Relações para a Inovação no Cluster Têxtil de Blumenau: a Interação das Empresas com os Sistemas Nacional e Regional de Inovação Autoria: Micheline Gaia Hoffmann, Nelci Moreira de Barros, Ilisangela Mais, Mohamed Amal RESUMO O artigo explora a inovação como um fenômeno interativo, que exige das organizações habilidades para o estabelecimento de mecanismos de relação não apenas com outras empresas, mas com diferentes atores componentes dos sistemas nacionais e regionais de inovação. O número de empresas do setor têxtil instaladas em Blumenau, SC, sua tradição, o volume de empregos gerados e sua importância na economia regional, são fatores que justificam a o reconhecimento deste como um importante cluster em nível nacional. A pesquisa investiga a rede de relações mantidas pelas empresas deste cluster com vistas à intensificação de sua capacidade de inovação. São identificados os atores com os quais elas mantêm relações, explorando-se para cada um deles o tipo da relação mantida, bem como a freqüência. Ao perfil de cooperação identificado são comparados os resultados em inovação conseguidos. Os dados obtidos levam à conclusão de que há na região um entendimento predominante da inovação como um desafio solitário que resulta na busca de soluções próprias, baseadas num processo endógeno de gestão. Com isso, a interação no sistema e o usufruto das possibilidades de cooperação ficam prejudicados, comprometendo a capacidade inovativa do cluster, que fica limitada a uma perspectiva mais incremental. 1- Apresentação e objetivos O ato de inovar está associado a um arcabouço de novos conhecimentos e de conhecimentos previamente existentes reunidos e combinados com vistas ao desenvolvimento e à implantação de novas tecnologias de processos produtivos e gerenciais e ao desenvolvimento, lançamento, comercialização e apropriação de novas tecnologias de produtos no mercado, de tal forma que possam agregar valor à economia. (SCHUMPETER, 1982; THEMA GUIDE, 1998). Para a inovação acontecer, todo um espectro de conhecimentos que ultrapassam o escopo da tecnologia faz-se necessário. Aspectos como o financiamento, a produção, a logística, e a difusão mercadológica são não apenas pertinentes como essenciais para que se migre da invenção à inovação. Assim, a inovação pode ser compreendida sob três perspectivas: como um processo criativo, como um processo de consumo-demanda por produtos inovativos e como um processo de difusão. Todas estas questões tornam elevado o grau de complexidade que caracteriza o processo de inovação. São muitas as variáveis envolvidas, que exigem uma interação sistemática entre atores de diferentes naturezas, de tal forma que a inovação não pode ser desenvolvida dentro de um contexto único e específico. Ela envolve também variáveis relacionadas à ciência, à economia, à sociedade, ao governo, tornando-se necessária a interação entre atores com vocações e competências complementares em relação aos diferentes desafios que caracterizam o processo de inovação como um todo. Neste contexto, surge o conceito de sistemas de inovação, que, segundo Freeman (1995), derivam das interações e das redes de relacionamento que caracterizam a natureza da arte de inovar. O entendimento do papel dos sistemas de inovação na capacidade inovativa das 1 empresas transcende a compreensão do conceito de inovação como um fenômeno linear e endógeno. A partir esta perspectiva, autores como Schumpeter (1982), Christensen (2000) e Kim (2004) abordam a relevância da interação e da cooperação como elementos do processo de inovação nas empresas, assim como Lundval (1992) e Freeman (1995) destacam o papel destes relacionamentos ao desenvolvimento regional, sobretudo aquele desenvolvimento baseado na capacidade das organizações para produzir, utilizar e difundir conhecimentos sob a forma de novos produtos, serviços e processos. Ou seja, sob esta base conceitual, a capacidade de inovação das organizações é diretamente relacionada a sua disposição e capacidade para se articular com parceiros externos. Tanto maior será a capacidade de inovação quanto mais esta articulação envolver atores de naturezas distintas e complementares, com os quais são mantidos processos sistemáticos de interação. Nesta perspectiva, o objetivo desta pesquisa é caracterizar a rede de relações em prol da inovação mantida pelas empresas do setor têxtil de Blumenau. Especificamente, a pesquisa identifica com quais atores do sistema nacional e regional de inovação estas empresas mantêm relações, a natureza e a freqüência destas relações. Aos perfis de relacionamento identificados, a pesquisa confronta os resultados em inovação conseguidos pelas empresas correspondentes, levando-se em conta, como fator interveniente, o porte das empresas. 