ESTUDOS E PESQUISAS Nº 321 Nova Logística de Transporte de Massa nas Grandes Cidades Brasileiras Marcus Quintella * XXI Fórum Nacional - Na Crise Global, o Novo Papel Mundial dos BRICs (BRIMCs?) e as Oportunidades do Brasil (Crise como Oportunidade, Através do Plano de Ação) 18 a 21 de maio de 2009 * Diretor Técnico da Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU. Doutor em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ, Mestre em Transporte pelo IME e Pós-graduado pela FGV. Professor do IME e da FGV.. Versão Preliminar – Texto sujeito à revisões pelo(s) autor(es). Copyright © 2009 - INAE - Instituto Nacional de Altos Estudos. Todos os direitos reservados. Permitida a cópia desde que citada a fonte. All rights reserved. Copy permitted since source cited. 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Além disso, existe a histórica escassez de recursos para investimentos em infraestrutura de transporte público, que tem provocado uma acentuada redução da mobilidade urbana nas grandes cidades brasileiras, especialmente o Rio de Janeiro, que não é contemplado com novos projetos de transporte público há muito tempo. Para ser indicada como sede dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, o Ministério dos Esportes precisa apresentar ao COI um dossiê com as melhores opções de transporte público para a Cidade do Rio de Janeiro. A palavra-chave para a vitória é “legado”, ou seja, os projetos devem ser consistentes, exeqüíveis, economicamente viáveis, integrados, socialmente justos e com grande vida útil, para que possam servir à população carioca por muitos e muitos anos. Estamos no meio de 2009 e faltam “apenas” sete anos e meio para a época da Olimpíada de 2016, tempo suficiente para a execução de grandes projetos de transporte público, desde que sejam iniciados, no máximo, no início de 2010. Cabe lembrar que o Rio de Janeiro ainda não conta com um sistema de transporte público de qualidade e terá que construir novos projetos e, ao mesmo tempo, melhorar e modernizar a infraestrutura atual, para suportar os novos projetos. Antes dos Jogos Olímpicos de 2016, o Rio de Janeiro sediará outros eventos internacionais importantes, como os V Jogos Mundiais Militares, em 2011, a Copa das Confederações, em 2013 e, provavelmente, a final da Copa do Mundo de Futebol, em 2014. Esses eventos poderão servir como teste para os projetos olímpicos que estiverem prontos. Quanto aos projetos que devem integrar o dossiê olímpico, entendo que as opções de transporte deverão atender às necessidades de longo prazo da Cidade do Rio de Janeiro e estar de acordo com os planos de desenvolvimento viário da cidade. Os projetos devem priorizar os corredores Barra-Deodoro, Barra-Penha e Barra-Zona Sul, sempre privilegiando o transporte de massa para atender a demanda da população e dos espectadores dos Jogos Olímpicos. Entendo como transporte de massa as opções sobre trilhos, ou seja, trens, metrô e VLT, que, por definição, representarão um legado importante para a cidade, por longo tempo. Esses projetos sobre trilhos devem vir acompanhados por soluções para a infraestrutura viária e o trânsito da cidade, como sinalização moderna e controle de tráfego inteligente. Nos corredores com menor demanda, pode-se adotar o transporte sob pneus em faixas exclusivas, como o sistema BRT (Bus Rapid Transit). Em complemento, devem ser sugeridos projetos de transporte alimentadores desses corredores, sob pneus, e o plano de reorganização do atual sistema de ônibus urbano da cidade. O Rio de Janeiro precisa de um sistema de transporte público de verdade, há décadas, independentemente dos Jogos Olímpicos. Esse sistema deve ser competente, abrangente e integrado, com veículos, vias, terminais e todas as partes necessárias para proporcionar a mobilidade da população com segurança, conforto, velocidade e modicidade. Isso é um direito do cidadão e um dever do estado. Por fim, vale a pena lembrar o “fracasso” do Pan 2007, no quesito do transporte público, que nenhum legado deixou para o Rio de Janeiro, a não ser as faixas coloridas pintadas nas principais vias da cidade e que servem para nada. Penso que a dimensão dos Jogos Olímpicos é muito maior do que os Jogos Panamericanos e as exigências do COI não devem ser desprezadas ou mitigadas. Agora, não haverá espaço para erros, pois o negócio é sério e envolverá milhões de reais de dinheiro público, que devem ser aplicados para o sucesso da Olimpíada na cidade e ter como objetivo maior o legado de importantes benefícios sociais e de melhoria da qualidade de vida da população do Rio de Janeiro. Boa sorte, Cidade Maravilhosa! Marcus Quintella 14 AS CIDADES CLAMAM POR TRANSPORTE PÚBLICO (Jornal do Brasil – 21/04/2009) Marcus Quintella As cidades brasileiras precisam urgentemente oferecer melhor qualidade de transporte público em suas regiões metropolitanas, pois a insatisfação com a péssima mobilidade das pessoas é quase uma unanimidade e atinge toda a população, desde aqueles que usam o automóvel, passando pelos usuários dos ônibus, trens e metrôs, até os pedestres. Os recentes episódios de revolta ocorridos com os usuários das barcas Rio-Niterói e a greve dos ferroviários dos trens da SuperVia comprovam que os nervos da população carioca estão à flor da pele, especialmente em relação ao precário, insuficiente e negligenciado transporte público oferecido no Rio de Janeiro. Esse descontentamento não é diferente nas demais grandes cidades brasileiras, que também apresentam gravíssimos problemas de mobilidade urbana, em virtude da falta de transporte público de qualidade. Para que haja uma inversão desse quadro atual, as cidades brasileiras precisam investir na modernização e expansão de seus sistemas de trens urbanos e metrôs, na construção de novas linhas de metrôs e VLTs e na implantação de corredores exclusivos de ônibus, além de transformação das atuais linhas de ônibus urbanos em sistemas alimentadores de terminais de integração modal. É imperativo que essas ações sejam apolíticas e tenham uma conotação social e humanística. As populações das grandes cidades brasileiras sofrem pela falta de um transporte público abrangente, integrado, econômico e competente, pois não suportam mais os congestionamentos diários e os seus malefícios conseqüentes, que trazem infelicidade, transtornos e baixa qualidade de vida para todos. As grandes cidades brasileiras não podem fugir da opção ferroviária de passageiros para resolver seus problemas de mobilidade urbana. Estamos engatinhando no setor metroferroviário, cuja participação na matriz brasileira de transporte urbano é ridícula. Os investimentos nesse setor são irrisórios e levam anos para saírem do papel. Enquanto isso, os congestionamentos aumentam significativamente e as pessoas perdem saúde e tempo de vida. Atualmente, são transportados em todos os trens e metrôs brasileiros apenas cerca de 6 milhões de passageiros, diariamente, em média, distribuídos da seguinte forma: 2,4 milhões no Metrô-SP, 1,95 milhões nos trens da CPTM-SP, 550 mil no Metrô-Rio, 480 mil nos trens da SuperVia-RJ, 180 mil no Metrô de Recife, da CBTU, 170 mil no Metrô de BH, da CBTU, 160 mil no Metrô de Porto Alegre, 130 mil no Metrô de Brasília, 25 mil nos trens de Fortaleza, 12 mil nos trens de Salvador e 30 mil nos três sistemas da CBTU no Nordeste, Natal, João Pessoa e Maceió. Na realidade, esse total deveria ser a quantidade de passageiros transportados diariamente apenas na região metropolitana de São Paulo, que possui quase 18 milhões de habitantes e ostenta um dos trânsitos mais engarrafados do planeta, com velocidade média entre 7 e 15 km/h, dependendo do dia. Volto a repetir que os benefícios sociais do transporte público baseado em sistemas metroferroviários são absurdamente grandes, tais como: economias de tempo de viagem, redução de poluição atmosférica e sonora, redução de acidentes de trânsito, economia com manutenção de vias urbanas, economia energética, maior conforto e segurança, valorização imobiliária, estruturação urbana, desenvolvimento econômico, entre outros. Na prática, as populações das grandes cidades brasileiras precisam se mobilizar para convencer seus governantes e políticos sobre os lucros sociais, econômicos e ambientais de um transporte público de qualidade, que beneficiará democraticamente a todos. Outro apoio importante seria a grande mídia, que poderia apadrinhar o transporte público e passar a promover debates técnicos e políticos sobre o tema, exibir programas e documentários sobre os sistemas de transportes nacionais e internacionais e cobrar intensamente soluções definitivas e competentes. Marcus Quintella 15 A VOZ DO POVO SOBRE TRANSPORTE PÚBLICO (Jornal do Brasil – 24/02/2009) Marcus Quintella Em 10 de janeiro, fiz a seguinte pergunta em meu blog no JB Online: Quais projetos de transporte seriam benéficos para o Rio de Janeiro? Até hoje, o blog vem recebendo muitos comentários sobre o tema proposto. Fiquei satisfeito com a qualidade das sugestões e reclamações e, lamentavelmente, constatei a insatisfação da população com atual modelo de transporte público do Rio de Janeiro. Entendo que vale a pena registrar e divulgar alguns projetos sugeridos no blog, sem qualquer juízo de valor de minha parte, com o único objetivo de tornar público os anseios do povo carioca sobre uma necessidade básica que atinge a nossa vida, o tempo todo, diariamente. Os projetos mais citados foram os de transporte sobre trilhos, mas os modos de transporte marítimo e por ônibus também forma abordados. Carlos Conrado propôs um sistema de trem suspenso, ligando Botafogo à Gávea, como existe no centro de Miami, pois seria um transporte silencioso, não poluente, estaria fora dos engarrafamentos diários e poderia ser interligado com a estação do metrô. Paulo