Supremo Tribunal Federal MANDADO DE SEGURANÇA 27.070 DISTRITO FEDERAL RELATOR IMPTE.(S) ADV.(A/S) IMPDO.(A/S) PROC.(A/S)(ES) IMPDO.(A/S) PROC.(A/S)(ES) IMPDO.(A/S) : MIN. LUIZ FUX : MARCO ANTÔNIO DE SOUZA : HUMBERTO LUCCHESI DE CARVALHO : PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO : RELATOR DO PROCESSO Nº 016.568/2003-0 DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO : CONSELHO REGIONAL DE TÉCNICOS EM RADIOLOGIA - CRTR 3ª REGIÃO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PROCEDIMENTO DE CARÁTER ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO INTERESSADO. NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO DUE PROCESS OF LAW , DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. As garantias fundamentais do devido processo legal (CRFB, art. 5º, LIV) e do contraditório e da ampla defesa (CRFB, art. 5º, LV) exigem a intimação do interessado nos processos perante o Tribunal de Contas da União, como reconhece a Súmula Vinculante nº 3, verbis: Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão . 2. In casu, o Tribunal de Contas da União, no Acórdão nº 1.411/2004, concluiu pela ilegalidade do concurso público realizado para a seleção de candidatos a serem contratados pelo Conselho Regional de Técnicos em Radiologia da 3ª Região e decidiu pela anulação do processo seletivo e das admissões realizadas sem a prévia intimação dos interessados. 3. A Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo da Administração Pública Federal, aplica-se aos procedimentos do Tribunal de Contas da União. Precedente: MS 23.550, Redator para o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Pleno, DJ de 31/10/2001. 4. Segurança concedida. DECISÃO: Cuida-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União consubstanciado no Acórdão 1.411/2004 proferido pelo Plenário do Tribunal de Contas da União que, no Processo Administrativo nº 016.568/2003-0, decidiu e determinou a demissão (sanção restritiva de atividade) dos impetrantes num prazo máximo de 180 (cento e oitenta dias) (fl. 03). Os impetrantes sustentam, em síntese: (a) a plausibilidade jurídica do pedido, tendo em vista o contido na Súmula Vinculante nº 03/STF; (b) a invalidação do processo administrativo que concluiu pela demissão dos impetrantes, por ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LIV e LV, da 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF Constituição da República), visto que eles foram subtraídos/impedidos de participarem do Processo nº 016.568/2003, em curso no Tribunal de Contas da União, já que não foram notificados ou intimados acerca do assunto (fl. 08); (c) a ofensa ao contido no art. 2º, caput , e 28 da Lei nº 9.784/99 e, por conseguinte, ao princípio da legalidade objeto do art. 37, caput , da CF, uma vez que não há nos autos do processo administrativo qualquer intimação dos impetrantes acerca da sua instauração. Os impetrantes pedem, ao final, o deferimento do pedido liminar para que seja suspenso o ato de demissão (sanção restritiva de atividade), determinando-se a manutenção dos autores mandamentais no exercício dos cargos, então ocupados junto ao Conselho de Técnicos em Radiologia-CRTR 3ª Região, até julgamento final deste feito. O Tribunal de Contas da União, em informações prestadas às fls. 120/127, sustenta em síntese: (a) os trabalhos conduzidos no âmbito de processo de denúncia (CF, art. 74, § 2º, Lei nº 8.443/92, art. 53) consubstanciam típica atividade constitucional de controle externo desenvolvida pelo TCU (art. 71, inciso IX) e que esta atividade não se encontra submetida à exigência de oitiva prévia de eventuais interessados; (b) a inexistência de violação à Súmula Vinculante nº 3; (c) a inexistência de violação ao art. 28 da Lei nº 9.784/99, em razão da norma aplicar-se subsidiariamente aos processos administrativos regulados por legislação própria. A liminar resultou deferida, às fls. 157/159, para suspender os efeitos do Acórdão nº 1.411/2004 do Tribunal de Contas da União, nos seguintes termos: Preliminarmente, do exame dos autos, constato, em juízo preliminar, a inexistência de prova no sentido de que os impetrantes, nos termos dos arts. 2º e 28 da Lei 9.784/99, tivessem sido intimados dos atos do processo que resultaram na dispensa de seus empregos, o que me faz vislumbrar, no caso, a existência dos requisitos necessários à concessão da medida liminar pleiteada, tendo em vista o contido na Súmula Vinculante nº 03/STF, certo que a espécie não se refere à apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF reforma ou pensão. 