2- Inovação – um fenômeno interativo A inovação pode ser compreendida como um ciclo que apenas se consolida quando novos conhecimentos são apropriados no setor produtivo e difundidos a ponto de gerarem ganhos econômicos e sociais (SCHUMPETER, 1982). Portanto, embora a geração de novos conhecimentos esteja associada à pesquisa científica, para que a inovação aconteça, este tipo de esforço não é suficiente. Fazem-se também necessários processos de transferência de tecnologia, comercialização e distribuição. Adicionalmente, é preciso reconhecer que embora as empresas também possam desenvolver novas tecnologias por meio de pesquisas realizadas internamente, freqüentemente o conhecimento científico poderá ser fundamental. Mormente quando se deseja realizar inovações que ultrapassem a perspectiva incremental, baseadas na melhoria e aperfeiçoamento de produtos e processos já existentes, pesquisas desenvolvidas em diferentes ciências e áreas do conhecimento podem ser de contribuição decisiva (KIM e MAUBORGNE, 2004;, CHRISTENSEN, 2000). Além disso, interações com empresas atuantes em outros setores ou mesmo com concorrentes têm se mostrado úteis para a realização da inovação, por meio de contratos de licença, joint venture, dentre outros mecanismos (LANDAU, 1991). As inovações incrementais, guiadas pela força das demandas já estabelecidas em mercados conhecidos, embora tenham sua importância reconhecida, vêm cedendo espaço ao reconhecimento da importância crescente que inovações de ruptura possuem num ambiente altamente competitivo e em constante transformação. A noção central é de que a tecnologia pode progredir mais rápido que as demanda de mercado. Esta abordagem é sustentada por pesquisas recentes de vários autores, dentre eles Kim e Mauborgne (2004) e Christensen (2000), assim como encontra respaldo também em abordagens clássicos de autores como Schumpeter (1982). Assim, verifica-se uma variedade de atores de diferentes naturezas associados ao entorno da inovação. Esta variedade justifica-se pelas diferentes fases que compõem o processo de inovação como um todo, caracterizadas, cada uma delas, por diferentes necessidades. Estudos sobre inovação realizados por diferentes instituições corroboram esta noção de que a 2 cooperação entre as empresas apresenta importância máxima no processo inovativo. Em ONUDI (2002), por exemplo, são apontadas três estratégias principais por meio das quais as empresas estabelecem tais relações de cooperação. A primeira delas é com empresas da mesma cadeia de valor. Por meio desta estratégia, as empresas podem adquirir tecnologia desenvolvida por seus provedores de maneira rápida, porém a custos elevados. A segunda estratégia vislumbra custos e também riscos menores. As alianças e consórcios de investimentos constituem alternativas plausíveis para amenizar o volume de recursos e a intensidade de incerteza que caracterizam principalmente as fases básicas e pré-comerciais do processo inovativo. No escopo desta estratégia, uma alternativa reconhecida para atender as mesmas necessidades é a aglomeração geográfica. Alvo de várias discussões entre os economistas, as vantagens da aglomeração geográfica tomaram novo impulso com a identificação de suas vantagens para o compartilhamento de conhecimentos intrínsecos ao processo de desenvolvimento de novas tecnologias, além da otimização de recursos, economias de escala, dentre outros benefícios tradicionalmente reconhecidos. Contudo, estas estratégias sugerem a viabilização de experiências de cooperação restritas a uma única cadeia de valor. Por meio de alianças dessa natureza, avanços obtidos em diferentes setores ou áreas do conhecimento podem passar despercebidos, ficando o processo de aprendizagem comprometido e a potencialidade inovativa prejudicada. Esta é uma potencial restrição inerente á potencialidade vista no conceito de clusters e arranjos produtivos locais para a competitividade das empresas. A terceira estratégia apontada em ONUDI (2002), contudo, ultrapassa esta limitação. O relatório demonstra que as empresas estão investindo no estabelecimento de vínculos mais estreitos com as ciências básicas, buscando os conhecimentos especializados das universidades e centros de pesquisa. Na medida em que estas instituições têm caráter multidisciplinar, esta