Gabriel escreveu que somente existe o metrô como solução, pois é limpo, economiza petróleo, retira de circulação os meios poluidores do ar e propiciam uma grande confraternização entre as pessoas. Cristina Marins sugere a melhoria dos trens e metrô com a execução dos projetos já existentes, tais como as Linhas 3 e 4 do Metrô, respectivamente, Rio-Niterói-São Gonçalo e Botafogo-Barra, o Corredor T5, PenhaAlvorada, e a reordenação das linhas de ônibus, com integração aos trens e metrô. C. Medeiros acha que se deve dar prioridade ao metrô, pois é o transporte mais rápido e eficaz. Ele entende que a Linha 1, Tijuca-Copacabana, está sobrecarregada pela Linha 2 e pelos trens da SuperVia. Caroline Amorim afirma que o metrô ainda é a alternativa mais rápida e segura para se circular na cidade, por mais que sua instalação seja cara e demorada. Ela acha que é preciso aumentar a rede ferroviária, sem perder a qualidade, pois viajar de metrô já não é tão confortável quanto antes. Marcus Abreu propõe a substituição de todos os trens da SuperVia por trens de Metrô, para que a extensão da rede metroviária atual passe de 42 km para 165 km e sejam transportadas um milhão de pessoas por dia. Solange Avellar escreveu que, em qualquer país do mundo, o melhor meio de transporte é a ferrovia, incluindo o metrô. Rodolfo Souza acha fundamental a volta dos bondes, pois o metrô é muito caro e os ônibus possuem pouca capacidade. Ele propõe o VLT para o Corredor T5, e não ônibus articulados, e também entende que a Ponte Rio-Niterói poderia ser adaptada para receber uma linha férrea no centro das pistas. Marcus Abreu e Claudio Pontes sugerem a ampliação da oferta de transporte hidroviário na Baía de Guanabara, com a construção de estações no Armazém 18, em frente à rodoviária Novo Rio, em São Gonçalo e em Botafogo. Eles afirmam que isso traria reflexos bem positivos na Ponte Rio Niterói, Perimetral, Av. Rodrigues Alves e Presidente Vargas. Joil, que utiliza as barcas diariamente, entre a Ilha do Governador e a Praça XV, disse que, apesar da precariedade do serviço, é um excelente meio de transporte, que poderia interligar a Baixada Fluminense e São Gonçalo ao Centro do Rio, trazendo grande beneficio ao trânsito e à qualidade do ar da cidade. Álvaro Felipe entende que deveriam ser canceladas as concessões de algumas linhas de ônibus nas Zonas Sul, Norte e Centro, para acabar com a superposição de itinerários e o excesso de coletivos nas ruas, e criadas outras linhas na Zona Oeste, que possui pouca oferta de ônibus. Ele defende também o aumento da capacidade dos trens da SuperVia e a construção de mais metrô. Carlos Alberto Baião quer a proibição de carros de passeio no Centro, no horário comercial, bem como a construção das linhas de metrô Centro-São Gonçalo e Zona Sul-Vargem Grande. Caro leitor, entre no meu blog (www.jblog.com.br/ttp.php) e conheça todas as respostas para a questão proposta e deixe também o seu comentário. A voz do povo é poderosa. Marcus Quintella 16 A CRISE DO TRANSPORTE PÚBLICO (Jornal do Brasil – 17/12/2008) Marcus Quintella Há anos que o transporte público nas principais cidades brasileiras está em crise, apesar da existência de inúmeros projetos e planos de ação para a resolução do problema. Esta crise não pode ser ignorada pela sociedade, ainda mais que as estatísticas denunciam o crescimento das perdas de demanda, os aumentos tarifários superiores ao poder de compra da população, a má qualidade dos serviços, a redução da velocidade comercial, decorrente dos congestionamentos, e a deficiência na mobilidade urbana. Ademais, pesquisas recentes mostram que apenas 32% dos brasileiros se locomovem por meio de transportes públicos, ou seja, ônibus, trens e metrôs. O restante da população utiliza o automóvel, a bicicleta, a motocicleta, a tração animal ou anda a pé. Nos últimos anos, o sistema brasileiro de transporte público perdeu 25% de seus passageiros para o transporte não regulamentado ou, como muitos preferem, alternativo. No caso dos ônibus urbanos, o sistema perde cerca de 16 milhões de pessoas diariamente. Já os trens suburbanos e metrôs não conseguem dar conta da demanda e estão absurdamente superlotados, principalmente pela falta de investimentos no setor, contrariando a tese de que são os melhores modos de transporte de massa. Para agravar ainda mais a crise, 63% das cidades com mais de 300 mil habitantes possuem transporte ilegal, que, de forma preocupante, crescem a cada dia. Um estudo da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) prevê que a falta de investimentos no transporte público, no curto prazo, duplicará o nível atual dos congestionamentos nos próximos dez anos, além de aumentar os acidentes e a poluição nas grandes cidades. Somente na Região Metropolitana de São Paulo, o custo social das externalidades negativas do sistema de transporte público está na casa dos 40 bilhões de reais, por ano. As velocidades médias dos ônibus urbanos são baixíssimas nas grandes cidades brasileiras, em torno de 20 km/h, sendo que Brasília possui a melhor marca, 27 km/h, e Rio e São Paulo as piores, 18 km/h e 15km/h, respectivamente. O sistema metroferroviário brasileiro não ultrapassa a velocidade média de 37 km/h. Milhões de brasileiros perdem, em média, 3 horas por dia dentro de um meio de transporte. Nos casos mais extremos, no Rio e em São Paulo, há casos de pessoas que gastam até 6 horas no trajeto casa-trabalho-casa. Certamente, a solução para os problemas do transporte público nas regiões metropolitanas brasileiras depende exclusivamente de ações políticas. De um modo geral, a mudança do quadro atual somente poderá ocorrer por meio de pesados investimentos em infra-estrutura, tais como em corredores exclusivos para os ônibus urbanos, terminais intermodais, estacionamentos centrais, metrôs, veículos leves sobre trilhos, viadutos, vias subterrâneas ou mergulhões, entre outros. Para que esses investimentos sejam exeqüíveis, há a necessidade de incentivos tributários e fiscais, associados às linhas de financiamento acessíveis para o setor, além de uma política de transporte público competente, planejada, integrada, apartidária e contínua. Tudo isso possibilitaria um futuro melhor para as populações das regiões metropolitanas, que passariam a desfrutar de uma qualidade de transporte público semelhante aos países desenvolvidos, em vez dos precários serviços prestados atualmente, que causam danos físicos e psicológicos irreversíveis. Atualmente, esses precários serviços de transporte são oferecidos maciçamente para as classes C, D e E, ou seja, os trens urbanos atendem 94% de pessoas dessas classes, os metrôs, 64%, e os ônibus urbanos, 71%. O transporte público é essencial para as cidades de médio e grande porte e deve ser considerado como uma necessidade humana básica, uma vez que é o único serviço que participa de todas as atividades da sociedade e afeta as pessoas todos os dias. Caro leitor, vamos discutir este relevante assunto em meu blog (www.jblog.com.br/ttp.php). Feliz Natal. Marcus Quintella 17 O LUCRO DOS TRENS URBANOS E METRÔS (Jornal do Brasil – 03/08/2008) Marcus Quintella Os especialistas em transportes vêm produzindo diversos estudos comprobatórios da viabilidade econômica dos projetos metroferroviários, que mostram claramente que são gerados benefícios sócioeconômicos suficientes para superar os investimentos públicos realizados. Isso significa dizer que os trens urbanos e metrôs são altamente lucrativos, não no sentido financeiro, mas no sentido sócio-econômicoambiental. Vou mais longe ainda, o transporte público sobre trilhos produz, e sempre produzirá, um imensurável lucro humanístico, de grande percepção e possível identificação. Esse lucro humanístico pode ser representado pelos seguintes benefícios tangíveis mais comuns: reduções de acidentes de trânsito, diminuição dos tempos de viagem, economia de combustíveis, eliminação de congestionamentos, redução das poluições atmosférica e sonora, valorização imobiliária, estruturação urbana, desenvolvimento econômico regional, geração de empregos, redução dos custos de manutenção das vias urbanas e aumento de arrecadação tributária. Além disso, são gerados benefícios intangíveis como conforto, segurança, tranqüilidade e qualidade de vida. Os grandes sistemas metroferroviários brasileiros emitem 75% de óxido de nitrogênio a menos que os automóveis com um ocupante apenas e quase nenhum hidrocarboneto e monóxido de carbono. Um trem cheio possui uma eficiência energética 15 vezes superior à do automóvel. Aproximadamente 1.250 passageiros são transportados em uma composição típica de metrô, o que corresponderia a uma fila de 25 ônibus ou a 830 automóveis. São economizadas, nas grandes cidades brasileiras, milhões de horas para os usuários de trens e metrôs, que correspondem a bilhões de reais de benefícios para esses usuários. Ao mesmo tempo, em algumas cidades brasileiras, como Maceió, João Pessoa, e Natal, os pequenos sistemas de trens urbanos, movidos a diesel, produzem os mesmos tipos de benefícios humanísticos dos grandes sistemas metroferroviários, mas de outra forma. Para o leitor ter uma idéia da importância desses sistemas, vou descrever como são transferidos para as populações dessas três cidades os benefícios relatados anteriormente. Os sistemas de trens urbanos dessas três cidades nordestinas são operados pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU, empresa do Governo Federal, vinculada ao Ministério das Cidades, e transportam perto de 30 mil pessoas por dia, que correspondem a 10 milhões de pessoas, anualmente, sem contar a grande evasão observada. A tarifa social cobrada é de R$0,50, para trechos de 30 km, em Maceió e João Pessoa, e de 56 km, em Natal. Os trens da CBTU atendem os pobres municípios das regiões