveu-se graças à comunicação, e fazem uma ampla abordagem das várias definições do termo comunicação. 20 Os autores concluem que o homem só pode existir se for através da comunicação, pois ela permeia toda sua vida, e onde existe vida humana, existe comunicação. Porém, para se ter uma idéia da abrangência do termo comunicação, é preciso voltar às origens dos estudos nesta área, e fazer uma breve síntese das teorias da comunicação. Segundo França (2002), para iniciar uma reflexão sobre teoria (ou teorias) da comunicação, é preciso, antes de tudo, definir o seu objeto. E a primeira questão que surge do senso comum é que o objeto da comunicação está disponível a todos, materializado em objetos e práticas que podem ser vistas, ouvidas e tocadas. A autora enfatiza esta visão ao afirmar que a comunicação é um fato concreto do nosso cotidiano, de presença quase exaustiva na sociedade contemporânea. A autora alerta ainda que, no estudo do objeto da comunicação, não estão em questão os objetos “comunicativos” do mundo, prontos para serem analisados, pois eles não estão disponíveis. Na verdade, foram conceituados, construídos e apontados pelos teóricos de comunicação. A comunicação, como processo social básico de produção e partilhamento do sentido através da materialização de formas simbólicas, sempre existiu na história dos homens. Foi a modernidade que transformou a comunicação em problema, que levantou questões em torno de uma prática até então natural, naturalizada, mas que, a partir desse momento, se impôs ao homem como algo a ser melhor conhecido. França (2002) afirma ainda, que a partir de 1930, uma teoria começou a ser desenvolvida nos Estados Unidos e foi chamada de mass communication research, pesquisa voltada para os meios de comunicação de massa, seus efeitos e funções. Preocupava-se com os aspectos objetivos, tangíveis e mensuráveis da comunicação como um todo, levando em conta a eficiência e a eficácia das práticas comunicativas. Esse sistema foi criado para 21 explicar a comunicação eletrônica, mas logo foi aplicado a diversos contextos sociais, principalmente para explicar a comunicação humana. Para Martino (2002), é importante ressaltar a intenção da comunicação de romper com o isolamento, realizando uma ação em comum, como o produto de um encontro social, num processo bem delimitado no tempo, sem se confundir com a convivialidade. Nesse sentido, a comunicação exprime um tipo de relação exercida sobre outrem, ou seja, uma relação entre consciências. O autor exemplifica citando que um livro somente se torna comunicação a partir do momento dessa relação: para que a página de um livro se transforme em mensagem, é preciso reunir tanto a atividade do leitor, quanto o produto da atividade do escritor. O rastro que uma consciência deixa sobre um suporte material, de modo que uma outra consciência possa resgatar, recuperar e simular o estado em que se encontrava a primeira consciência, é a informação (MARTINO, 2002). A informação é uma comunicação que pode ser ativada a qualquer momento, e tanto pode ser considerada uma parte do processo de comunicação ou um sinônimo desse processo, pois não existe comunicação sem informação, e, por outro lado, não há informação, senão em vista da possibilidade dela se tornar comunicação. Para Martino (2002), a resposta que surge espontaneamente para a pergunta “o que é comunicação?”, é a situação de diálogo, onde duas pessoas – o emissor e o receptor – trocam idéias, informações ou mensagens, ou seja, conversam. Mas este fenômeno não se restringe exclusivamente ao envolvimento de duas pessoas. Existe uma diversidade de conceitos que pode nos levar para situações muito distintas do diálogo, como, por exemplo, a comunicação entre animais, comunicação não verbal, comunicação entre máquinas, como computadores conectados por um modem. Entretanto, considerando-se a comunicação como uma disciplina, 22 delimita-se o tema, pois nesse âmbito o seu estudo não engloba todo e qualquer fenômeno comunicativo, mas apenas aqueles restritos à dimensão humana. O autor busca a etimologia do termo para discorrer sobre o tema. O termo comunicação vem do latim communicatio, que se divide em três partes. A raiz munis significa “estar encarregado de”, o acréscimo do prefixo co expressa simultaneidade, reunião, ou “atividade realizada conjuntamente”, reforçados pela terminação tio, que também exprime a idéia de atividade (MARTINO, 2002). O autor conclui que o objeto de estudo da comunicação tende a se confundir com o objeto de outras ciências. A verdadeira dimensão desse problema pode ser percebida ao se analisar a riqueza semântica da palavra “comunicação”. Hohlfeldt (2002), partindo do pressuposto de que a comunicação é a troca de mensagens, afirma que o processo comunicacional é, antes de tudo, uma habilidade exclusivamente humana, que se aprende através da linguagem, consistindo em um fenômeno social. Para o autor, embora seja hoje estudada enquanto disciplina específica, a comunicação é, na verdade, campo de estudos e análises de múltiplas disciplinas, tais como a antropologia e a sociologia. Neste sentido, Rüdiger (2002) contribui para reforçar a questão da interdisciplinaridade dos estudos comunicacionais, ao sinalizar que os precursores da pesquisa crítica em comunicação não eram teóricos do campo da comunicação, mas pensadores que se interessavam por diversos campos do saber com o objetivo filosófico e político de elaborar uma ampla teoria crítica da sociedade. O autor refere-se à Escola de Frankfurt, grupo de cientistas sociais alemães cujos expoentes eram Theodor Adorno, Max Horkheimer, Erich Fromm e Herbert Marcuse (2002). 23 Entre as contribuições da referida Escola está a criação do conceito que se tornou central para os estudos sobre mídia e que interessa ainda hoje para os pesquisadores de comunicação: a indústria cultural. Este termo refere-se à conversão da cultura em mercadoria, ou seja, a produção cultural e intelectual orientada em função de sua possibilidade de consumo no mercado. Os pensadores frankfurtianos criticaram a cultura de massa porque perceberam que a família, a escola e a religião perderam grande parte de sua influência socializadora para os meios de comunicação, a ponto de o capitalismo penetrar no campo da formação da consciência. Para eles, a cultura convertida em mercadoria conserva as marcas da violência e da exploração a que as massas têm sido submetidas desde as origens da história, transformando não só o conhecimento, a literatura e a arte em produtos de consumo, mas também os próprios seres humanos (RUDIGER, 2002). Nesse paradigma estudava-se a comunicação inserida na cultura, considerando os ritos, valores, conteúdos de linguagens e das narrativas, sem adotar conceitos préestabelecidos. Desse modo, busca-se a interpretação dos fatos, relacionando-os em aspectos sócio-culturais da época, dando ênfase nas suas diferenças e similaridades e revelando o sentido de um mito ou de um sistema. Contudo, Martin-Barbero (2004) afirma que a inserção da comunicação nos estudos das ciências sociais gerou uma visão reducionista da área, tornando suas tecnologias e linguagens restritas aos aparelhos e instrumentos de reprodução social. Tal reducionismo pode ser percebido na visão dos pensadores da Escola de Frankfurt de que a arte somente permaneceria íntegra se não participasse da comunicação, como se a comunicação se restringisse a um instrumento de reprodução ideológica. 24 O autor aborda também a necessidade crescente de conscientização da transdisciplinaridade do campo da comunicação. Esta consciência é imposta pela globalização, que cada vez mais levanta questões transnacionais com novos territórios, atores, contradições e conflitos. Entretanto, Martin-Barbero (2004) alerta que essa transdisciplinaridade não significa a dissolução dos objetos da comunicação nas disciplinas sociais, e sim a construção de articulações que permitem a compreensão das novas formas de percepção e de linguagem. A comunicação também é analisada a partir de uma realidade una e múltipla, em que a pluralidade está nas relações complexas que o sujeito estabelece com o mundo. Para Morin (2002), o pensamento complexo não é um pensamento onisciente, mas uma aventura contraditória que exige a construção e a reconstrução dos fatos para chegar a uma autoorganização recursiva. Tal organização permite compreender a realidade e a sua interdependência, ou seja, a realidade recíproca entre as noções de sociedade e indivíduo. Finalizando esta breve descrição dos estudos de comunicação, constata-se a necessidade de estudar a comunicação de uma maneira global e multidisciplinar, revisando constantemente os conceitos e permitindo a integração com um mundo cada vez mais complexo, onde a comunicação tem papel essencial. Acredita-se que esta abordagem inicial da comunicação como objeto de estudo permite a melhor compreensão da comunicação no âmbito organizacional, onde esta possui papel fundamental e estratégico. 1.2 COMUNICAÇÃO NO ESPAÇO ORGANIZACIONAL No Brasil, a terminologia “comunicação organizacional” é usada indistintamente dos termos “comunicação empresarial” e “comunicação corporativa”, para designar todo o esforço 25 de comunicação realizado pelas organizações em geral. Contudo, defende-se o uso da terminologia “comunicação organizacional”, apoiando-se na visão de Kunsch (2003), para quem este termo abrange toda a gama das ações organizacionais e apresenta maior amplitude, aplicando-se a qualquer tipo de organização – pública, privada, sem fins lucrativos, ONGs (organizações não-governamentais) –, associações etc. No que tange às organizações, a comunicação atua como mecanismo de adaptação crucial para seus membros e para sua própria sobrevivência (KREPS, 1995). Nesse sentido, está relacionada primeiramente como uma atividade simbólica, um mecanismo de adaptação para a humanidade, uma ferramenta para ajudar as pessoas a reconhecer e responder às ameaças à sua existência. Num segundo momento, Kreps (1995) afirma que a comunicação é um processo de recolhimento, envio e interpretação de mensagens. Este processo permite às pessoas compreender suas experiências, gerar e compartilhar informações e ferramentas de pensamento e direção para cooperar e organizar-se. Dentro das organizações, este processo de comunicação é utilizado para facilitar o desempenho de suas atividades. O autor afirma ainda, que as organizações só estão organizadas porque seus membros trabalham para esse fim e estão continuamente comprometidos com um processo de organização e de reorganização. A comunicação insere-se neste contexto como o elo norteador da interação da organização com seus diversos públicos, na medida em que o relacionamento entre as pessoas é considerado fator primordial na vida organizacional. Esta visão é compartilhada por Kunsch (2003), que considera a comunicação como ponto crucial da sobrevivência das organizações, sendo o único meio para conhecer o consumidor e se relacionar com ele. Para a autora, o grande valor de uma organização e seu produto ou serviço é a diferença e a credibilidade gravada na mente do consumidor. 26 Contudo, é pertinente ressaltar que os departamentos das organizações não dependem apenas da comunicação para que possam alcançar as suas metas, mas também de modernas tecnologias de armazenamento e recuperação de informação, como sistemas de informação e arquivos (KREPS, 1995). O autor afirma que, tanto os sistemas de informação, quanto os diversos departamentos das empresas, utilizam a comunicação para coletar, interpretar, avaliar e aproveitar a informação relevante para a organização. A informação é um resultado da comunicação e da criação de significados que serve às pessoas para compreender e prever o mundo à sua volta. Nesse sentido, o referido autor destaca que os membros de cada setor necessitam compartilhar informações relevantes entre si para que todos os setores da organização trabalhem conjuntamente. Na vida da organização, a informação é fundamental e necessária, pois os indivíduos que possuem conhecimento podem responder apropriadamente às diversas tarefas, problemas e ações da organização. A informação ajuda a dirigir o comportamento nas organizações ao indicar a maneira mais frutífera de interpretar e cumprir essas atividades. A carência desta pode conduzir a organização a resultados desastrosos. Para Kreps (1995), uma compreensão clara das funções de adaptação da comunicação para os indivíduos e as organizações serve para reforçar e acentuar a centralidade da comunicação e da informação ao organizar atividades. O autor destaca ainda, que existem canais internos e externos, dois sistemas primários de comunicação nas organizações que desempenham funções importantes e inter-relacionadas no processo de organizar. Já Goldhaber (1991) analisa a comunicação a partir de definições de diversos autores conforme o quadro a seguir: 27 Autor Concepção de Comunicação Organizacional Redding e Somtom Ato de enviar e receber informação dentro de uma organização complexa. (1964) Zelco e Dance (1965) Interdependente entre as comunicações internas (ascendentes, descendentes e horizontais) e as comunicações externas (relações públicas, vendas e publicidade). Katz e Kahn (1966) Fluxo de informação (o intercâmbio de informação e a transmissão de mensagens com sentido) dentro da organização. Thayer (1968) Fluxo de dados que serve aos processos de comunicação e intercomunicação da organização. Bormann e outros “Comunicação oral” como oposta à comunicação escrita. (1969) Huseman e outros Fator da estrutura organizacional, presente na motivação e nas habilidades (1969) comunicativas como falar, escutar, escrever, entrevistar e discutir. Lesikar (1972) Interdependente entre as comunicações internas (ascendentes, descendentes e horizontais), externas (relações públicas, vendas e publicidade) e pessoais (intercâmbio informal de informação e sentimentos entre os indivíduos que formam a organização). Quadro 1 - Concepção de comunicação organizacional. Fonte: Elaborado a partir da obra de Goldhaber (1991, p.15-31). Ao analisar o quadro, cabe destacar os elementos consensuais entre os autores. O primeiro, é que a comunicação ocorre em um sistema complexo e aberto que é influenciado e influencia o meio ambiente. Segundo, que implica mensagens, seu fluxo, propósito, direção e o meio empregado por elas, e terceiro, que envolve pessoas, suas atitudes, seus sentimentos, suas relações e habilidades. A partir das idéias expostas, Goldhaber (1991) conclui que a comunicação organizacional é o fluxo de mensagens dentro de uma rede de relações interdependentes. Torquato (1986), por sua vez, destaca que, para se atingir um nível de expectativa desejado para as ações de comunicação, é preciso também escolher os canais adequados, a fim de gerar empatia, pois as comunicações altamente empáticas são comunicações eficazes. A eficiência comunicativa deve ser vista como a potencialidade do emissor de afetar outros, de modo a fazê-los seguir suas intenções e também o potencial do emissor para ser afetado pelos outros. Simplificando, o desenvolvimento das aptidões de alguém para receber comunicação é tão importante como o desenvolvimento das aptidões de alguém para comunicar. 28 Considera-se importante destacar a diferenciação que Torquato (1986) faz dos termos eficácia e eficiência no campo da comunicação. Comunicação eficaz não é apenas o ato em que o emissor e receptor se envolvem numa mensagem, com resultados claros e consensuais para ambos. Apesar de o emissor ter claramente em vista o objetivo de sua mensagem, com a qual concorda o receptor, ambos podem se comportar de maneira diferente. Portanto, a eficácia do desempenho comunicativo não é o mesmo que a eficiência do encontro comunicativo. Duas pessoas podem ser eficientes, mas os resultados de um encontro de comunicação podem ser desastrosos. A informação a ser transmitida, o desempenho do emissor e suas habilidades integram o processo de comunicação, mas também fazem parte desse processo a situação, a mensagem que o receptor interpreta, suas habilidades de captação, etc. O autor deixa claro que não se pode analisar eficácia isolando-se qualquer um desses elementos. Assim, acredita-se que a eficácia da comunicação só é atingida quando todos esses fatores que integram o processo de comunicação são analisados e considerados favoráveis para que o receptor receba exatamente a mensagem que o emissor intencionalmente transmitiu. Torquato (2002) destaca ainda, que a comunicação organizacional não deve ser percebida somente como comunicação social. Para o autor, a comunicação assume quatro modalidades distintas dentro da organização. A primeira é a comunicação cultural, onde se inserem os costumes, as personalidades e perfis das pessoas, é o clima interno da organização. A segunda dimensão é a comunicação administrativa que engloba os memorandos, correspondências internas e outros materiais impressos, que muitas vezes acabam não sendo lidos. A terceira forma de comunicação é a comunicação social, a mais conhecida, que envolve o jornalismo, relações públicas, publicidade, editoração e marketing. Existe ainda a 29 quarta e última forma, que é a comunicação cibernética, onde estão reunidos os sistemas de informação e bancos de dados. Para o autor: “a comunicação organizacional é a possibilidade sistêmica, integrada, que reúne essas quatro grandes modalidades, cada uma exercendo uma função específica” (TORQUATO, 2002, p.35). Nesse sentido, insere-se a visão de Kunsch (2003) e de Bueno (2005), de que a comunicação organizacional necessita ser abordada a partir da concepção de comunicação integrada. Esta, para Kunsch, envolve a comunicação institucional, a comunicação mercadológica, a comunicação interna, e a comunicação administrativa. Bueno, por sua vez, prioriza as duas instâncias da comunicação que são trabalhadas neste estudo, a comunicação institucional e a comunicação mercadológica. As abordagens destes autores serão discutidas no decorrer deste capítulo. Por fim, conforme Baldissera (2000), acredita-se que a comunicação é utilizada para reforçar e preservar a identidade organizacional, e ser a força que impulsiona para as transformações desejadas, uma vez que a comunicação organizacional compreende todo o fluxo de mensagens que compõem a rede de relações da organização. Assim, considerou-se pertinente uma leitura das teorias organizacionais para melhor compreensão desta visão. 1.2.1 Um olhar sobre as teorias organizacionais A teoria das organizações, segundo Motta (2001), é fruto de uma transformação na teoria da administração, a partir da evolução da Sociologia, da Ciência Política e da Psicologia Social norte-americanas, e que rapidamente foi divulgada em diversos países capitalistas, inclusive no Brasil. 30 Na transição da teoria da administração para a teoria das organizações, a preocupação com a produtividade dá lugar à preocupação com a eficiência do sistema. Nesta teoria, a organização é entendida como uma rede de tomada de decisões, onde a racionalidade tem papel limitado. Esta linha teórica ficou conhecida como behaviorismo, onde o processo decisório tem papel central. Seguindo a evolução da teoria organizacional, Motta (2001) discorre sobre as diversas influências neste campo, das quais destacam-se, entre outras, o funcionalismo, o estruturalismo, a teoria dos sistemas abertos e a teoria da contingência1. Não se pretende aqui desenvolver ou defender essas abordagens, bastante densas, mas apenas citálas como marcos importantes da evolução das teorias da organização. Uma outra abordagem é feita por Marsden e Townley (2001), que afirmam que a organização foi inicialmente definida como um sistema formal orientado para realização de um objetivo. Porém, os autores alertam que esta abordagem não foi suficiente para atender às necessidades psicológicas dos trabalhadores. Nesse sentido, afirmam que não há uma só prática organizacional, nem tampouco uma só teoria. Destaca-se a análise que os referidos autores fazem das chamadas teoria organizacional normal e teoria organizacional contranormal. A teoria organizacional normal está ligada ao modelo econômico e político capitalista norte-americano e é acusada pela teoria contra-normal de ser a teoria dos gestores em detrimento dos geridos. A grande questão que a teoria organizacional contra-normal critica é a postura da teoria normal em pregar a administração sem considerar as pessoas, sem dar a elas a devida importância, alienando-as em um processo de controle e dificultando que reconheçam a natureza do poder que influi sobre elas. 1 Sobre a origem destas influências na teoria das organizações consultar Talcott Parsons, The Social System (Nova Iorque, The Free Press, 1964); Amitai Etzioni, Organizações Complexas (São Paulo: Atlas, 1973); Ludwig von Bertalanffy, Teoria Geral dos Sistemas (Petrópolis, Vozes, 1973); Tom Burns e G. M. Stalker, The Management of Innovation (Londres, Tavistock Publications, 1968). 31 Contudo, os referidos autores alertam que a teoria contra-normal também apresenta falhas devido à sua incapacidade, até o momento, de produzir uma alternativa à teoria normal, que, segundo os autores continua atuando até hoje. Embora divergentes em muitos aspectos, as teorias organizacionais mantêm em comum o interesse em diagnosticar as causas da ineficiência e identificar possíveis soluções. Nesse sentido, concorda-se com a afirmação de Bronzo e Garcia (2000), de que existe a necessidade de se estabelecer uma nova visão sobre as teorias organizacionais que seria construída a partir da abrangência da análise administrativa, incluindo enfoques de economia, política e sociologia. Acredita-se que também possa ser inserido nesse processo o enfoque da comunicação. Esta nova visão da administração, que para Chanlat (2000) seria baseada também na antropologia, semiologia, psicanálise e ciências da linguagem, parece ser mais apropriada, em função dos argumentos defendidos pelos autores aqui citados. Ficou claro que a teoria organizacional normal, apesar de ser a mais utilizada atualmente, não é a palavra final e necessita de uma alternativa que a teoria organizacional contra-normal não conseguiu criar. Chanlat (2000) aponta ainda que em numerosas instituições de formação em management ocorre a redução da presença das ciências sociais em proveito de disciplinas mais técnicas ou menos perturbadoras. Essa mesma insatisfação foi sentida durante o transcorrer desta pesquisa. Constatou-se que há uma tendência das obras de administração e marketing enfatizarem apenas algumas ferramentas de comunicação, e não explorarem a importância e o poder que ela exerce sobre toda a estrutura organizacional. Esta tendência está explícita na afirmação de Kotler (2002), de que é na promoção – um dos chamados “4Ps” do marketing – que são desenvolvidos os programas de comunicação. Contudo, entende-se que a comunicação organizacional não se restringe a um instrumento de venda, e, por isso, acredita-se que, esta nova visão do campo da administração 32 defendida por Chanlat (2000) precisa incluir também uma abordagem mais ampla da comunicação. Enriquez (2000), por sua vez, ressalta a importância que está começando a ser atribuída pelas organizações à afetividade humana. O autor retoma as principais etapas do desenvolvimento do aspecto emocional nos estudos organizacionais, partindo da visão reducionista do taylorismo sobre o psiquismo humano. Enriquez afirma que Taylor considerava os indivíduos preguiçosos e egoístas, e que para garantir o bom funcionamento da organização eles tornavam-se inclusive meros executores sem alma. O autor ressalta que esta visão é abordada de forma mais sutil por Weber2, que reconhece o direito dos indivíduos de se deixarem levar pelas paixões, mas somente na vida privada, sendo permitido na vida pública apenas manifestações puramente racionais. Motta (2001) cita Fayol que também desenvolve estudos voltados à racionalização da estrutura administrativa e complementa o trabalho desenvolvido por Taylor ao criar a classificação lógico-dedutiva das funções do administrador: planejar, organizar, coordenar, comandar e controlar. As reações a essas análises foram elaboradas pelo psicólogo industrial George Elton Mayo, que ressaltou a importância dos fatores afetivos nas organizações e inspirou a criação da corrente administrativa chamada de Relações Humanas (MOTTA, 2001). A Escola de Relações Humanas sucedeu à Administração Científica e deslocou a atenção da organização formal para a informal, estimulando uma “psicologização” das relações de trabalho. Esta influência da Escola de Relações Humanas inaugurou a preocupação psicossocial no campo da teoria das organizações. Já para Moscovici (2002), os valores atuantes na organização moldam atitudes e comportamentos, norteiam e condicionam as relações interpessoais internas e externas. A 2 Enriquez faz referência à obra de Max Weber, L’étique protestante et l’esprit du capitalism. Paris, Plon,s.d. 33 autora enfatiza também a importância da cultura organizacional, ao afirmar que esta constitui um dos mais fortes condicionadores do desempenho profissional. Entretanto, a autora alerta que, apesar de muitas organizações afirmarem dispor de valores humanísticos na sua cultura, – o que hoje, pode ser visto com uma atitude moderna e avançada – estes aparecem mais no discurso do que nas práticas organizacionais. Segundo a autora, as emoções e sentimentos ainda são ignorados ou menosprezados como se fossem variáveis menos importantes e menos decisivas na dinâmica da organização. A empresa que dispõe de uma administração “saudável” reconhece, acolhe e permite a expressão das emoções, procurando aproveitar essa energia de forma positiva. A idéia de enpowerment3 expressa essa tendência no sentido de que as pessoas precisam ser potencializadas, descobrir seu potencial e aprender a usá-lo e expandi-lo de forma construtiva. A comunicação organizacional atuaria, então, como agente minimizador da hierarquia e da distância entre os departamentos, contribuindo para a atribuição de responsabilidades e poder a todos que interagem com os clientes internos e externos. Destaca-se, deste breve recorte sobre as teorias apresentadas, que a criação desta nova abordagem organizacional abrangendo áreas externas à administração pode vir a preencher a lacuna deixada pelas teorias anteriores, desde que pretenda ampliar a importância da afetividade e evidenciar a necessidade da combinação das várias ciências que estudam as relações humanas. A citação de Enriquez (2000, p.16), “Se a paixão age sozinha, termina em paranóia. Da mesma forma, se a razão não é temperada pela paixão, termina em perversão”, demonstra claramente o equilíbrio que se considera necessário para que uma organização se legitime e se mantenha como tal. Atuando no alcance e conservação desse equilíbrio organizacional, insere-se a comunicação integrada, tópico que será desenvolvido a seguir. 