4. Ademais, em casos semelhantes ao presente, esta Corte tem reconhecido a plausibilidade jurídica da pretensão cautelar aqui deduzida: MS 26.353/DF, rel. Min. Marco Aurélio, Plenário, DJ 17.9.2007; MS MS 26.404-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, DJ 23.2.2007; MS 26.406-MC/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 23.2.2007; MS 26.375-MC/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 28.2.2007; MS 26.660-MC/DF, MS 26.652-MC/DF e MS 26.631MC/DF, rel. Min. Cezar Peluso, DJ 05.6.2007, inter plures. 5. Ante o exposto, defiro a liminar para, relativamente aos impetrantes, suspender os efeitos do Acórdão 1.411/2004 do Tribunal de Contas da União (Proc. 016.568/2003), até o julgamento final do presente mandado de segurança. Embora regularmente citado (fl. 178), o Conselho Regional de Técnicos em Radiologia CRTR 3ª Região, não apresentou manifestação, conforme certificado a fl. 183. A Procuradoria Geral da República manifestou-se pela concessão da segurança (fls. 184/185). A União, por meio da Petição 46.535/2013, requereu seu ingresso no feito. É o relatório. DECIDO. Preliminarmente, anoto que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião da edição da Emenda Regimental nº 28, de 18 de fevereiro de 2009, reformou a redação do art. 205 de seu Regimento Interno para estabelecer, expressamente, que compete ao Relator da causa denegar ou conceder a ordem de mandado de segurança, em sede de julgamento monocrático, desde que a matéria versada no writ em questão constitua objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal (RI/STF, art. 205, caput , na redação dada pela ER nº 28/2009). Esse entendimento que vem sendo amplamente observado na jurisprudência desta Suprema Corte ( v. g., MS 27.649/DF, Rel. Min. 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF Cezar Peluso, DJe 06.03.2009; MS 27.962/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 26.03.2010) possui legitimidade jurídica decorrente da circunstância de o Relator dispor de competência plena para exercer, monocraticamente, o controle das petições dirigidas ao Supremo Tribunal Federal, justificando-se, em consequência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a praticar. Nesse passo, oportuno assinalar que o Plenário deste Tribunal, ao apreciar o MS 27.236-AgR/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 30.04.2010, reafirmou a possibilidade processual do julgamento monocrático do próprio mérito da ação de mandado de segurança, desde que observados os requisitos previstos no supracitado art. 205 do RISTF. Desse modo, mister reconhecer que a controvérsia mandamental em exame ajusta-se conforme se demonstrará ao longo desse decisum - à jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou sobre a matéria, o que, indubitavelmente, possibilita seja proferida decisão monocrática sobre a lide em debate. Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por Marco Antônio de Souza e Marilândia Alves de Araújo Silva, contra o Acórdão nº 1.411/2004 proferido pelo Plenário do Tribunal de Contas da União que, “no Processo Administrativo nº 016.568/2003-0, decidiu e determinou a demissão (sanção restritiva de atividade) dos impetrantes num prazo máximo de 180 (cento e oitenta dias)” (fl. 03). O Tribunal de Contas da União, no Acórdão nº 1.411/2004, concluiu pela ilegalidade do concurso público realizado para a seleção de candidatos a serem contratados pelo Conselho Regional de Técnicos em Radiologia da 3ª Região e decidiu pela anulação do processo seletivo e das admissões realizadas, verbis: “9.3.1. anule o processo seletivo para a contratação de funcionários para o quadro da entidade, realizado pela empresa Prest-Ação Ltda (contratada por meio do Edital 0002/2003), permitindo-se que se mantenha, excepcionalmente, os funcionários contratados por meio do citado processo seletivo 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF pelo prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, período suficiente para a realização de nova seleção, livre dos vícios ora constatados, que deverá contemplar critérios objetivos para a avaliação dos