metropolitanas dessas capitais, verdadeiras cidadezinhas de interior, que, para a maioria de seus usuários, são o único meio de transporte disponível ou acessível para transportá-los aos centros urbanos, onde trabalham ou sobrevivem com empregos informais. Muitos usuários da CBTU saem de casa apenas com o dinheiro da passagem de ida, ou seja, com R$0,50 no bolso. Elas se dirigem para os centros para comer, levar algo de volta e conseguir o dinheiro da passagem de volta. Caso consigam comer e voltar para casa, já ganharam o dia. Os demais usuários dependem dos trens da CBTU para trabalhar, senão ficariam em casa, pois as tarifas dos ônibus urbanos são inalcançáveis para eles. Caro leitor, diante do exposto acima, que, in loco, é muito mais impressionante e tocante, como alguém poderia questionar se realmente são verdadeiros os benefícios do transporte urbano sobre trilhos, tanto para os grandes sistemas metroferroviários, como para os pequenos sistemas de trens urbanos? Tudo isso serve para comprovar que o transporte público sobre trilhos não foi feito para dar lucro financeiro, mas lucros sociais e humanísticos, produzidos pelos investimentos e subsídios operacionais bancados pelo dinheiro público. Marcus Quintella 18 PERSPECTIVAS PARA O TRANSPORTE URBANO NO BRASIL (Jornal do Brasil – 07/05/2008) Marcus Quintella Vou aproveitar este espaço para responder uma lista de perguntas sobre as perspectivas do transporte nas cidades brasileiras, formuladas pelo Departamento de Marketing e Comunicação Institucional da Companhia Brasileira de Trens Urbanos – CBTU. Essa mesma lista está sendo apresentada a políticos, gestores públicos, consultores de transporte, acadêmicos, dirigentes de empresas de transporte urbano de passageiros e técnicos do setor, com o objetivo de conhecer e divulgar, em seu portal na Internet (www.cbtu.gov.br), a opinião dessas pessoas sobre os caminhos para a melhoria da mobilidade urbana nas cidades brasileiras. A primeira pergunta quer uma visão sobre o transporte urbano de passageiros nas cidades brasileiras. Lamentavelmente, vejo uma situação caótica nesse setor, visto que não há planejamento sistêmico e integrado dos transportes públicos e, cada vez mais, o rodoviarismo prevalece de forma desordenada, paliativa e empírica. A segunda pergunta busca uma opinião sobre o que seria preciso para se ter um transporte integrado nas metrópoles brasileiras. Penso que a integração entre os modos de transporte somente existirá a partir de planejamentos sérios e apolíticos, baseados em estudos e simulações científicas, com a participação abnegada dos poderes públicos envolvidos e de profissionais confiáveis. A terceira questão pede uma solução para o problema da falta de modicidade tarifária, que restringe a mobilidade da população. O problema da carestia das tarifas do transporte público é decorrente da falta de integração citada acima, bem como dos irrisórios investimentos e dos restritos subsídios e incentivos oferecidos ao setor. A quarta interrogação solicita as perspectivas e os desafios para o transporte sobre trilhos. As perspectivas são animadoras, pois os políticos e governantes passaram a valorizar o transporte sobre trilhos como a melhor solução para desafogar as metrópoles brasileiras. O Governo Federal está anunciando, ainda para este ano, o PAC da mobilidade urbana, que, certamente, privilegiará os trilhos urbanos. O quinto quesito aborda os benefícios que são gerados pelo transporte metroferroviário. Esses benefícios incrementais, mensurados pela comparação entre as situações sem e com o transporte sobre trilhos, são os responsáveis pela viabilidade sócio-econômica e ambiental dos investimentos metroferroviários. Os principais benefícios são as reduções das poluições atmosférica e sonora, dos acidentes de trânsito, dos tempos de viagem, do consumo energético, dos custos de manutenção viária, entre outras. A sexta questão quer saber o que falta para que as cidades brasileiras possuam transporte sobre trilhos. Na verdade, falta a chamada vontade política e maior interesse do setor privado. A sétima pergunta deseja saber se existiria alguma ação emergencial para melhorar o trânsito e o transporte urbano nas congestionadas cidades brasileiras. Não acredito em ações emergenciais. As cidades brasileiras precisam de planejamento de transporte e ações definitivas. A penúltima questão quer conhecer uma forma para tornar o transporte urbano acessível a todos, sem exclusão social. Isso somente ocorrerá quando as cidades brasileiras forem dotadas de sistemas de transporte abrangentes, integrados, econômicos e humanos. Finalmente, o último quesito solicita uma avaliação para o papel atual e futuro da CBTU. O Governo Federal já delegou à empresa a gestão de todos os projetos urbanos sobre trilhos que possuam aporte de recursos da União, além de ter reforçado as suas atribuições atuais de operadora de metrôs e trens urbanos. Fico preocupado apenas com um detalhe para o futuro da CBTU: nos últimos anos, a empresa perdeu boa parte de seu excelente corpo técnico, detentor de grande parte da memória ferroviária do país, e, atualmente, possui um pessoal técnico envelhecido e oferece salários pouco atrativos, que não permitem uma renovação para garantir o seu futuro, ou melhor, o futuro do transporte sobre trilhos no Brasil. Marcus Quintella 19 CIDADES FORA DOS TRILHOS (Revista Ferroviária - março/2008) Marcus Quintella Nos últimos anos, observa-se que muitos países vêm descobrindo o trem como solução para os graves problemas no deslocamento das pessoas em suas populosas metrópoles, ainda mais que existe um consenso entre os especialistas que o transporte urbano sobre trilhos produz reduções de tempo de viagem, poluição atmosférica, consumo energético e acidentes de trânsito e melhora a qualidade de vida da população, desde que bem planejado e integrado com os demais modos de transporte. O transporte público nas grandes cidades sempre foi um desafio para os governantes em todo o planeta, especialmente no Brasil, onde mais de 75% da população reside em áreas urbanas, gerando cerca de 60 milhões de viagens diariamente, já que os locais de moradia, de trabalho e de lazer estão cada vez mais separados espacialmente entre si. Além disso, o Brasil sofre atualmente as conseqüências da infeliz opção pelo transporte rodoviário, feita na metade do século passado, em detrimento do transporte ferroviário. Enquanto nossas grandes cidades possuem pouquíssimas linhas de metrôs e deficientes sistemas de trens urbanos, exceto São Paulo, que vem evoluindo bastante neste ponto, dezenas de metrópoles pelo mundo afora possuem, há muito tempo, competentes redes metroferroviárias, que são a base de seus sistemas de transporte público. Para inverter este quadro caótico do transporte público, torna-se imprescindível uma ação premente do Governo Federal no apoio ao setor metroferroviário. O ponto de partida seria a designação imediata de uma entidade federal com competência e experiência para exercer o papel de órgão de articulação, fomento, apoio técnico-financeiro, orientação e coordenação de uma política nacional do transporte metroferroviário, além de desenvolver estudos e pesquisas necessárias ao planejamento dos transportes sobre trilhos no país. Por sorte, já existe uma entidade pronta para assumir este papel, sem custos adicionais para o erário, que é a Companhia Brasileira de Trens Urbanos - CBTU, criada em 1984 para dar um tratamento diferenciado ao transporte ferroviário urbano e que, desde então, vem sendo uma referência internacional no setor, apoiada em seus recursos humanos de alta competência técnica e gerencial. A CBTU é o único órgão oficial com capacidade de articulação junto aos governos locais das cidades brasileiras e com experiência comprovada no setor ferroviário de passageiros. Entretanto, existe uma interpretação da Constituição Federal que dá competência exclusiva aos estados e municípios sobre as questões de transporte urbano e que pode, inclusive, extinguir ou dissolver a CBTU. Desta forma, caso o Governo Federal não abra seus olhos rapidamente, ocorrerá mais uma decisão insana e equivocada e mais dinheiro público será desperdiçado, além de ser postergada uma oportunidade ímpar de beneficiar o país com uma política nacional de transporte urbano sobre trilhos, capaz de implementar mecanismos coordenados e consistentes de financiamento e apoio técnico ao setor. Em última análise, penso que o Governo Federal não pode fechar as portas da CBTU e prescindir de cerca de 350 empregados de sua administração central, preparados durante 22 anos com dinheiro público para serem as cabeças pensantes que tanto precisamos hoje para ajudar a colocar as grandes cidades brasileiras nos trilhos e, conseqüentemente, melhorar as condições de vida e de bem-estar de seus habitantes. Marcus Quintella 20 A HORA E A VEZ DOS BONDES E METRÔS (Jornal do Brasil – 13/02/2008) Marcus Quintella No início deste mês, o Detran de São Paulo contabilizou a impressionante marca de 6 milhões de veículos emplacados na maior cidade da América Latina. Considerando-se os veículos da Grande São Paulo, esse número atinge 10 milhões de veículos, ou seja, quase 25% da frota nacional. Na prática, essa quantidade de veículos responde pelos estúpidos engarrafamentos diários da capital paulista, que são medidos pela CET, chegando normalmente a 100 km de vias congestionadas. Recentemente, houve registros de 180 km de vias com problemas de tráfego. Tudo isso pode ser traduzido pela distorcida matriz de transporte da Cidade de São Paulo, onde os ônibus e lotações fisgam uma fatia de 35%, os automóveis, de 48%, trem e metrô, de 12%, táxi, moto e outros, de 5%. Em suma, esse quadro reflete a infeliz opção pelos pneus, escolhida pelos governantes