3 Para a autora, enpowerment é o resgate da essência humana. Ao tornar-se humana, a pessoa se torna poderosa. 34 1.3 AFINAL, O QUE É COMUNICAÇÃO INTEGRADA? Administrar estrategicamente a comunicação nas organizações com os diferentes públicos (empregados, consumidores, imprensa, poderes públicos, acionistas, fornecedores), requer uma consulta a especialistas no assunto, que podem ser profissionais de comunicação que atuam internamente, ou de empresas e agências de comunicação, que prestam serviços externos. Também é possível considerar as duas fontes juntas. Para Kunsch (2003), somente a partir das decisões tomadas pela organização após ouvir esses profissionais, é que deverá ser pensada a elaboração de um plano estratégico de comunicação. Kunsch (2003) alerta ainda que conceber projetos, programas e planos isolados de comunicação institucional sem uma vinculação com a comunicação mercadológica, a comunicação interna e todo o conjunto político, econômico e social de uma organização, é atuar de maneira fragmentada que resultará em resultados duvidosos. Para a autora, a realização dessa tarefa só é possível através de um projeto global, com políticas definidas e com um planejamento alinhado às diretrizes e ações delineadas por todos os setores da organização, através da comunicação integrada. Essa comunicação envolve a comunicação institucional, a comunicação mercadológica, a comunicação interna e a comunicação administrativa, que atuam de maneira conjunta. Kunsch destaca que essa visão já era vislumbrada em 1984: Não acreditamos que haja, na área de comunicação, um profissional ecumênico. Acreditamos na comunicação integrada, ou seja, na atuação conjugada de todos os profissionais da área. Não há conflitos entre as diversas atividades: há somatória em benefício do cliente. (ABERP 1984, p.12 apud KUNSCH 2003, p. 151). 35 É importante ressaltar aqui a afirmação de Torquato (2001), que faz outra abordagem. Para o autor, a comunicação organizacional4 é composta por quatro grandes modalidades: a comunicação cultural, a comunicação social, a comunicação administrativa e a comunicação cibernética, conforme já destacado anteriormente. Neste sentido, a comunicação social seria o subcampo escolhido para ser estudado neste trabalho, sob o viés da comunicação institucional e mercadológica. Entende-se a comunicação organizacional como um dos sub campos da comunicação, fazendo parte deles a comunicação institucional e a comunicação mercadológica. Esta visão está baseada na perspectiva de Bueno (2005) de que a comunicação empresarial é composta pela comunicação institucional e a comunicação mercadológica, que devem agir de maneira integrada. Para o autor, a comunicação institucional e mercadológica, quando autênticas, não entram em conflito, mas se alinham para construir um trabalho ético, comprometido com o interesse público, gerando lucros para as organizações. Neste sentido, considera-se relevante desenvolver os tópicos da comunicação institucional e mercadológica para melhor compreender a importância da sua atuação conjunta e efetiva relação. 1.3.1 Comunicação institucional X comunicação de marketing: Torquato (1986) afirma que é importante considerar a comunicação como uma ação integrada de meios, formas, recursos, canais e intenções, pensada de maneira estratégica para impulsionar e assessorar a administração na conquista de melhores resultados, tornando-a assim um investimento que trará resultados. Assim, apesar de afirmar que os programas de 4 O autor entende comunicação organizacional e comunicação empresarial como sinônimos. 36 comunicação institucional e mercadológica têm diferenças em suas abordagens, o autor defende sua atuação conjunta: O programa de comunicação institucional distingue-se, portanto, do programa de comunicação mercadológica, apesar de poder-se estabelecer entre eles afetiva relação, na medida em que um bom conceito é vital para a organização, integrandose na estratégia global dos negócios e promovendo e respaldando a sinergia comercial. (TORQUATO 1985 p. 183-4 apud KUNSCH 2003 p. 165) Para Rabaça (2001 p. 176) o termo comunicação institucional é definido como um “conjunto de procedimentos destinados a difundir informações de interesse público sobre as políticas, práticas e objetivos de uma instituição, interna e externamente, de modo a tornar compreensíveis e aceitáveis essas proposições”. Segundo Kunsch (2003), a comunicação institucional está intrinsecamente ligada aos aspectos organizacionais que explicitam o lado público das organizações, constrói uma personalidade legítima e tem como proposta básica a influência político-social na sociedade onde está inserida. A autora cita três definições de comunicação institucional de diferentes autores, conforme quadro a seguir: Autor Torquato (1985) Weil (1992) Fonseca (1999) Concepção de Comunicação Institucional Ação que objetiva conquistar simpatia, credibilidade e confiança, realizando, com meta finalista, a influência político-social; utilizando, para tanto, estratégias de relações públicas, tanto no campo empresarial como no governamental, de imprensa, publicidade, até as técnicas e práticas do lobby. Anunciar a política, traduzir a missão, cumprir seus objetivos como sujeito pensante e dirigente de sua produção, ir além do registro puramente comercial. Conjunto de procedimentos destinados a difundir informações de interesse público sobre as filosofias, as políticas, as práticas e os objetivos das organizações, de modo a tornar compreensíveis essas propostas. Quadro 2 - Concepção de comunicação institucional Fonte: Kunsch 2003, p. 164-165 Segundo as percepções dos autores citados no quadro, Kunsch (2003) assegura que a comunicação institucional é complexa e necessita de estratégias e políticas bem definidas de comunicação que precisam ser pensadas de maneira integrada, pois realizar a comunicação institucional de maneira satisfatória implica conhecer a organização e saber compartilhar seus atributos – missão, visão, valores, filosofia e políticas organizacionais. 37 Conforme Kunsch (2003), a comunicação institucional é composta por instrumentos que concorrem para legitimar a organização perante seus públicos, a opinião pública e a sociedade em geral. Esses instrumentos são: as relações públicas, às quais cabe delinear e gerenciar essa comunicação, o jornalismo empresarial, a assessoria de imprensa, a publicidade/propaganda institucional, a imagem e a identidade corporativa, o marketing social, o marketing cultural e a editoração multimídia. A autora afirma ainda, que a comunicação institucional visa agregar valor ao negócio das organizações e contribuir para criar um diferencial no imaginário dos públicos. Neste sentido, não pode ser concebida isolada da comunicação mercadológica, interna e administrativa, pois, apesar de serem áreas específicas, atuam conjuntamente para uma só organização, que necessita manter uma comunicação cada vez mais precisa para alcançar a aceitação e adesão dos públicos. Já a comunicação de marketing é utilizada para tentar aumentar vendas e lucros (CHURCHILL E PETER, 2000). Os referidos autores ressaltam que os profissionais de marketing desejam que os receptores respondam suas mensagens através da compra dos produtos ou marcas oferecidos. Na comunicação de marketing, a criação das mensagens destinadas ao público-alvo da organização visa estimular atenção, interesse, desejo e ação, sendo esta última etapa, a efetivação da compra. Churchill e Peter (2000) complementam o tema, afirmando que a comunicação de marketing informa, persuade e lembra os consumidores; comunica vantagens e a relação custo-benefício dos produtos desejados pelos consumidores. Os autores asseguram ainda que, antes que os consumidores ou compradores organizacionais possam adquirir um produto qualquer, precisam saber o que é o produto, como ele proporciona valor, e onde é encontrado, sendo tarefa da promoção – um dos “4Ps” do marketing - fornecer essas informações. 38 Considera-se importante destacar a divergência sobre a concepção de comunicação para os autores de marketing, e para os autores de comunicação. Enquanto a maioria dos autores de marketing reduz a comunicação a um dos chamados “4Ps” do composto de marketing – a promoção –, os autores de comunicação aqui citados entendem a comunicação como um fenômeno social, interdisciplinar, quase exaustivamente presente na sociedade contemporânea. E, no que diz ao respeito ao marketing, deve ser encarada como todos os meios de exposição e interação da organização com os diversos públicos (consumidores, funcionários, imprensa, poderes públicos, acionistas, fornecedores). Para Churchill e Peter, por exemplo, a comunicação faz parte do composto de marketing – combinação de ferramentas estratégicas usadas para criar valor para os clientes e alcançar os objetivos da empresa –, e é chamada também de promoção. Dentro do composto de marketing existem quatro elementos primários: produto, preço, ponto de venda e promoção, que também são chamados de “quatro Ps”. (2000 p.20): “o elemento promoção, ou comunicação, refere-se a como os profissionais de marketing informam, convencem e lembram os clientes sobre produtos e serviços”. Kotler (2001) também identifica a comunicação de marketing como sinônimo de promoção. Segundo este autor, a comunicação de marketing – ou promoção – é projetada para ser persuasiva, para conseguir um efeito calculado nas atitudes e no comportamento do público-alvo. É todo o esforço de comunicação empreendido pela empresa para informar a existência do produto e promover as vendas. O autor afirma ainda, que há uma nova concepção da comunicação, isto é, um diálogo interativo entre a empresa e seus clientes que ocorre durante os estágios de pré-vendas, vendas, consumo, e pós-consumo. As empresas precisam se perguntar não apenas “Como chegaremos aos nossos clientes?”, mas também “Como nossos consumidores chegarão até nós?”. O autor sugere que, para promover uma 39 comunicação eficiente5, os profissionais de marketing precisam compreender os principais elementos que compõem essa comunicação. Neste ponto, pode-se inserir a abordagem de Torquato (1986), que afirma que, para avaliar se a comunicação foi eficaz é necessário levar em consideração os seguintes fatores: a mensagem, o desempenho do emissor, suas habilidades, a situação, o receptor, a interpretação do receptor, suas habilidades de captação, relevância, credibilidade, adequação, entendimento e sincronia. O autor afirma que o objetivo final dos profissionais que lidam com comunicação nas empresas é produzir aceitação, gerar consentimento, através do desenvolvimento de uma comunicação eficaz. Para Kotler (2001), o comunicador de marketing necessita realizar oito etapas para desenvolver esta comunicação eficaz: identificar o público-alvo, determinar os objetivos de comunicação, elaborar a mensagem, selecionar os canais de comunicação, estabelecer o orçamento total de comunicação, decidir sobre o mix de comunicação, medir os resultados de comunicação e gerenciar o processo de comunicação integrada de marketing. Esta última surge da necessidade de coordenar a ampla gama de ferramentas de comunicação, mensagens e públicos. Segundo Kotler: comunicação integrada de marketing é deixar de depender quase que exclusivamente de uma só ferramenta de comunicação como a publicidade ou a força de vendas, e passar a combinar várias ferramentas para proporcionar uma imagem de marca consistente aos clientes a cada contato que eles tiverem com a marca (2001, p. 50). Torquato (2002) cita a comunicação integrada de marketing (CIM), afirmando que ela consiste na união de esforços para se comunicar de modo eficaz. Através dessa integração e coordenação de todos os canais de comunicação – propaganda, venda pessoal, promoção de 5 Diferentemente de Torquato (1986), percebe-se que Kotler (2001) não diferencia comunicação eficiente e comunicação eficaz, citando os dois termos como sinônimos. 40 vendas, relações públicas e marketing direto –, torna-se possível a veiculação de uma mensagem clara, coerente e convincente sobre a organização e seus produtos. Kunsch (1997), por sua vez, também defende esta terminologia – Comunicação Integrada de Marketing – onde a comunicação assume fundamental importância, envolvendo propaganda, promoção de vendas, feiras, exposições, demonstração de produtos, venda pessoal, merchandising, etc. Para a autora esse termo inova ao propor uma teoria que substitui os tão consagrados “4 Ps” do marketing, pelos “4 Cs” do marketing: cliente, custo possível, conveniência e comunicação. Apesar de parecer modismo, o termo tem a preocupação de demonstrar que existe uma nova maneira de olhar o todo, usando adequadamente o mix da comunicação, conhecendo melhor o público, sem se limitar à mídia de massa. Kunsch (2003) conclui afirmando que, assim como a comunicação institucional precisa ser gerenciada pela área de relações públicas, utilizando-se de todas as articulações necessárias com as outras subáreas afins para construir a imagem organizacional na mente do consumidor, a comunicação mercadológica fica a cargo do marketing, que coordena as ações persuasivas que objetivam conquistar o consumidor. Enfim, no decorrer destes processos, a organização necessita definir a utilização de todo o mix ou composto de comunicação, a partir da comunicação integrada, buscando sempre estabelecer relações de confiança com seus públicos. Concorda-se com Bueno (2005), quando acusa os profissionais de comunicação empresarial de serem preconceituosos com as atividades de comunicação mercadológica, buscando rejeitá-las em prol da comunicação institucional, como se fosse possível e razoável separá-las. O autor considera impossível para uma organização distinguir a sua imagem da qualidade e do prestígio de seus produtos ou marcas, assim como uma empresa não pode desvincular os produtos que fabrica de sua ação social e, é por isso que se acredita que a 41 comunicação integrada é tão importante para garantir a atuação conjunta da comunicação mercadológica e institucional. 42 2 A COMUNICAÇÃO INTEGRADA E A IMAGEM ORGANIZACIONAL A comunicação integrada, conforme a perspectiva defendida neste estudo, significa a articulação da comunicação organizacional com o processo de gestão, de planejamento e de marketing, de acordo com objetivos comuns. Dentro dessa comunicação, a imagem organizacional é tida como a integração, na mente do público, de todas as manifestações emitidas pela instituição no relacionamento com esse mesmo público (VILLAFAÑE, 1999). É possível, portanto, inferir que a imagem organizacional pode e precisa ser construída através da comunicação integrada. Contudo, faz-se uma ressalva importante: a comunicação não é a única responsável pela construção dessa imagem. Muitos episódios interferem na construção da imagem de uma organização, por esta ser construída através da integração de todas as manifestações emitidas e suas relações com o público. Acredita-se que, se a comunicação está bem articulada em toda a estrutura organizacional, tais episódios tendem a manifestar uma imagem positiva, de acordo com o que a empresa cultiva e quer divulgar. Porém, a complexidade inerente ao processo de comunicação evidencia a impossibilidade de se prever tais resultados. Ainda assim, a imagem, no âmbito organizacional precisa ser gerida, tarefa que cabe à comunicação institucional, inserida na perspectiva da comunicação integrada. Segundo Kunsch (2003), a imagem corporativa é formada pela dimensão coletiva das percepções que cada pessoa cria, como um conceito intangível e abstrato, uma visão subjetiva da realidade. Por ter essa natureza intangível, admite que conhecer e administrar a imagem das organizações é uma tarefa complexa, um verdadeiro desafio a ser gerido pela área de relações públicas, através da comunicação institucional. 43 Já Bueno (2005) admite que a imagem de uma organização está definitivamente atrelada a tudo que se relaciona a ela, pois, no mundo globalizado, onde as empresas estão focadas no cliente, não é possível imaginar ações que sejam apenas institucionais ou mercadológicas, pois tudo se soma para construir a imagem. Toda a ação mercadológica positiva reforça a imagem da organização como toda a ação social efetiva, qualifica seus produtos. Neste sentido, entende-se que o papel da comunicação integrada na construção da imagem organizacional inclui, ainda, os conceitos de imagem e identidade. 2.1 CONSTRUÇÃO DA IMAGEM ORGANIZACIONAL NA PERSPECTIVA DA COMUNICAÇÃO INTEGRADA Segundo Costa (2003), a imagem é o principal ativo da empresa6, apesar de ser o menos conhecido. O autor coloca a comunicação e a imagem lado a lado, ao afirmar que, assim como nada exclui uma empresa dos problemas e oportunidades de comunicação (nem mesmo o setor de negócios ou de atividade, o tempo de existência ou o tamanho da empresa), da mesma forma, toda empresa irradia uma determinada imagem em seus públicos. É preciso compreender que ambas – a comunicação e a imagem – são comuns a todas as empresas. A imagem corporativa é um instrumento estratégico importantíssimo que tem um valor diferenciador e duradouro que se acumula na memória social. Portanto, não é aconselhável que a imagem organizacional seja encarada como um conceito abstrato, algo inevitável e secundário, nem tampouco como um modismo. Na mente do público, a imagem empresarial produz diversos efeitos: percepções, induções e deduções, projeções, experiências, sensações, emoções e vivências. Costa (2003) afirma ainda, que as estratégias 6 Para Costa (2003), empresa é o termo amplo que engloba instituições, fundações, indústrias, entidades comerciais e de serviços, organizações sem fins lucrativos, administração pública, governos e ONGs. O autor usa o termo empresa indistintamente do termo corporação. 44 de comunicação, integradas pelo vetor da imagem, servem tanto aos objetivos pontuais, de curto prazo, quanto aos objetivos globais, de longo prazo, gerando uma certa sinergia positiva ao alcançar ao mesmo tempo tais objetivos. Para o autor, no que diz respeito às organizações, a imagem seria a “a representação mental, no imaginário coletivo, de um conjunto de atributos e valores que funcionam como um estereótipo e determinam as condutas e opiniões desta coletividade” (COSTA, 2003, p. 53). Contudo, acredita-se que existe confusão causada pela polissemia do termo “imagem”, que muitas vezes é confundido com termos que também fazem parte do mundo corporativo, como a identidade organizacional. Para melhor esclarecer a definição destes termos, no âmbito das organizações, serão discutidos os conceitos de imagem, de identidade e de identificação. 2.1.1 Imagem, identidade e identificação. Villafañe (1999) faz uma abordagem esclarecedora da imagem organizacional, afirmando que esta é formada a partir de três tipos de imagem: a imagem funcional, a autoimagem e a imagem intencional. A imagem funcional seria aquela construída a partir do comportamento da empresa, ou seja, a qualidade dos produtos, os serviços prestados, suas políticas financeira, de produção, comercial, etc. A auto-imagem seria uma imagem interna, gerada a partir da cultura organizacional. Cabe destacar que este estudo não pretende se deter profundamente na cultura corporativa, que renderia assunto para uma outra abordagem, porém, é importante ressaltar sua influência 45 na formação da imagem corporativa. Segundo Villafañe (1999), as diversas manifestações da cultura corporativa projetam uma imagem interna, ou auto-imagem da organização, que será refletida na imagem corporativa. O autor destaca a existência de uma imagem intencional, que é construída a partir da personalidade corporativa, ou seja, dos atributos que a empresa pretende induzir voluntariamente na mente de seus públicos para alcançar uma imagem positiva. Esta personalidade é o posicionamento estratégico da organização. O autor elabora um esquema para resumir esta abordagem: EMPRESA Comportamento Imagem funcional Cultura Auto-imagem Personalidade Imagem intencional IMAGEM Figura 1 - Construção da imagem Fonte: Villafañe (1999 p. 32) A partir da figura, percebe-se que, para o autor, a imagem de uma empresa é construída pelo comportamento, pela cultura e pela personalidade da organização. É preciso, portanto, preocupar-se com estes conceitos, pois eles sustentam essa imagem, e dificilmente uma organização conseguirá projetar uma imagem positiva sem que exista realmente uma base que a respalde. Na visão do autor a comunicação não deve ser considerada como única responsável pela gestão da imagem da organização, pois uma comunicação excelente e bem planejada pode perder seu valor se a empresa atender mal seus clientes, ou se envolver em escândalos financeiros freqüentes, por exemplo. 46 Torna-se importante destacar o próprio conceito de identidade, que, para Hall (2001), é demasiado complexo e pouco desenvolvido nas ciências sociais, dificultando a análise das proposições teóricas existentes. Para o autor, as identidades representam vínculos, lugares, eventos, símbolos, e histórias particulares que remetem ao sentido de pertencimento, que estaria sendo questionado pela globalização. As identidades, então, passam por uma transformação gerada pela tensão entre o local e o global, pois a globalização, na medida que produziu novas identidades, também contribuiu para o fortalecendo de identidades “fechadas”. Esse efeito contraditório se refletiu no comportamento das pessoas, pois enquanto muitas tentaram resgatar suas tradições, outras aceitaram a diversidade de misturas das novas identidades, como as que surgiram com as culturas híbridas7. No que tange às organizações, Múnera e Sanchez (2003) entendem a identidade como a conjunção entre o ser e o fazer de um organismo, que o diferencia de outros organismos, singularizando-o ao mesmo tempo em que o distinguem dos demais. Para os autores, tanto o conceito de identidade quanto o de imagem, têm sido abordados de maneira superficial, limitados ao aspecto da aparência. Buscando demonstrar a dimensão desses conceitos, os autores fazem a seguinte relação: Identidade Identificação Imagem Retroalimentação Figura 2 - Processo da identidade e da imagem. Fonte: Múnera e Sanchez (2003) p. 396 No esquema apresentado, o processo de configuração da imagem é alimentado pela identificação. Esta, por sua vez, seria o ato de reconhecer a identidade de um sujeito ou objeto, isto é, o ato de registrar e memorizar de maneira inequívoca aquilo que o faz 7 Para Hall (2005), as culturas híbridas constituem um desses novos tipos de identidades produzidos pela globalização, onde não existe uma cultura pura, ou um absolutismo étnico e sim uma mistura de culturas com as quais essas pessoas se identificam. 