estratégia constitui uma oportunidade para as empresas acessarem conhecimento de diferentes ciências. Aos atores externos relevantes ao processo de inovação cabe não deixar de lembrar dos atores internos. A importância das atividades de P&D desenvolvidas pelas empresas e sua influência sobre os resultados corporativos no quesito inovação tem seu reconhecimento tão explícito ao ponto de os investimentos em P&D constituírem um dos principais indicadores adotados em estudos sobre o comportamento inovador de empresas e mesmo de regiões e países. Contudo, a ascensão de temas como aprendizagem organizacional (SENGE, 1990) e gestão do conhecimento nas empresas (NONAKA, 1991; NONAKA e TAKEUCHI, 1997) têm em comum o fato de despertarem para o ponto em que se deve reconhecer que, no processo inovativo, há mais por ser considerado nas empresas que o departamento de pesquisa e desenvolvimento. Freeman (1995) atribui importância crucial para a inovação e para o êxito das empresas, à capacidade para acumulação e geração interna de conhecimento, por meio dos processos formais e informais de formação de pessoal. Seguindo esta linha, Freeman (1995) conclui que a inovação é um processo interativo em que a empresa adquire conhecimentos a partir de sua própria experiência nas etapas de desenho, desenvolvimento, produção e comercialização, e também num processo permanente de aprendizagem em função de suas relações com diversas fontes externas, como fornecedores, clientes, concorrentes, consultores, universidades e centros de pesquisa. Isso resulta num processo complexo e interativo, que ultrapassa a compreensão da inovação sob uma premissa mecanicista, baseada em modelos seqüenciais e lineares, da pesquisa à produção e desta para 3 o mercado (TÖDLING e KAUFMANN, 2002). A interatividade do modelo não linear referese não apenas às colaborações internas entre os diversos departamentos que compõem a empresa, mas também à interação da empresa com diferentes atores de seu entorno. 3- Os Sistemas de Inovação como fomento e suporte à cooperação O conceito de sistema de inovação está associado ao conjunto de instituições, organizações e empresas que interagem em um determinado ambiente com vistas a promover a capacidade inovativa das empresas. Na visão de Freeman (1995), mais que estarem associados, os sistemas de inovação derivam das interações e das redes de relacionamento que caracterizam a natureza da arte de inovar. Lundvall (1992) enfatiza que o processo interativo no qual as empresas, instituições e organizações se envolvem para produzir, utilizar e difundir conhecimentos sob a forma de novos produtos, serviços e processos, está na base do conceito. Portanto, trata-se de termo que ultrapassa o paradigma da inovação como um fenômeno linear e endógeno às empresas. Até aqui, dois componentes ficam colocados em evidência como parte dos sistemas de inovação: as organizações (nas quais estão incluídas as empresas) e as instituições. Silva (2003) destaca o território como terceiro componente. De maneira gráfica, o modelo proposto pode ser representado da seguinte forma: Figura 1 – Componentes dos Sistemas de Inovação Fonte: Adaptado de Silva, Fábio Q. B. Sistemas Locais de Inovação: Algumas reflexões para a construção de uma base conceitual. Anais do I Simpósio em Gestão Estratégica de Negócios. Rio de Janeiro, 2003. A figura 1 facilita a compreensão da classificação dos sistemas de inovação em dois diferentes níveis: o nacional e o regional, da qual originam-se os conceitos de Sistemas Nacionais de Inovação e Sistemas Regionais de Inovação. A partir da figura, os Sistemas Nacionais, podem ser compreendidos como resultantes das interações entre o eixo das organizações e das instituições, já que o componente território é mais frágil em função do baixo nível de concentração geográfica intrínseco a este conceito. Já os Sistemas Regionais, originam-se das interações entre os três eixos, visto que, além das organizações e instituições de nível local e regional, neste nível a alta concentração geográfica permite a inclusão do componente território. Isto pode sugerir que o nível do sistema regional seja superior ao nacional em potencialidade. Contudo, a partir do que segue, o que se percebe é a complementaridade entre os dois conceitos. 