candidatos e obedecer aos princípios da isonomia e da publicidade” Os impetrantes fazem parte do quadro de servidores do Conselho Regional de Técnicos em Radiologia da 3ª Região sobre o qual recai a determinação do TCU de demissão após prazo de 180 dias. Verifica-se nos autos, que o Tribunal de Contas da União não procedeu à intimação dos impetrantes para apresentação de defesa ou qualquer outra manifestação. Em defesa a esta omissão, o Tribunal de Contas da União alega, nas informações ofertadas às fls. 120/127, que “não há violação ao contraditório e a ampla defesa quando, em processo de denúncia, não são ouvidos interessados selecionados por meio de processo seletivo simplificado eivado de irregularidades”. A Constituição da República instituiu, em favor dos indiciados, a garantia do contraditório e da ampla defesa em processo administrativo, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, LV). Não se está por meio deste writ postulando-se investigação e o controle jurisdicional do mérito administrativo do ato coator. Busca-se a invalidação do ato coator que determinou a demissão dos impetrantes, uma vez que o processo administrativo não observou os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, insertos no artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição. O ato administrativo questionado neste writ anulou a contratação dos impetrantes sem que estes tomassem conhecimento do processo, violando o devido processo legal, porquanto suprimidos direitos dos contratados. A Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo da Administração Pública Federal, prevê, em seu artigo 26, que a intimação pessoal dos interessados no processo administrativo realiza-se, em obediência aos postulados do contraditório e da ampla defesa, por ciência no processo, por via postal com aviso de recebimento, por telegrama ou 6 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF outro meio idôneo que assegure a certeza da ciência. Esta Corte, no julgamento do MS 23.550, Redator para o acórdão o Ministro Sepúlveda Pertence, já teve a oportunidade de manifestar-se a respeito da aplicação da Lei nº 9.784/99 aos procedimentos do Tribunal de Constas da União. Naquela oportunidade restou decidido: “EMENTA: I. Tribunal de Contas: competência: contratos administrativos (CF, art. 71, IX e §§ 1º e 2º). O Tribunal de Contas da União - embora não tenha poder para anular ou sustar contratos administrativos - tem competência, conforme o art. 71, IX, para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se for o caso, da licitação de que se originou. II. Tribunal de Contas: processo de representação fundado em invalidade de contrato administrativo: incidência das garantias do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa, que impõem assegurar aos interessados, a começar do particular contratante, a ciência de sua instauração e as intervenções cabíveis. Decisão pelo TCU de um processo de representação, do que resultou injunção à autarquia para anular licitação e o contrato já celebrado e em começo de execução com a licitante vencedora, sem que a essa sequer se desse ciência de sua instauração: nulidade. Os mais elementares corolários da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa são a ciência dada ao interessado da instauração do processo e a oportunidade de se manifestar e produzir ou requerer a produção de provas; de outro lado, se se impõe a garantia do devido processo legal aos procedimentos administrativos comuns, a fortiori, é irrecusável que a ela há de submeter-se o desempenho de todas as funções de controle do Tribunal de Contas, de colorido quase jurisdicional. A incidência imediata das garantias constitucionais referidas dispensariam previsão legal expressa de audiência dos interessados; de qualquer modo, nada exclui os procedimentos do Tribunal de Contas da aplicação subsidiária da lei geral de processo administrativo federal (L. 9.784/99), que assegura aos administrados, entre outros, o direito a ‘ter ciência da tramitação dos processos administrativos em que tenha 7 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF a condição de interessado, ter vista dos autos (art. 3º, II), formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente’. A oportunidade de defesa assegurada ao interessado há de ser prévia à decisão, não lhe suprindo a falta a