47 intrinsecamente diferente dos demais e, ao mesmo tempo, idêntico a si mesmo. Para os autores, este processo demonstra que, para o público, a imagem que se tem da empresa é a sua verdadeira identidade. Costa (2003) também faz uma relação entre imagem e identidade, afirmando que a imagem é um valor global que transcende a todas as realizações, produções e comunicações da empresa, pois injeta identidade, personalidade e significados próprios nestas atividades. O autor conclui que a imagem organizacional, por não ser um objeto ou algo, e sim um conceito psicossociológico, somente pode ser gerida indiretamente pela empresa, por meio de suas ações e comunicações. Porém, o autor alerta que a imagem organizacional é tão poderosa quanto frágil, e aponta a comunicação mal utilizada como possível causa dessa vulnerabilidade da imagem organizacional. Pode-se resumir a relação entre imagem e identidade a partir da afirmação de Kunsch: “imagem é o que passa na mente dos públicos, no seu imaginário, enquanto identidade é o que a organização é, faz e diz” (KUNSCH, 2003, p. 170). Entende-se que a comunicação integrada busca ser uma aliada das organizações para que cada manifestação desta, mesmo que em linguagens diferentes, seja harmônica e coerente, criando uma legitimidade, e projetando na mente do público exatamente a imagem do que a organização é, busca e parece ser. Portanto, a separação entre a comunicação institucional e a mercadológica pode gerar danos na imagem da empresa, por trazer visões distintas e até contraditórias. Acredita-se, porém, que o objetivo final de uma organização que visa lucro, ao investir em uma campanha publicitária (mesmo que essa seja dita institucional e não venda diretamente nenhum produto ou serviço), é gerar lucros. Isso se justifica pela abordagem do capítulo anterior, onde se enfatizou que a comunicação institucional e mercadológica estão 48 integradas, ou seja, toda divulgação da marca vende seus produtos e serviços, e toda a divulgação de seus produtos e serviços vende sua marca, inevitavelmente. Dentro das divulgações da marca, estão as ações de responsabilidade social, que foram incluídas na pesquisa pelo grande apelo que a empresa estudada faz a este tema, considerando-se que é fator contribuinte na formação da imagem organizacional. 2.2 A RESPONSABILIDADE SOCIAL A SERVIÇO DA IMAGEM INSTITUCIONAL A responsabilidade social pode ser definida como “a preocupação com as conseqüências sociais dos atos de uma pessoa ou instituição na medida em que eles podem afetar os interesses de outros” (CHURCHILL E PETER, 2000, p. 40). Os autores afirmam que, em longo prazo, a responsabilidade social é interessante para a organização, pois, além de proporcionar uma imagem séria e respeitosa, é provável que os potenciais clientes venham a comprar de uma organização que demonstre ser e estar preocupada com o seu bem-estar e o de sua comunidade. Neste sentido, insere-se também o que os autores chamam de marketing relacionado a causas, projetado para promover uma causa ou problema específico. Este tipo de ação é bastante usada entre os profissionais de marketing, pois beneficia a todos: os produtos são promovidos, as vendas aumentam, os consumidores percebem o valor agregado, e a comunidade beneficia-se com as doações, estreitando a sua relação com a empresa. Assim, doações de caridade podem ser ligadas diretamente às vendas de produtos específicos. Além de interessar para a empresa, a responsabilidade social também é uma questão ética. Segundo os autores, “ética” são os princípios e valores morais que governam o modo como um indivíduo ou grupo conduz suas atividades. As questões éticas precisam de mais 49 atenção ainda quando uma organização atua globalmente, pois elas podem variar conforme a cultura local e podem prejudicar alguns stakeholders8 em detrimento de outros. Uma outra abordagem sobre o tema é proposta por Chanlat (2000). O autor afirma que, em gestão, a ética ficou muito tempo na sombra, e somente nos últimos vinte anos do século XX é que o questionamento ético surgiu como importante ponto de reflexão. Neste período, algumas práticas de gestão contestáveis – escândalos financeiros, casos de corrupção, publicidade enganosa, poluição ambiental, oferta de produtos perigosos e de serviços duvidosos, entre outros – coagiram as organizações a se interessarem pelas questões da equidade e da responsabilidade, ou seja, pela legitimidade da ação dos gestores (JACKALL e PASQUERO apud CHANLAT 2000). Nesse sentido, Morin (2005), apresenta a ética como um conceito em crise no mundo ocidental. O autor esclarece que os tempos modernos produziram deslocamentos e rupturas éticas na relação indivíduo/sociedade/espécie, gerando a desintegração social, o crescimento da corrupção de todos os tipos, dos atentados à civilidade e das ondas de violência. O desenvolvimento da sociedade contemporânea, individualista e egocêntrica, criou relações de interesse e lucro que desintegraram as formas tradicionais de solidariedade, e incitaram a busca por uma regeneração ética. Esta visão, embasada no pensamento complexo proposto pelo autor, busca religar os saberes, e de um modo abrangente, os seres humanos. O autor alerta para a necessidade do desenvolvimento do altruísmo dos seres humanos, buscando equilibrar o excesso de egocentrismo, e gerando princípios da ética, como a solidariedade e a responsabilidade. 8 Stakeholders: indivíduos e grupos que podem influenciar decisões de marketing e ser influenciados por elas (CHURCHILL e PETER, 2000: 13). 50 Bueno (2003) lembra que a relação entre as organizações e os públicos de interesse modificou-se profundamente com a criação de entidades independentes que atuam com competência para defender os interesses dos consumidores. Além disso, o autor afirma que a sociedade como um todo está mais disposta a se mobilizar para condenar ações consideradas antiéticas, como a agressão ao meio ambiente, a exploração do trabalho infantil e a busca obsessiva do lucro pelo lucro. Ou seja, as organizações são exigidas a praticar administrações transparentes e cidadãs. O autor afirma também, que as empresas que orientam suas ações com responsabilidade social recebem diversas referências positivas na mídia, e adquirem o respeito da comunidade e dos cidadãos, o que, no caso das organizações que visam lucro, pode se refletir em melhores vendas. Para Bueno (2003), a responsabilidade precisa adquirir status de filosofia organizacional, extrapolando aspectos meramente comerciais e deixando de ser apenas uma simples prática. O autor destaca que a atuação socialmente responsável pode e precisa ser planejada em perfeita sintonia com os objetivos comerciais, pois, como uma organização social, toda a empresa pode obter lucro de maneira sadia e pró-ativa, interagindo com a comunidade. Nesta perspectiva, insere-se uma visão mais abrangente do lucro, onde este não seria só baseado em resultados financeiros, mas também em resultados sociais e institucionais. No lucro social estão os benefícios que a organização gera para a comunidade, e no lucro institucional, a geração de uma imagem positiva. Porém é preciso analisar com cuidado as ações de responsabilidade social, pois, segundo Bueno (2005), muitas organizações fazem apologia de suas parcerias com entidades 51 do Terceiro Setor9 apenas para se apoiar em seus trabalhos sociais e aparecer junto à opinião pública como empresas solidárias. Confundem responsabilidade social com marketing, empreendendo ações oportunistas para conseguir vantagens. Neste sentido, Bueno (2003, p. 118) afirma que “a comunicação empresarial é crucial em todo o processo de gestão focado na responsabilidade social”. Para o autor, a comunicação, quando empregada com competência, ética e transparência, demonstra o compromisso da organização com a sociedade e com os stakeholders, agrega valor ao seu produto ou serviço, e é decisiva para a formação de uma imagem positiva. Entende-se, portanto, que somente a partir da adoção de atitudes socialmente responsáveis é que a organização pode garantir uma avaliação satisfatória de sua imagem perante o público. A comunicação, inserida e permeando completamente esse processo, poderá auxiliar a manter uma longa e promissora existência das organizações. Enfim, este esforço de integrar o econômico e o social requer dedicação e espaço à comunicação, empregada de maneira integrada em toda a estrutura organizacional. A construção de um referencial teórico que contemplasse aspectos da comunicação, das organizações e da imagem organizacional, conceitos abordados até este ponto, fez-se necessária para permitir uma melhor compreensão do discurso da organização eleita para o estudo, tema que será abordado a seguir a partir da visão de Morin (2003). 9 Entende-se o Terceiro Setor como as organizações sem fins lucrativos e não governamentais, que tem como objetivo gerar serviços de caráter público. 52 3 O DISCURSO ORGANIZACIONAL Encontrou-se no Paradigma da Complexidade, proposto por Morin (2003), o respaldo para analisar o corpus da maneira abrangente que a técnica de Charaudeau exige. O Paradigma da Complexidade sugere uma mudança de olhar sobre todas as esferas, demonstrando que a complexidade é onipresente. É nesta perspectiva que se discute o discurso organizacional, permeado pela circularidade que permite que se dimensione os fatos sempre dentro de um contexto, a partir de diversas interações. 3.1 O PARADIGMA DA COMPLEXIDADE Para Morin, um paradigma torna-se necessário para embasar e orientar o desenvolvimento do conhecimento, considerando-se aí conceitos fundamentais e norteadores que não estão isentos das relações de atração e repulsão. Ao mesmo tempo em que um paradigma define a organização das idéias, ele permite o questionamento e propõe a constante incerteza de conceitos. Para o autor, portanto, todo o paradigma estabelece um pensamento apto a reconhecer a dialógica, a recursividade e a multidimensionalidade, princípios do pensamento complexo. O autor defende, então, que não se pode pensar a complexidade como algo pronto e acabado, e não se pode materializá-la de forma linear e objetiva, como ocorre com o modelo mecanicista. Como justificativa dessa visão, Morin questiona a existência de um paradigma da simplicidade, contrastando-o com o paradigma da complexidade. A simplificação, para o 53 autor, é um ato inibidor que limita o processo do conhecimento, na medida em que se baseia na proposta de excluir a desordem do universo, instituir uma ordem e reduzi-la a uma lei, a um princípio. A partir do paradigma da simplicidade vê-se ora o uno, ora o múltiplo, mas não é possível ver que o uno pode ser ao mesmo tempo múltiplo. Morin (2003) conclui que o princípio da simplicidade quer separar o que está ligado e unificar o que está disperso, causando respectivamente disjunção e redução. Torna-se mais fácil compreender esta abordagem a partir do exemplo proposto pelo autor: o estudo do ser humano. O homem é um ser evidentemente biológico e é ao mesmo tempo um ser cultural, que vive num universo de linguagem, de idéias e de consciência. O homem vive, portanto, em duas realidades, a biológica e a cultural. O paradigma da simplicidade separa e reduz estas realidades da mais complexa a menos complexa possível, fazendo com que o homem seja estudado separadamente, por departamentos distintos da academia. Então, ele é estudado como um ser anatômico, fisiológico, etc., nos departamentos de biologia. Os outros aspectos humanos serão estudados nas ciências humanas e sociais. O cérebro será estudado como órgão biológico, separadamente do espírito, da mente, que, por sua vez, será estudada como função ou realidade psicológica. Isso porque, este paradigma esquece-se de que não existe um sem o outro, não existe cérebro sem mente, não existe corpo sem alma, ou seja, um é simultaneamente o outro, embora sejam tratados por termos e conceitos diferentes. O paradigma da complexidade, por sua vez, tem por essência possibilitar que o homem seja capaz de enxergar algo decomposto em suas partes, podendo, no entanto, tornar a vê-lo enquanto todo. Schvarstein e Etkin (1990) também abordam o paradigma da complexidade e enfocam a sua característica de enxergar a interação das partes de um sistema entre si, e do próprio 54 sistema com um todo com outros sistemas do seu ambiente. A complexidade se manifesta, então, pela coexistência da ordem e da desordem nos planos manifesto e latente destes sistemas. A complexidade, portanto, não poderia ser qualquer coisa que se define de maneira simples e que tome o lugar da simplicidade. Para Morin (2003), a complexidade é, então, uma palavra que traz problemas, e não soluções10. Acredita-se que o conteúdo deste paradigma é capaz de auxiliar na compreensão de dois termos tão complexos e tantas vezes equivocadamente simplificados nos estudos das ciências sociais: a comunicação e a organização. 3.1.1 Três princípios da complexidade O pensamento complexo proposto por Morin busca escapar das inúmeras dualidades presentes no campo das ciências, a partir de sete princípios: princípio sistêmico ou organizacional, princípio hologramático ou hologrâmico, princípio do anel retroativo, princípio do anel recursivo, princípio dialógico e princípio da re-introdução. Nesta análise, foram selecionados três destes princípios que nortearam o estudo, visto que a complexidade da própria técnica de Charaudeau já permite uma análise extensa. O primeiro princípio utilizado, chamado de dialógico, permite “assumir racionalmente a associação de noções contraditórias para conceber um mesmo fenômeno complexo” (MORIN, 2000, p. 34). Assim, é possível manter-se uma unidade através da união de dois conceitos ora complementares, ora antagônicos. No exemplo do estudo do homem, este princípio pode relacionar-se com a dualidade dos seres humanos, como seres biológicos e 10 Morin (2005) elaborou a coleção O Método, com seis volumes que abordam este paradigma. 55 sociais. Este princípio contempla o objeto desta pesquisa na medida em que permite a compreensão da inseparabilidade da comunicação organizacional em áreas como a mercadológica e a institucional. Neste sentido, acredita-se que a comunicação institucional e a mercadológica são duas partes de um todo que se relacionam para aperfeiçoar os resultados da comunicação organizacional. Podem ser ora complementares, ora antagônicas, na medida em que se analisa o implícito e o explícito em cada uma dessas instâncias, que atuam de maneira integrada. A recursividade organizacional é o segundo princípio da complexidade analisado neste estudo. Esta etapa sugere o rompimento com a idéia linear de causa e efeito, de produto e produtor, estrutura e superestrutura. A partir deste princípio, entende-se que tudo que é produzido reentra sobre aquele que o produziu em um ciclo em si mesmo, auto-constitutivo, auto-organizador e auto-reprodutor. Por exemplo, os indivíduos produzem a sociedade que os produziu. A escolha desse princípio deve-se ao fato da análise de discurso de Charaudeau, que sugere uma reinvenção dos sujeitos do ato publicitário, num circuito onde se insere o ato de linguagem sempre revisto a partir dos vieses do mundo real e do mundo imaginário criado pela publicidade. Por fim, elegeu-se ainda o princípio hologramático, pois se acredita que este compreende os dois princípios anteriores, a partir da constatação de que a parte está no todo e o todo está na parte. Transcende o reducionismo que só enxerga as partes, e o holismo que não vê mais que o todo (MORIN, 2003). Um filme de holograma onde se tem gravada uma imagem, mesmo cortado em partes menores, ao ser irradiado, irá projetar a imagem inteira que foi gravada. Este princípio é utilizado por Morin para exemplificar qualquer organização viva, desde uma pequena célula, que contém todo o código genético do ser vivo, que a ela pertence até uma estrutura sócio-antropológica, onde ao mesmo tempo cada indivíduo é parte de uma sociedade, essa sociedade se manifesta em cada indivíduo, através da linguagem, da 56 cultura e das normas. Aplicado neste estudo, esse princípio é bastante pertinente, na medida em que encaminha para a compreensão de que não é possível dissociar em partes a comunicação de uma organização, diferenciando-se a comunicação mercadológica da comunicação institucional. 3.2 A NECESSIDADE DO PENSAMENTO COMPLEXO NAS ORGANIZAÇÕES Sobre a organização e a complexidade, é pertinente citar a visão de Maturana e Varela (2004, p. 50): O que é a organização de algo? É alguma coisa ao mesmo tempo muito simples e potencialmente complicada. Trata-se daquelas relações que têm de existir, ou têm de ocorrer, para que esse algo seja. [...] É simples apontar para uma determinada organização ao indicar objetos que formam uma classe. Mas pode ser complexo e difícil descrever com exatidão e de modo explícito as relações que constituem tal organização. Segundo Morin (2003), a necessidade do pensamento complexo não poderia ser justificada em poucas linhas, pois não se trata de exercer um pensamento capaz de abordar o real, de dialogar e negociar com ele. O que a complexidade busca, é eliminar a simplicidade recusando as conseqüências mutiladoras e ilusórias de uma visão simplificadora que apenas reflete o que há de real na realidade. Como exemplo, pode-se citar a comunicação organizacional, que, em diversas obras de administração, não é referenciada com a complexidade devida. Alguns autores, conforme abordagens nos capítulos anteriores, buscam simplificá-la, definido-a como um meio de divulgar algum produto ou serviço, e se esquecem de que a comunicação permeia e determina todo o discurso organizacional. Para auxiliar a compreensão do paradigma da complexidade em uma organização, o autor utiliza a metáfora da tapeçaria, a partir das três etapas da complexidade. A primeira 57 etapa da complexidade indica que conhecimentos simples não ajudam a conhecer as propriedades do conjunto. O autor exemplifica sua idéia através de uma tapeçaria, que seria mais do que a soma dos fios que a constituem, ou seja, o todo é mais do que a soma de suas partes. A segunda etapa da complexidade revela exatamente o contrário, ou seja, o todo é menor do que a soma de suas partes. O autor conclui que o fato de existir uma tapeçaria faz com que as qualidades desse ou daquele fio não possam expressar-se em sua plenitude, pois estão inibidas ou virtualizadas. A terceira etapa da complexidade une as duas etapas anteriores e afirma que o todo é ao mesmo tempo maior e menor do que a soma de suas partes. Morin (2003), sob a ótica da complexidade, afirma que a organização não pode ser compreendida segundo a mesma lógica que a máquina artificial. O autor aborda o conceito de auto-organização ou organização viva, que foi criado para compreender o ser vivo e representa um sistema que cria suas próprias determinações e suas próprias finalidades. Nesta organização viva, os componentes se degradam muito rapidamente, mas ao mesmo tempo em que se deterioram, se renovam com a mesma velocidade, mantendo o organismo idêntico, apesar da constante desintegração de seus componentes. O autor enfatiza que nessa desintegração cria-se desordem e uma conseqüente autoorganização, onde a agitação e o acaso participam e ajudam a produzir uma nova ordem, que seria a auto-organização da desordem, exemplificada como o trabalho incessante de degradação/renovação celular do corpo humano. Segundo Morin (2003), a organização não é um conceito fechado, é um desenvolvimento ainda não atingido. Para demonstrar esta afirmação, ele cita a existência 58 desses novos conceitos, como a organização viva (auto-organização), a desorganização (entropia), a reorganização (neguentropia) e a auto-eco-organização (depende do meio externo). Sob a ótica do paradigma da complexidade, o autor sugere uma nova lógica da organização, contrária ao modelo newtoniano de um mundo mecânico, do qual a mudança não faz parte, pois o paradigma por ele proposto não visa constituir uma teoria acabada, mas um campo teórico aberto. Neste ponto, sustentando a idéia de que as contradições são necessárias, Morin (2001) possibilita a imersão na complexidade, auxiliando na convicção de que nenhuma verdade é definitiva, e o incerto está presente em todos os momentos. A necessidade de preparar-se para o inesperado, proposta pelo autor, é um caminho para tornar as ações organizacionais adequadas às constantes mudanças do mundo globalizado. Neste sentido, inserem-se as ações de responsabilidade social, já previamente citadas como novas “imposições” que a sociedade faz às organizações. Morin (2003) também afirma que pensar processos comunicacionais a partir da complexidade é perceber a solidariedade entre partes contraditórias de um mesmo campo e a interação com outros campos sociais, o que dá um caráter multidimensional ao todo da realidade social. Sobre a comunicação, Morin (2002, p.77), faz a seguinte explanação: a comunicação entre as pessoas é medida pelas conversas, essa troca desajeitada das palavras convencionais, pontuadas de sorrisos delicados e risos espasmódicos, de solilóquios cruzados, entre os quais, às vezes, surge uma pequena luz. Na vida cotidiana, a comunidade é bloqueada, atrofiada, desviada – daí o sucesso da comunicação imaginária dos filmes e dos romances. O autor alerta ainda que, é preciso distinguir comunicação de compreensão. A comunicação é a transmissão de informação às pessoas ou a grupos que podem entender o que significa a informação. A compreensão é um fenômeno que mobiliza os poderes subjetivos de 59 simpatia para entender a pessoa. Morin (2002) acredita que este é um problema fundamental no mundo da comunicação, pois, para o autor, não basta multiplicar as formas de comunicação, também é preciso compreendê-las, já que na sociedade atual existe muita comunicação e pouca compreensão. Schvarstein e Etkin (1990) também abordam a organização sob a ótica do paradigma da complexidade, e afirmam que este considera a realidade organizacional como processos não ordenados ou programáveis. Pressupõe a existência de forças de múltiplas fontes, exercidas em direções distintas. Os autores concluem, então, que na organização coexistem, em um mesmo sistema, relações complementares, simultâneas e antagônicas, ou seja, o ambiente é de relativa desordem, diversidade e incerteza. Este paradigma destaca também as vinculações que se estabelecem entre o observador, com seu aparato perceptual e conceitual próprios, e a realidade que é estudada. É importante destacar ainda que, para os autores, o paradigma da complexidade explica o funcionamento das organizações através de processos que se fecham em si mesmos, e, então, se regeneram. Admitem que as organizações não desenvolvem atividades com início e fim bem definidos, mas estão num constante processo de recursividade e de reconhecimento contínuo, num ciclo ininterrupto. Segundo Morin (2003), o pensamento complexo é aquele que, pressupondo a incerteza, é capaz de conceber a organização e reunir, contextualizar, globalizar, e, ao mesmo tempo, reconhecer o singular, o individual, o concreto. Foi neste sentido que se considerou o discurso publicitário, como parte integrante do discurso organizacional, a partir da análise de aspectos singulares e de sua relação com o contexto em que se insere. Buscou-se demonstrar que a proposta de Morin atende ao propósito de ancorar a análise dos discursos organizacionais, a partir do discurso publicitário, tema do próximo capítulo. 