4 Observa-se que nas redes externas em que as empresas interagem com vistas ao desenvolvimento de sua capacidade inovativa, governos e agências de fomento ocupam espaço no sentido de criar e desenvolver políticas que contribuam para a consolidação de um ambiente favorável à inovação, quer sob o ponto de vista da regulamentação, quer sob o ponto de vista do financiamento. No conceito de sistemas de inovação, estes atores encontram-se no componente institucional, sendo desejável que o componente territorial atue no sentido de promover a complementaridade entre os programas oriundos destas políticas. Isto é, no nível regional, estes atores estariam focados no desenvolvimento de ações capazes de atender peculiaridades não atendidas pelos programas nacionais, mas em sinergia com a política comum a todos os componentes do sistema. Neste sentido, o conceito de sistemas de inovação supõe haver responsabilidades centralizadas no status nacional, acompanhadas de responsabilidades de interlocução com as empresas que cabem a instâncias regionais e locais. Adicionalmente, além de reconhecerem peculiaridades regionais, os programas oriundos de uma política de desenvolvimento tecnológico têm o desafio de estabelecer tratamento diferenciado às empresas de diferentes portes e setores. A dinâmica de pequenas ou grandes empresas, ou de empresas atuantes em setores intensivos em capital ou em trabalho, por exemplo, é diferente. As estratégias que guiam a inovação, bem como as estruturas que lhes dão suporte, são distintas nestas diferentes categorias de empresas. Portanto, no estrato dos governos e agências de fomento que compõem os sistemas de suporte à inovação, é desejável encontrar programas que venham ao encontro de tais peculiaridades. Por outro lado, esta variedade de programas convergentes com uma política comum, pode enriquecer a aprendizagem proporcionada pela interação na rede. Assim, Sistemas Nacionais de Inovação virtuosos reconhecem e executam com eficácia seu papel no financiamento do investimento inovativo, por meio da ação do governo e agências de fomento. Financiamento da pesquisa (especialmente da pesquisa básica), incentivos fiscais e subsídios à inovação tecnológica são questões que compõem o espectro de ação dos SNI. Na base disso, está o papel da regulamentação, desempenhado exclusivamente pelo governo. Uma diferença importante entre os sistemas regionais e os nacionais está situada no processo de aprendizagem proporcionado por cada um deles. Em função do componente território, os sistemas regionais têm vantagem sobre os nacionais no sentido de que podem proporcionar o compartilhamento de conhecimento tácito (NONAKA e TAKEUCHI, 1997), que requer interação direta, confiança, cumplicidade e outros elementos em que a distância geográfica pode ser prejudicial. Lundvall (1992) e Porter (1998) são grandes defensores desta potencialidade intrínseca à territorialidade. Contudo, esta vantagem pode facilmente tornar-se um ponto fraco se os componentes do sistema regional mantiverem sua rede de relações restritas ao território. Pesquisas ilustram esta assertiva ao apontar que as empresas confinadas a sua região tendem a caracterizar-se por menor nível de inovação em relação àquelas que mantêm redes externas (TODLING e KAUFFMANN, 2002). De um modo geral, o sucesso de um cluster é avaliado em função da capacidade competitiva das empresas que o compõem. A contribuição do cluster ao incremento da competitividade destas empresas dá-se em função de uma série de vantagens (TÖDTLING e KAUFMANN, 2002), tais como: suporte ao desenvolvimento de fornecedores locais especializados; geração de economias de escala; ampliação da disponibilidade e da flexibilidade do mercado de trabalho; disponibilidade de informação, eliminação de gargalos tecnológicos comuns, dentre vários outros. Adicionalmente, como observado anteriormente, em função dos processos de interação e networking intrínsecos ao cluster, facilitados pela proximidade física, ele 5 proporciona ainda a seus integrantes maiores possibilidades para o aprendizado coletivo e para a conversão de conhecimento tácito em ações e benefícios concretos. Contudo, paralelamente às vantagens que clusters bem sucedidos proporcionam a seus integrantes, alguns aspectos desfavoráveis têm sido observados em várias experiências (IEDI, 2005; COOKE, 2002) e merecem ser considerados, dentre eles: tendência à localização de parcerias na própria região; cooperação externa, quando ocorre, especialmente centrada em clientes e fornecedores da própria cadeia produtiva; baixa freqüência de cooperação com parceiros externos focados na inovação; pequena cooperação com a academia e com outras cadeias produtivas; foco maior na solução de problemas do que na exploração de