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Gastronomia
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16 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, sábado, 13 de setembro de 2014
Café com pão,
mas sem glúten
» FLÁVIA FRANCO
pão faz parte da rotina
alimentar de grande
parte das famílias brasileiras. Está na mesa do
café da manhã, vai no lanche do
meio da tarde e recebe recheios
diversos no tradicional sanduíche da noite. Por isso, há diversos tipos: francês, de forma, careca, sovado… Geralmente, opções com farinha de trigo. Mas a
busca por dietas funcionais e
problemas de saúde, como a
doença celíaca e a intolerância
ao glúten, têm tirado ou reduzido o cereal das refeições. Consultados pelo Correio, profissionais da gastronomia apresentam
alternativas saborosas e saudáveis para os novos hábitos.
A primeira orientação é
também consenso entre especialistas que trabalham com
pães: a farinha de arroz, em
conjunto com a fécula de batata ou de mandioca, forma a base para o preparo de qualquer
massa que não tenha farinha
de trigo. Yohanna Tainná, pro-
O
Reação autoimune
O glúten é resultado da mistura
de proteínas muito comuns em
cereais, como o trigo, a cevada e o
centeio. Algumas pessoas têm
intolerância a ele e até alergia,
condição chamada de doença
celíaca. O contato dessa
substância com a mucosa do
intestino causa inflamações,
diminuindo a capacidade de
digestão e absorção de nutrientes.
O grau de severidade da doença
varia, apresentando sintomas que
vão de diarreia a desnutrição e
doenças neurológicas. Estudos
internacionais indicam que cerca
de 1% da população mundial é
celíaca. A enfermidade
autoimune ocorre apenas em
indivíduos geneticamente
predispostos.
fessora do curso de panificação do Centro Universitário
Iesb, já adianta que a mistura
terá consistência diferente. “As
proteínas do glúten ajudam a
dar uma elasticidade à massa
porque acabam criando uma
resistência quando são hidratadas com água”, compara.
Essa rede elástica possibilita
sovar e modelar a massa no formato desejado. “A versão com
farinha de arroz fica mais líquida, mais cremosa, não permitindo essa movimentação. Por
isso, costuma vir em formatos
adquiridos com forminhas”, explica. Tainná tenta amenizar a
limitação usando também goma xantana e açúcar mascavo.
Outro ajuste tem a ver com o sabor da receita. “A massa tradicional acaba sendo muito neutra porque a farinha de arroz
não tem um gosto tão característico quanto o da farinha de
trigo”, afirma a chef.
Sementes, como o gergelim,
e frutas secas — ameixa e abacaxi desidratados, por exemplo —
estão entre as alternativas encontradas para enriquecer a receita. “No caso de frutas como o
abacaxi desidratado, acho que
acaba ficando com um pouco
de cara de bolo, mas fica extremamente saboroso”, conta. Outra sugestão envolvendo frutas
combina as cítricas, como laranja e limão, mas cristalizadas.
“Fica bem gostoso e fácil de harmonizar, mas não é um sabor
tão comum”, orienta.
Para deixar a receita com cara
de pão tradicional, a preferida
da chef é a linhaça. “Como ela
entra na mistura da própria farinha, não só na finalização, a
massa absorve o sabor. Então,
fica diferente.” Seguindo a proposta de gosto como prioridade,
outra opção é trocar a fécula de
batata pelo purê, que também
ajuda a dar liga na massa e deixa
o resultado final com um sabor
mais puxado para a batata. “No
Dá para apreciar um dos alimentos mais
consumidos pelos brasileiros sem agredir o
intestino e comprometer a dieta. Especialistas
ensinam receitas que dispensam a farinha de
trigo e chamam a atenção pelo sabor
Fotos: Ana Rayssa/Esp.CB/D.A Press
A massa da Belini leva farinha de arroz, fécula de batata e de mandioca: a combinação dá uma estrutura consistente aos pães
caso de optar pelo purê, porém,
a massa fica um pouco mais pesada que a feita com fécula de
batata”, ressalta Tainná.
Tentativa e erro
A Belini Pães e Gastronomia
passou a oferecer opções sem
glúten e com grãos após perceber o aumento da demanda por
produtos que atendessem ao
público celíaco e intolerante ao
glúten. “Precisamos nos adaptar
a essa tendência. Então, procuramos desenvolver uma receita
própria que se enquadrasse no
requisito de ser sem farinha de
trigo”, conta Luiz Gustavo, proprietário do empreendimento.
O empresário conta que várias fórmulas foram testadas em
busca de substitutos que agradassem pela estrutura e pelo sabor. “Usamos farinha de arroz.
Depois, experimentamos a fécula de batata e trocamos por
mandioca. Algumas alternativas
alteravam a consistência da
massa. Por isso, fizemos vários
testes até optar pela mistura das
três”, detalha. A versão tradicional sem glúten não tem “temperos”. “Acaba dando para perceber a presença de cada um dos
três ingredientes principais no
pão. Escolhemos acrescentar
grãos em algumas versões para
dar uma equilibrada no sabor”,
diz Luiz Gustavo.