brasileiros, desde o início do século passado. Guardadas as devidas proporções, todas as grandes cidades brasileiras apresentam os mesmos problemas de mobilidade urbana de São Paulo, além de registrarem, anualmente, milhares de mortes por causa da poluição e de acidentes de trânsito, apesar de existir um clamor popular pela retirada dos automóveis das ruas e uma reivindicação desesperada pela construção de transporte urbano sobre trilhos. No caso de São Paulo, cujo metrô possui apenas 58 km de extensão e 52 estações, o governo estadual pretende investir R$16 bilhões em transporte público, até 2010, sendo a maior parte em transporte sobre trilhos. Esses investimentos visam retirar um grande número de carros das ruas, reduzir a poluição atmosférica e sonora, proporcionar maior economia de energia e rapidez nos deslocamentos, além de contribuir para diminuir os custos do transporte e, conseqüentemente, elevar a qualidade de vida da população. A idéia do transporte urbana sobre trilhos é antiga, pois os primeiros bondes surgiram em Nova Iorque, em 1827, e eram puxados por cavalos. Dois anos depois, esse tipo de transporte era utilizado em Paris e Londres. No Brasil, os bondes foram introduzidos, primeiramente, no Rio de Janeiro, em março de 1856, e, cinco meses depois, em São Paulo. Em 1927, a Light, concessionária dos serviços de bonde, desde 1900, e de energia elétrica, tinha planos de construir três linhas de metrô em São Paulo, em parceria com a prefeitura. Esse modelo de transporte não era novidade no mundo, uma vez que já existia em Londres, desde 1863, e em Buenos Aires, desde 1913. Lamentavelmente, os políticos da época rejeitaram a proposta da Light e a primeira linha de metrô do país tornou-se realidade quase 50 anos mais tarde, quando a cidade já apresentava os primeiros sintomas do caos urbano que vive hoje. Em 1968, os bondes foram eliminados de São Paulo e, poucos anos adiante, começaram as obras do metrô. Em termos de transporte urbano, especialmente em transporte sobre trilhos, as grandes cidades brasileiras estão engatinhando e precisam, urgentemente, de um plano de longo prazo, eminentemente técnico, com o único objetivo de dotar essas cidades de sistemas de transporte público integrados, abrangentes, energeticamente limpos, operacionalmente eficientes, confortáveis, econômicos e seguros. Caro leitor, pesquise na Internet e procure conhecer melhor os benefícios sociais, econômicos e ambientais dos trens urbanos, metrôs e bondes, para que você possa passar adiante essa boa idéia e, quem sabe, um dia, sensibilizar os políticos para que passem a priorizar os trilhos como base de qualquer sistema de transporte público, de qualquer grande cidade brasileira. Vamos voltar ao início dos tempos e começar outra vez pelos bondes, que, hoje, atendem pelo nome de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). Os bondes ainda existem em 325 cidades de todo o mundo, percorrendo uma rede de 15 mil km de trilhos. Felizmente, muitas cidades brasileiras, como Recife, Fortaleza, Natal, Maceió, João Pessoa, entre outras, estudam o retorno dos bondes, desta vez mais velozes, silenciosos e confortáveis. Quem sabe não chegou novamente a hora e a vez dos trilhos urbanos! Marcus Quintella 21 EXISTE SOLUÇÃO PARA O TRANSPORTE PÚBLICO NO BRASIL? (Revista Plurale – janeiro/2008) Marcus Quintella O transporte público das grandes metrópoles brasileiras, quando comparado a cidades de países desenvolvidos ou mesmo a algumas cidades de países emergentes, apresenta significativas diferenças organizacionais e gerenciais, defasagens tecnológicas e distorções sócio-econômicas. Vou tomar o exemplo de Barcelona, que possui cerca de seis milhões de habitantes e possui um magnífico sistema de transporte público, denominado de Transportes Metropolitanos de Barcelona – TMB, composto por metrô, trens suburbanos e regionais, veículos leves sobre trilhos (bondes elétricos), ônibus urbanos e turísticos, funiculares e táxis. O TMB é coordenado e gerenciado por uma única entidade, a Autoridade de Transporte Metropolitano – ATM, que utiliza um sistema de integração com um único bilhete, que permite ao usuário fazer transferências nos sistemas de metrô, trens, bondes e ônibus, durante uma hora e quinze minutos. Em complemento ao TMB, a infra-estrutura viária da cidade possui avenidas largas, com faixas segregadas para ônibus e táxis, ciclovias demarcadas, estacionamentos subterrâneos, mergulhões, boa sinalização e semaforização sincronizada. Não existem, obviamente, transportes alternativos e clandestinos, visto que o poder público não dá espaço para tais anomalias, simplesmente porque atende com competência e eficácia as demandas por transporte da população. Existe ainda segurança pública, dentro e fora do sistema de transporte e tudo funciona nos horários pré-estabelecidos. Os usuários do TMB podem comprar seus bilhetes integrados em todas as estações de bondes e metrô, através de eficientes máquinas que aceitam cartões de crédito e dinheiro ou nas bilheterias tradicionais do metrô. Os congestionamentos são raros ou toleráveis, mesmo nas horas de rush. Aí, o caro leitor pode argumentar que Barcelona pertence a uma cultura avançada, de Primeiro Mundo etc e tal. Concordo, mas eles começaram tudo isso um dia e vieram evoluindo progressivamente para atingirem o estágio atual. Por que Barcelona e outras grandes cidades espanholas, como Madri, Sevilha e Bilbao, além de outras metrópoles européias, como Paris, Londres, Bruxelas, possuem excelentes sistemas de transporte público? Por que os países europeus investem tanto em transporte público? Simplesmente, os europeus perceberam que o transporte público é fundamental para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. No Brasil, o transporte público não apresenta boa qualidade, carece de grandes investimentos em sistemas integrados e não goza de boa reputação com a população urbana, visto que sua imagem está associada a congestionamentos, poluição, desconforto, insegurança e perdas de tempo. Ademais, os altos custos tarifários do transporte público geram problemas sociais e infelicidade para a população das cidades, bem como malefícios para a economia como um todo, como, por exemplo, desemprego e favelização, bem como aumento dos moradores de rua das grandes cidades, uma vez que os empregadores buscam trabalhadores com moradias próximas aos locais de trabalho, para reduzir faltas, atrasos e gastos com transporte. Então, qual seria a solução para o transporte público no Brasil? Sem dúvida alguma, a solução são os trens e metrôs. Nos países desenvolvidos, não há registro de regiões metropolitanas densamente povoadas, com mais de 10 milhões de habitantes, que contabilizam 70% dos deslocamentos de seus habitantes realizados por ônibus, como ocorre, por exemplo, no Rio de Janeiro e em São Paulo. As grandes metrópoles mundiais possuem competentes sistemas metroferroviários, de alta capacidade, para atender demandas dessa natureza, de forma integrada com os demais modos de transporte complementares e alimentadores. Em termos de vantagens competitivas, se gasta a metade do tempo viajando de trem ou metrô, em comparação com o ônibus ou automóvel. Os sistemas metroferroviários emitem 75% de óxido de nitrogênio a menos que os automóveis com um ocupante apenas e quase nenhum hidrocarboneto e monóxido de carbono. Um trem cheio possui uma eficiência energética 15 vezes superior à do automóvel. Os sistemas de transporte urbano sobre trilhos apresentam baixos índices de acidentes, com milhares de mortes e acidentes de trânsito evitados, gerando menos danos às famílias e à sociedade. Os imóveis residenciais e de negócios lindeiros às estações metroferroviárias são valorizados. Os carros, estações e leitos ferroviários podem ser explorados para a veiculação de propaganda de diversos modos, gerando receitas extra-operacionais e promovendo o interesse público. Aproximadamente 1.250 passageiros são transportados em uma composição típica de metrô, o que corresponderia a uma fila de 25 ônibus ou a 830 automóveis. Marcus Quintella 22 Os estudos de viabilidade econômica dos projetos metroferroviários mostram claramente que são gerados benefícios sócio-econômicos suficientes para superar os investimentos públicos realizados, tais como as reduções de acidentes de trânsito, diminuição dos tempos de viagem, economia de combustíveis, eliminação de congestionamentos, redução das poluições atmosférica e sonora, valorização imobiliária, estruturação urbana, redução dos custos de manutenção das vias urbanas e aumento de arrecadação tributária, além de benefícios intangíveis como conforto, segurança, tranqüilidade e qualidade de vida. Em última análise, as grandes regiões metropolitanas brasileiras precisam, urgentemente, de sistemas de transporte público baseados em espinhas dorsais metroferroviárias, abrangentes e integradas aos demais modos de transporte, para, no futuro, nossos descendentes possam usufruir de melhor mobilidade urbana. Marcus Quintella 23 APOLOGIA AOS TRILHOS URBANOS (Jornal do Brasil – 10/10/2007) Marcus Quintella Mais uma vez quero levantar a bandeira do transporte sobre trilhos como a principal solução para garantir a qualidade da mobilidade urbana nas grandes cidades brasileiras, cujos benefícios são rapidamente percebidos e sentidos pelas pessoas, em decorrência das reduções de tempo de viagem, poluição atmosférica e ruídos, diminuição dos acidentes de trânsito, especialmente aqueles com mortes, economia de combustíveis, e mais conforto, segurança e rapidez. Como estamos cansados de saber, o Brasil sofre atualmente as conseqüências da infeliz opção pelo transporte rodoviário, feita na metade do século passado, em detrimento do transporte ferroviário. Enquanto nossas grandes cidades possuem