60 4 A ORGANIZAÇÃO DISCURSIVA Torna-se difícil fazer um repertório de todas as tendências que hoje se interessam pela análise de discurso. Isso se deve à diversidade de enfoques e à variedade de conceitos sobre o que é discurso. Contudo, foi possível eleger alguns autores pela sua relevante contribuição na fundamentação deste tema. Para Pinto (2002), as análises de discurso que se praticam hoje são derivadas de duas tradições distintas: a análise do discurso francesa e a análise de textos anglo-americana, com diferentes abordagens epistemológicas. Ambas empregam a palavra discurso no singular, mas o autor sugere o uso da palavra no plural em função da sua multiplicidade e para distingui-la das grandes categorias abstratas, evitando o estruturalismo. Como diz o autor, é na superfície dos textos que podem ser encontradas as pistas, ou marcas, deixadas pelos processos sociais de produção de sentidos que o analista vai interpretar. O analista de discursos é uma espécie de detetive sociocultural, pois sua prática é primordialmente a de procurar e interpretar vestígios que permitem a contextualização em três níveis: o contexto situacional imediato, o contexto institucional e o contexto sociocultural mais amplo, no interior dos quais se deu o evento comunicacional. Ou seja, a análise de discursos não se interessa tanto pelo que o texto diz ou mostra, pois não é uma interpretação semântica de conteúdos, mas sim como e porque o diz e mostra. O discurso será associado à linguagem apenas à medida que faz sentido para sujeitos inscritos em estratégias de interlocução, em posições sociais ou em conjunturas históricas. Segundo Maingueneau (1997), esse tipo de análise aborda a dualidade da linguagem – a 61 explícita e a implícita – tanto integralmente formal, como integralmente atravessada pelos embates subjetivos e sociais. Entretanto, torna-se importante lembrar a ligação essencial que a análise de discurso mantém com a finitude e a “raridade”, pois, como defende Foucault (1986), não é possível defini-la como uma gramática de língua, uma vez que uma palavra só pode ser analisada a partir do contexto em que foi usada. Isso equivale a determinar qual é a posição que pode e deve ocupar cada indivíduo, para dela ser o sujeito do enunciado, no momento em que este acontece. Os atos de fala, então, acirram regras e convenções que regulam institucionalmente as relações entre os sujeitos de enunciação, atribuindo a cada um deles um “contrato de comunicação”. A noção de contrato pressupõe que os indivíduos que pertencem ao mesmo corpo de práticas sociais utilizem códigos específicos de área, como os utilizados em discursos jurídicos, pedagógicos, publicitários, etc. Conseqüentemente, o sujeito que anuncia sempre poderá atribuir ao outro uma competência de linguagem análoga à sua, que o habilite ao reconhecimento. Tal processo explica como o uso da linguagem está ligado às práticas sociais e a um contexto histórico. Para Ducrot (1987), a língua comporta um catálogo completo de relações interhumanas, “toda uma coleção de papéis” que o locutor pode escolher para si e impor ao destinatário. Caracteriza uma encenação em que as formulações eficazes conferem credibilidade ao que é dito, assim como todas as estratégias envolvidas no tempo e no espaço, que são remetidas ante os parceiros no ato da comunicação. Isso porque, segundo o autor, todo discurso faz parte da história de outros discursos; todo discurso é a continuação de discursos anteriores, como uma citação explícita ou implícita do que já foi dito anteriormente. 62 Todo discurso também poderá estar relacionado a novos discursos e fazer parte, assim, do grande corpo textual de uma cultura. Assim, a análise de discursos procura descrever, explicar e avaliar criticamente os processos de produção, circulação e consumo dos sentidos vinculados aos produtos culturais empíricos criados por eventos comunicacionais (tais como anúncios publicitários, textos jornalísticos impressos, programas televisivos ou de rádio, até mesmo a organização dos espaços de uma cidade, empresa, etc.). Neste contexto, insere-se a abordagem de Charaudeau (1983), que propõe um projeto global de análise de discurso ao levar em consideração não só a dimensão lingüística, mas também a psicológica e a sociológica. 4.1 O DISCURSO PUBLICITÁRIO A importância da publicidade e propaganda pode ser percebida a partir da abordagem de Iasbeck (2002), para quem a linguagem publicitária extrapolou os limites dos meios de comunicação, e já é parte integrante dos diversos discursos da modernidade, emigrando, por exemplo, de jornais, revistas, cartazes e televisões para freqüentar o dia-a-dia de diversos profissionais, como executivos, políticos e até conversas pela Internet. A publicidade envolve por completo a sociedade, e está presente em quase tudo o que é consumido pelo homem moderno. Pinho (2001) afirma que a força da publicidade está na sua grande capacidade persuasiva e na sua efetiva contribuição para mudar hábitos, recuperar uma economia, criar imagem, promover o consumo, vender produtos e informar o consumidor. A mais conhecida 63 função da publicidade é contribuir para o desenvolvimento econômico, ajudando a conquistar e manter mercados para um determinado produto ou serviço, e, no caso de novos produtos, a formar o mercado consumidor. Atualmente, a publicidade tem papel central na construção e manutenção de marcas fortes e duradouras, que estão se tornando o principal ativo das empresas. Seguindo-se a linha de pesquisa de Charaudeau, será discutida, nesse capítulo, a publicidade enquanto discurso, buscando em outros teóricos da comunicação os conhecimentos que permitam ampliar a abordagem sobre o tema. O discurso publicitário prende-se a normas precisas da linguagem cotidiana, garantindo assim uma interpretação única e um bom retorno no contrato de comunicação. Para Sant’anna (1966), a publicidade encontra-se subordinada à arte de vender, conferindo ao consumidor o papel de maior importância, já que tudo é feito em função dele, limitando o que é criado e o que é dito. Por outro lado, a publicidade é capaz de construir uma nova realidade: Embora nem todas as mensagens publicitárias surtam o efeito desejado, a onipresença da publicidade comercial na sociedade de consumo cria um ambiente cultural próprio, um novo sistema de valores, de acordo com o “espírito do tempo” (CARVALHO, 1996: 11). Assim, a mensagem publicitária torna familiar o produto que está vendendo, ao mesmo tempo em que o diferencia do concorrente. Para a autora, publicidade é discurso, linguagem, e tem como objetivo mediar objetos e públicos, utilizando-se mais da linguagem do mercado do que da linguagem dos objetos. Para Castro (2004), o discurso publicitário transcendeu a realidade e busca mais seduzir o consumidor do que persuadi-lo, pois a sedução está ligada ao afetivo e ao psíquico, instâncias que propiciam a criação de um ambiente apto à realização do desejo prometida pela mensagem publicitária. 64 Acredita-se que, sempre que se utilizar textos na pesquisa social sem abordá-los com instrumentos lingüísticos ou semiológicos adequados, a palavra será analisada fora do contexto. Esta visão vai ao encontro da análise de discurso proposta por Charaudeau (1983), que afirma que é possível analisar a produção publicitária a partir de dois vieses: o do conteúdo, circunscrita pelo próprio texto, e o do anunciante, a partir do ponto de origem da produção. A primeira abordagem, a partir do conteúdo, é do tipo hermenêutica, e tem inspiração semiológica. A análise se detém na interpretação do texto, e, como desvantagem, pode induzir à revelação de um objeto parcial. Ela se mantém complexa e ambígua por acabar demonstrando que o analista seria o único portador e decifrador de seu conteúdo. A interpretação neste tipo de análise corre o risco de ser extremamente subjetiva, pois aspira esgotar o sentido do texto. Isso não seria possível se o analista tivesse a recomendável transparência em relação ao seu objeto. A segunda abordagem, que se apóia nos produtores da publicidade, remete à análise de um ponto anterior ao das formas textuais. Os publicitários precisam conhecer os verdadeiros destinatários do discurso para prever sua adesão à mensagem nele contida. Para tanto, estes profissionais realizam pesquisas e produzem verdadeiras enciclopédias de perfis psicossociais de um consumidor ideal. A desvantagem desta análise é que os receptores seriam todos previsíveis, cabendo ao publicitário apenas ajustar a mensagem aos moldes do destinatário. Soulages (1996) sugere então, que a análise de discurso pode ser uma terceira análise, que seria capaz de evitar o extremo subjetivismo ou extremo mecanicismo, presente nas análises anteriores. O objeto desta análise seria o fenômeno publicitário, abrangendo tanto as considerações do produtor, quanto do receptor e do conteúdo da mensagem em si, envolvendo também o contexto em que estes fatores estão inseridos. A partir de um processo empírico- 65 dedutivo, a análise de discurso pretende revelar um falar publicitário com suas configurações, tanto coerentes quanto contraditórias. Quanto às circunstâncias do discurso, Charaudeau (1983) define o ato de linguagem como algo assimétrico, na medida em que o fato de produção ou de interpretação depende dos conhecimentos supostos que circulam entre os sujeitos da linguagem, a partir do explícito e do implícito. Assim, o ato de linguagem não é concebido apenas como um ato de comunicação da produção de uma mensagem por um emissor para um receptor, e sim como um encontro dialético entre o processo de produção, produzido por um emissor para um destinatário, e o processo de interpretação, produzido por um receptor interpretante, que constrói uma imagem do emissor. Para Charaudeau, a observação do sistema sócio-econômico mostra que a publicidade se inscreve em um circuito de trocas de bens de produção que põe em questão vários parceiros: Circuito externo: sujeitos psicossociais Parceiros Circuito interno: interlocutores Empresa Anunciante + Agência de Publicidade EUc = EUe benfeitor ELEx mensagem publicitária TUd beneficiário = TUi Consumidores do produto, público-alvo da publicidade Protagonistas ELEo – Produto / serviço Figura 3 - Contrato de comunicação publicitária Fonte Soulages 1996 p. 146 O esquema apresentado por Charaudeau resulta do relacionamento de dois parceiros, um sujeito comunicante – um anunciante (publicitário) determinado - e sujeitos interpretantes – um conjunto indiferenciado de consumidores e compradores em potencial do produto. Estes 66 sujeitos estão inscritos em um circuito externo, que demonstra o andamento real da comunicação publicitária. No interior deste circuito, o autor descreve a existência de uma duplicação de cada um desses sujeitos, protagonistas das produções discursivas que a publicidade busca representar. Entende-se que o circuito externo seria a realidade, e o circuito interno uma representação dessa realidade, um mundo imaginário, proposto pelo sujeito comunicador, ou seja, o criador do anúncio. Este criador poderá ser o fabricante do produto e o publicitário, que serão levados a fazer estudos de mercado até conceber a divulgação publicitária sob formas diversas, como outdoors, anúncios em jornais e revistas, merchandising, etc. Os diferentes parceiros são ligados por contratos de interesse em torno do valor de mercado dos produtos que eles podem oferecer. Do outro lado do circuito estão os consumidores, isto é, os parceiros que têm parte ligada a esse sistema sócio-econômico, e no qual eles têm um lugar determinado: o de compradores de bens de produção. O autor busca, então, denominar os diferentes sujeitos que agem no contrato de comunicação, chamando-os da seguinte maneira: EUc-Publicitário, TUiConsumidor e ELEo-Produto e descrevendo-os conforme segue: EUc-Publicitário: é quem comunica, é de onde provém a fala publicitária destinada a um receptor imaginário. Seria a fala do fabricante do produto anunciado, concebida através de um texto publicitário. Existe ainda um EUe, que seria o enunciador do discurso publicitário, que constrói uma imagem do EUc. TUi-Consumidor: é quem age, ou seja, quem lê e interpreta a mensagem do texto publicitário, e compra o produto elogiado nessa mensagem. Aqui existe ainda o TUd, ou seja, o destinatário imaginado para a mensagem, um possível utilizador do produto. 67 ELEo-Produto: é o objeto elogiado no texto publicitário, o objeto de troca que promete aquisição de vantagem para o consumidor, e enriquecimento para o publicitário. O autor sugere que o objetivo desse contrato sociolinguageiro é de realmente transformar, por meio de persuasão, um consumidor de publicidade em um consumidor de mercadorias. Os meios para alcançar tal objetivo incluem estratégias para ocultar a finalidade comercial do discurso publicitário, que serão abordadas no decorrer deste capítulo. 4.1.1 Organizações do discurso publicitário Os seres de fala que são postos em cena pelo discurso publicitário podem ser organizados de maneira enunciativa, narrativa e argumentativa, ou seja, a definição de quem o texto põe em fala e como isso é feito. Charaudeau (1983) discorre então sobre cada uma dessa formas de organização discursiva. A organização enunciativa pressupõe que o enunciador, EUe nunca se revele como publicitário. Em alguns casos, ele identifica-se com a “sociedade” produtora do bem de consumo, mas apenas como uma estratégia para fazer crer que EUc e EUe sejam um único sujeito, ou seja, no discurso criado, o enunciador identifica-se com a empresa. O enunciador tem então, estatuto de apresentador de um produto, sobre o qual ele diz um certo número de qualidades. O autor também denomina este enunciador do discurso publicitário de anunciador. O destinatário (TUd) do texto enunciativo não é designado como consumidor, mas como um sujeito suscetível de ser atingido por tudo que é dito a respeito do produto anunciado. O autor o denomina como um utilizador eventual do produto. 68 Ainda no texto enunciativo, o terceiro elemento é denominado ELEx, e não é apresentado em sua forma original, que seria o ELEo. Isto ocorre porque o produto em si não é citado, mas é apresentado como uma marca, uma qualidade, ou uma vantagem. O autor também indica que muitos publicitários não exprimem as qualificações do produto, querendo assinalar que a marca em si já é suficientemente conhecida, o que ele chama de efeito de notoriedade. Neste sentido, o autor constata a presença constante, de maneira mais ou menos explícita, de quatro componentes no texto: produto (P), a marca (M), qualidades do produto (q) e vantagens q o produto oferece (R) e constrói uma fórmula, descrita da seguinte maneira: P(M ) × q ⇒ R Figura 4 - Elementos presentes no texto publicitário. Fonte: Charaudeau (1983). A organização narrativa, por sua vez, é pensada a partir do princípio do aparelho narrativo citado pelo autor, que pressupõe a existência de uma situação de falta para alguém. A tomada de consciência dessa falta é o que incita esse alguém a buscar algo para supri-la. A busca pode resultar num processo de sucesso ou de fracasso, dependendo se a falta foi suprida ou não. O produto em questão, (P), seria um meio de ajudar o possível consumidor a satisfazer esta necessidade criada. O objeto dessa busca seria representado por aquilo que o produto oferece. Então, o autor sugere a seguinte descrição da organização narrativa do texto publicitário: • Alguém tem uma Falta => [Falta = R (-)] • O sujeito procura suprir esta Falta => (Busca) • R = a Falta suprida => (Objeto de busca) • P(M) x q = meio de suprir essa Falta => (Auxiliar de busca) 69 Charaudeau (1983) observa ainda, que no texto publicitário não se fala do resultado dessa busca. Para o autor, existe um duplo objetivo do agente EU. Para o EUc-Publicitário, o objetivo do anúncio é o ato da compra, mas para o EUe-Enunciador, o objetivo do anúncio é levar o leitor a acreditar que tem uma falta do produto anunciado. Neste sentido, o autor afirma que o ato da compra não significa que o leitor se convenceu de que tem uma falta, e a consciência de ter essa falta pode não resultar no ato da compra. Ou seja, o ato da compra não é prova de sucesso do “fazer-crer”, e, inversamente, a “não-compra” não constituiria um fracasso. O consumidor pode ter se convencido que precisa do produto, mas mesmo assim não o compra, ao mesmo tempo em que o consumidor pode comprar o produto, mesmo não estando convencido de que precisa realmente comprá-lo. Finalmente, no caso da organização argumentativa de discurso, o autor a descreve como uma proposta – que mostra onde se apóia a argumentação -, uma proposição – que mostra o raciocínio – e, por fim, um ato de persuasão – que mostra a validade da proposição, tentando responder antecipadamente a duas objeções possíveis. A proposta do texto publicitário é representada pelo ELEx, o produto de uma marca, que, combinado com suas qualificações, alcançará um resultado, conforme ilustrado na figura 3. A proposição, por sua vez, cria um contexto de raciocínio indutivo que se articula com a organização narrativa na medida em que o destinatário é convocado a perceber que R é seu objeto de busca. Já o ato de persuasão pode ser descrito da seguinte maneira: a) “você não pode não querer R” – esta frase busca atingir tanto os destinatários que buscam R quanto os que não se interessam por R. 70 b) “somente P(M) permitirá que você tenha R” – esta frase busca deixar claro, inclusive para os destinatários que não se interessam por R de que não existe outra maneira de conseguir R. O autor esclarece, contudo, que por força do pressuposto do contrato de fala, de que não se pode afirmar nada de antemão, cabe aos publicitários utilizarem-se de meios retóricos adequados em cada caso, para chegar a seus fins persuasivos. Ainda sobre o contrato de fala que define o gênero publicitário, Charaudeau (1983) afirma que possui uma dupla estratégia: a estratégia de ocultação e a estratégica de sedução/persuasão. A seguir serão descritas estas estratégias. 4.1.2 Estratégias do discurso publicitário Para Charaudeau (1983), o discurso publicitário é encenado de modo a ocultar o que se passa no circuito externo, segundo a figura 3. Neste circuito, os parceiros são ligados por relações de interesse muito mais em prol do publicitário do que do consumidor. Para o autor, o ato de compra do consumidor é a garantia do enriquecimento dos parceiros que se encontram na cadeia da instância produtora, enquanto que o consumidor só recebe a sua parte na apropriação de um bem que é, por definição, perecível (qualquer que seja seu prazo), e ainda, é algo que o consumidor nem mesmo pode afirmar que realmente necessita (a não ser que ele justifique essa necessidade utilizando a mesma argumentação do discurso publicitário). Essa ocultação se realiza primeiramente pela fabricação de uma imagem de sujeito que enuncia (EUe), que “se mascara” de anunciador através do sujeito que comunica (EUc)- 71 Publicitário (CHARAUDEAU, 1983). Por outro lado, o sujeito consumidor também é mascarado por uma imagem de sujeito destinatário, que deve estar interessado não no produto, mas no que ele oferece. Ele é, portanto, chamando a se colocar no local de um agente de uma busca, cujo objeto não é a compra de um produto, mas a imagem vaga de um objeto de desejo, ou seja, a identificação. Ao mesmo tempo, o autor percebe que se opera um deslocamento do lugar do produto. No circuito externo (figura 3), P é o objeto de troca entre a instância produtora e a instância consumidora, que obterá esse objeto através do ato da compra. Já no circuito interno, onde opera o discurso publicitário, P não é mais este objeto, mas sim, um auxiliar na busca deste objeto. Assim, este deslocamento tem o efeito de inocentar P, dar a impressão de que ele está mais acessível, e ainda, fazer crer que o consumidor se apropriou dele por outro motivo que não o produto em si. Na organização discursiva narrativa, relatada anteriormente, Charaudeau (1983) destaca que R representa um objeto de valor positivo, um benefício, que teria como beneficiário o destinatário e como benfeitores o anunciador e o fabricante. Este benefício é reapresentado por um valor vago, como o amor, a sabedoria, a virilidade, para que possa se inscrever em um imaginário coletivo no qual se supõe que cada um encontra um ponto de ancoragem pessoal. Mas essa subjetividade é ao mesmo tempo levada por um objeto concreto, o que constitui uma maneira de fazer crer que o desejo de cada um pode encontrar a sua concretização em um objeto material, e o seu preenchimento na apropriação desse objeto. Enfim, o publicitário pode trabalhar com categorias de interlocutores diferentes, talvez até opostas. Algumas, com efeito, serão mais sensíveis a um discurso de sedução, e outras a um discurso de persuasão. O autor discorre também sobre a relação do tipo de contrato publicitário e a mídia que o publicitário utiliza para veicular suas mensagens. A mídia 72 especializada é indicada quando o público alvo é formado por destinatários intelectuais, e precisa de um discurso argumentativo através do que o autor chama de “contrato sério”. Já a mídia de massa é utilizada quando o público alvo é extenso e mais inclinado a sonhar, e precisa do que o autor chama de “contrato maravilhoso”. A seguir será discutido como o discurso publicitário é formatado em uma campanha publicitária, suas peças e as mídias escolhidas na campanha analisada. 4.2 CAMPANHAS PUBLICITÁRIAS Segundo Sampaio (2003), uma campanha de propaganda pode ser definida como a soma de diversos esforços publicitários integrados e coordenados entre si, e realizados para cumprir determinados objetivos de comunicação de um anunciante, tais como: lançamento de uma nova marca no mercado, promoção de uma liquidação, sustentação das vendas e da imagem de um produto ou serviço já existente, esforço de caráter institucional, e muitos outros exemplos. A campanha de propaganda diferencia-se do anúncio ou do comercial isolado pela maior quantidade e integração das peças de comunicação utilizadas, pela coordenação dos esforços, e pela existência de um tema de campanha. Para o referido autor, tema de campanha é um slogan, frase, conceito visual, gráfico ou sonoro que resume a essência do posicionamento de um produto, marca ou empresa. É o elemento que integra suas diversas peças de comunicação, uma vez que está presente em todas elas. O tema também é a essência daquilo que é mais importante dizer em toda a 73 campanha, é a própria expressão comunicativa da estratégia de comunicação adotada. Pode ser expresso através de palavras, elementos visuais, sonoros ou gráficos. Além das peças de comunicação publicitária, pode-se utilizar outras ferramentas de comunicação que complementam os esforços de propaganda, ou cumpram tarefas específicas necessárias à consecução dos objetivos centrais da campanha. 4.2.1 As peças publicitárias A abordagem teórica sobre as peças publicitárias será restrita às utilizadas pela campanha analisada neste estudo, ou seja: anúncio, outdoor e spot de rádio. Os anúncios encontram boas oportunidades em jornais e revistas, pois estes veículos permitem a inserção de textos, desenhos, fotografias, manchetes chamativas, diagramação e design inovador, oferecendo a possibilidade de passar uma mensagem detalhada. O anúncio é o canal que estabelece a ligação direta entre a oferta e a procura (CARVALHO, 1996). Castro (2004) esclarece que a estrutura do texto publicitário de um anúncio permite que as suas partes se complementem num todo, dispostas logicamente, a começar pelo título, que geralmente aparece destacado e tem a função primordial de conduzir à leitura do restante do anúncio. Esta leitura serve para reproduzir relações sociais da vida cotidiana, buscando causar a identificação do público com o conteúdo da mensagem publicitária, que retrata significados variáveis do contexto social e cultural em que veicula. O outdoor, cartaz de grandes proporções posicionado em locais estratégicos, de modo a ser visto por um grande número de pessoas, utiliza mensagens curtas e diretas associadas a imagens igualmente simples e fortes para convencer as pessoas a respeito de uma idéia ou 74 produto. O outdoor se diferencia do anúncio pela sua grande visibilidade (CARVALHO, 1996). A autora afirma ainda que o outdoor e o anúncio – em jornal ou em revista - ocupam lugar de destaque, por se basearem na palavra escrita, que exerce a função de direcionar o sentido da imagem. Assim como em outras publicidades ao ar livre, no outdoor a mensagem precisa ser curta para ser eficaz, conforme afirma Carvalho (1996). No entanto, a velocidade com que a mensagem é vista, e as distrações comuns de quem está no tráfego, fazem com que os outdoors precisem ser expostos ao público por um tempo relativamente longo. A autora afirma ainda, que, no Brasil, esses painéis costumam ficar um tempo mínimo de 15 dias em veiculação. Martins (2004) esclarece que o outdoor atua como mídia de apoio em uma campanha publicitária, veiculando, de maneira rápida e enfática, a síntese do seu conceito. Já o spot de rádio não dispõe do fator visual como os anúncios e os outdoors, e é encarado como mídia eletrônica. Este veículo busca atrair a atenção do público em horário e condições que outros meios não conseguiriam, pois as pessoas costumam ouvir o rádio enquanto estão fazendo alguma outra coisa. Por outro lado, o ouvinte pode não estar prestando atenção integral à mensagem publicitária. Segundo Shaver (2002), o rádio combinado com outdoor costuma ser a televisão barata, por surtir quase o mesmo efeito de um comercial televisivo. Tanto o rádio, como o jornal e o outdoor são usados primordialmente para reforçar, em termos locais, uma campanha de âmbito nacional, pois são excelentes meios de comunicação para fixar e relembrar (SCHULTZ e BARNES, 2001). 