PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC S E N T E N Ç A (RITO ORDINÁRIO) Reclamante: SINDICATO DOS EMPREGADOS ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS DE FLORIANÓPOLIS/SC E REGIÃO EM Reclamado: BANCO DO BRASIL S/A (sucessor do Banco do Estado de Santa Catarina S/A) Processo RT 04138-2009-032-12-00-3 Vistos, etc. SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS DE FLORIANÓPOLIS/SC E REGIÃO, qualificado na petição inicial, propõe ação trabalhista contra BANCO DO BRASIL S/A (sucessor do Banco do Estado de Santa Catarina S/A), igualmente qualificado nos autos, alegando e postulando tudo quanto constante na exordial, relativamente aos contrato de trabalho dos substituídos egressos do BESC. Em razão dos fatos elencados na exordial, requer a declaração de nulidade de cláusula de renúncia à estabilidade dos ex-besquianos que venham a migrar ou já tenham migrado para o Regulamento do Banco do Brasil, sob pena de multa em caso de descumprimento, bem como a condenação do réu ao pagamento de indenização por assédio moral coletivo. Atribui à causa o valor de R$ 20.000,00. Junta documentos. Sem sucesso a primeira proposta de acordo, à fl. 209, o réu junta defesa escrita (fls. 214/258), com documentos. Às fls. 575 e seguintes, o reclamante se manifesta a respeito do conteúdo da contestação e documentos com ela juntados. Ouvem-se os representantes das partes; duas testemunhas do autor e uma do réu (fls. 580/586), oportunidade em que este junta outros documentos. Às fls. 644 e seguintes, o Banco do Brasil junta novos documentos, acerca dos quais o autor emite manifestação à fl. 689. Sem outras provas, encerra-se a instrução processual. PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC AUTOS DO PROCESSO RT 04138-2009-032-12-00-3 SENTENÇA – FOLHA 2 Às fls. 641 e seguintes, o Sindicato autor apresenta razões finais. Conciliação final inexitosa. É o relatório. DA FUNDAMENTAÇÃO: PRELIMINARMENTE: Da incompetência territorial. O reclamado alega que esta Vara do Trabalho não detém competência para apreciar a demanda, relativamente a substituídos lotados nos municípios de Palhoça/SC e em outros integrantes da jurisdição da UJA localizada naquele. Não lhe assiste razão. O destacamento de municípios para a "jurisdição" da UJA de Palhoça/SC foi providência meramente administrativa tomada pelo TRT/12ª, cujo objetivo precipuamente facilitar o deslocamento de partes e advogados às audiências, bem como o acesso aos autos na fase de conhecimento. Formalmente, todos os municípios mencionados seguem sob a jurisdição do fôro trabalhista de São José/SC, do qual a UJA de Palhoça/SC é integrante. Rejeito a preliminar. Da ilegitimidade ativa. O reclamado suscita a prefacial de ilegitimidade ativa do sindicato autor, visto que os direitos alegadamente violados, mais especificamente os vindicados nos subitens 'a' e 'b' e 'd' do item 9 da petição inicial, embora de cunho individual, não se caracterizariam como homogêneos, com o que refugiriam à atribuição conferida pelo inciso III do art. 8º da Constituição Federal. Não lhe assiste razão. O inciso III do art. 8º da Constituição Federal dispõe que "ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas". Como se vê, a Carta Magna confere legitimação extraordinária aos sindicatos para defenderem PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC AUTOS DO PROCESSO RT 04138-2009-032-12-00-3 SENTENÇA – FOLHA 3 direito alheio, na condição de substituto processual. A legitimação conferida aos sindicatos na defesa dos interesses de seus filiados é, sim, irrestrita. Assim, no caso dos autos o autor é legitimado a defender interesses afirmados na pretensão, mesmo que não sejam de titularidade da integralidade da categoria profissional. Rejeito, portanto, a preliminar. Da impossibilidade jurídica do pedido de indenização por assédio moral coletivo. O reclamado levanta a prefacial em destaque, ao argumento de que o ordenamento jurídico pátrio não trata sobre o tema e não há previsão legal de indenização para situações dessa natureza. Não lhe assiste razão. Diferentemente