pouquíssimas linhas de metrôs e deficientes sistemas de transporte urbano, dezenas de metrópoles pelo mundo afora possuem, há muito tempo, competentes redes metroferroviárias, que são a base de seus sistemas de transporte público. Os gravíssimos problemas dos transportes urbanos em nosso país afetam as vidas das pessoas diariamente e custam muito caro para a sociedade como um todo. Como são serviços públicos fundamentais para a qualidade de vida da população, o transporte urbano precisa ser tratado como uma necessidade humana básica, assim como a educação, saúde, habitação, saneamento, segurança e nutrição. A maioria das cidades brasileiras possui sistemas de transportes altamente dependentes do transporte sobre pneus, em vez de privilegiar o transporte sobre trilhos, que é mais econômico, menos poluente e produtor de grandes benefícios sociais. O transporte metroferroviário tem de ser considerado o coração do sistema de transporte público de qualquer grande cidade brasileira, devido a sua enorme capacidade de atender às crescentes demandas por transporte de massa e por sua reconhecida produtividade, competitividade e eficácia. Além disso, o transporte de passageiros sobre trilhos tem um grande poder estruturador sobre a economia das áreas urbanas. As cidades brasileiras precisam de uma política permanente para o financiamento de sistemas de transporte urbano sobre trilhos, baseada em parte dos recursos da CIDE e no sistema BNDES, através de linhas para a infra-estrutura metroferroviária, equipamentos e material rodante, e nos recursos externos das entidades de fomento ao desenvolvimento, como BIRD e BID. Além disso, o transporte urbano sobre trilhos poderia usufruir da redução ou isenção de tributos municipais, estaduais e federais, incluindo combustíveis e energia elétrica, bem como ser contemplado por parcerias público-privadas bem elaboradas e consistentes. Em última análise, vale ressaltar que o transporte metroferroviário de passageiros também gera dividendos políticos, contribui para o desenvolvimento econômico do país, com a geração de milhares de empregos, em virtude da reativação da indústria ferroviária nacional e construção civil. Penso que esta pequena apologia do transporte urbano sobre trilhos seja suficiente para ajudar a causa ferroviária e possa despertar o interesse dos milhões de brasileiros que utilizam o transporte urbano diariamente nas regiões metropolitanas brasileiras. Os altos investimentos em sistemas metroferroviários trazem benefícios duradouros, sendo recuperados por meio do lucro social e ambiental e pelos imensuráveis dividendos da melhoria da qualidade de vida e bem-estar das pessoas. Marcus Quintella 24 POR QUE INVESTIR EM TRENS E METRÔS? (Jornal do Brasil – 05/12/2007) Marcus Quintella A resposta para a questão levantada pelo título deste artigo não precisa vir de especialistas em transportes nem de acadêmicos, pois está na “boca do povo”, como se diz na gíria, uma vez que a insatisfação com a mobilidade nas grandes cidades brasileiras é quase uma unanimidade e atinge toda a população, desde aqueles que usam o automóvel, passando pelos usuários dos sistemas de transporte público, até os pedestres. Já foram realizadas diversas pesquisas sobre o assunto e os resultados são sempre os mesmos, ou seja, os trens urbanos e o metrô figurando como os primeiros colocados na preferência dos cidadãos, enquanto os ônibus municipais e intermunicipais levam a fama de pior desempenho dentre os meios de transportes nas cidades brasileiras. Existem várias razões para a preferência do povo recair sobre os trens urbanos e metrôs, dentre as quais posso citar o alto preço dos combustíveis para os usuários do automóvel, os elevados níveis de poluição sonora e atmosférica, os intermináveis congestionamentos, os temíveis acidentes de trânsito e a inconcebível insegurança pública, com os crescentes riscos de assaltos e roubos nas vias públicas e semáforos das cidades. Os projetos de trens urbanos e metrôs deveriam ser prioritários em todas as secretarias municipais e estaduais de transporte, independentemente da política partidária vigente, em virtude da magnitude dos benefícios sociais que serão levados para toda a sociedade, do papel estruturador que exercerão sobre o crescimento econômico urbano e da influência permanente sobre as vidas das pessoas. Hoje em dia, as populações das maiores cidades brasileiras dependem do transporte público para efetuarem seus deslocamentos, que, lamentavelmente, são deficientes, insuficientes, incompetentes, desintegrados e desorganizados. As regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Fortaleza e Curitiba precisam, urgentemente, de sistemas de transporte público baseados em espinhas dorsais metroferroviárias, abrangentes e integradas aos demais modos de transporte, para, daqui a dez ou vinte anos, nossos descendentes possam usufruir de uma mobilidade urbana melhor. Os especialistas em transportes vêm produzindo diversos estudos comprobatórios da viabilidade econômica dos projetos metroferroviários, que mostram claramente que são gerados benefícios sócioeconômicos suficientes para superar os investimentos públicos realizados, além dos ganhos na arrecadação tributária dos governos e no grande incentivo para a indústria ferroviária e construção civil, com expressiva geração de empregos diretos e indiretos no país. Estimo que as cidades acima, juntas, precisem de cerca de 500 km de novas linhas de trens urbanos e metrôs para atender suas populações durantes os próximos 50 anos. As construções dessas linhas custariam para os cofres públicos, aproximadamente, R$80 bilhões e poderiam ficar prontas, facilmente, em 15 ou 20 anos, no máximo, desde que não ocorram imprevistos políticos, nem interrupções nos fluxos de recursos financeiros. Em termos técnicos, seria possível construir, facilmente, cerca de 25 km de linhas por ano, com investimentos anuais médios de R$4 bilhões. Caro leitor, não fique espantado com as cifras acima, visto que R$4 bilhões anuais equivale a pouco menos de 0,2% do PIB brasileiro e somente a CIDE arrecada o dobro dessa quantia, por ano. Por fim, penso que não existem empecilhos técnico-financeiros para não se investir em trens e metrôs neste país, falta apenas interesse político na questão. Marcus Quintella 25 AS VANTAGENS DOS METRÔS E TRENS: PARTE I (Jornal do Brasil – 20/12/2006) Marcus Quintella Apesar de produzir significativos benefícios sócio-econômicos e ambientais para a sociedade como um todo, o sistema metroferroviário tem baixa participação na matriz brasileira de transporte urbano. Isso decorre, entre outras causas, da insuficiência de mecanismos de financiamento e da falta de planos de integração e programas de incentivo ao transporte público competente. Ademais, existe o histórico desinteresse dos governantes brasileiros pelo bem-estar das pessoas. Numa série de dois artigos, tentarei resumir os principais problemas do setor metroferroviário brasileiro e ousarei apontar algumas possíveis soluções, com o objetivo de orientar os novos governantes que assumirão em janeiro próximo. Daqui a quinze dias, voltarei com a segunda parte, com mais soluções para os problemas do setor. Os primeiros problemas são os desvios da finalidade da CIDE e o desprezo pelas fontes alternativas de financiamento, tais como as PPPs, o pedágio urbano e o mercado de crédito de carbono. A CIDE foi instituída para ser aplicada, obrigatoriamente, no financiamento de programas de infraestrutura de transportes, mas houve um desvio sistemático e comprovado em sua aplicação. Caso o Governo Federal tivesse aplicado corretamente 50% de sua parte da CIDE arrecadada até hoje, as grandes cidades brasileiras poderiam estar construindo quase 200 km de transporte urbanos sobre trilhos, sem sacrifício da reforma da malha rodoviária nacional, que poderia já estar concluída com os 50% restantes. Além disso, se os estados tivessem também investido 50% de sua parte em sistemas metroferroviários, mais 80 km poderiam ter sido construídos. A Lei das PPPs, criada para ser uma forma alternativa de busca de recursos para a realização dos investimentos em infra-estrutura, não consegue decolar, pois há entraves financeiros, políticos e jurídicos que impedem sua implementação, principalmente em nível federal. O ponto de partida para as PPPs federais seria a designação imediata de uma entidade com competência e experiência para exercer o papel de órgão de articulação, fomento, apoio técnico-financeiro, orientação e coordenação de uma política nacional do transporte metroferroviário, além de desenvolver estudos e pesquisas necessárias ao planejamento dos transportes sobre trilhos no país. O pedágio urbano, a princípio, pode parecer mais um impopular aumento tributário, mas, com o tempo, os benefícios para os usuários ou não de transporte público serão reais e notórios. Segundo estudos preliminares, numa cidade como São Paulo, o pedágio urbano, sistema inibidor do automóvel nas áreas centrais das metrópoles, poderia arrecadar R$ 2,5 bilhões anualmente, montante que daria para construir cerca de 15 km de metrô todo ano. Os créditos de carbono poderiam ajudar no financiamento do transporte metroferroviário, mesmo que de forma modesta. Estima-se que, na cidade de São Paulo, os créditos de carbono poderiam financiar uma estação de metrô por ano. Um metrô típico conduziria, anualmente, a uma diminuição de 640 milhões de litros de gasolina, 140 milhões de litros de álcool anidro, 49 milhões de litros de álcool hidratado e mais de 1,7 bilhões de litros de óleo diesel, por conta da menor necessidade de veículos nas ruas. Em valores de 2006, o total de recursos poupados seria de R$ 4,5 bilhões. A redução da poluição do ar evitaria o desembolso de mais de R$150 milhões para mitigação