oportunidades; inflexibilidades geradas pelo excesso de especialização; poucos gastos em inovação e desenvolvimento de produtos; dificuldades de acesso a informações sobre produtos e tendências de mercado; carência de serviços técnicos e profissionais especializados. Alguns dos aspectos acima podem limitar a potencialidade do cluster para processos mais vigorosos de inovação, sobretudo inovações de ruptura (CHRISTENSEN, 2000). A interação proporcionada pelos clusters contribui bastante para o processo de melhoria contínua, associado aos conceitos de inovação incremental e sustentada (CHRISTENSEN, 2000) A estes resultados está associado o compartilhamento de conhecimento tácito, viabilizado pelas relações de confiança, cooperação e interação freqüente estabelecidas no interior do cluster. No entanto, embora estas inovações sejam relevantes à manutenção da competitividade empresarial no mercado global, vantagens competitivas mais significativas exigem, cada vez mais, saltos de qualidade associados a inovações de ruptura. E a ausência de relações externas à localidade do cluster limita o acesso a culturas, experiências e conseqüentemente, conhecimentos mais heterogêneos. Além disso, a ausência do componente institucional na rede do cluster, especialmente de instituições focadas na inovação, podem representar limitações às empresas no que tange a capacidade para inovações mais intensas e vigorosas. Algumas instituições que podem contribuir neste sentido são as universidades, centros de pesquisa, parques tecnológicos e centros de transferência de tecnologia, cujo papel está relacionado à geração de conhecimento básico e à intermediação entre o ambiente acadêmico e o empresarial respectivamente. Como visto, apesar de não constituir uma vocação das empresas, a pesquisa básica é o elemento fundamental de inovações mais vigorosas. Por meio da interação com a ciência esta limitação pode ser ultrapassada pelas empresas componentes do cluster. Assim, mais do que extrapolar a territorialidade, é um desafio ultrapassar as barreiras dos setores e diversificar a natureza dos parceiros, visando à variedade de conhecimentos necessária à viabilização da inovação, enquanto fenômeno multidisciplinar. 4- Aspectos metodológicos A pesquisa tomou como universo o total de estabelecimentos formalmente atuantes no setor têxtil do município de Blumenau. Visando a intenção de considerar as peculiaridades inerentes ao porte das empresas nas análises dos dados, foram calculadas amostras representativas por porte, conforme segue. 6 Tabela 1 – Plano Amostral Porte (1) Empregados Pequeno 0 a 49 Médio Estabelecimentos Amostra Realizados 1485 305 270 de 50 a 249 45 40 34 Grande acima de 249 13 13 13 - Total 1543 358 317 Fonte: Base de dados PIS-IPS/FURB A seleção da amostra para as pequenas e médias empresas admitiu uma margem de erro de 5,4% e 8,3% respectivamente. Os dados foram coletados ao longo do segundo semestre de 2006, por meio de entrevistas estruturadas realizadas in loco. Com vistas ao atendimento dos objetivos propostos, o instrumento de coleta de dados foi estruturado com vistas a identificar os atores com os quais as empresas mantêm relações voltadas à inovação: Universidades; Instituições de ensino superior; Governo; Entidades de classe; Concorrentes; Fornecedores; Clientes; Empresas de Consultoria; e Instituições prestadoras de serviço. O instrumento não contemplou elementos para a classificação das relações quanto a sua localização no sistema nacional ou regional de inovação; o julgamento neste sentido foi estabelecido na análise dos dados. Verificou-se ainda a freqüência das relações mantidas, se esporádicas ou sistemáticas. Adicionalmente, foi investigado o objeto da relação: Troca de idéias; Uso de equipamentos e laboratórios; Ações conjuntas de P&D; Uso de corpo técnico / docente; Transferência de tecnologia; Treinamento; Consultoria; Orientação empresarial; Ações de marketing; Recursos financeiros. Finalmente, foram investigados os resultados obtidos em inovação nos 24 meses que antecederam a realização da pesquisa. 5- Relações para a inovação no cluster Têxtil de Blumenau – Apresentação e Análise dos Resultados da Pesquisa Tendo-se em vista os objetivos da pesquisa, um primeiro conjunto de dados relevante á condução das análises diz respeito à identificação da rede de relacionamentos para a inovação mantida pelas empresas. A tabela 2 condensa estes dados, distinguindo-os por porte das empresas. 