do que sugere o reclamado, a possibilidade jurídica do pedido, consoante doutrina moderna, consiste na inexistência de vedação no ordenamento jurídico do exercício do direito público subjetivo de obter a prestação jurisdicional, e não propriamente na previsão legal. Assim, exemplificativamente, antes da promulgação da atual Constituição Federal, a Lei nº 883/49 vedava a ação investigatória de paternidade adulterina, na constância do casamento do genitor adúltero. A norma em questão não permitia que a lide, caso existente entre as partes, fosse trazida a Juízo, configurando-se, pois, a impossibilidade jurídica do pedido imediato. Na situação em exame, não há proibição, no ordenamento jurídico pátrio, para o exercício, pelo Sindicato, de defesa de interesses coletivos da categoria ou de parte dela. Ao contrario, como visto acima, há expressa previsão constitucional para que atue nesse desiderato. NO MÉRITO: Da indenização por assédio moral coletivo e da renúncia à estabilidade. O reclamante alega que, por ocasião da incorporação do BESC pelo Banco do Brasil, os ex-empregados do banco incorporado passaram a sofrer assédio moral no ambiente de trabalho, consubstanciado no tratamento discriminado relativamente aos empregados que já eram do Banco do Brasil. Esclarece que diversos departamentos foram extintos e muitos empregados foram PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC AUTOS DO PROCESSO RT 04138-2009-032-12-00-3 SENTENÇA – FOLHA 4 mantidos em ambiente sem móveis, computadores e sem quaisquer serviços para realizar. Aduz que após três meses da incorporação, o Banco do Brasil abriu exíguo prazo para que egressos do BESC optassem pela migração para o seu quadro de carreira, porém mediante a obrigatória renúncia de direitos, tais como horas extras pré-contratadas e estabilidade. O réu rebate as arguições, aduzindo que os direitos foram preservados e negando práticas discriminatórias contra os ex-besquianos. Todavia, admite que a adesão ao plano de carreira do Banco do Brasil está condicionada à renúncia dos direitos contido no antigo regulamento do BESC, dentre os quais a estabilidade. Assiste razão parcial ao sindicato. De acordo com o art. 10 da CLT, qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não pode afetar os direitos adquiridos do empregados. Já o art. 468 da CLT assenta a impossibilidade de alterações das condições de trabalho em prejuízo dos empregados, ainda que com o consentimento desses. Depreende-se do depoimento do preposto, que do total de empregados do BESC, 2600 empregados fizeram a opção pelo plano de carreira do Banco do Brasil, restando em torno de 300 que ainda não fizeram. No caso, é incontroverso que alguns empregados do BESC eram detentores de estabilidade quando da incorporação pelo Banco do Brasil, mais especificamente, aqueles que contavam com dois anos de efetivo exercício na data de 03/02/1988. Com isso, inegável que o benefício integrou-se ao contrato de trabalho dos empregados que tinham aquela condição implementada em 03/02/1988. Incontroverso, também, que para a ascensão na carreira do Banco do Brasil (participação no sistema TAO), necessária a renúncia a essa estabilidade. Indiscutível, portanto, que a supressão desse direito, diga-se de passagem, adquirido, traduz um prejuízo a esses empregados. Assim, ao pretender incorporar o BESC, fosse a que pretexto fosse, o Banco do Brasil deveria preservar essa estabilidade em nome do disposto nos art. 10 e 448 da CLT. A mera troca da estabilidade pela possibilidade de progressão na carreira não pode ser aceita, porque além de unilateral, envolve valores diferentes com pressupostos diferentes, e nem de longe uma compensa a outra. PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC AUTOS DO PROCESSO RT 04138-2009-032-12-00-3 SENTENÇA – FOLHA 5 A alegação de que a opção não era obrigatória, e que os não optantes mantiveram a estabilidade, não socorre o reclamado, justamente porque demasiado caro o preço dessa manutenção, qual seja, ficar alijado da possibilidade de progressão funcional prevista no Regulamento do Banco