75 Segundo Prata (2005), é pertinente destacar a visão de Charaudeau (1984) de que a voz é a principal característica que dá suporte ao rádio, e instaura uma relação muito particular entre a instância midiática e o receptor. No caso do spot de rádio é pertinente levar em consideração a observação do autor sobre o tema: O rádio é essencialmente a voz, os sons, a música e é esse conjunto que o inscreve em uma tradição oral, mais marcada ainda se não o acompanha nenhuma imagem, nenhuma representação figurada dos locutores nem de objetos que produzam vozes ou sons. A magia particular do rádio se deve a essa ausência de encarnação e essa onipresença de uma voz pura. A voz – timbre, entonação, intenção – revela o estado de espírito daquele que fala. Assim, ele poderá parecer forte ou fraco, autoritário ou submisso, emotivo ou controlado, frio ou emocionado, tudo isso com que jogam os políticos e profissionais da mídia. (Prata 2005 p. 242 apud Charaudeau, 1997 p. 119) Charaudeau (1984) esclarece ainda, que a análise da mídia não pode se contentar apenas com o produto final, como as peças publicitárias. Para o autor, toda a produção de sentido depende do sujeito que a produz e do processo em esta se dá em função dos efeitos que se quer produzir nos destinatários. A partir das abordagens expostas, acredita-se que, no que tange à comunicação integrada, a propaganda é um instrumento, tanto da comunicação dita mercadológica, quanto institucional, que atuam conjuntamente. Ou seja, assim como a propaganda é uma ferramenta da comunicação, também é uma ferramenta do marketing, na medida que estes setores buscam um mesmo objetivo organizacional. Garantir a sobrevivência da organização é função de toda a estrutura organizacional, a partir de uma atuação ética que permite a geração de lucros (financeiro, social e institucional), beneficiando acionistas, clientes, funcionários, fornecedores, toda a comunidade e o meio ambiente. 76 4.3 A RELAÇÃO DA IMAGEM COM O TEXTO Apesar de não ser o enfoque principal deste estudo, considerou-se pertinente fazer uma leitura, ainda que breve, da imagem em peças publicitárias. Para tanto, elegeu-se Barthes (1990), por ser considerado o primeiro teórico a propor uma análise desse tipo voltada à publicidade, e trabalhar com a semiolinguística. Para este autor, a publicidade exprime mensagens de teor lingüístico e icônico, sendo que este último se divide em outros dois tipos de mensagem: a imagem icônica codificada, e a mensagem icônica decodificada, que traçam as relações dos diferentes elementos entre si para construir uma mensagem visual (BARTHES, 1990). Essas mensagens podem ser relacionadas, respectivamente, com os conceitos de conotação (implícito) e denotação (explícito), baseando-se na presença ou ausência de certos elementos nas peças publicitárias. Quanto ao emprego da cor, Farina (2003) disponibiliza uma abordagem oportuna no que se refere à publicidade. Para o autor, a cor tem íntima conexão com aquilo que será anunciado, quer seja para transmitir a sensação de realidade, quer para causar impacto. Devido às suas qualidades intrínsecas, a cor tem a capacidade de captar rapidamente, e sob um domínio emotivo, a atenção do comprador. Para o autor, é inegável que o anúncio publicitário realizado nos contrastes de branco e preto tem poder atrativo muito grande, é um contraste agradável à vista e com um inquestionável poder de impacto. Porém, as combinações de cores possuem um poder muito maior, atuando diretamente sob a parte sensorial do indivíduo. O autor afirma ainda que existem certas cores que possuem, por si próprias, um grau de atenção maior do que as outras. O vermelho simboliza uma cor de aproximação, de 77 encontro e algumas de suas características afetivas são o movimento, o dinamismo, a força, energia, vigor, intensidade, coragem. O cinza dá a idéia de máquinas, seriedade, finura, e em geral não interfere junto às outras cores. O branco lembra a harmonia, simplicidade, limpeza, estabilidade. Contudo, o tema é demasiado complexo e não se pretende estendê-lo, atendo-se apenas as cores que são utilizadas com relevância nas peças da campanha analisada a seguir. 78 5 5.1 ESTUDO DE CASO: A CAMPANHA CARAVANA 500 MIL PELO BRASIL CARACTERIZANDO A ORGANIZAÇÃO PESQUISADA Considera-se relevante mencionar algumas das características ímpares da AGCO que concorreram para que a organização fosse escolhida como objeto desta pesquisa11. A sede da AGCO Corporation fica na cidade de Duluth, Georgia, Estados Unidos e a empresa possui fábricas em seis países: Alemanha, Brasil, Dinamarca, Estados Unidos, França e México. Atualmente, a AGCO exporta para 90 países, expandindo-se na Europa, no Oriente Médio e na África. A empresa projeta, fabrica e distribui equipamentos agrícolas e peças de reposição relacionadas, como tratores, colheitadeiras, retro-escavadeiras, pás carregadeiras, tratores de esteira e pulverizadores. No Brasil, a AGCO conta com aproximadamente 3.000 colaboradores nas fábricas de Canoas e Santa Rosa, no Rio Grande do Sul, e contempla as marcas Massey Ferguson, AGCO ALLIS, Challenger, Ag-Chem, Fieldstar, Auto-Guide, Soilteq, MF Industrial e Spra-Coupe. A empresa possui a maior rede de concessionárias do país, com 220 lojas espalhadas por todos os estados. Para validar sua missão – crescimento sustentável através do atendimento ao cliente, inovação, qualidade e comprometimento superiores – e sua visão – soluções de alta tecnologia para produtores rurais que alimentam o mundo –, a AGCO baseia-se em cinco valores, descritos no quadro a seguir: 11 Todas as informações sobre a AGCO foram colhidas durante conversas e trocas de mensagens eletrônicas com os profissionais da empresa. 79 VALOR Foco no cliente DESCRIÇÃO “Criamos soluções excelentes para nossos clientes ouvindo atentamente suas necessidades e excedendo suas expectativas”. Dimensões humanas “Valorizamos nossos funcionários; queremos ser o empregador preferido no nosso segmento; queremos desenvolver funcionários altamente motivados que sejam; os mais instruídos e melhor treinados no segmento; desenvolvemos as habilidades e qualificações dos funcionários; queremos que nossos líderes sejam pró-ativos e indiquem a direção; queremos que nossos líderes influenciem e estabeleçam as regras; queremos alcançar vantagem competitiva através da agilidade, qualidade e comportamento inovador”. Número um na “Mais do que entregar alta qualidade em produtos e serviços, queremos ser qualidade percebida reconhecidos por isso”. pelo cliente Padrões éticos “Agiremos de maneira ética como bons cidadãos corporativos em todas as comunidades nas quais a Companhia atua; cuidamos do meio ambiente; queremos proteger o meio ambiente de influências nocivas, conservar os recursos naturais e promover a consciência ambiental”. Valores da marca “Reconhecemos a tradição e o valor das marcas, a lealdade de nossos clientes e a identificação de nossas concessionárias e distribuidores com as marcas. A estratégia multi-marcas da AGCO mantém o valor de cada marca”. Quadro 3 - Valores da AGCO Fonte: www.AGCO.com.br (disponível em 13 de novembro de 2005.) Entre suas ações para legitimar sua missão, está também a criação do primeiro programa de marketing de relacionamento do setor agrícola, que visa ouvir o cliente e desenvolver soluções adequadas. Ressalta-se ainda a preocupação da empresa com sua imagem junto aos públicos, explícita nos diversos prêmios que a empresa recebeu, ligados ao meio ambiente, segurança e saúde ocupacional, marketing, recursos humanos e qualidade. Entre eles destacam-se: Top of Mind, Top List e Destaque Empresarial (2003 e 2000), Gerdau Melhores da Terra (2003, 2002 e 2000), Top Ser Humano da ABRH–RS (2003), Prêmio Expressão de Ecologia (2003, 2002 2001, 2000 e 1999), Prêmio Qualidade RS (2003, 2002, 2001, 2000, 1998 e 1997), Prêmio Sul de Energia da Revista Expressão (2002) e Prêmio CNI de Ecologia (1999). Além dos prêmios, a AGCO recebeu as seguintes certificações: ISO 9001 (2003), OHSAS 18001 (2002), ISO 14001 (1999), e ISO 9001 (1994). Em 2003, a AGCO do Brasil recebeu o seu primeiro Certificado de Responsabilidade Social fornecido pela Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul a empresas situadas no Estado. 80 Esta constante participação da empresa nos prêmios mencionados demonstra seu esforço em cultivar sua imagem, fator que também foi considerado para justificar sua escolha como modelo de organização preocupada com sua comunicação. Numa visita à sede da empresa em Canoas, no dia 15 de junho de 2004, às 15h, constatou-se que o departamento de comunicação é intitulado marketing e comunicação, e trabalha em conjunto com o departamento de marketing e vendas. É importante destacar esta integração entre comunicação, marketing e vendas, uma vez que pode ser um indício da importância que a empresa atribui à comunicação. 5.2 A CAMPANHA A Massey Ferguson, que a partir deste ponto será referida como MF, é a marca líder do mercado de tratores no Brasil há 44 anos, e alcançou, em 2003, o número de 500 mil tratores produzidos no país. Dentre as comemorações desse fato, a empresa resolveu confeccionar um trator especialmente para a ocasião. O trator, com detalhes cromados, virou motivo de orgulho para os funcionários da AGCO, quando a empresa decidiu promover um leilão beneficente no dia 08 de julho de 2003. O valor arrecadado seria integralmente doado para o Programa Fome Zero, do Governo Federal, que estava sendo lançado na época, e repercutia na mídia nacional. Esta foi uma oportunidade que a empresa percebeu para agregar sua marca a uma ação de cidadania, uma ação isolada, mas que se legitima por ser realizada por uma empresa com histórico bastante sólido em atuação socialmente responsável. A idéia que originou a criação da Caravana 500 mil pelo Brasil surgiu no momento em que a AGCO decidiu leiloar o Trator 500 mil e doar o valor arrecadado ao programa Fome 81 Zero. Esta doação atendia a um apelo do Governo para que as empresas aderissem a este programa social de amparo a pessoas carentes, recém lançado e bastante presente na mídia. A iniciativa da AGCO atraiu atenção da imprensa, e a realização do leilão gerou um grande momento para a empresa. Estiveram presentes na ocasião políticos, membros do Ministério da Reforma Agrária, representando o governo federal e os governadores dos Estados do Rio Grande do Sul e do Mato Grosso. O evento foi transmitido ao vivo para todo o país pelo Canal Rural. O trator comemorativo foi arrematado pela Unimassey por R$ 200.000,00, e a AGCO reverteu este valor para o programa Fome Zero. Toda essa comemoração fez com que a Unimassey resolvesse mostrar o trator recém adquirido, lançando então a campanha Caravana 500 mil pelo Brasil, com o objetivo de arrecadar alimentos por onde passasse. Para divulgar a campanha, juntamente com o alcance dos 500 mil tratores produzidos no país, a AGCO encomendou uma campanha publicitária que compõe o corpus deste estudo. A campanha teve seu lançamento oficial na feira agropecuária Expointer de 2003, em Esteio/RS, e saiu do pátio da fábrica da AGCO, em Canoas/RS, no dia 28 de setembro, percorrendo, até setembro de 2004, cerca de 83 cidades. O trator comemorativo 500 mil da série MF 500 mil viajou pelo Brasil e visitou os concessionários associados, onde ficou em exposição durante um dia, para os clientes terem a oportunidade de conhecer e tirar uma foto com ele. Nessa ocasião, a campanha promovia na comunidade uma mobilização para a doação de alimentos não-perecíveis, que foram entregues às entidades carentes. A cada 5 quilos de alimentos doados, o produtor rural que apresentasse sua inscrição, ganhava um cupom para concorrer a um trator da série 500 mil. O primeiro sorteio aconteceu em abril de 2004, na 82 Agrishow de Ribeirão Preto (SP) e o segundo ocorreu durante a Expointer 2004, no encerramento da campanha. Em maio de 2004, a AGCO doou outro trator para leilão, que foi arrematado por R$ 49 mil pela Covediesel - Comércio de Veículos Diesel, de Santa Rosa. O evento aconteceu durante a 15ª Fenasoja, em Santa Rosa, e teve transmissão ao vivo para todo o Brasil pelo Canal Rural. A renda também foi integralmente revertida ao programa de combate à fome do Governo Federal, com benefício direto às entidades assistenciais da região. A campanha analisada, segundo os profissionais da AGCO entrevistados, buscou prioritariamente reforçar a imagem da organização, ou seja, contribuir para que essa imagem fosse positiva na mente dos seus públicos. Este objetivo foi planejado a partir de uma campanha publicitária declaradamente institucional, que buscou atrelar a marca a ações socialmente responsáveis. Para alcançar este objetivo, a sugestão da AGCO para veiculação das peças da campanha concentrou-se em três veículos: anúncio para jornal ou revista, outdoor e rádio. No caso da campanha da AGCO, a Unimassey deixou a cargo de cada concessionária participante da campanha a decisão e o investimento de veicular as peças na mídia local. As peças analisadas, dois anúncios em preto e branco para revista ou jornal, um outdoor colorido e um spot de rádio, visavam motivar o público a participar da Caravana quando ela estivesse chegando na sua cidade, através do apelo da solidariedade e do combate à fome, conforme o contexto social em que o país se encontrava. 5.3 O CONTEXTO - PROGRAMA FOME ZERO 83 Considera-se relevante destacar o contexto nacional em que a empresa se situava no momento do lançamento da campanha em estudo, fazendo-se um relato sobre o programa Fome Zero, que, segundo os profissionais entrevistados, inspirou a criação da Caravana. O programa Fome Zero12 é um conjunto de políticas públicas lançado pelo governo federal visando garantir o direito à alimentação adequada a todos os brasileiros, priorizando as pessoas carentes. Fez parte das propostas da campanha presidencial de 2002 do Partido dos Trabalhadores, anunciado como prioridade de governo no primeiro discurso do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, na manhã seguinte à eleição. Em novembro de 2002, o Fome Zero foi submetido ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), em reunião realizada em Washington, nos Estados Unidos. Nessa ocasião, o diretor-geral da FAO, Jacques Diouf, declarou que esse projeto seria uma referência para as atividades daquele organismo em outros países. A iniciativa deste programa partiu do Instituto Cidadania, entidade independente e apartidária, fundada pelo presidente Lula há dez anos. Foi financiado com recursos da Fundação Djalma Guimarães, entidade vinculada à Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), do Grupo Moreira Salles. O projeto teve início em meados do ano 2000 e reuniu uma equipe com mais de 50 pesquisadores e colaboradores, entre os maiores especialistas do Brasil em políticas sociais, alimentação, nutrição e saúde. Num país como o Brasil, onde a fome e desnutrição formam um círculo vicioso e agravam a pobreza, o programa Fome Zero foi recebido com grande entusiasmo pela sociedade em geral. Sabe-se que o problema do país não é a falta de comida, mas a falta de 12 Todas as informações sobre o programa Fome Zero foram retiradas dos sites da Internet <http://www.fomezero.gov.br> e <http://www.fomezero.org.br>, acessados em 30 de novembro de 2005. 84 recursos financeiros para adquiri-los em quantidade permanente e com qualidade adequada. Como a renda no Brasil é indiscutivelmente mal distribuída, uma parcela da população não tem acesso nem mesmo à quantidade mínima de alimentos necessária para garantir a sua sobrevivência. Esta situação produz efeitos cumulativos e irreversíveis principalmente nas crianças, como a dificuldade de assimilação de conhecimento, a quebra da imunidade às doenças, o retardamento mental, a cegueira, os distúrbios glandulares (há crianças “gordas” em decorrência da fome), e até a morte precoce (de cada mil crianças nascidas vivas no Brasil, cerca de trinta e duas morrem antes de completar um ano de vida). Utilizando-se desses argumentos, o programa Fome Zero propôs um conjunto de políticas públicas que envolveram os três níveis de governo: o federal, o estadual e o municipal. Porém, percebe-se que a responsabilidade pelo êxito do programa foi claramente entregue à sociedade brasileira como um todo, conforme declaração do presidente Lula: Penso que o Brasil deu uma oportunidade a si mesmo. (O Fome Zero) não será um milagre de um presidente da República. Acho que será um milagre da sociedade brasileira. Se cada entidade empresarial, se cada pessoa que tenha alma, consciência política, neste país, resolver adotar essa campanha, o governo não precisa nem saber, porque não queremos paternidade do resultado. Se alguém na sua cidade, se alguém na sua vila, se alguém na sua comunidade quiser fazer alguma coisa, pelo amor de Deus, faça! Não fique esperando o governo! Faça, porque o que nós queremos não é ver a cor da semente, o que nós queremos é ver o resultado que essa semente vai dar, se a sociedade brasileira assumir para si a responsabilidade de acabar com a fome no nosso país.13 É pertinente destacar ainda, que o Programa Fome Zero foi pensado buscando a integração de três instâncias. A primeira, voltada às Políticas Estruturais, busca reverter as causas profundas da fome e da pobreza, e é desenvolvido pelo poder público. Possui os programas de Bolsa Família, Geração de Emprego e Renda, Previdência Social Universal, 13 BETTO, F. Cartilha da Mobilização Social do Fome Zero, disponível em: <http://www.fomezero.gov.br>. Acesso em: 30 nov. 2005. 85 Incentivo à Agricultura Familiar, Intensificação da Reforma Agrária, Sede Zero / Apoio ao Programa 1 Milhão de Cisternas, Segurança e Qualidade dos Alimentos. A segunda instância – Políticas Específicas – é voltada para atender diretamente às famílias carentes, no que se refere ao acesso ao alimento. Podem ser desenvolvidas pelos governos dos estados, dos municípios, e pela sociedade civil organizada através de doação de cestas básicas emergenciais, combate à desnutrição materno-infantil, restaurantes populares e cozinhas comunitárias, ampliação da merenda escolar, programa de distribuição de leite, ampliação do PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador), bancos de alimentos, manutenção de estoques de segurança, educação para o consumo e educação alimentar e nutricional, segurança e qualidade dos alimentos. Por fim, as Políticas Locais dizem respeito às prefeituras e à sociedade civil organizada de cada município, propondo apoio à agricultura familiar e à produção para consumo próprio. Nas pequenas e médias cidades, a sugestão é a criação de bancos de alimentos, parcerias com varejistas para doação de alimentos, feira do produtor, modernização dos equipamentos de abastecimento e agricultura urbana. Já nas cidades grandes, destaca-se a criação de restaurantes populares. Finalizando-se as abordagens apresentadas até este ponto, que serviram de embasamento e fundamentação para a pesquisa, parte-se para o desafio proposto de se compreender a comunicação no âmbito organizacional a partir de discursos publicitários. Neste momento, cabe a reflexão de que o caminho percorrido não se apresentava pronto, mas foi construído ao longo da trajetória, constituindo uma dentre tantas possibilidades vislumbradas no início e até mesmo durante este percurso. 86 6 APLICAÇÃO DA ANÁLISE: O ENCONTRO DE CHARAUDEAU COM A COMPLEXIDADE Para estudar os textos das peças da campanha em questão, foi utilizada a técnica de análise de discurso, a partir dos contratos de comunicação propostos por Charaudeau (1983), amparada pelo método do paradigma da complexidade proposto por Morin (2003). Optou-se por estes autores pela sua abordagem bastante abrangente e por terem sido já utilizados para análise de textos publicitários. Charaudeau (1983) apresenta um contrato de comunicação, onde o gênero lingüístico publicitário se inscreve em um circuito de trocas de bens de produção, com uma interação entre parceiros, conforme apresentado anteriormente. Como forma de coleta de dados para o estudo de caso, a entrevista simultânea com dois profissionais na empresa, foi conduzida de maneira espontânea, buscando construir uma conversa informal, e seguindo, na medida do possível, um roteiro de perguntas. O intuito do uso desse tipo de entrevista é corroborar certos fatos que já se acreditam terem sido estabelecidos. Este estudo de caso foi analisado a partir de duas das fontes de coleta de dados recomendadas por Yin (2005). A primeira foi a documental, que é constituída pelas peças da campanha, analisadas sob a ótica posposta por Charaudeau. A segunda é a entrevista com profissionais da AGCO, que auxiliou no momento de caracterizar a empresa e compreender as intenções desta com a campanha. Apesar de não ser este o propósito principal do estudo, realizou-se também uma breve leitura da imagem da peças publicitárias, segundo Barthes (1990) e Farina (2003), como complementação. 87 As técnicas propostas para a pesquisa, a análise semiolinguística do discurso segundo Charaudeau (1983) e o estudo de caso de Yin (2005), são ancoradas pelo método do paradigma da complexidade de Morin (2003), que sugere a superação dos limites impostos por uma metodologia tradicional, ao afirmar que nenhuma ação tem a garantia de ser previsível, e que as contradições são necessárias e convivem com uma permanente incerteza. Na medida em que sugere uma revisão no conceito do próprio método, impedindo que este se imponha como uma forma rígida, racional e reducionista a ser seguida, o paradigma da complexidade propõe aspectos metodológicos que buscam a construção do saber em um processo transdisciplinar contínuo. 6.1 A ANÁLISE DAS PEÇAS Aplicado à campanha Caravana 500 mil, o contrato de comunicação tem os seguintes elementos: Circuito externo: sujeitos psicossociais = Fome Zero Parceiros Circuito interno: interlocutores Massey Ferguson + Dez Propaganda EUc = Publicitário EUe Anunciador ELEx = Texto publicitário TUd Leitor = TUi Prováveis consumidores do trator Protagonistas ELEo - Trator MF500 mil Figura 5 - Contrato de comunicação publicitária – Campanha Caravana 500 mil pelo Brasil 88 Esse esquema mostra que o ato de linguagem se compõe de dois circuitos de produção de saber: -circuito interno, da fala configurada com seres de fala criados à imagem de sujeito que enuncia (EUe) e de sujeito destinatário (TUd). -circuito externo à fala configurada com sujeitos reais que agem e são instituídos à imagem do sujeito comunicante (EUc) e dos sujeitos que interpretam o anúncio (TUi). Na análise do circuito, percebe-se que, de um lado encontra-se a marca MF, que contratou uma agência de publicidade para conceber uma campanha. Juntas, a Massey Ferguson e a agência, são parceiras que compartilham o mesmo espaço no circuito de linguagem (base de construção do discurso publicitário), e estão ligadas por contratos de interesses em torno do valor no mercado do trator que elas oferecem implicitamente, representado o EUc que é transformado em EUe. Do lado oposto do circuito está o público-alvo da campanha, que, ao adquirir um trator, completa a relação entre a persuasão estabelecida no texto do anúncio, e o ato de compra do produto, representando o TUd transformado em TUi. Esse procedimento evidencia que o indivíduo foi convencido a usar o trator anunciado, o que completa o circuito de trocas ilustrado na figura 5. O enunciador (EUe) é o sujeito responsável pela fala dos enunciados do texto e não se revela como publicitário, pois tem o papel de apresentador do discurso sobre o trator da marca MF, enaltecendo suas qualidades e vantagens sobre a concorrência. O destinatário (TUd), ou leitor do texto publicitário não é designado previamente como consumidor; mas é tido como um sujeito vulnerável a tudo o que é dito sobre o produto anunciado, como o apelo à solidariedade evidente na chamada: “A Massey Ferguson vai bater recorde de solidariedade”. 