7 Tabela 2 - Rede de relacionamento Parceiros Universidades/Centros de Pesquisa Instituições de Ensino Superior Governo Entidade da Classe Empresarial Concorrentes Fornecedores Clientes Instituições Prestadoras de Serviços Grandes Médias Pequenas Empresas % Empresas % Empresas % 7 53,85 4 11,76 3 1,11 5 38,46 0 0 1 0,37 6 8 46,15 61,53 3 9 8,82 26,47 2 23 0,74 8,52 6 10 9 9 46,15 76,92 69,23 69,23 3 13 7 11 8,82 38,24 20,59 32,35 28 41 34 17 10,37 15,18 12,59 7,08 Fonte: a partir da pesquisa Nota: Grande porte: o percentual foi calculado sobre 13 empresas; Médio porte: o percentual foi calculado sobre 34 empresas; Pequeno porte: o percentual foi calculado sobre 270 empresas. A análise destes dados demonstrou um comportamento significativamente diferente entre as empresas de diferentes portes, com uma relação direta entre o porte e a amplitude da rede de relacionamento. É nítida a maior intensidade de relacionamentos externos pelas grandes. Detalhando-se as análises das empresas de grande porte, levando-se em conta a freqüência (esporádica ou sistemática) e natureza das relações mantidas, nota-se que clientes, fornecedores e entidades de classe são os atores com quem as empresas mais mantêm relações sistemáticas, com freqüência de citação de 46,15% para os clientes e de 38,46% para os outros dois grupos de atores. Nos três casos, as relações mantidas estão focadas na troca de idéias. Ações de P&D sistemáticas são mantidas por poucas empresas: apenas duas, com fornecedores, e uma, com entidades de classe e concorrentes. Analisando-se as relações esporádicas das grandes, as empresas de consultoria aparecem como ator mais citado, por 38,46% das empresas. O objeto destas relações são treinamentos, consultoria e orientação empresarial. Em segundo lugar, apontada por 30,77% das empresas , estão as universidades (com relações focadas em compartilhamento de equipamentos e laboratórios), os clientes (com ações conjuntas de P&D), empresas de consultoria e instituições prestadoras de serviço (com trocas de idéias). Uma comparação entre as relações mantidas com universidades e aquelas mantidas com outras instituições de ensino superior posiciona a universidade com destaque. Não foram verificadas parcerias sistemáticas; ou seja, relações com este parceiro são em sua maioria esporádicas. As parcerias com o governo também são bastante pontuais, ocorrendo apenas em três empresas, para a troca de idéias, e em duas, para recursos financeiros. Migrando o detalhamento da análise para as médias empresas, as parcerias com universidades sofrem ainda alguma perda em relação às grandes. Não são verificadas relações sistemáticas e mesmo as esporádicas são apontadas por um numero muito restrito de empresas. Quanto ao governo, o foco principal de relacionamentos é relacionado a recursos financeiros. A maior 8 concentração de citações obtida foi para relações sistemáticas mantidas com fornecedores, para a troca de idéias (20,59%, correspondente a sete empresas). A segunda maior citação foi de 11,76% (quatro empresas), para relações esporádicas mantidas com entidades de classe, para trocas de idéias e orientação empresarial, e com clientes, para ações conjuntas de P&D e troca de idéias, esta última em caráter sistemático. Passando para as empresas de pequeno porte, o que se verifica é uma queda significativa da freqüência de parcerias. Aproximadamente 90% das empresas não mantêm relação de parceria alguma. A mais freqüente citação de relações sistemáticas foi para fornecedores e clientes; em ambos os casos, apontadas por 8,52% das empresas e focadas em trocas de idéias. A segunda e terceira maior freqüência de citações, com 4,07% e 2,96%, para concorrentes e entidades de classe respectivamente, ambos focados na troca de idéias. Nota-se assim, que das relações sistemáticas mantidas, a mais importante é a troca de idéia, ainda que bastante tímida, tendo em vista o volume de citações obtido. As relações de caráter esporádico não são mais intensas. A maior freqüência obtida foi de 6,3% para troca de idéias com concorrentes. Em seguida vêm a troca de idéias com fornecedores, com clientes e com entidades de classe, respectivamente apontadas por 5,19%, 4,07% e 2,96% das empresas. Assim, fica em destaque a troca de idéias como o objeto da parceria mais valorizado por pequenas empresas. Para finalizar a análise da rede de relacionamento das pequenas empresas, é válido destacar o quase inexistente contato com universidades, IES e governos. Um aprofundamento quanto à localização dos parceiros com os quais as empresas mantêm relações para a