dos impactos gerados. Esse valor seria capaz de sustentar mais de 50 mil bolsasfamília por ano. Marcus Quintella 26 AS VANTAGENS DOS METRÔS E TRENS: PARTE II (Jornal do Brasil – 03/01/2007) Marcus Quintella Há quinze dias, apresentei um resumo dos principais problemas do setor metroferroviário brasileiro e apontei algumas possíveis soluções, com o objetivo de orientar os novos governantes que acabaram de assumir seus mandatos. Neste artigo, fecharei a série mostrando mais algumas soluções e as principais vantagens competitivas dos trens e metrôs para as cidades de médio e grande porte. Como o Brasil apresenta uma das maiores cargas tributárias do mundo, a simples citação da palavra “tributo” tem conotação negativa. Contudo, os governos deveriam entender que a implantação de sistemas metroferroviários, além de produzirem magníficos benefícios sócio-econômicos e ambientais para a população, traz significativos ingressos de impostos aos cofres municipais, estaduais e federal. Em 20 anos, um metrô típico brasileiro tem a potencialidade de arrecadar em tributos o equivalente a 33% dos investimentos em sua implantação. A Linha 1 do Metrô-SP, em 25 anos, proporcionou, em seus entornos, um incremento de receitas de IPTU equivalente a todo investimento realizado pela prefeitura. Em termos de financiamentos de grande porte, inexistem, no país, linhas especiais de empréstimos para a construção de metrôs e trens urbanos e para a aquisição de materiais e equipamentos, nos mercados interno e externo, condizentes com a realidade do setor, sem contar que não há estímulo para a indústria nacional atuar na substituição das importações de trilhos, locomotivas etc. O país precisa de uma indústria ferroviária forte, com apoio governamental para a desoneração tributária de suas produções. Para auxiliar na captação de recursos para obras e investimentos, também em sistemas metroferroviários, o governo federal estabeleceu normas gerais de contratação de consórcios públicos, que torna possível a formação de consórcios, entre os Estados e a União, para a realização de objetivos de interesse comum. Trata-se de um mecanismo ainda pouco utilizado. Outro problema pouco divulgado são as tarifas de energia elétrica, definidas pelo governo federal, que afetam o custo operacional dos sistemas metroferroviários, pois são mais elevadas nos horários de pico, horo-sazonalidade, fato que agrava os custos gerais do transporte público eletrificado, desestimulando os investimentos privados no setor. A suspensão da horo-sazonalidade poderia reduzir as tarifas metroferroviárias em cerca de 15%, segundo estudos do setor. Em termos de vantagens competitivas, gasta-se a metade do tempo viajando de trem ou metrô, em comparação com o ônibus ou automóvel. Um trem cheio possui uma eficiência energética 15 vezes superior à do automóvel. Os sistemas metroferroviários apresentam baixos índices de acidentes, com milhares de mortes e acidentes de trânsito evitados, gerando menos danos às famílias e à sociedade. Os imóveis residenciais e de negócios lindeiros às estações dos sistemas metroferroviários são valorizados. Os carros, estações e leitos ferroviários podem ser explorados para a veiculação de propaganda de diversos modos, gerando receitas extraoperacionais e promovendo o interesse público. Aproximadamente 1.250 passageiros são transportados em um trem de 65 m, o que corresponderia a uma fila de 25 ônibus (300 m) ou 830 automóveis (4 km). Recomendo fortemente aos novos governantes que estudem e entendam os duradouros benefícios sócio-econômicos dos sistemas metroferroviários para a sociedade e percebam as suas vantagens políticas de longo prazo. Feliz Ano Novo. Marcus Quintella 27 METRÔS SEMPRE SÃO VIÁVEIS (Jornal do Brasil – 22/11/2006) Marcus Quintella Com a eleição do novo governador, o Rio de Janeiro volta a discutir seus esquecidos projetos de metrôs, mais especificamente das Linhas 3 e 4, respectivamente, Centro – Itaboraí e Centro – Barra da Tijuca. Para esquentar a nova discussão, o prefeito César Maia declarou que, em sua opinião, a Linha 4 é inviável. Já o futuro secretário estadual de transporte, Júlio Lopes, foi mais prudente e não descartou o projeto, dizendo apenas que a definição dependerá da demanda. Cabe ressaltar que projetos de metrôs e de trens urbanos não devem e nem podem ser avaliados por “achologia” ou “opinilogia”, visto que envolvem grandes investimentos de dinheiro público e influenciarão permanentemente a vidas das pessoas. É notório que a maioria da população da região metropolitana do Rio de Janeiro depende do transporte público para efetuar seus deslocamentos e que este, lamentavelmente, é deficiente, insuficiente, incompetente, desintegrado e desorganizado. O Rio precisa de um transporte público digno de uma cidade dita maravilhosa, baseado num abrangente sistema metroferroviário, devidamente integrado aos demais modos de transporte. Os especialistas em transportes vêm produzindo diversos estudos comprobatórios da viabilidade econômica dos projetos metroferroviários, que mostram claramente que são gerados benefícios sócioeconômicos suficientes para superar os investimentos públicos realizados. Os benefícios tangíveis mais comuns são as reduções de acidentes de trânsito, diminuição dos tempos de viagem, economia de combustíveis, eliminação de congestionamentos, redução das poluições atmosférica e sonora, valorização imobiliária, estruturação urbana, redução dos custos de manutenção das vias urbanas e aumento de arrecadação tributária. Além disso, são gerados benefícios intangíveis como conforto, segurança, tranqüilidade e qualidade de vida. Para o leitor ter uma idéia, os sistemas metroferroviários emitem 75% de óxido de nitrogênio a menos que os automóveis com um ocupante apenas e quase nenhum hidrocarboneto e monóxido de carbono. Um trem cheio possui uma eficiência energética 15 vezes superior à do automóvel. Aproximadamente 1.250 passageiros são transportados em uma composição típica de metrô, o que corresponderia a uma fila de 25 ônibus ou a 830 automóveis. Para reforçar meus argumentos, vou citar o caso do Metrô-SP, cuja economia de combustíveis atual é de 300 milhões de litros por ano, equivalentes a 3 milhões de barris de petróleo bruto, que proporciona uma economia de US$ 200 milhões para o país. Em 2005, os benefícios totais gerados pelo Metrô-SP totalizaram R$ 3,5 bilhões. Não há nenhum projeto de infra-estrutura pública no país que apresente tal nível de retorno. A Linha 1 do Metrô-SP proporcionou, em 25 anos, em seus entornos, um incremento de receitas de IPTU equivalente a todo investimento realizado pela prefeitura. Penso que o novo governo estadual deve aproveitar o canal aberto para entendimento com a prefeitura e o apoio do governo federal, para mudar a grave situação da gestão dos transportes público na região metropolitana. Sugiro que não mais haja discussão sobre a viabilidade de linhas de metrô, pois seria perda de tempo e demonstração de desconhecimento sobre o assunto, visto que metrôs são sempre viáveis em metrópoles como o Rio. Enquanto o tempo passa, as coisas deixam de acontecer e perdemos tempo adiando dias melhores para todos. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer, como sempre diz a canção de Geraldo Vandré. Marcus Quintella 28 NÃO EXISTE TRANSPORTE PÚBLICO NO BRASIL (Jornal do Brasil – 25/10/2006) Marcus Quintella À primeira vista, o assertivo título deste artigo pode parecer rigoroso e implacável, todavia, o seu conteúdo pretende apenas mostrar o atraso dos transportes públicos das grandes cidades brasileiras. O transporte público das grandes metrópoles brasileiras, quando comparado a cidades de países desenvolvidos, ou mesmo a algumas cidades de países emergentes, apresenta significativas diferenças organizacionais e gerenciais, defasagens tecnológicas e incompetências políticas. Para que o leitor tenha idéia do que estou falando, vou tomar o exemplo de Barcelona, que possui cerca de seis milhões de habitantes e possui um magnífico sistema de transporte público, denominado de Transportes Metropolitanos de Barcelona – TMB, composto por metrô, trens suburbanos e regionais, veículos leves sobre trilhos (bondes elétricos), ônibus urbanos e turísticos, funiculares e táxis. O TMB é coordenado e gerenciado por uma única entidade, a Autoridade de Transporte Metropolitano – ATM, que utiliza um sistema de integração com um único bilhete, que permite ao usuário fazer transbordos nos sistemas de metrô, trens, bondes e ônibus, durante uma hora e quinze minutos. Em complemento ao TMB, a infra-estrutura viária da cidade possui avenidas largas, com faixas segregadas para ônibus e táxis, ciclovias demarcadas, estacionamentos subterrâneos, mergulhões, boa sinalização e semaforização sincronizada. Não existem, obviamente, transportes alternativos e clandestinos, visto que o poder público não dá espaço para tais anomalias, simplesmente porque atende com competência e eficácia as demandas por transporte da população. Para matar de inveja os cidadãos metropolitanos brasileiros, há ainda segurança pública, dentro e fora do sistema de transporte e tudo funciona nos horários pré-estabelecidos. Os usuários do TMB podem comprar seus bilhetes integrados em todas as estações de bondes e metrô, através de eficientes máquinas que aceitam cartões de crédito e dinheiro ou nas bilheterias tradicionais do metrô. Os congestionamentos são raros ou toleráveis, mesmo nas horas de rush. Aí, o caro leitor pode argumentar que Barcelona pertence a uma cultura avançada, de Primeiro Mundo etc e tal. Concordo, mas eles começaram tudo isso um dia e vieram evoluindo progressivamente para atingirem o estágio atual. Ao longo do tempo, os espanhóis, assim como os demais povos europeus, perceberam que o transporte