89 O autor chama este sujeito de utilizador eventual do produto, ou seja, um possível consumidor do trator MF 500mil. A partir das asserções de Charaudeau (1983) sobre a organização discursiva, a ênfase da análise será na enunciação, embora também se façam leituras das formas argumentativa e narrativa ao longo do capítulo, ainda que de maneira menos densa. Optou-se pela enunciação por se considerar este o tipo de organização discursiva que permite maior visualização do duplo sentido das mensagens existentes na campanha analisada. Todas as peças analisadas estão inseridas em tamanho ampliado no anexo A, para uma melhor visualização das mesmas, porém, considerou-se pertinente inserir as peças gráficas também no corpo do trabalho para facilitar a compreensão da análise: Figura 6 - Anúncio 1. TÍTULO TEXTO Vamos passar como um trator por cima da fome. A Massey Ferguson vai pegar a estrada rumo a um Brasil sem fome. É a Caravana 500 mil pelo Brasil que vai levar solidariedade a todos os cantos do país, através de nosso grande orgulho: o trator 500 mil. Ele vai rodar o país inteiro arrecadando alimentos para comunidades carentes. Participe. Quando o trator estiver na concessionária da sua cidade, passe lá e doe alimentos não-perecíveis. Assim, você ajuda a combater a fome e ainda conhece de perto o novo recorde da Massey. Quadro 4 - Anúncio 1. O anúncio 1 tem formato retangular, conhecido como “rodapé”, utilizado para ocupar a parte inferior de jornais ou revisas. Em tons de cinza e preto, é composto por um título, em destaque, no canto superior direito, disposto em duas linhas. O texto está logo abaixo em tamanho reduzido, alinhado ao título. A imagem do trator está em primeiro plano, ocupando 90 toda a metade esquerda do anúncio. Como pano de fundo desta estrutura, encontra-se a imagem de um mapa rodoviário. Assinando a peça, estão três logotipos dispostos no canto inferior direito, da esquerda para a direita: logotipo da campanha Caravana 500 mil pelo Brasil, brasão comemorativo ao alcance dos 500 mil tratores da marca MF produzidos no país e logotipo da marca MF. Figura 7 - Anúncio 2. TÍTULO TEXTO A Massey Ferguson vai bater recorde de solidariedade. Depois de bater seu recorde com a produção de 500 mil tratores, a Massey Ferguson está pronta para um novo desafio: rodar o Brasil levando solidariedade a todos os cantos do país. É a caravana 500 mil pelo Brasil. O trator 500 mil vai pegar a estrada e arrecadar alimentos para comunidades carentes.Participe. Quando o trator estiver na concessionária da sua cidade, passe lá e doe alimentos não-perecíveis. Assim, você ajuda a combater a fome a ainda conhece de perto nossa nova conquista. Quadro 5 - Anúncio 2. O anúncio 2 tem formato quadrado, e é chamado do meio publicitário de “meiapágina”. Também tem tons de cinza e preto e é composto por um título em destaque, disposto em duas linhas, e ocupa toda a parte superior do anúncio. Alinhado ao título, o texto está logo abaixo em tamanho reduzido. A imagem do trator está em primeiro plano, ocupando a metade 91 inferior esquerda do anúncio, que também tem como pano de fundo a imagem do mapa rodoviário e os mesmos três logotipos de assinatura. Figura 8 - Outdoor. O outdoor tem formato retangular, e é a única peça gráfica colorida. Por suas características de veículo de rápida visualização, possui apenas uma frase: “Vamos passar como um trator por cima da fome”, que é a mesma frase do título do anúncio 1. A frase está destacada na parte superior direita da peça, tendo ao lado a imagem do trator, na sua cor original, que ocupa todo o lado esquerdo do outdoor. Assim como a imagem do mapa, também estão presentes os três logotipos das outras duas peças gráficas. Já o spot, por não ter características gráficas, será analisado apenas enquanto texto. Também não serão consideradas suas características de áudio. O texto do spot é composto pelas seguintes frases: “Venha juntar-se ao trator 500 mil e ajudar a combater a fome no país. É a Caravana 500 mil pelo Brasil que vai levar solidariedade a todos os cantos do país. Basta trazer alimentos não perecíveis e se preparar para esta grande comemoração solidária. E, logo, ela vai chegar aqui em nossa cidade. Esperamos você e sua família. De___a___de____na concessionária___________”. Cabe destacar que o tema da campanha, que, segundo o profissional 1 é “um trator contra a fome”, está presente em todas a peças analisadas, demonstrando a unificação desta 92 mensagem de solidariedade vinculada ao produto trator. A partir das quatro peças apresentadas foi feita uma leitura global do discurso publicitário da campanha. 6.1.1 Organização enunciativa Os textos nas peças da campanha apresentam sobreposição de vozes que interagem com enunciações dirigidas aos destinatários de maneira ora explícita, quando usa verbos no imperativo, ora implícita, quando aparece como o narrador de uma história. Percebe-se que esta polifonia presente nos textos é construída a partir da união de duas vozes enunciativas. Para facilitar a análise do ponto de vista da enunciação, as frases dos textos das peças da campanha foram separadas no quadro 6 conforme seu comportamento enunciativo, que, com base na abordagem de Charaudeau (1983), se constatou ser do tipo alocutivo e delocutivo. O primeiro tipo é claramente objetivo e dirige-se ao destinatário de maneira explícita, através do emprego de verbos no imperativo, em primeira pessoa e pronomes possessivos, enquanto o segundo tipo é subjetivo e fala implicitamente ao destinatário, que também se apresenta oculto. Neste jogo polifônico, as duas vozes aparecem intercaladas nas peças da campanha analisada. Contatou-se que os dois anúncios e o spot possuem este caráter polifônico ao longo do texto, a exceção é o outdoor, que, por ter apenas uma frase em sua estrutura discursiva, possui um único comportamento enunciativo. 93 PEÇAS Anúncio 1 FRASES ALOCUTIVAS Vamos passar como um trator por cima da fome. (título) Participe. Quando o trator estiver na concessionária da sua cidade, passe lá e doe alimentos nãoperecíveis. através de nosso grande orgulho: o trator 500 mil. FRASES DELOCUTIVAS A Massey Ferguson vai pegar a estrada rumo a um Brasil sem fome É a Caravana 500 mil pelo Brasil que vai levar solidariedade a todos os cantos do país, Assim, você ajuda a combater a fome e ainda Ele vai rodar o país inteiro arrecadando conhece de perto o novo recorde da Massey. alimentos para comunidades carentes. Participe. Anúncio 2 Outdoor Spot A Massey Ferguson vai bater recorde de solidariedade. (título) Quando o trator estiver na concessionária da Depois de bater seu recorde com a produção de sua cidade, passe lá e doe alimentos não- 500 mil tratores, a Massey Ferguson está perecíveis. pronta para um novo desafio: rodar o Brasil levando solidariedade a todos os cantos do país. É a caravana 500 mil pelo Brasil. Assim, você ajuda a combater a fome a ainda O trator 500 mil vai pegar a estrada e conhece de perto nossa nova conquista. arrecadar alimentos para comunidades carentes. Vamos passar como um trator por cima da ____________________________ fome. Venha juntar-se ao trator 500mil e ajudar a A Massey Ferguson está na estrada rumo a um combater a fome no país. Brasil sem fome. Basta trazer alimentos não perecíveis e se É a Caravana 500 mil pelo Brasil que vai levar preparar para esta grande comemoração solidariedade a todos os cantos do país. solidária. E, logo, ela vai chegar aqui em nossa cidade. De___a___de____na Esperamos você e sua família. Juntos, vamos passar como um trator por cima concessionária___________. da fome. Quadro 6 - Frases das peças da campanha Na análise do quadro 6, percebe-se que as peças possuem textos polifônicos, ou seja, possuem “marcas” que evidenciam diferentes comportamentos enunciativos num mesmo texto. Estes comportamentos são as formas de linguagem que o locutor se apropria para referir-se a si mesmo (EU) e a seu interlocutor (TU), que nas peças mostraram ser do tipo alocotivo e delocutivo. Percebe-se que o texto publicitário dos anúncios da campanha possui nos títulos um comportamento delocutivo, sendo que ao longo dos enunciados o comportamento muda para o alocutivo e permanece assim até o final do texto publicitário. 94 A seguir, serão analisadas as frases da campanha, separadas no quadro 6 conforme seu comportamento enunciativo. 6.1.1.1 Comportamento Alocutivo O comportamento alocutivo utiliza-se da fala direta ao TUd, o sujeito assume a responsabilidade de falar no mesmo instante em que solicita a participação do destinatário, incitando-o a algo, ao usar o tempo verbal imperativo. Neste comportamento, o efeito é transformar definitivamente o leitor do anúncio em um potencial consumidor do trator, identificando-se com uma imagem ideal de destinatário, em que será o beneficiário ao comprar o trator da MF. O tempo verbal imperativo presente no exemplo “Participe” explicita o caráter persuasivo e a intenção de venda, tentando convencer o destinatário a participar da campanha. A presença do destinatário é destacada na medida em que ele é o indivíduo que vai ser convencido a comprar o produto anunciado. O enunciador se apresenta como um conselheiro, e propõe um contrato de confiança ao destinatário. Este comportamento é característico do tipo alocutivo, que marca a presença do destinatário no texto, o que não acontece no tipo delocutivo, onde este se encontra oculto. O leitor é convidado a participar da campanha de solidariedade e “passar na concessionária” de sua cidade para levar os alimentos, onde estarão expostos os produtos da MF, conforme a frase: Quando o trator estiver na concessionária da sua cidade, passe lá e doe alimentos não-perecíveis. 95 Já o uso do pronome “nosso” demonstra que o enunciador se anuncia em nome da Massey Ferguson, revelando-se responsável pelo que afirma sobre as qualidades desta marca: [...] através de nosso grande orgulho: o trator 500 mil. O uso deste pronome e os verbos em primeira pessoa induzem a união entre a voz delegada e a voz que delega, situando-as no mesmo universo de referência, para que, ao lerem o texto, os sujeitos representados sejam capazes de se identificar como grupo privilegiado e testemunhas do anunciante, levando à compra do trator. Também se verifica esta característica nos exemplos abaixo: Venha juntar-se ao trator 500 mil e ajudar a combater a fome no país. Vamos passar como um trator por cima da fome. Nessas frases, a MF confere credibilidade ao que é dito, pois traz o leitor do anúncio, possível consumidor, para junto de si, colocando-o ao lado da empresa para realizar a campanha de solidariedade. Agenciando elementos simbólicos como “500 mil”, “novo recorde”, “grande orgulho”, ela transforma o produto, já dotado de valor comercial, em objeto de desejo, diferenciando-o da concorrência e singularizando sua posição no Brasil. Já nas frases em que o anunciador se dirige diretamente ao destinatário, é possível perceber o vínculo que a empresa quer manter com o possível consumidor do trator: Assim, você ajuda a combater a fome a ainda conhece de perto nossa nova conquista. Basta trazer alimentos não perecíveis e se preparar para esta grande comemoração solidária. 96 Nestas frases percebe-se que o enunciador convoca o leitor na participação da campanha proposta pela empresa, que visa mostrar que a Massey Ferguson, e, conseqüentemente, a AGCO, estão preocupadas com projetos que envolvem o acesso aos alimentos pela população. Esses trechos também situam o destinatário como responsável pelos problemas sociais do país, convocando-o a ajudar no combate à fome. Esperamos você e sua família. Juntos, vamos passar como um trator por cima da fome. O envolvimento da família do destinatário na campanha demonstra a preocupação da empresa em se mostrar, ela própria, como uma grande família solidária. Na medida em que a MF utiliza a metáfora de “passar como um trator por cima da fome”, o trator é considerado como capaz de passar a combater a miséria de muitas famílias, gerada pela fome. Esta associação deve-se ao uso deste equipamento como ferramenta principal para o desenvolvimento agrícola do país. O trator é o veículo que lavra a terra para produzir alimentos, e conseqüentemente, combater a fome. O enunciador aparece como agente das ações descritas e se determina como benfeitor, para incitar o destinatário, mesmo que não seja solicitado explicitamente, a se considerar como beneficiário das vantagens que o trator oferece. Tal estratégia busca ocultar o intuito comercial presente na campanha. 97 6.1.1.2 Comportamento Delocutivo Através da impessoalidade, este tipo de comportamento mostra marcas de distanciamento no momento em que o enunciador deixa de ser o sujeito empírico e assume o papel de narrador dos fatos. Neste tipo enunciativo, o anunciador EUe – a Massey Ferguson – está em segundo plano, e se faz passar por um apresentador que anuncia algo. O destinatário TUd – o leitor do anúncio – também não é solicitado explicitamente, sendo apenas um espectador-testemunha. O efeito deste tipo enunciativo é fazer com que o sujeito interpretante do anúncio comece a se identificar com o possível comprador do trator, despertando uma carência em relação ao mesmo. O texto oculta também a verdadeira agente da solidariedade, que é a comunidade, pois a empresa anunciante não irá doar alimentos, e sim os participantes que aderirem à campanha, conforme a frase: A Massey Ferguson vai bater recorde de solidariedade. Em todas as frases deste tipo enunciativo percebe-se que o anunciador está apenas contando um fato extraordinário sobre a empresa, que é a produção recorde de tratores, e anunciando algo de bom que a empresa irá realizar, ou seja, rodar o Brasil levando solidariedade a todos os cantos do país. O recorde a que a empresa se refere, tem duplo sentido, pois está relacionado ao combate à fome e à produção de 500 mil tratores, conforme as frases a seguir: Depois de bater seu recorde com a produção de 500 mil tratores, a Massey Ferguson está pronta para um novo desafio: rodar o Brasil levando solidariedade a todos os cantos do país. 98 É a Caravana 500 mil pelo Brasil que vai levar solidariedade a todos os cantos do país. Ele vai rodar o país inteiro arrecadando alimentos para comunidades carentes. O trator 500 mil vai pegar a estrada e arrecadar alimentos para comunidades carentes. Também nestas frases é possível perceber que o enunciador do texto assume a narrativa como um contador de estórias, falando subjetivamente para o destinatário sobre a grande produção de tratores da empresa, causando neste uma situação de falta não só de ser solidário, mas também do trator. Nestes exemplos, não se encontram vestígios de um falar direto a um parceiro qualquer, mas a um destinatário específico chamado a considerar a obtenção de um resultado – o recorde de produção de tratores –, a partir da procura do bem que é anunciado implicitamente – o trator. Tal destinatário não é solicitado explicitamente pelo enunciador, que não o designa como consumidor, mas deixa a entender que o considera um sujeito suscetível a tudo o que é dito sobre o trator e a empresa, e lhe atribui o papel de “utilizador eventual”. A enunciação se processa dentro dessas condições de produção, quando o enunciador, interagindo com o sujeito para quem o discurso está voltado obtém do processo um produto discursivo. Este tipo enunciativo substitui, então, o discurso argumentativo pela descrição de ações e qualidades do trator, como ser capaz de rodar o Brasil inteiro levando solidariedade a cada canto do país, na tentativa de envolver o provável comprador com as singularidades do trator. 99 As mensagens provocam ainda o desejo de ser solidário. O leitor do anúncio e eventual consumidor dos produtos anunciados é então incitado a se identificar com o modelo de solidariedade para também se engajar no combate à fome. Assim, o enunciador destas frases faz referência à vida cotidiana da sociedade no momento em que a campanha está veiculando, concomitante com o lançamento do programa Fome Zero, colocando em cena universos de referência circunscritos ao espaço do país, como se observa no exemplo: A Massey Ferguson vai pegar a estrada rumo a um Brasil sem fome. As mensagens põem em evidência não só a solidariedade, mas o sucesso dos 500 mil tratores produzidos no Brasil e colocados no mercado, marcando sua intenção objetiva e comercial: o fazer comprar. Este aspecto de venda fica oculto, envolto em procedimentos que têm por função destacar a participação da empresa em projetos sociais, valorizando seu objetivo filantrópico. Os argumentos dos anúncios são apresentados de modo impessoal, pois não há, ao longo dos textos, marcas verbais ou pronominais de primeira pessoa. Esta ausência mostra que o enunciador fala de si mesmo, não como sujeito explícito, mas como uma terceira pessoa com quem pretende que o sujeito interpretante se identifique. A finalidade dessa enunciação é captar o sujeito interpretante, seduzindo-o, para que, ao se identificar com a marca Massey Ferguson, sinta-se induzido a comprar o trator, contribuindo com o sucesso da campanha e as metas da empresa. 100 6.1.2 Organização argumentativa A organização argumentativa do discurso publicitário é estruturada a partir de uma proposta, de uma proposição e de um ato de persuasão. A proposta do texto publicitário é representada pelo trator da marca Massey Ferguson, que, combinado com suas qualificações, alcançará um resultado, conforme ilustrado na figura 9. Aplicando-se a fórmula da figura 4 à campanha: A Massey Ferguson × (P(M)) tem uma nova conquista (500 mil tratores) e está pronta para um novo desafio ⇒ vai bater recorde de solidariedade com a Campanha Caravana 500mil (q) (R) Figura 9 - Proposta do discurso argumentativo. Percebe-se que R está presente em todas as peças da campanha e, segundo Charaudeau (1983), estará sempre presente, mesmo que implicitamente, pois é o que incita no leitor o desejo de compra. Neste elemento, estão presentes duas palavras de significados relevantes: recorde e solidariedade. A partir destas palavras pode-se inferir que se trata de uma organização de grande porte, capaz de bater recordes. Ao vincular a palavra solidariedade ao nome da empresa, o anúncio também possibilita a conclusão de que a Massey Ferguson busca manter ou criar uma imagem de empresa socialmente responsável. A proposição, por sua vez, convoca o destinatário a perceber que bater recorde de solidariedade (através do trator 500 mil) é seu objeto de busca e está claramente presente na frase: 101 Assim, você ajuda a combater a fome a ainda conhece de perto nossa nova conquista. Já a persuasão é percebida a partir das objeções “você não pode não querer bater recorde de solidariedade” e “somente o trator da Massey Ferguson permitirá que você bata recorde de solidariedade” e está presente na frase: Venha juntar-se ao trator 500 mil e ajudar a combater a fome no país. Esta frase demonstra nitidamente o argumento da campanha de que para combater a fome e ser solidário, o destinatário precisa associar-se ao trator. 6.1.3 Organização narrativa A organização narrativa do texto publicitário, proposta por Charaudeau (1986), pode ser aplicada às peças da campanha da seguinte maneira: • O sujeito tem um falta ⇒ a solidariedade (e o trator) • O sujeito busca suprir esta falta ⇒ vai à concessionária e participa da campanha • A falta é suprida ⇒ compra o trator e doa alimentos, tornando-se solidário Assim, bater recorde de solidariedade (ser solidário, ajudar a combater a fome) representa algo que as pessoas não conseguiriam sem o trator. Ao ler o anúncio, o destinatário se conscientiza que tem esta falta e parte em busca de algo para supri-la. O trator representa um meio de ajudar o destinatário a satisfazer esta necessidade. 102 A falta que o leitor sente ao ler o anúncio é ser solidário. Esta falta será suprida no momento em que o leitor identificar-se com a campanha, a partir do contexto social do programa Fome Zero e realizar a transação comercial, tornando-se também solidário. A ênfase na palavra solidariedade demonstra que a empresa não só busca para si a imagem de solidária, mas convida o público a participar também, fazendo a sua parte através da doação de alimentos para entidades carentes. Esta palavra pode demonstrar um desejo de vínculo com o público, estreitando o relacionamento organização-público, como participantes de uma campanha em que é buscado o mesmo objetivo: combater a fome dos miseráveis do país. 6.1.4 Relação da imagem com o texto Como todas as peças de mídia impressa da campanha são ilustradas, constatou-se a necessidade de se analisar os estímulos visuais. Contudo, foi feita apenas uma leitura complementar e não exaustiva, pois a complexidade dos textos dos anúncios e da técnica de Charaudeau (1983) exigiu um recorte com vistas aos discursos publicitários. Elegeu-se Barthes (1990) como base para esta etapa por ser um dos pioneiros a optar pela utilização da imagem publicitária como campo de estudo para a semiologia. Para o autor, a imagem publicitária revela três tipos diferentes de mensagens, uma de teor lingüístico, e duas de teor icônico. Como o teor lingüístico das peças publicitárias já foi analisado sob a perspectiva de Charaudeau, a perspectiva de Barthes auxiliou na leitura das imagens icônicas. A imagem do trator sobre um mapa, também presente nas três peças gráficas, remete novamente ao trator viajando pelo país, o que demonstra uma relação de “ancoragem” (BARTHES, 1990), na medida em que a imagem identifica elementos presentes no texto e 103 complementa o sentido deste, apresentando uma íntima ligação com o que o texto diz. A frase “vamos passar como um trator por cima da fome”, está ancorada na imagem do trator em cima do mapa, que demonstra a intenção da empresa em rodar o país arrecadando alimentos para bater o recorde de solidariedade. Quanto à denotação percebem-se alguns aspectos de estrutura. Nos dois anúncios, deduz-se que a chamada tem mais importância que o resto do texto, pois está em caixa alta e em um tamanho muito maior em relação ao parágrafo seguinte. No anúncio 2 o texto está acima da imagem, induzindo a uma maior evidência na chamada, que ocupa toda a extensão lateral do anúncio. Em todas as peças, o trator aparece em primeiro plano, em local privilegiado, revelando seu caráter de produto anunciado, seguindo a estrutura de um anúncio comercial. Ainda sobre a denotação, se a campanha é institucional, seria mais admissível que a foto mostrasse um saco de arroz, por exemplo, ou uma foto de uma cesta básica. Mas o que aparece em todas as peças é o trator 500 mil, o produto que a empresa vende. As peças apresentam ainda três imagens dispostas no canto inferior direito: o logotipo da campanha Caravana 500 mil pelo Brasil, o brasão dos 500 mil tratores e o logotipo da Massey Ferguson, que assinam a campanha. Já a conotação pode ser relacionada com as cores que têm presença relevante no outdoor – a única peça gráfica colorida da campanha –, como o vermelho do trator e dos logotipos, o preto do texto e o cinza do mapa. O vermelho é a cor de todos os tratores da marca MF. Segundo os profissionais entrevistados, no mercado de tratores, cada empresa utiliza uma cor única em todos os seus produtos, e o vermelho é a cor associada à MF. Esta associação está clara nas palavras do profissional 1: “... o cara já vai começar a ver o vermelho, a ver o Massey...”. 104 O logotipo da campanha traz um trator vermelho estilizado, inclinado, dando a idéia de que está em movimento. É associado ao logotipo da MF, que também é vermelho e faz referência explícita ao trator 500 mil. A cor vermelha, conforme Farina (2003), transmite paixão, que pode ser interpretada como o orgulho que a empresa tem de ter alcançado a produção de 500 mil tratores. Além disso, por ser considerada vibrante, o vermelho está ligado à motivação que resulta na ação da compra. Já o brasão que foi confeccionado para marcar as comemorações do alcance do meio milhão de tratores fabricados no Brasil foi aplicado a toda uma série de tratores produzidos no ano de 2003. Foi também alvo de muitas reproduções, inclusive de um chaveiro dourado que foi entregue pelos profissionais da empresa no momento da entrevista. As cores do brasão remetem à bandeira do Brasil, e sua aplicação nos tratores MF, que são vermelhos, remete também às cores da bandeira do Rio Grande do Sul. Esta associação pode demonstrar uma intenção de vinculação com este estado, que sedia as fábricas da empresa. Além disso, o brasão também se relaciona com o logotipo do programa Fome Zero, na medida em que ambos apresentam as cores predominantes do símbolo nacional, o verde e amarelo. Todas essas associações demonstram a intenção da empresa em vincular o seu produto, o trator, ao projeto social do governo, caracterizando o objetivo institucional e socialmente responsável que foi aplicado às peças. Contudo, a leitura da imagem também revelou que esta “essência institucional” oculta um caráter mercadológico, complementando a discussão da análise dos textos. 