inovação demonstra grande concentração no território local ou regional. Embora instituições como SENAI e SEBRAE tenham aparecido com freqüência significativa dentre as citações, o que se percebe é que o interlocutor são as agências regionais. Assim, predomina a interação no Sistema Regional de Inovação em relação a atores do Sistema Nacional. Mesmo nas linhas de financiamento à inovação oferecidas por agências de fomento e utilizadas pelas empresas pesquisadas, verifica-se baixa freqüência de atores do Sistema Nacional de Inovação. Predominam entre as instituições apontadas, BADESC, BRDE e BNDES. Embora este último seja correspondente ao nível nacional, nenhum dos três apresentam vocação inata para o fomento à inovação. O fato dos recursos captados junto a estes órgãos ter sido destinado, em 83,33% dos casos, à ampliação da capacidade produtiva, comprovam esta observação. Instituições de âmbito nacional focadas no fomento e suporte à inovação, como CNPq e FINEP, bem como linhas específicas do SEBRAE, não aparecem na lista apontada pelas empresas, com exceção de dois casos particulares. Vale observar que em um deles foi justamente o único exemplo de geração de patente identificado na pesquisa. Analisando-se as interações mantidas com relação à área de atuação dos parceiros, nota-se concentração quase absoluta na própria área de atuação da empresa. Ou seja, são praticamente nulas as relações com parceiros atuantes em outras áreas do conhecimento ou setores distintos. Estes fatores apontam para uma rede de relacionamentos limitada em sua potencialidade para contribuir com a capacidade de inovação das empresas, segundo as premissas vistas na revisão bibliográfica. As relações são insuficientes e pouco sistemáticas, comprometendo o aprofundamento dos laços. Isso se comprova nos tipos de relações mantidas, notadamente superficiais, principalmente focadas em troca de idéias. Relações de cooperação mais profundas, como, por exemplo, ações cooperadas de pesquisa e desenvolvimento, são praticamente inexistentes. Adicionalmente, reforça a limitação da potencialidade de inovação 9 segundo as premissas abordadas na revisão bibliográfica o fato das relações estarem restritas ao território e ao setor. A ampliação do espectro de conhecimentos que a extrapolação do território e do setor permitiria, fica, assim, comprometida. A praticamente nula existência de interações com atores que apresentam vocação inata para a inovação, quer seja sob a perspectiva da pesquisa e desenvolvimento, quer seja para o financiamento dos processos de inovação, contribui para o quadro restritivo. Este panorama quanto aos relacionamentos mantidos pelas empresas pesquisadas com vistas á inovação deve ser comparado, tendo-se em vista o proposto neste trabalho, aos resultados em inovação por elas conquistados. Nos 24 meses que antecederam a pesquisa, o percentual de novos produtos em relação ao total de produtos oferecidos pelas empresas ao mercado é bastante pequeno e torna-se ainda menor quando se trata de produtos inovadores. O foco de mercado é local. Mesmo quando falam dos planos futuros, as empresas apontam o mercado nacional como objeto de seus interesses estratégicos. A maior abrangência geográfica é proporcional ao porte das empresas. Desta forma, os casos de exportação concentram-se junto às grandes. Adicionalmente, os itens a seguir apontam um perfil de inovação mais incremental, focado na perspectiva de melhoramento e baseado na curva de valor tradicional da empresa: • Inovação ocorre por meio de melhoramento dos produtos e serviços existentes 84,62% de citação • Atuam sobre necessidades explícitas dos clientes – 84,62% de citação • Atuam sobre necessidades não formuladas – 46,15% de citação • Geram novas necessidades nos clientes – 38,46 de citação • Permitem à empresa explorar novos mercados – 23,08% de citação • Influenciam positivamente as exportações – 38,46% de citação. Assim, tem-se dados que corroboram as premissas teóricas apresentadas anteriormente. Processos de inovação mais arrojados, capazes de conferir às empresas saltos de qualidade e sua inserção em novos espaços de mercado, por meio de rupturas nos processos e produtos tradicionais, não fazem parte dos resultados conquistados pelas empresas pesquisadas. Estas conquistas podem estar relacionadas a vários fatores que transcendem a rede de relacionamentos cultivada pelas empresas em prol da inovação. Contudo, não fazem parte do escopo do presente estudo. Resguardada esta limitação, esta pesquisa permite, de qualquer forma, destacar pontos de alerta a estas empresas, tendo em vista vários outros estudos de referência indicados na revisão bibliográfica. 