Quinoa é umas das opções
disponíveis. “A vantagem desse
grão é que, além de tirar a atenção da mandioca e da batata, ele
é considerado um superalimento, ou seja, também aumenta o
valor nutricional da receita”,
destaca o empresário. Ele conta
ainda que os pães da casa foram
pensados de forma a substituir a
versão que leva farinha de trigo.
Por conta dessa característica,
optaram por não desenvolver
uma linha de sabores específicos e mais marcantes. “A maioria das pessoas quer comê-los
em casa no café da manhã ou
acompanhando outros alimentos. Por isso, decidimos seguir
uma linha mais neutra.”
Aposta nos temperos
Palavra de
especialista
Nutrientes
garantidos
Receita
Pão tradicional
sem glúten
“As alternativas sem glúten
são tão nutritivas quanto o pão
preparado com farinha de trigo.
A fécula de batata, por exemplo,
é muito rica em fibras, com
quantidade até mais elevada do
que a encontrada na farinha
branca, o que ajuda a aumentar
a sensação de saciedade. Além
disso, tem vitaminas e minerais.
Já a farinha de arroz auxilia
no controle do diabetes por
causa do baixo índice glicêmico, quando o açúcar entra mais
devagar na corrente sanguínea.
Também possui grande quantidade de fibras e diminui a absorção de óleos vegetais dos alimentos, tornando o pão menos
calórico”
Por Yohanna Tainná
Ingredientes
» 100g de farinha de arroz
» 100g de fécula de batata
» 1 ovo
» 30g de açúcar mascavo
» 5g de fermento
» Uma pitada de sal
» 3g de goma xantana
» Água morna (o suficiente para
hidratar a massa)
Modo de preparo
» Em uma vasilha, misture a
farinha de arroz com a fécula de
batata, o açúcar mascavo, o
fermento, o sal e a goma
xantana. Acrescente a água
morna aos poucos para ir
hidratando e dissolvendo a
massa. Acrescente o ovo e
misture bem. Quando atingir
um ponto similar ao de um
creme consistente, coloque em
uma forma e deixe descansar
por cerca de 20 minutos. Leve
ao forno preaquecido
» Luciana Valle Barros,
nutricionista do Hospital
Anchieta
No Alimentação Diferenciada, tomate seco com pesto e banana-passa com ameixa dão sabor especial aos pães
receita, o pão leva o nome dela.
Cebola, quinoa, frutas em geral,
Maia garante que vale de tudo
para criar uma alternativa sem
glúten. “Os pães ficam também
com aparência diferente porque o recheio acaba ressaltado.
O de ervas frescas é esverdeado;
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É possível explorar combinações diferenciadas — e inusitadas
— para incrementar pães que não
são feito com farinha de trigo. Depois de precisar seguir uma dieta
restritiva ao glúten, a chef Tatiana
Maia, do Alimentação Diferenciada, decidiu encontrar uma receita
que permitisse que celíacos também desfrutassem da tradição de
comer pão em casa. “A maioria
dos produtos que eu encontrava
era congelada. Resolvi criar eu
mesma uma alternativa fresca”,
conta. A opção também conta
com farinha de arroz e fécula de
batata, mas o ingrediente que sobressai é o polvilho, que ajuda a
dar liga à combinação.
Adepta da produção artesanal, Maia coloca a mão na massa para preparar todos os pães,
de sabores variados. “A massa é
bem neutra, então dá para inovar e ousar nos complementos.
Faço pão de milho, de ervas frescas, de tomate seco, de bananapassa com ameixa”, exemplifica.
Depois de conseguir diversificar
o cardápio de sabores, a chef encarou o desafio de desenvolver
uma opção que as pessoas pudessem prepara em casa sozinhas. “Criei um mix de farinhas
que só precisam de ovo, água e
um pouco de óleo para a massa
ficar pronta. O sabor fica a critério de cada um”, conta.
Foi assim que algumas das opções hoje adotadas pela chef surgiram, como a de tomate seco
com pesto.“Uma cliente me ligou
dizendo que tinha testado essa
mistura em casa e tinha adorado.
Resolvi adotar na linha dos pães
que preparo”, lembra. Em homenagem à cliente que deu origem à
As receitas criadas por Yohanna
Tainná levam sementes e frutas
o de tomate seco, um pouco rosado, o de cebola fica dourado
porque as cebolas são torradas; e
o de banana-passa com ameixa,
parecendo uma rosca”, revela.
Sobre a dificuldade em criar
uma versão cuja textura seja parecida com a do tradicional pão
francês, a chef busca superá-la.
Esse, aliás, a nova desafio na cozinha de Maia. “Estou estudando possibilidades nas farinhas
para encontrar uma mistura
que torne possível aquela casca
crocante do pão francês, assim
como o miolo”, conta. Outra ambição é desenvolver alternativas
sem glúten para o pão de hambúrguer e o de cachorro-quente.
“O segredo está na massa, só
preciso encontrar a receita ideal
para cada uma.” (FF)
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