105 6.2 ANÁLISE DAS FALAS – ENTREVISTA Segundo Yin (2005), a entrevista é um importante meio de coleta de dados nos estudos de caso, é uma fonte essencial de informações. Neste sentido, a entrevista com os profissionais da AGCO foi conduzida de maneira a deixar que eles se sentissem livres e até confidentes para reproduzirem as reais intenções da empresa com a campanha. O principal propósito desta entrevista foi, através de uma conversa espontânea e informal, corroborar o fato, que já havia sido comprovado pela análise das peças, de que a campanha tinha, além do seu caráter explícito de ação socialmente responsável, o intuito da venda. A reprodução completa das falas encontra-se no anexo B. Foram selecionados alguns trechos das falas dos profissionais entrevistados (por questões éticas, foram identificados apenas como profissional 1 e profissional 2) para análise, a partir da abordagem da organização discursiva enunciativa de Charaudeau (1983). Embora a análise das falas não seja a preocupação principal deste estudo, considerou-se estes trechos relevantes para se conhecer os objetivos da empresa com a campanha Caravana 500 mil. Percebe-se o entendimento do profissional 1 sobre a campanha através da seguinte fala: quando começou a se aproximar a execução, a montagem do trator 500 mil, a turma de marketing e a diretoria da empresa, em uma série de reuniões, definiu que isso era um grande momento, com um ano antes de antecedência a gente já estava vislumbrando que esse seria um grande momento. Então se pensou em várias coisas. E a coisa que mais se configurou em termos de produto, em termos de marco para isso era pegar o nosso trator mais vendido, o nosso best-seller, o mais conhecido, o mais premiado, enfim, que era o 275 e transformar esse trator em que saísse um 275 da linha para ser celebrado, comemorado, porém um 275 estilizado, único. 106 O trecho apresenta um discurso polifônico, pois, no início, o enunciador se posiciona como um narrador de uma história, contando como surgiu a idéia de comemorar os 500 mil tratores produzidos no país, caracterizando um comportamento delocutivo. Em seguida, o trecho adquire um teor alocutivo, através do uso do pronome nosso, posicionando-se como representante da empresa. Percebe-se que o profissional 1 da empresa considera o trator 500 mil, o produto da empresa presente nas peças da campanha, realmente um produto de bastante valor, um grande marco, digno de merecer uma grande divulgação. Neste trecho está explícito que a campanha surgiu para divulgar o trator e o alcance de produção, portanto, até este ponto, a empresa não pensava em uma campanha institucional, mas sim mercadológica. Este intuito mercadológico está presente também na seguinte fala do entrevistado: Então a Unimassey que é a associação dos revendedores Massey Ferguson comprou o trator por 200 mil reais...A Unimassey com essa relíquia nas mãos tinha que faturar em cima disso. E ela fez esse trator percorrer por todas as suas afiliadas, a menos que alguma não quisesse, por estar num lugar muito longínquo, mas ela deu uma circulada legal pelo Brasil todo. Esta fala de comportamento delocutivo, demonstra o objetivo primeiro da Caravana, que era percorrer as revendedoras MF para promover a venda de tratores. A partir daí o segundo entrevistado, chamado de profissional 2, apresenta sua visão, que, em parte, reflete o pensamento do profissional 1 da empresa e é, em parte, contraditória: o trator nada mais é do que uma máquina que foi desenvolvida para produzir alimentos, isso foi uma forma simbólica de resgatar qual a função social do trator, e valorizar as pessoas que estão envolvidas com esse negócio. A intenção social da campanha está clara neste trecho, no momento em que o profissional 2 deseja valorizar as pessoas envolvidas com o campo. Novamente o comportamento delocutivo se apresenta neste trecho através da impessoalidade. 107 Quando solicitado sobre os objetivos da campanha Caravana 500 mil, o profissional 2 proferiu a seguinte fala: é aquela coisa da responsabilidade social,...a empresa fica mais valorizada perante a comunidade [...] por isso que a gente saiu do Fome Zero, que é uma coisa muito federal, e nessa época o Fome Zero estava começando a ser muito questionado também, por ser um programa muito demagógico. Então a gente resolveu fazer uma carreira solo. Também quando tu entras no Fome Zero, tu perdes o controle de pra onde vão as doações [...] assim se prestigiam as entidades locais [...] O concessionário tinha total liberdade para escolher as entidades locais, e juntavam políticos, autoridades. Isso cria uma imagem positiva da marca, uma boa vontade das pessoas com aquela marca [...] mais cedo ou mais tarde, o mercado responde a isso. [...] o foco aqui (na Caravana) foi o cliente Massey, o cara que tem o nosso trator, gosta da marca, para o cara sentir orgulho, tirar foto da família com o trator...Isso é um cara que já tem uma vinculação com a marca, a gente quer alimentar sempre isso. Portanto, está claro que o entrevistado percebe a campanha como uma ação de responsabilidade social, com fins sociais. Entretanto, o objetivo final de valorizar a empresa perante a comunidade também é destacado. A intenção de venda está explícita em dois momentos dos trechos. O primeiro, quando o entrevistado afirma que o mercado acaba respondendo a uma ação institucional, e a segunda quando se admite que o público que a empresa quer atingir é o consumidor do trator. A partir da concepção de comunicação institucional dos autores aqui citados, é possível verificar que a campanha Caravana 500 mil é realmente uma ação de comunicação institucional, na medida em que visa vincular a marca da empresa a um programa solidário, como o Fome o Zero, mas assume, de maneira dissimulada, um caráter de ação mercadológica a partir do momento em que a foto do produto da empresa, o trator, está em primeiro plano. Também nas mensagens do texto o destaque é o produto da empresa, o trator que “passa por cima da fome”. As marcas no texto também evidenciam o intuito da venda, como a solicitação 108 para que o leitor passe na concessionária, ponto de venda, para doar os alimentos, onde o possível consumidor será envolvido e induzido à compra. Neste sentido, entende-se que a complexidade, a partir dessas diversas contradições, está presente em todo o desenrolar da análise, seja no estudo do discurso publicitário nas peças da campanha, seja nas falas dos entrevistados. Os princípios da dialógica, da recursividade, e da hologramática, mostraram-se inerentes ao discurso publicitário. No circuito do contrato de comunicação proposto por Charaudeau (1992), aplicado no transcorrer de toda a análise, encontra-se o princípio dialógico, em que os diversos sujeitos trocam de papéis de maneira contínua, representando também o princípio da recursividade. A hologramática, por sua vez, vai ao encontro do conceito de comunicação integrada, na medida em que não pode ser separada em institucional e mercadológica. Ao se adotar o pensamento complexo de Morin (2000) para nortear a pesquisa, foi possível estender o trabalho de análise para além dos aspectos da lógica determinista, construindo um caminho que vislumbra trajetórias paralelas e convergentes. 109 CONSIDERAÇÕES FINAIS No momento em que a caminhada aproxima-se do fim, percebe-se a possibilidade de outras abordagens, na medida em que se toma consciência da circularidade presente na trajetória percorrida à luz do pensamento complexo. Contudo, o foco no objeto de estudo permitiu que se mantivesse o caminho projetado, construído através de abordagens tanto complementares quanto divergentes. O aporte teórico dos capítulos iniciais permitiu a sustentação da análise e a preparação para uma discussão de múltiplas facetas. Charaudeau (1983), através da sua análise de discurso, contribuiu para demonstrar como a linguagem publicitária está estruturada, e como ela depende de seus contextos para ser interpretada. A abertura necessária à transdisciplinaridade mostrou-se pertinente num momento em que o papel da publicidade, como instrumento econômico e social, adquire maior relevância. Cada vez mais as organizações estão trocando a publicidade de seus produtos e suas respectivas qualidades intrínsecas pela publicidade de sua marca relacionada a uma imagem positiva junto ao público consumidor. Ou seja, as pessoas tendem a escolher entre as marcas anunciadas não pela funcionalidade de seus produtos, mas pela imagem atrelada a cada marca, a partir do momento em que o destinatário identifica-se com ela. Neste sentido, a publicidade atua como criadora de identidades, evidenciando figuras e significações dentro do espaço social. Na campanha analisada, o benefício oferecido pelo discurso publicitário é representado pela solidariedade, um valor subjetivo que se inscreve no contexto social do país, induzindo seus destinatários a se identificarem com a empresa. Ao mesmo tempo, essa 110 subjetividade é relacionada a um objeto concreto, o trator, o que constitui uma maneira de “fazer crer” que o desejo de cada pessoa pode encontrar a sua concretização na apropriação de um objeto material. As peças da campanha apresentam características polifônicas, que têm a finalidade de levar o destinatário a identificar-se com o mundo imaginário criado pela publicidade. A mensagem da campanha faz referência a um acontecimento social a nível nacional, como o combate à fome, apresentando uma situação compartilhada com a sociedade, revelando, em parte, a vida cotidiana e, em parte, o mundo ficcional. O discurso publicitário mostrou-se, então, revelador de diferentes possibilidades de interpretação, na medida em que oculta a intenção da venda. Charaudeau (1983) permite a compreensão do projeto de fala do enunciador, que pretende transformar o leitor de anúncios em consumidor efetivo de mercadorias. Essa transformação ocorre quando o publicitário oculta sua fala direta, apresentando-se como interessado apenas no bem-estar do consumidor, seduzindo-o com apelos subjetivos. O sujeito consumidor também está implícito, oculto por uma imagem de sujeito destinatário que deve estar interessado não no produto, mas no que ele oferece. Ele é, portanto, chamando a se colocar no local de agente de uma busca cujo objeto não é compra de um produto, mas a imagem de um objeto de desejo, ou seja, a identificação. A análise permitiu enxergar esses objetivos tácitos, através da transformação dos sujeitos do circuito interno do contrato de comunicação em sujeitos reais do circuito externo, os produtores da publicidade. Essa concepção, amparada pelo paradigma da complexidade, permitiu a análise do discurso publicitário, não como uma enganação, mas como uma organização circular e contraditória, a partir dos três princípios de Morin (2002) que embasaram a análise. 111 Já na análise da imagem, o que aparece em primeiro plano nas peças é o trator estilizado, ou seja, o produto final da empresa, que está presente também no logotipo da campanha. O apelo da campanha é combater a fome, mas em nenhum momento aparecem imagens de alimentos ou de pessoas carentes se alimentando. Metodologicamente encarou-se o desafio de analisar a campanha à luz do paradigma de Morin, na medida em que este pressupõe a incerteza. Este método foi pertinente pela sua capacidade de conceber a dualidade da organização, reunindo, contextualizando, globalizando, e ao mesmo tempo reconhecendo o singular, o concreto, individualizando. Tanto o caráter dialógico, quanto o recursivo e o hologramático, propostos pelo paradigma da complexidade, proporcionaram o entendimento de que o discurso publicitário é contraditório, e que esta é sua essência. A publicidade cria um mundo imaginário propositalmente, pois toda a publicidade visa ocultar o objeto de venda. Na análise da campanha foi possível perceber, por exemplo, que o novo trator deve ser um produto bom, pois se subentende que será capaz de atravessar o Brasil, rodando pelas estradas e arrecadando alimentos. Além disso, o anúncio traz a foto do próprio trator, ou seja, mesmo sendo uma campanha institucional, a empresa está também divulgando o produto. A associação destas idéias de Morin à campanha está presente em diversos momentos na contextualização que a empresa faz ao vincular-se ao tema atual da fome, através do Programa Fome Zero do governo federal. A empresa usa desta oportunidade, deste “gancho” nacional, para sensibilizar o público de todo o país, mas não deixa de alcançar seu objetivo final, concreto, que seria a divulgação do produto, o trator MF 500 mil. Através da chamada e do texto, as peças repetem várias vezes a mesma mensagem, mensagem esta que é também representada pela imagem do trator sobre o mapa. 112 Através da análise das peças da campanha, percebe-se a contradição em que o discurso publicitário se insere. Frases como “vamos passar como um trator por cima da fome” e “vamos bater recorde de solidariedade” induzem o leitor a pensar que a Massey Ferguson irá realmente combater a fome. Contudo, a análise de Charaudeau permite enxergar o implícito, onde se percebe que quem doa os alimentos são as pessoas que participam da campanha. Portanto, a Massey Ferguson não “vai bater recorde de solidariedade”, nem “combater a fome”. Da mesma forma, a frase: “O trator 500 mil vai pegar a estrada...” dá a idéia de que o trator em questão vai rodar país, o que passa uma mensagem de que o trator tem bastante potência e grande resistência, pois o Brasil é uma nação de extensão continental. Porém, através da entrevista com profissionais da empresa, constatou-se que o trator viajou em um caminhão e apenas foi retirado para ficar exposto nas concessionárias. Esta é uma das muitas contradições presentes no texto, pois a campanha anuncia que é o próprio trator que fará o percurso, e não informa que, na verdade, ele estará viajando dentro de um caminhão. As contradições inerentes ao discurso publicitário também estão presentes nas falas dos executivos. Segundo José Alexandre Barioni, analista de marketing da AGCO, o grande resultado da Caravana não foi somente a doação de alimentos, mas o fato de sensibilizar a comunidade. "Estamos mostrando às concessionárias a importância de trabalhos como esse. Seus funcionários sentem-se melhor em saber que a empresa se preocupa com essas questões. É muito bom ver a alegria das pessoas que participam", ressalta Barioni14. Esta frase mostra a intenção da empresa em promover ações puramente sociais. 14 Disponível em <http://cidadania.terra.com.br/interna/0,,OI291117-EI3453,00.html>, acessado em 08 de abril de 2004. 113 Já a frase do profissional 2, “isso (a Caravana 500 mil) cria uma imagem positiva da marca, uma boa vontade das pessoas com aquela marca... mais cedo ou mais tarde, o mercado responde a isso”, demonstra que existe a intenção de gerar lucros com essa ação. A comunicação mercadológica, segundo os autores aqui citados, informa, persuade e comunica vantagens dos produtos aos consumidores, itens que estão presentes no discurso da campanha analisada. Apesar de ser uma campanha com objetivos “puramente institucionais”, segundo os profissionais da empresa, as peças dizem exatamente o que uma campanha essencialmente mercadológica precisa dizer: o que é o produto da empresa – o trator –, como ele proporciona valor – é solidário – e onde ele é encontrado – nas concessionárias. Esta contradição entre a fala dos profissionais e o discurso presente nas peças da campanha, remete à outra análise paralela. Com embasamento em Bueno (2005), pode-se inferir que a comunicação da empresa está atuando de maneira integrada, na medida em que a comunicação institucional e a comunicação mercadológica, apesar de diferentes, complementam-se. A mensagem do anúncio, tanto a que está explícita e que reforça a imagem institucional, quando a que está implícita e demonstra objetivos mercadológicos, demonstra que a comunicação está integrada num processo complexo e contraditório. A visão de Bueno (2005) sobre comunicação integrada está presente na análise das peças na medida em que se percebe características tanto da comunicação institucional quanto da mercadológica. À primeira vista, as peças são puramente institucionais, visto que induzem a população a combater a fome no país e não vendem explicitamente o produto da empresa. Mas o enfoque discursivo de Charaudeau permitiu uma análise abrangente, incluindo as mensagens implícitas contidas nas peças enaltecendo o produto da empresa. Nesse sentido, a análise da campanha Caravana 500 mil demonstrou a inseparabilidade da comunicação institucional e mercadológica, através do discurso publicitário. 114 Assim, a comunicação organizacional, sob a forma do discurso publicitário, possui aspectos complexos, ambíguos e contraditórios, e que possibilitam múltiplas leituras. Este discurso, por sua vez, irá, juntamente com todas as outras formas de interação da organização com este público, reproduzir uma imagem na mente de cada indivíduo. É pertinente destacar que esta imagem depende também do receptor, ou seja, não se pode tomar o fenômeno do conhecer como se houvesse fatos ou objetos prontos no mundo, que podem ser captados e introduzidos na mente (MATURANA E VARELA, 2004). Para os autores, toda a experiência é validada de uma maneira particular pela própria estrutura humana, que torna possível a descrição desta experiência. Acredita-se que esta abordagem renderia assunto para outro estudo. Por fim, considera-se relevante destacar que surgiram, num primeiro momento, resistências ao uso do paradigma da complexidade, o que se deve à dificuldade em se aceitar seu caráter empírico, incerto, confuso, incapaz de conceber uma ordem absoluta, e de evitar as contradições. Mas percebe-se a necessidade de conscientização dessa complexidade, inerente a todas as esferas do conhecimento, a partir da consciência de que a própria comunicação organizacional não pode ser analisada de outra maneira, senão como um processo integrado, dialógico, incerto e contraditório, ou seja, complexo. 115 REFERÊNCIAS BALDISSERA, Rudimar. Comunicação organizacional: o treinamento de recursos humanos como rito de passagem. São Leopoldo: Ed. UNISINOS, 2000. BARTHES, R. O óbvio e o obtuso. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. BRONZO, M. e GARCIA, F. C. As bases epistemológicas do pensamento administrativo convencional e a crítica à teoria das organizações. In: RODRIGUES, S. B. e CUNHA, M. P. Estudos organizacionais: novas perspectivas na administração de empresas. São Paulo: Iglu: 2000. BUENO, W. C. Comunicação empresarial: teoria e pesquisa. Barueri, SP: Manole, 2003. ____________. Comunicação empresarial no Brasil: uma leitura crítica. São Paulo: All Print, 2005. CARVALHO, N. Publicidade: a linguagem da sedução. São Paulo: Ática, 1996. CASTRO, M. H. S. O Literário como sedução: a publicidade na Revista do Globo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. CHANLAT, J-F. Ciências Sociais e management: Reconciliando o econômico e o social. São Paulo: Atlas, 2000. CHARAUDEAU, P. Langage et discours. A propôs du genre publicitaire. Paris: Hachette Université, 1983. Tradução de Daniela Ilha Porto. ________________. Para uma nova análise do discurso. Tradução de Agostinho Dias Carneiro. In CARNEIRO, A. D. (Org.). O discurso da mídia. Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1996. ________________. Problemas de análises das Mídias. Tradução de Marilene Pavão In MEDITSCH, E. (Org.). Teorias do rádio: textos e contextos. Florianópolis, PosjorUFSC/Insular, 2005. CHURCHILL, G. A. Jr. e PETER, J. P. Marketing: criando valor para os clientes. São Paulo: Saraiva, 2000. COSTA, J. Imagem corporativa em el siglo XXI. 2ª edição. Buenos Aires: La Crujía, 2003. DUCROT, O. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987. ENRIQUEZ, E. Vida psíquica e organização.In: MOTTA , Fernando C. Prestes, FREITAS, Maria Éster de (Org). Vida psíquica e Organização. Rio de Janeiro: FGV, 2000. FARINA, M. Psicodinâmica das cores em comunicação. 4. ed. São Paulo: E. Blücher, 2003. 116 FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro, Forense, 1986. FRANÇA, V. V. O objeto da comunicação / a comunicação como objeto. In: HOHLFELDT, A.; MARTINO, L. C. e FRANÇA, V. V. Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis: Vozes, 2002. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5.ed. São Paulo: Atlas, 1999. GOLDHABER, G. M. Comunicación organizacional. México: Ed. Diana, 1991. HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP&A, 2001. HOHLFELDT, A. Hipóteses contemporâneas de pesquisa em comunicação. In: HOHLFELDT, A.; MARTINO, L. C. e FRANÇA, V. V. Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis: Vozes, 2002. IASBECK, L. C. A arte dos slogans: as técnicas de construção das frases de efeito no texto publicitário. São Paulo: Annablume, Brasília: Upis, 2002. KOTLER, P. Administração de marketing: a edição do novo milênio. São Paulo: Prentice Hall, 2001. __________. Marketing de serviços profissionais: estratégias inovadoras para impulsionar sua atividade, sua imagem e seus lucros. Barueri: Manole, 2002. KREPS, G. L. La comunicación em las organizaciones. 2.ed. Wilmington, Delaware, USA: Addison-Wesley Iberoamericana, 1995. KUNSCH, M. M. K. Obtendo resultados com relações públicas. São Paulo: Editora Pioneira, 1997. _________________. Planejamento de relações públicas na comunicação integrada. 4ª ed. São Paulo: Summus, 2003. LITTLEJOHN, S. W. Fundamentos teóricos da comunicação humana. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1982. MAINGUENEAU, D. Novas tendências em análise do discurso. Campinas, SP: Pontes: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 3ª ed. 1997. MARSDEN, R. e TOWNLEY, B. A coruja de Minerva: reflexões sobre a teoria na prática. In: STEWART, R. HARDY, C. e NORD, W. Handbook de estudos organizacionais: ação e análise organizacionais. Vol. 3. São Paulo: Atlas, 2004. MARTIN-BARBERO, J. Ofício de cartógrafo – Travessias latino-americanas da comunicação na cultura. São Paulo, Edições Loyola, 2004. MARTINO, L. C. Interdisciplinaridade e objeto de estudo da comunicação. In: HOHLFELDT, A.; MARTINO, L. C. e FRANÇA, V. V. Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis: Vozes, 2002. 117 MARTINS, Z. Propaganda é isso aí: um guia completo para novos anunciantes e futuros publicitários. São Paulo: Atlas, 2004. MATTELART, A. Comunicação-mundo: história das idéias e das estratégias. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1996. MATURANA, H. e VARELA, F. A Árvore do Conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. 4 ed. São Paulo: Palas Athena, 2004. MORIN, E. As duas globalizações: complexidade e comunicação, uma pedagogia do presente. Porto Alegre: 2.ed. Sulina/Edipucrs, 2002. __________. Introdução ao pensamento complexo. 4. ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2003. __________. O método seis: ética. São Paulo: Sulina, 2005. MOSCOVICI, F. A organização por trás do espelho: reflexos e reflexões. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2001. MOTTA, F. C. P. Teoria das organizações: evolução e crítica. 2. ed. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001. MÚNERA URIBE, P. A. y SÁNCHEZ ZULUAGA, U. H. Comunicación Empresarial, una mirada corporativa. Collección Henos. Ed: Zuluaga. Medellín , 2003. PINHO, J. B. Comunicação em marketing. Princípios da comunicação mercadológica. Campinas: Papirus, 2001. PINTO, M. J. Comunicação e discurso: introdução à análise de discursos. 2. ed. São Paulo: Hacker Editores, 2002. PRATA, N. Charaudeau e o discurso radiofônico. In MEDITSCH, E. (Org.). Teorias do rádio: textos e contextos. Florianópolis, Posjor-UFSC/Insular, 2005. PUTNAM, L., PHILLIPS, N., e CHAPMAN, P. Metáforas da Comunicação e da Organização. In: STEWART, R. HARDY, C. e NORD, W. Handbook de estudos organizacionais: reflexões e novas direções. Vol. 2. São Paulo: Atlas, 2004. RABAÇA, C. A e BARBOSA, G. G. Dicionário de comunicação. Rio de Janeiro: Campus, 2001. RUDIGER, F. A Escola de Frankfurt. In: HOHLFELDT, A.; MARTINO, L. C. e FRANÇA, V. V. Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis: Vozes, 2002. SAMPAIO, R. Propaganda de A a Z: como usar a propaganda para construir marcas e empresas de sucesso. 4. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2002. SANT’ANNA, Armando. Propaganda teórica, técnica e prática. São Paulo: Pioneira, 1996. SHAVER, M. A. Como vender a mídia – o marketing como ferramenta de venda do espaço publicitário. São Paulo, Nobel, 2002. 118 SCHULTZ, Don e BARNES, Beth.Campanhas estratégicas de comunicação de marca. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001. SCHVARSTEIN, L. e ETKIN, J. Identidad de las organizaciones. Invariancia y cambio. Buenos Aires: Ed. Paidós, 1990. SOULAGES, Jean-Claude. Discurso e Mensagens Publicitárias. Tradução de Maria Luiza Ramiarina e Laís Vilanova. In: CARNEIRO, Agostinho Dias (Org.). O discurso da mídia. Rio de Janeiro: Oficina do Autor, 1996. TORQUATO, G. Comunicação empresarial, comunicação institucional: conceitos, estratégias, sistemas, estrutura, planejamento e técnicas. São Paulo: Summus, 1986. ______________. A comunicação como ferramenta estratégica. Revista Brasileira de Comunicação Empresarial, São Paulo, Publicação trimestral da ABERJE – Associação Brasileira de Comunicação Empresarial, ano 11, n.38, 1º trimestre de 2001. _______________. Tratado de comunicação organizacional e política. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. VILLAFAÑE, Justo. La gestión profesional de la imagem corporativa. Madrid, Ediciones Pirâmide, 1999. YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. 119 ANEXOS 120 ANEXO A A CAMPANHA CARAVANA 500 MIL PELO BRASIL 121 Logotipo da campanha. 122 Outdoor. 123 Anúncio 1. 124 Anúncio 2. 125 Spot de rádio. 126 Capa da Revista Campo Aberto de 20 de agosto de 2003. 127 Capa da Revista Campo Aberto de 30 de outubro de 2003. 128 Entrega do Cheque Trator 500.000 Leiloado Relatório fornecido pela AGCO. 129 Logotipo do Programa Fome Zero. 130 A Continuação da Campanha Relatório fornecido pela AGCO. 131 Trator 500.000 em exposição na concessionária Alpha, em Balsas, no Maranhão. 132 Crianças de entidade assistencial favorecida pela Caravana em Juazeiro, Bahia. 133 Sorteio de trator durante a Agrishow 2004, em Ribeirão Preto, São Paulo. 134 Sorteio de trator durante a Expointer 2004, em Esteio, Rio Grande do Sul. 135 ANEXO B ENTREVISTA COM PROFISSIONAIS DA EMPRESA AGCO 136 Entrevista realiza em 30 de maio de 2005, na sede da AGCO, em Canoas-RS, com duração de 41 minutos. Ângela - Esse anúncio é um modelo de como a comunicação está sendo realizada de forma integrada, porque ele é um anúncio á primeira vista institucional, ele não está vendendo nada n o texto todo nem aqui, mas ele tem a imagem do trator então ele está mostrando o produto da empresa, pode não ser a primeira idéia, mas ele também está vendendo, então é um anúncio de comunicação institucional e de comunicação mercadológica. Profissional 1 - Eu vou te contar um pouco de como isso tudo surgiu, como isso depois evoluiu, e como isso depois acabou terminando. Nós começamos de um jeito e terminou de um outro jeito, para nossa satisfação terminou num patamar acima um pouco da expectativa que nós estávamos. Depois o Profissional 2 vai poder te dar um detalhe mais técnico que tu precisas da parte que o marketing trabalhou, os bastidores, essas coisas que eventualmente venham também te ajudar no teu trabalho.Eu acho que isso que tu abordou de comunicação integrada, não só a comunicação foi integrada, sob o ponto de vista comunicação, mas também foi bastante integrada a questão fábrica, nós somos fábrica, nós fabricamos esse produto, existe uma rede de distribuição que vende esse produto e daqui a pouquinho tu vai entender porque e tem também o aspecto comercial mais amplo que tu v ais entender. (Profissional 2 entra). Eu estou dando para a Ângela um panorama macro da caravana 500 mil e depois na parte mais específica certamente tu tens muito a colaborar, Profissional 2. Então, além da comunicação integrada teve toda uma integração de outros fatores que agora tu vais entender melhor quando eu te der um rápido histórico do que foi isso. Nós somos líderes de mercado há 137 mais de 40 anos e nunca perdemos essa liderança e por isso quem tem maior a população de tratores nesse país, sem dúvida nenhuma é a marca Massey Ferguson. Quando se aproximou a contabilização dos 500 mil tratores feitos aqui no Brasil, eles começaram a ser feitos em São Paulo, a partir de 1981 nós transferimos a fábrica aqui para Canoas, onde ela está hoje e pelos controles de produção, a gente sabe quantos tratores a gente fez no decorrer do tempo, quantos modelos, etc. Quando começou a se aproximar a execução, montagem do trator 500 mil, a turma de marketing e a diretoria da empresa, em uma série de reuniões, definiu que isso era um grande momento, com um ano antes de antecedência a gente já estava vislumbrando que esse seria um grande momento. Então se pensou em várias coisas. E a coisa que mais se configurou em termos de produto, em termos de marco para isso era pegar o nosso trator mais vendido, o nosso best-seller, o mais conhecido, o mais premiado, enfim, que era o 275 e transformar esse trator em que saísse um 275 da linha para ser celebrado, comemorado, porém um 275 estilizado, único. Seria um 275 para museu, esse é o cara, ninguém mais vai ver um trator igual a esse na história, foi se criando essa expectativa. Tu conheces o trator? Ângela - Não, só por foto. Profissional 1 - Eu não sei nem onde ele está hoje, mas eu posso de antecipar alguma coisas, por exemplo, um 275 não tem um pára-lama de plástico, como tu ta vendo aqui, arredondado, ele não tem as rodas cromadas, ele não tem o escapamento cromado, ele não tem a barra de proteção cromada. Ele é um 275 realmente único, ele é um 275 bonito, ele salta aos olhos, ele brilha os cromos, depois isso se evidenciou mais ainda. No momento que isso foi concebido, vai ser 138 por aí, nós aqui na fábrica, a engenharia, o trator aconteceu. O trator não tinha muito vínculo com o projeto, era mais uma peça de comemoração do que uma peça comercial ou uma peça de trabalho no campo. Então encima disso a turma começou a montar o evento. E a espinha dorsal do evento seria esse trator andar na linha e lá na ponta ter todo um cenário, uma montagem comemorativa, com várias autoridades políticas, a autoridade máxima da AGCO no mundo estava aqui, a autoridade máxima do Estado do Rio Grande do Sul estava aqui, que era o governador Rigotto, três ou quatro ministros de estado estavam aqui, o governador Blairo do Mato Grosso, realmente aquele momento foi um momento ímpar para a nossa atividade aqui em Canoas. Choveu que foi um horror. Profissional 2 – O que foi a nossa sorte, porque por uma questão de protocolo quando se tem uma autoridade como o Rigotto convidada, tu não podes começar o evento sem que ele esteja presente. É uma questão de lei. E o evento estava marcado para as quatro horas da tarde e ele tinha um evento, a duplicação da fábrica da Souza Cruz, em Santa Cruz do Sul e ele queria ir aos dois eventos, com certeza ele iria bater aqui umas 6h da tarde. Só que tinha um detalhe, o evento ia ser transmitido ao vivo pelo canal rural, se ele chegasse tarde, tua ia ficar um tempão enchendo lingüiça ia perder teu horário na TV. No fim a chuva nos ajudou porque com ele estava de helicóptero e não conseguiu ir ao outro evento. Profissional 1 - Mas então esse trator ia sair na linha, nos preparamos toda uma saída na linha e ele saiu sendo dirigido pelo vice-presidente mundial de vendas e marketing e tinha toda uma arquibancada montada e isso era apenas o começo, a saída do trator era apenas o começo muito mais vinha por aí. Teve um coral de 139 funcionários, uma atitude muito bonita da turma que se auto-indicou pra cantar e teve um coquetel e toda essa parte festiva da estória. Mas esse trator único ele ainda seria vendido. Quando ele informou que o canal rural estava aí, ele não estava apenas para mostrar o momento, mas para fazer um leilão em nível nacional ao vivo para qualquer revendedor, ou qualquer agricultor, ou qualquer pessoa que tivesse um telefone e estivesse sintonizada no canal rural naquele momento poderia dar o lance para comprar o trator. Então um trator desses na época vamos supor que custasse oitenta mil reais, entre os lances que foram dados, ele acabou sendo vendido por uns duzentos mil reais. E quem comprou o trator foi uma entidade que se chama Unimassey, porque os revendedores Massey Ferguson, aí que eu comecei a abrir um pouco o círculo para ti, tem a fábrica, tem a engenharia, tem o marketing, são círculo internos e depois tem um grande círculo externo que são a nossas redes de revendedores. Então a Unimassey que é a associação dos revendedores Massey Ferguson comprou o trator por 200 mil reais. A partir disso eu acho que vem o tema mais pontual da tua dissertação que é a Caravana 500 mil. A Unimassey com essa relíquia nas mãos tinha que faturar encima disso. E ela fez esse trator percorrer por todas as suas afiliadas, a menos que alguma não quisesse, por estar num lugar muito longínquo, mas ela deu uma circulada legal pelo Brasil todo. E esse trator era conduzido num caminhão que tinha toda uma comunicação visual, devemos ter várias fotos desse caminhão. E em cada revenda que ele parava para passar dois ou três dias ou o fim de semana a revenda fazia uma mini comemoração em que ela convidava seus principais clientes, seus principais amigo,s ia sempre um dos diretores aqui da AGCO para dar um pouco de porte à apresentação. E todas 140 as pessoas que eventualmente queriam bater uma foto com trator, tinha o fotógrafo oficial, tinha o porta retrato oficial que hoje às vezes tu vais visitar um agricultor e tu chega lá pra tomar chimarrão com o cara e ele te diz vem cá quero te mostrar uma coisa aqui encima da minha lareira e ta lá a foto do trator 500 mil, foi uma coisa que realmente quando eu te disse que estourou um pouco a nossa expectativa é nisso, é uma coisa que foi um pouco além do que sair com o trator na linha que é onde tudo tinha começado. Então essas pessoas de alguma forma para entrar dentro do contexto de solidariedade, o Lula tinha recém lançado o Fome Zero e todo mundo tava fazendo campanha, vai jogar futebol e dá um quilo de arroz, show do Eric Clapton paga não sei o que em banana, e daí a gente institui também que o pessoal pra ir lá bater a foto, participar do evento, bater o porta-retrato, tinha que doar alguma coisa, só que, quando os caras anunciam olha no Beira Rio no jogo fulano de tal arrecadamos 3 toneladas de alimentos, para nós, no primeiro evento, os caras em vez de darem um quilo de feijão os caras disseram olha eu vou dar um caminhão de soja, eu vou dar três bois, o negócio foi virando uma coisa que a gente imagina q fosse ser uma coisinha para se comparar a um evento no beira Rio, por exemplo, extrapolou 50 vezes mais em termos de arrecadação. A caravana não estava ligada ao Fome Zero, revenda que estava organizando o evento na sua região de atuação fazia a doação para entidades assistenciais locais. A renda do leilão, R$ 200.000,00 é que foi doada para o Fome Zero. Houve pessoas que doaram sozinhas 6, 7 toneladas. Porque para um agricultor que colhe milhares de toneladas, doar um quilo de alimentos não significa nada, ele doa várias toneladas. Então isso foi mais ou menos por onde terminou, esse trator girou pelo Brasil todo e provavelmente a 141 Unimassey vai acabar emprestando ele para o nosso memorial, que nós estamos montando aqui, porque a Unimassey é uma entidade, ele não pode ficar na casa de ninguém. Então esse é o contexto da campanha. Ângela - Qual o conceito da campanha? Profissional 2 - Um trator contra a fome. Ângela - Quais as peças da campanha? Profissional 2 - Não tem muita coisa, na verdade. Tem o caminhão, um banner, e muitas fotos de cada evento, que estavam na nossa home page, fotos do trator, fotos do pessoal doando alimentos, o que dá sustentação à popularidade que o programa teve... Ângela - Como foi a idéia de relacionar o trator com a campanha? Profissional 2 - É que o trator nada mais é do que uma máquina que foi desenvolvida para produzir alimentos, isso foi uma forma simbólica de resgatar qual a função social do trator, e valorizar as pessoas que estão envolvidas com esse negócio. Profissional 1 - Foi criado um brasão especial para a série comemorativa. Ele foi colocado nos tratores na forma de adesivo, e foi distribuído como um chaveirão, uns na cor prata e outros ouro. Esse símbolo foi um marco também. E a caravana por si só teve seu próprio símbolo... Ângela - Quem eram os destinatários dessa campanha? Teve algum público alvo específico? 142 Profissional 2 - Os clientes das nossas concessionárias. Ângela - O público alvo que ela atingiu foram esses clientes? Profissional 2 - Além dos clientes, a comunidade em geral foi atingida.Hoje essa coisa da responsabilidade social é muito forte dentro da empresa, e isso a gente tenta passar para o concessionário também. Então, isso é uma forma da empresa, do concessionário, ser bem visto na região. Ângela - Foi feita alguma medida dos resultados? Profissional 2 - Sim, até porque uma das coisas que a gente fez na caravana foi o sorteio de dois tratores da série 500mil. A cada 5 quilos de alimentos que a pessoa doasse, ela ganhava um cupom. Nos tivemos dois sorteios, um na Agrishow, em Ribeirão Preto/SP, no ano passado, e outro na Expointer Ângela - Quando a campanha foi feita, vocês pensaram nos objetivos mercadológicos e institucionais, ou... Profissional 2 - Mais institucionais...é aquela coisa da responsabilidade social, né... a empresa fica mais valorizada perante a comunidade...por isso que a gente saiu do Fome Zero, que é uma coisa muito federal, e nessa época o Fome Zero estava começando a ser muito questionado também, por ser um programa muito demagógico. Então a gente resolveu fazer uma carreira solo. Também quando tu entras no Fome Zero, tu perdes o controle de pra onde vão as doações... assim se prestigia as entidades locais... O concessionário tinha total liberdade para escolher as entidades locais, e juntavam políticos, autoridades... Ângela - Os objetivos institucionais foram alcançados? 143 Profissional 2 - Sim, eu participei de um evento quando a gente entregou o 2 trator, e foi bem emocionante... estavam as entidades que receberam os alimentos... a gente nota que o pessoal valorizou muito. Até pelo fato de não ter nenhum interesse comercial. Eu poderia dizer “ah, se tu comprares um trator, 5% da renda vai ser doado”, mas aí tu estás vendendo um trator. Aqui não, a pessoa ia lá, tirava uma foto com o trator, doava o alimento, e realmente o público é todo do concessionário, que está bancando o evento, Profissional 1 - Houve alguns depoimentos de quem recebia, por exemplo, curador de santa casa, eram coisas de arrepiar... então quando tu perguntas se o objetivo foi atingido, o objetivo foi muito bem atingido, nesse tema de solidariedade... isso foi muito comentado... Profissional 2 - Isso cria uma imagem positiva da marca, uma boa vontade das pessoas com aquela marca... mais cedo ou mais tarde, o mercado responde a isso... Ângela - Como a campanha foi nacional, ela teve impactos diferentes por onde ela passou? Profissional 2 - Teve... não deu pra saber quais os fatores que determinaram essa ou aquela reação, acho que foi muito ligado ao empenho do concessionário, do prestígio que o cara tem na região, de como ele se mobilizou para fazer isso aí. O evento era padronizado...Mas não tivemos nenhum evento medíocre, todos tiveram bom resultado, tanto de público, como de doações. Profissional 1 - Se tu pegares uma revenda, por exemplo, em Cascavel/PR, que é uma cidade grande, que tem um círculo fantástico, foi um show... As revendas estão muito próximas do seu mercado...agora tu vais a Sapezal, por exemplo, tu 144 estás no meio agrícola, mas longe da grande população, é importante pra região, mas não fica uma coisa tão popular. Então, eu acho que a resposta está muito relacionada com o tamanho da revenda e com a relação que a revenda tem com o cliente e com a comunidade. Ângela - As pessoas se sentiram solidárias ao participar da campanha? Profissional 2 - Esse cliente que ganhou o trator em Camarã, uma cidadezinha no meio do nada, o cara já é engajado em questões sociais. Ele naturalmente já ajuda as entidades. Quando o concessionário falou pra ele sobre a campanha, ele de imediato disse para anotar três mil quilos de alimentos pra ele, depois ele veria o que seria doado. Isso que ele nem sabia que seria sorteado um trator. Ângela - A relevância da comunicação institucional para a empresa? Profissional 2 - Esse ano esta um pouquinho mais fraquinho porque a grana está curta, mas a gente faz muita coisa institucional aqui. Se tu quiseres a gente pode te conseguir um relatório social que tem o balanço social. A gente fala muito pouco do que a gente faz, até internamente, mas se faz muita coisa. Apoio a escolas, parte de ecologia, utilização de resíduo, os restos da madeiras que se usa aqui vão para uma instituição que faz móveis. Ângela - Qual o entendimento de comunicação da empresa? Profissional 2 - Temos uma área para isso. A área de comunicação é uma área dentro do marketing. A gente tem uma área de comunicação bastante estruturada. Comparando com outras empresas do setor e até de outros setores a gente está bem. Temos uma estratégia bem clara com a mídia com a Internet. 145 Ângela - Algumas empresas confundem vendas com comunicação... Profissional 2 - A gente trabalha parcerias. Eu acho que a coisa se mistura mesmo. A feira, por exemplo, para nós, é uma ferramenta de vendas e não institucional. A Expointer é um pouco diferente porque é aqui do lado. Mas as feiras no Brasil estão se tornando cada vez mais feiras de negócio. Então tu tens o negócio do marketing que é a aplicação do logotipo, a exposição das máquinas, o uniforme das recepcionistas, da equipe de trabalho, mas tu tens toda uma estrutura voltada para a venda , na Agrishow, por exemplo, nós tínhamos cinco bancos dentro no nosso stand, o consórcio, todos eles com sala, Internet, conexão, telefone, tínhamos um segundo andar só para o pessoal de vendas, para protocolos de pedidos, passar fax, para os coordenadores de venda trabalhar e embaixo cada concessionário tinha uma ilha de atendimento e ainda tinha mais uma sala de reuniões, tudo isso era uma máquina de vender e tudo isso faz com que a coisa se confunda. A gente tem uma preocupação com os vários canais de comunicação. Tem a Internet, temos duas revistas uma para cliente externo que é a Campo Aberto e uma para concessionários que é a Mão na Roda, tem mais o Acontece que é o informativo para funcionários. Nós temos a intranet, temos o trabalho com a imprensa, propaganda na TV, rádio, jornal e a gente procura trabalhar tudo de forma integrada, o conceito que tu queres passar, a mensagem é a mesma, com ferramentas diferentes. Tu entras no site tu vais ver coisas que levam pra revista que leva pro site, essas coisas têm inter-relação. Ângela - A empresa tem um histórico de engajamento social? 146 Profissional 1 - Tem, achei uma coisa pra te dar um exemplo, um projeto para atender um pedido do governo para dar empregos para pessoas com defeitos físicos, cegos, mancos, aleijados, etc. A nossa concorrência não tem isso, mas cada vez que nós somos chamados a algo desse tipo a gente sempre participa. Sob o ponto de vista não só social, mas também a parte relacionada com o meio ambiente, ecologia, natureza, nós estamos muito engajados. Semana passada nós inauguramos dentro da nossa empresa a primeira recicladora de água interna através de plantas aquáticas. Estava aí toda a turma de meio ambiente participando conosco disto. Não é à toa que nós já ganhamos quatro ou cinco anos seguidos o Top Ser Humano da ABRH e assim vai. Então essa questão do meio ambiente, da comunidade, não só aqui, mas também na comunidade de Santa Rosa, nós temos em Santa Rosa a fábrica de colheitadeiras e lá também é assim. Então é muito grande a lista. Se tu tens interesse nessa parte social, de comunidade tu tens que receber uma cópia do nosso Balanço Social. Ângela - A campanha teve algum retorno mercadológico, em termo de vendas? Profissional 1 – Mensurável, não. Profissional 2 - Esse não era o nosso objetivo Profissional 1 – Tu tens q entender um pouco o nosso mundo. O mundo do trator não é o mundo de um automóvel. O trator tem quatro ou cinco marcas aqui no Brasil e cada uma tem uma cor. Só o fato de tu veres um trator Massey tu rotula aquela pessoa, aquela pessoa é Massey. Se for um trator verde, aquela pessoa é Jonh Deere. É uma coisa muito engraçada e interessante o nosso mercado. Tudo o que tem por trás disso institucionalmente, um jornal que foi lá fazer 147 uma reportagem da Caravana, por exemplo, isso soma pontos que tu não fazes idéia, só que isso a gente não consegue medir, mas isso faz com que a marca se solidifique. Porque que a gente participa em universidade e dá cursos com o nosso trator, dá cursos de mecânica e máquinas agrícolas com o nosso trator, porque o cara já vai começar a ver o vermelho, a ver o Massey e isso lá na frente tem retorno, tu não vai medir, mas a gente sabe que tem. Profissional 2 - E essa é uma formação de fidelização. O foco aqui (na Caravana) foi o cliente Massey, o cara que tem o nosso trator, gosta da marca, para o cara sentir orgulho, tirar foto da família com o trator, colocar na lareira como o Profissional 1 falou. Isso é um cara que já tem uma vinculação com a marca, a gente quer alimentar sempre isso. O cara não fica pensando só na coisa mecânica do trator, o que ele faz, quanto ele custa, ele tem algo a mais, ele se sente parte de uma família, a gente costuma usa o termo família Massey Ferguson aqui. A nossa marca tem um componente emocional muito forte, comprovado em pesquisas, o que é estranho para um bem de produção como um trator, que é uma compra fria, se paga ou não se paga. A gente trata de estar sempre alimentando esse componente emocional da nossa marca. Ângela – Esse consumidor é o pequeno agricultor? Profissional 2 – Todos, a gente tem desde o sitiante até o mega-empresário rural. A gente os trata de maneira diferente porque compram produtos diferentes. Profissional 1 - Nós temos aqui na empresa o Club Líder que são os clientes de carteirinha, para quem é fiel à marca e compra e recompra e vai ganhando pontos para se tornar membro do clube. 148 Profissional 2 - Tem grandes e tem pequenos. Profissional 1 - A partir do momento que tu faz parte do Club Líder tu tens vantagens nas feiras, na compra de peças de reposição. Ângela - Onde veicularam as peças da campanha? Profissional 2 - A campanha da Caravana 500 mil não tem plano de mídia porque foi uma campanha dirigida. Eu posso te conseguir as peças, mas não a veiculação. Profissional 1 - Tem também o caminhão onde o trator viajou, aquilo é um grande outdoor. Visualmente aonde ele chega ele chama a atenção. Ângela – Muito obrigada. Livros Grátis ( http://www.livrosgratis.com.br ) Milhares de Livros para Download: Baixar livros de Administração Baixar livros de Agronomia Baixar livros de Arquitetura Baixar livros de Artes Baixar livros de Astronomia Baixar livros de Biologia Geral Baixar livros de Ciência da Computação Baixar livros de Ciência da Informação Baixar livros de Ciência Política Baixar livros de Ciências da Saúde Baixar livros de Comunicação Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE Baixar livros de Defesa civil Baixar livros de Direito Baixar livros de Direitos humanos Baixar livros de Economia Baixar livros de Economia Doméstica Baixar livros de Educação Baixar livros de Educação - Trânsito Baixar livros de Educação Física Baixar livros de Engenharia Aeroespacial Baixar livros de Farmácia Baixar livros de Filosofia Baixar livros de Física Baixar livros de Geociências Baixar livros de Geografia Baixar livros de História Baixar livros de Línguas Baixar livros de Literatura Baixar livros de Literatura de Cordel Baixar livros de Literatura Infantil Baixar livros de Matemática Baixar livros de Medicina Baixar livros de Medicina Veterinária Baixar livros de Meio Ambiente Baixar livros de Meteorologia Baixar Monografias e TCC Baixar livros Multidisciplinar Baixar livros de Música Baixar livros de Psicologia Baixar livros de Química Baixar livros de Saúde Coletiva Baixar livros de Serviço Social Baixar livros de Sociologia Baixar livros de Teologia Baixar livros de Trabalho Baixar livros de Turismo