6- Conclusão A análise conclusiva dos dados levantados na pesquisa deve destacar, inicialmente, o baixo índice de relacionamentos focados na inovação, sobretudo nas médias e pequenas empresas. Os relacionamentos existentes são esporádicos e focados em trocas mais superficiais. Não são identificadas práticas sistemáticas de cooperação com parceiros com grande potencial de contribuição aos processos de inovação. Parceiros vistos na revisão bibliográfica como relevantes neste sentido, como é o caso de universidades, centros de pesquisa e agentes de fomento, tem as menores freqüências. As 10 interações pontuais que se identifica, não são focadas no escopo de relação mais apropriada para ganhos significativos. As universidades e centros de pesquisa, por exemplo, não estão entre os três atores com os quais as empresas mais mantêm relações de cooperação e parceria, embora apareça com freqüência significativa entre as grandes. Contudo, não são identificas práticas de colaboração em P&D; o objeto das relações é, sobretudo, a troca de idéias, o uso de equipamentos e laboratórios e a utilização de corpo técnico. Quanto às relações com políticas e programas de governo e respectivas agências de fomento, verificou-se que os instrumentos disponíveis não estão atingindo as empresas têxteis blumenauenses, nem contribuem diretamente para a superação do déficit em inovação destas empresas. Os instrumentos utilizados são destinados especialmente à ampliação de capacidade produtiva, não a esforços de inovação. Práticas como estas restringem o acesso a conhecimentos e recursos relevantes para viabilizar inovações, sobretudo as mais vigorosas, cuja viabilização pelas empresas isolada e solitariamente torna-se muito mais complexa. Adicionalmente a esta ausência de parceiros com vocação para o fomento e o suporte à inovação na rede de relacionamentos das empresas, tem-se ainda outro conjunto de fragilidades. As interações identificadas estão mais restritas ao território, a empresas do próprio setor, a fornecedores e clientes atuais. Assim, as limitações ao cluster discutidas na revisão teórica parecem caracterizar a prática das empresas estudadas. Da mesma forma a tendência vista da revisão bibliográfica deste tipo de comportamento confinar as possibilidades de inovação a uma perspectiva mais incremental é confirmada nos resultados conseguidos pelas empresas nos dois anos que antecederam a pesquisa. Concluindo, os padrões de relacionamentos verificados no cluster analisado apontam para o entendimento da inovação sob uma perspectiva endógena. Caracterizada como um esforço solitário das empresas, ela está baseada em premissas incrementais, limitando a conquista de saltos competitivos mais vigorosos. A análise da pesquisa pode inclusive suscitar um questionamento quanto à efetividade real do cluster têxtil em Blumenau, se considerada a definição de um cluster como uma concentração geográfica de empresas e instituições de um determinado campo, interconectadas. O componente “empresarial” está apresente, assim como o componente “territorial” e o componente “institucional”. Contudo, a interconexão, caracterizada por relações de interação sistemáticas, existe em baixíssima intensidade, sobretudo nas médias e ainda mais nas pequenas. A caracterização de um cluster efetivo exige ações no sentido de promover a intensificação destas relações. Assim, tanto ações de governança no cluster quanto de cultivo de uma reflexão quanto ao conceito de inovação vigente apresentam-se como necessárias, especialmente se levada em conta a importância deste segmento e sua tradição na economia da região, por um lado, e a pressão competitiva e a urgência da inovação, por outro. Referências CHRISTENSEN, Clayton M. The innovator’s dilemma. New York: Harper Business, 2000. 11 COOKE, Philip. Regional Innovation Systems: General findings and some new evidence from biotechnology clusters. Journal of Technology Transfer, 27, 2002, p. 133–145. FREEMAN, C. The National System of Innovation in historical perspective. Cambridge Journal of Economics, 19, 1995, p. 5-24. IEDI.Clusters ou sistemas locais de produção e inovação: identificação, caracterização e medidas de apoio. Acesso em: 06 jun. 2005. Disponível em www.iedi.org.br. KIM, W. Chan; MAUBORGNE, Renée. Value innovation. The strategic logic of high growth. 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