admissibilidade de recurso, mormente quando o único admissível é o de reexame pelo mesmo plenário do TCU, de que emanou a decisão”. (MS 23.550, Redator para o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Pleno, DJ de 31/10/2001) Restou, também, consagrado o entendimento pela aplicabilidade e extensão da garantia do devido processo legal aos processos de natureza administrativa, como o instaurado, no caso ora em exame, perante o Tribunal de Contas da União. Nesse sentido: “ATO ADMINISTRATIVO REPERCUSSÕES PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE SITUAÇÃO CONSTITUÍDA INTERESSES CONTRAPOSTOS ANULAÇÃO - CONTRADITÓRIO. Tratando-se de ato administrativo cuja formalização haja repercutido no campo de interesses individuais, a anulação não prescinde da observância do contraditório, ou seja, da instauração de processo administrativo que enseje a audição daqueles que terão modificada situação já alcançada. Presunção de legitimidade do ato administrativo praticado, que não pode ser afastada unilateralmente, porque é comum à Administração e ao particular. CONCURSO PÚBLICO - FEITURA - APROVAÇÃO NOMEAÇÃO - POSSE - EXONERAÇÃO - DEVIDO PROCESSO LEGAL - INOBSERVÂNCIA. Uma vez ocorridos os atos próprios a chegar-se ao exercício de certo cargo público, há de observar-se o devido processo legal para o afastamento de tal quadro. Insubsistência de ato da Administração Pública unilateral e imediato a resultar na exoneração dos concursados sem o atendimento do devido processo legal”. (RE 199.733, Rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, DJ de 27/04/1999) 8 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF É esse o entendimento perfilhado pela doutrina: “O coroamento do caminho evolutivo da interpretação da cláusula do ‘devido processo legal’ ocorreu, no Brasil, com a Constituição de 1988, pelo art. 5º, inc. LV, que reza: ‘Art. 5°, LV. Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.’ Assim, as garantias do contraditório e da ampla defesa desdobram-se hoje em três planos: a) no plano jurisdicional, em que elas passam a ser expressamente reconhecidas, diretamente como tais, para o processo penal e para o não-penal; b) no plano das acusações em geral, em que a garantia explicitamente abrange as pessoas objeto de acusação; c) no processo administrativo sempre que haja litigantes. (...) É esta a grande inovação da Constituição de 1988. (...) Assim, a Constituição não mais limita o contraditório e a ampla defesa aos processos administrativos (punitivos) em que haja acusados, mas estende as garantias a todos os processos administrativos, não-punitivos e punitivos, ainda que neles não haja acusados, mas simplesmente litigantes. Litigantes existem sempre que, num procedimento qualquer, surja um conflito de interesses. Não é preciso que o conflito seja qualificado pela pretensão resistida, pois neste caso surgirão a lide e o processo jurisdicional. Basta que os partícipes do processo administrativo se anteponham face a face, numa posição contraposta. Litígio equivale a controvérsia, a contenda, e não a lide. Pode haver litigantes – e os há – sem acusação alguma, em qualquer lide.” (GRINOVER, Ada Pellegrini. O Processo em Evolução, Forense Universitária, 1996, p. 82/85). Com efeito, diz o inciso LV do art. 5º da C.F. que “aos litigantes, em 9 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ele inerentes”. Convém insistir que a garantia constitucional do direito à ampla defesa exige que seja dada ao acusado – ou a qualquer pessoa cujo patrimônio jurídico e moral possa ser afetado por uma decisão administrativa – a possibilidade de apresentação de defesa prévia à decisão administrativa. A ampla defesa, só tem sentido em sua plenitude se for produzida previamente à decisão, para que possa ser conhecida e efetivamente considerada pela autoridade competente para decidir. A prova coligida nos autos indica que os impetrantes, nos termos dos arts. 2º e 28 da Lei 9.784/99, não foram intimados dos atos do processo que resultou na dispensa de seus empregos, fazendo vislumbrar, assim, violação do disposto na Súmula Vinculante nº 3, verbis: Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. O Supremo Tribunal Federal, calcado nas garantias constitucionais do contraditório e do devido processo legal, assentou premissa de que a anulação dos atos administrativos, cuja