público competente, abrangente, econômico, rápido, seguro, confiável e confortável é um magnífico vetor de tranqüilidade e felicidade para a população, além de ser um importante gerador de empregos, redutor de pobreza, estruturador urbano e promotor de desenvolvimento econômico e social. Por que Barcelona e outras grandes cidades espanholas, como Madri, Sevilha e Bilbao, além de outras metrópoles européias, como Paris, Londres, Bruxelas, possuem excelentes sistemas de transporte público? Por que os países europeus investem tanto em transporte público? Simplesmente, porque os políticos e governantes europeus são inteligentes e comprometidos com o bem-estar de suas populações e perceberam que o transporte público é fundamental para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Caro leitor, talvez seja quase impossível chegarmos ao nível de Barcelona ainda neste século, mas poderíamos, no mínimo, batalhar, por meio da pressão popular, para que o transporte público brasileiro passe a ser planejado, integrado, apolítico e mais humano. Marcus Quintella 29 POR UM TRANSPORTE PÚBLICO INTEGRADO (Jornal do Brasil – 11/10/2006) Marcus Quintella Há um consenso entre os especialistas sobre a gravidade da situação da gestão do transporte público nas regiões metropolitanas brasileiras e sobre a falta de maior integração entre os modos de transporte, sobretudo pela dificuldade de entendimento, de um modo geral, entre os governos municipais e estaduais. Segundo a Associação Nacional de Transportes Públicos - ANTP, cerca de 80% da população brasileira reside em áreas urbanas e a maioria depende do transporte público para efetuar seus deslocamentos. Desta forma, a qualidade do transporte de pessoas e mercadorias, nas médias e grandes cidades, está cada vez mais difícil, com alta tendência de crescimento dos congestionamentos, das perdas de tempo, das poluições atmosférica e sonora, dos acidentes, do consumo energético, entre outros malefícios. As nossas regiões metropolitanas vêm apresentando sistemas de transporte desorganizados e deficientes, principalmente em virtude das ocupações desordenadas e usos indevidos do solo urbano, cujas regras e leis para combater tais ações não são cumpridas, assim como são ignoradas as normas federais, estaduais e municipais para a estruturação dos sistemas de transporte. Para efeito comparativo, as metrópoles de Madri, Paris e Nova Iorque possuem sistemas de transporte público organizados e eficazes, baseados nos clássicos modos de transporte por trens urbanos, metrôs e ônibus. O sucesso do transporte público nessas cidades está relacionado à existência, em cada uma delas, de uma única autoridade metropolitana, responsável pelo planejamento geral da infra-estrutura de transporte, integração intermodal, definição de operações, controle do trânsito, integração tarifária etc. No Brasil, a integração teve início com a reforma no sistema de transportes de Curitiba e Goiânia, em 1974, e o sistema de alimentação por ônibus do metrô de São Paulo, a partir de 1975. Os sistemas de transporte integrados por metrôs, trens urbanos, ônibus municipais e intermunicipais, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Porto Alegre, Campinas e noutras de portes médio e grande, surgiram durante as últimas duas décadas, mas são desorganizados institucionalmente e controlados por entidades diferentes, que muitas vezes não se entendem ou possuem objetivos conflitantes. Para que cada região metropolitana brasileira possa apresentar uma organização institucional forte, baseada em modelos sistêmicos e integrados, é fundamental a criação de uma autoridade metropolitana única, controladora do transporte público. Isso poderá atrair o interesse da iniciativa privada em investimentos em transporte metroferroviário, visto que a capacidade de endividamento dos governos encontra-se limitada e, em alguns casos, esgotada. As nossas metrópoles carecem urgentemente de organismos pensadores em transporte público, nos moldes das autoridades únicas existentes em Madri, Paris e Nova Iorque, que promovam discussões técnicas, estudos de viabilidade, pesquisas tecnológicas e planejamento de ações que tragam eficácia e qualidade para o setor. Espero que os novos governantes tenham em mente que o transporte urbano deve ser racionalmente organizado em forma de redes integradas e gerenciado segundo uma visão sistêmica, para que possa atender a população de forma rápida, econômica, segura e confortável, garantindo, assim, uma boa qualidade de vida para todos. Marcus Quintella 30 O TRANSPORTE METROFERROVIÁRIO E SUAS VANTAGENS AMBIENTAIS (Revista Ferroviária – março/2007) Marcus Quintella Apesar de gerar significativos benefícios sócio-econômicos e ambientais para a sociedade como um todo e produzir expressivas externalidades positivas, os sistemas metroferroviários têm baixa participação na matriz brasileira de transporte urbano. Isso decorre de um conjunto de fatores políticos e culturais que não permitem o desenvolvimento do setor, associado ao histórico incentivo ao automóvel. É consenso entre os especialistas em transportes que o uso do automóvel deve ser severamente restrito nas cidades, em virtude de produzirem malefícios ambientais que pioram a qualidade de vida da população. Já o transporte metroferroviário gera uma série de benefícios, tais como as reduções de tempo de viagem, acidentes, congestionamentos e emissão de poluentes atmosféricos, economia de combustíveis etc. Um metrô típico conduz, em média, anualmente, a uma diminuição de 640 milhões de litros de gasolina, 140 milhões de litros de álcool anidro, 49 milhões de litros de álcool hidratado e mais de 1,7 bilhões de litros de óleo diesel, por conta da menor necessidade de veículos nas ruas. Em valores de 2006, o total de recursos poupados seria de R$ 4,5 bilhões. A redução da poluição do ar evitaria o desembolso de mais de R$150 milhões para mitigação dos impactos gerados. Esse valor seria capaz de sustentar mais de 50 mil bolsas-família por ano. Em termos de vantagens competitivas, se gasta a metade do tempo viajando de trem ou metrô, em comparação com o ônibus ou automóvel. Um trem cheio possui uma eficiência energética 15 vezes superior à do automóvel. Os sistemas metroferroviários apresentam baixos índices de acidentes, com milhares de mortes e acidentes de trânsito evitados, gerando menos danos às famílias e à sociedade. A gasolina e o diesel usados no transporte urbano são os principais poluentes que contribuem para o aquecimento global e a poluição do ar, ao liberar emissões de monóxido de carbono (NO), óxido de nitrogênio (NOx), hidrocarbonetos (HC) e partículas. Tais gases causam grandes nevoeiros e são os principais causadores de milhões de internações em emergências hospitalares, na forma de doenças respiratórias (asma), doenças cardiovasculares em crianças e idosos etc. Em 2001, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que, somente em países em desenvolvimento, 700 mil mortes teriam sido evitadas por ano, se fossem reduzidos os agentes poluidores do ar, e ocorreria uma economia anual de US$ 100 bilhões de custos sanitários. O transporte metroferroviário emite 75% de óxido de nitrogênio a menos que os automóveis. O grau de eficiência energética dos sistemas metroferroviários, traduzido em economia de energia, constitui uma das grandes vantagens que essa modalidade tem sobre a concorrência rodoviária. A escassez das fontes de energia em relação à demanda crescente, aliada aos aumentos vertiginosos nos preços do petróleo, justifica o re-direcionamento de políticas de incentivo a investimentos em transporte metroferroviário. Para cada 10 mil veículos, com apenas 1 ocupante (com destino ao trabalho), atraídos para o sistema metroferroviário, acarreta numa economia de aproximadamente 10 milhões de litros de combustível. A energia elétrica, combustível propulsor dos sistemas metroferroviários modernos, configurase numa fonte de energia renovável e limpa, se comparada aos combustíveis derivados do petróleo. O transporte metroferroviário faz melhor uso do espaço urbano, por ter melhor capacidade, visto que uma via de metrô pode transportar 60.000 passageiros por hora, enquanto uma faixa de ônibus urbano pode chegar a 6.700 passageiros por hora e três faixas para automóveis não ultrapassam a 5.450 passageiros por hora. O espaço economizado poderia ser utilizado para criação de áreas verdes, de pedestres, de lazer e comerciais. A construção de vias pavimentadas (impermeáveis), para melhorar a fluidez do trânsito, provoca aumento do coeficiente de escoamento de águas pluviais, porque uma substancial parcela das águas das chuvas, devido à impossibilidade de infiltração no solo, causaria enchentes e toda a sorte de poluição e doenças de veiculação hídrica. Esse fenômeno é responsável por 55% da deterioração dos rios, 46% da poluição dos estuários do mar e por 21% da deterioração dos lagos. A expansão da rede metroferroviária reduziria esses impactos negativos ao meio ambiente. Na realidade, não há argumento algum que possa suportar as decisões governamentais contrárias à implantação de sistemas metroviários nas grandes regiões metropolitanas brasileiras. Em termos sociais, econômicos e ambientais, os metrôs e trens urbanos serão sempre viáveis. Marcus Quintella 31 TRANSPORTE É ENGENHARIA (Revista do CREA-RJ – outubro/2004) Marcus Quintella Em 1926, sob o lema “governar é construir estradas”, Washington Luís assumiu o governo brasileiro construindo duas importantes rodovias, a Rio-Petrópolis, que leva o seu nome, e a Rio-São Paulo, que leva o nome de outro ex-presidente, Eurico Gaspar Dutra. Desde então, a matriz de transportes brasileira vem apresentando um desequilíbrio histórico a favor do modo rodoviário. Tal desequilíbrio pode ser constatado numa simples comparação com as matrizes de transporte de dois importantes parceiros comerciais do Brasil, a China e os Estados Unidos. Enquanto que nos Estados Unidos 33% do transporte de carga é realizado por rodovia e 44% por ferrovia, na China, os modos ferroviário e aquaviário respondem por 87% do mesmo tipo de transporte. Em contraposição, no Brasil, as rodovias são responsáveis por 65% das cargas transportadas e as ferrovias por apenas 20%. TRASPORTE DE CARGAS R OD OVI ÁR I O A QU A VI ÁR I O FER R OVI ÁR I O 80% 60% 40% 20% 0% BRASIL CHINA EUA Font e: GEIPOT, 2002 A nossa rede ferroviária possui apenas 29 mil quilômetros de extensão, contra 162 mil dos EUA e 73 mil do Canadá, países do mesmo porte territorial do Brasil. Já a Argentina, três vezes menor que o Brasil, possui 36 mil quilômetros de ferrovias. Em termos produtivos, os EUA transportam 14 vezes mais que o Brasil e o Canadá 2 vezes e meia. A velocidade média de nossos trens não passa de 25 km/h, contra os 80 km/h dos trens americanos. Desta forma, não há como negar que vivemos num país que prioriza o modo rodoviário, mas que praticamente não possui rodovias. Esta assertiva pode ser facilmente comprovada pela extensão de nossa malha rodoviária pavimentada, de 165 mil quilômetros, que corresponde a menos de 10% do total das rodovias do país. Os Estados Unidos possuem uma malha com 5.169 mil quilômetros de rodovias pavimentadas, ou seja, 31 vezes maior que a brasileira, e a França, com 6,5% da superfície do Brasil, possui 738 mil quilômetros de rodovias. Além disso, apenas 20% das rodovias brasileiras podem ser consideradas boas ou ótimas. As estradas restantes apresentam precariedade contundente, com pavimentos em notória decomposição, sinalizações inexistentes, gerenciamento de tráfego ineficaz, traçados perigosos e não contam com policiamento adequado, sendo palcos de emboscadas, assaltos e acidentes. Em conseqüência desse lamentável quadro, todos os dias ocorrem cerca de 720 acidentes nas rodovias pavimentadas do país, provocando a morte de 35 pessoas por dia e deixando 417 feridos, dos quais 30 morrem posteriormente em decorrência do acidente. São quase três mortes por hora, em média, ou uma morte a cada vinte minutos. Em resumo, são mortas, em média, 24 mil pessoas por ano, em razão de acidentes nas estradas, que corresponde a 182 aviões Boeing 737, lotados. Na realidade, trata-se de um exemplo de desleixo com o dinheiro do contribuinte e de malversação do patrimônio público, principalmente por parte da classe política. Apesar dos desanimadores números apresentados acima, o transporte rodoviário é considerado o alicerce do progresso e do desenvolvimento do país. Contudo, o escoamento das exportações e produções industrial e agrícola brasileiras ficará comprometido nos próximos anos e o tão esperado espetáculo do crescimento poderá sofrer um atraso considerável. Como exemplo, a produção atual de soja, na casa dos 52 milhões de toneladas, passará para 120 milhões de toneladas, em 2006, e terá de ser transportada pelas mesmas rodovias e ferrovias que hoje são utilizadas, caso não haja novos investimentos em infra-estrutura Marcus Quintella 32 de transporte. Fica fácil imaginar os quilométricos estacionamentos de caminhões nas margens das rodovias, a falta de capacidade das ferrovias e a conseqüente perda de competitividade de nossos produtos no mercado externo, sem contar os custos intangíveis para a sociedade como um todo. A magnífica safra brasileira de grãos sofre problemas logísticos e é quase toda transportada por caminhões, de forma perigosa, lenta e cara, além de ser embarcada para o exterior em portos com altos custos de movimentação e com graves problemas de infra-estrutura. Estima-se que a logística no Brasil seja 70% mais cara do que nos Estados Unidos. Estudos mostram que o Brasil tem a desprezível participação de menos de 1% no comércio mundial. Tal fato pode ser atribuído em grande parte, à falta de investimentos no transporte ferroviário e na modernização dos portos. Analisando somente este cenário, torna-se óbvia a necessidade de uma mudança radical em nossa atual matriz de transportes de cargas, para que possamos atender as demandas futuras e garantirmos o desenvolvimento e crescimento sustentado do país. A melhor solução seria a utilização mais racional dos demais modos de transporte, ferroviário, aquaviário, dutoviário e aeroviário, e dos sistemas intermodais, ou seja, os terminais rodo-ferroviários e portuários, os centros de distribuição, os armazéns gerais e os aeroportos, com investimentos imediatos para proporcionar aos produtores, às indústrias e à sociedade uma logística de primeiro mundo. Certamente, a tão sonhada erradicação da pobreza em nosso país não dependerá apenas das obras para o melhoramento da infra-estrutura do transporte de cargas, mas também dos investimentos em transporte público de metrôs e trens. A erradicação da pobreza vai muito além do Programa Fome Zero, pois dependerá da vontade política em ações que garantam à população acesso às clássicas necessidades humanas básicas, que compreendem educação, saúde, nutrição, água, saneamento e habitação. Nesse contexto, deve-se incluir o transporte como uma das necessidades humanas básicas, uma vez que os deslocamentos casa-trabalho, casa-escola e casa-lazer, o acesso a hospitais, a chegada dos alimentos à população, o escoamento das produções agrícolas e industriais e a comercialização de produtos e serviços dependem fundamentalmente de alguma modalidade de transporte. O transporte é um fator de extrema relevância para a melhoria de vida das pessoas e deveria sempre ser privilegiado nas ações de combate à pobreza, pois é o único serviço que participa de todas as atividades da sociedade e afeta as pessoas todos os dias. Além disso, mais de 75% dos brasileiros residem em áreas urbanas, onde ocorrem cerca de 60 milhões de viagens diariamente, em decorrência dos locais de moradia, de trabalho e de lazer estarem cada vez mais separados espacialmente entre si. As cidades brasileiras de médio e grande portes carecem de metrôs, trens suburbanos ou veículos leves sobre trilhos, desde que planejados de forma racional e integrados aos demais modos de transporte e com política tarifária adequada ao poder aquisitivo da população. A efetiva erradicação da pobreza no Brasil deve começar pela implementação de projetos de transportes que produzam reais benefícios sociais, econômicos, ambientais e humanos para toda a população, de forma que suas finalidades precípuas sejam atingidas: deslocar seres humanos de forma econômica, rápida, segura, confortável e saudável. Os poderes públicos responsáveis pelas políticas de transporte deveriam pensar seriamente em modificar a matriz de transportes em nosso país, para que as modalidades de transportes urbanos, regionais e de carga sejam mais equilibradas, possam ser sólidos pilares de nosso crescimento econômico sustentado e contribuam efetivamente no combate à pobreza. Diante da magnitude do problema, a solução deveria ter por base um plano plurianual de recuperação, duplicação e conservação de rodovias, construção e reativação de ferrovias e hidrovias e a construção de dutovias, cujos financiamentos teriam por base a correta destinação dos impostos pertinentes, os bancos de fomento ao desenvolvimento, a expansão das concessões privadas e a utilização do modelo de parceria público-privada, ainda embrionário e em aprovação no congresso nacional. Independentemente da aprovação das parcerias público-privadas, encontra-se em prática no país, desde o início das privatizações, por volta de 1996, uma modalidade de financiamento de grandes projetos, denominada Project Finance, como forma de facilitar as concessões rodoviárias, as construções de usinas hidrelétricas e as explorações de campos petrolíferos, com a participação da iniciativa privada. O Project Finance clássico, extremamente raro, é uma forma de engenharia financeira sustentada contratualmente pela certeza do fluxo de caixa do projeto. No caso dos transportes, de carga e de passageiros, uma boa solução seria a adoção do modelo Built, Operate and Transfer - BOT, isto é, a iniciativa privada constrói um determinado sistema de transporte, recebe a concessão para operá-lo por 25 ou 30 anos e depois transfere Marcus Quintella 33 tudo para o poder concedente, o Estado. Na prática, trata-se de uma parceria entre Estado e iniciativa privada, uma vez que os poderes públicos estão sem capacidade de investir e as empresas precisam de trabalho. Assim, o Estado entraria com uma parte do investimento, com recursos do erário, do BIRD ou do BNDES, por exemplo, e a iniciativa privada entraria com o restante, com recursos próprios e/ou de terceiros. Ambos parceiros estarão, certamente, visando lucro, sendo que o Estado deverá almejar somente o lucro social, ou seja, os benefícios para a sociedade como um todo, e a iniciativa privada deverá perseguir o lucro financeiro e a criação de valor para seus acionistas. Em última análise, governar não é somente construir estradas, mas construir um sistema de transportes multimodal eficiente, eficaz e equilibrado e promover condições para a iniciativa privada participar desse grande projeto, com uma legislação tributária justa, linhas de financiamento dentro dos padrões internacionais, estabilidade econômica e garantia de cumprimento dos planos de governo e de continuidade administrativa no longo prazo. Tudo isso envolverá, obrigatoriamente, a excelente engenharia nacional, em todas as suas especialidades, gerando empregos, movimentando o comércio e a indústria, revitalizando as empresas de consultoria, incrementando a construção civil e valorizando os profissionais de engenharia, arquitetura e agronomia. Marcus Quintella 34 Marcus Quintella 35