formalização haja repercutido no âmbito dos interesses individuais, deve ser precedida de ampla defesa, consoante se infere de inúmeros julgados, dentre os quais, destacamos: “RESTRIÇÃO DE DIREITOS E GARANTIA DO ‘DUE PROCESS OF LAW’. - O Estado, em tema de punições disciplinares ou de restrição a direitos, qualquer que seja o destinatário de tais medidas, não pode exercer a sua autoridade de maneira abusiva ou arbitrária, desconsiderando, no exercício de sua atividade, o postulado da plenitude de defesa, pois o reconhecimento da legitimidade éticojurídica de qualquer medida estatal - que importe em punição disciplinar ou em limitação de direitos - exige, ainda que se cuide de 10 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF procedimento meramente administrativo (CF, art. 5º, LV), a fiel observância do princípio do devido processo legal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem reafirmado a essencialidade desse princípio, nele reconhecendo uma insuprimível garantia, que, instituída em favor de qualquer pessoa ou entidade, rege e condiciona o exercício, pelo Poder Público, de sua atividade, ainda que em sede materialmente administrativa, sob pena de nulidade do próprio ato punitivo ou da medida restritiva de direitos. Precedentes. Doutrina.” (AI 241.201-AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, 2ª Turma, DJ de 20/09/2002) “SERVIDOR PÚBLICO. Funcionário (s) da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. Cargo. Ascensão funcional sem concurso público. anulação pelo Tribunal de Contas da União – tcu. Inadmissibilidade. Ato aprovado pelo tcu há mais de cinco (5) anos. Inobservância do contraditório e da ampla defesa. Consumação, ademais, da decadência administrativa após o qüinqüênio legal. Ofensa a direito líquido e certo. Cassação dos acórdãos. Segurança concedida para esse fim. Aplicação do art. 5º, inc. LV, da CF, e art. 54 da Lei federal nº 9.784/99 . Não pode o Tribunal de Contas da União, sob fundamento ou pretexto algum, anular ascensão funcional de servidor operada e aprovada há mais de 5 (cinco) anos, sobretudo em procedimento que lhe não assegura o contraditório e a ampla defesa.” (MS 26.940, Rel. Min. CEZAR PELUSO, Pleno, Dje de 21/02/2008) “AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. SÚMULA 473. OBSERVÂNCIA DO ART. 5º, LV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A Constituição Federal, no seu art. 5º, LV, assegura aos litigantes, em processo judicial e administrativo, o contraditório e a ampla defesa, com os meios e os recursos inerentes. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido.” (AI 627.146-AgR, Rel. Min. ELLEN GRACIE, 2ª Turma, Dje 24/09/2010) 11 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039. Supremo Tribunal Federal MS 27070 / DF “CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS. Anulação de Contrato. Processo Administrativo. Inobservância dos princípios da ampla defesa e contraditório. Autotutela. Alegação de lesão à ordem pública. Necessidade de comprovação. Suspensão de Segurança indeferida. Agravo regimental improvido. Não há risco de grave lesão à ordem pública na decisão judicial que determina sejam observados os princípios da ampla defesa e do contraditório em processo administrativo instaurado para anular contrato de concessão de serviço público de registro de alienações fiduciárias.” (SS 3.952-AgR, Rel. Min. CEZAR PELUSO (Presidente), Tribunal Pleno, Dje 27/08/2010) “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO NÃO ESTÁVEL. DEMISSÃO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. I - A demissão de servidor público, mesmo que não estável, deve ser precedida por processo administrativo, em que sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa. Precedentes. II - Agravo regimental não provido." (RE 594.040-AgR, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, Dje 23/04/2010) Ex positis, CONCEDO a segurança para determinar a reintegração dos impetrantes ao cargo. Defiro o pedido de ingresso da União no feito e sua intimação para os atos processuais, com fundamento no art. 7º, inciso II, da Lei nº 12.016/09, devendo a Secretaria proceder às anotações pertinentes. Publique-se. Brasília, 8 de outubro de 2013. Ministro LUIZ FUX Relator Documento assinado digitalmente 12 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 4653039.