incorporador. E mais, a supressão da estabilidade dos besquianos não pode ser admitida nem mesmo a pretexto de equalizar as condições de trabalho com os servidores que ingressaram diretamente no Banco do Brasil, que não detém tal prerrogativa. Isso porque o Banco incorporador não os trata igualitariamente em outros aspectos, como confessou o preposto em audiência, ao dizer que "ainda não foi oferecido a nenhum empregado oriundo do BESC o aceso à PREVI e a CASSI". Não bastasse isso, a migração também implicou a perda das horas extras habituais (7ª e 8ª horas) praticadas pelos egressos do BESC. Assim, se a adesão ao Plano do Banco do Brasil pode, por um lado, viabilizar o crescimento na carreira; por outro lado, implica a redução imediata da remuneração e pode ensejar o despedimento sem justa causa, de modo que o trabalhador tem muito mais a perder do que a ganhar com essa opção. Nesse contexto, fácil inferir que os atingidos tenham experimentado tormentosa e inaceitável situação, pois teriam de optar, de uma hora para outra, entre a possibilidade de serem despedidos sem justa causa; ou dar adeus à possibilidade de crescimento profissional. Por isso, acolho o requerido e declaro nula a cláusula de renúncia à estabilidade contida no termo de migração para o Regulamento de Pessoal do Banco do Brasil, mantendo incólume o benefício tanto para aqueles que já aderiram ao plano do Banco do Brasil como para migrações futuras. Por todo o exposto, embora não comprovada a prática discriminatória individualizada com os ex-besquianos, entendo que a situação imposta pelo Banco do Brasil, de lançar sobre esse grupo de trabalhadores o dilema de ficar estagnado na carreira ou perder a estabilidade, efetivamente caracteriza o que a doutrina convencionou denominar de assédio moral coletivo, na medida em que atingiu um grupo perfeitamente delimitado. Diga-se de passagem, o ambiente de trabalho sadio é direito tutelado constitucionalmente, e o assédio moral coletivo insere-se entre as maiores mazelas do ambiente do trabalho, atingindo diretamente a saúde mental dos trabalhadores. PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC AUTOS DO PROCESSO RT 04138-2009-032-12-00-3 SENTENÇA – FOLHA 6 Muito a propósito, neste particular, é o ensinamento da insigne Profa. Sônia Mascaro Nascimento, citada pelo autor na petição inicial: "Sendo o assédio moral uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, sua forma coletiva estar-se-á configurada quando uma certa coletividade de pessoas forem vítimas dessa conduta assediadora. Assim, o assédio moral coletivo constitui uma das principais causas de prejuízo ao meio ambiente do trabalho, e, conseqüentemente, à saúde dos trabalhadores. Deve-se mencionar que o meio ambiente do trabalho é tutelado constitucionalmente pelos artigos 200, inciso VIII e 225, §1º, inciso V. Dessa maneira, o assédio moral coletivo é concretizado quando há violação de interesses coletivos que pertençam a um grupo, ou a uma categoria ou ainda a uma classe formada por determinados indivíduos que são passíveis de identificação. Essa modalidade de assédio também pode surgir () quando interesses individuais homogêneos são violados" . 1 Consequentemente, com fundamento nos arts. 1º, III, e 225, § 1º, V, da Constituição Federal e arts. 186 e 927 do Código Civil Brasileiro, levando-se em conta a gravidade e extensão do dano causado, bem como as condições econômicas da empresa ofensora e dos ofendidos, defiro indenização por assédio moral coletivo no valor de R$ 10.000,00 a cada um dos substituídos. Dos honorários advocatícios. Preenchidos os requisitos legais estabelecidos na Lei 5.584/70 e com base na Súmula 220 do TST, defiro honorários de assistência judiciária, fixados em 15% do valor líquido da condenação, ao final apurado.. Dos descontos previdenciários e fiscais. A verba deferida aos substituídos, ante seu caráter indenizatório, não é passível de incidência de descontos fiscais e previdenciários. Da liquidação de sentença por simples cálculos. Dos juros e da 1 http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=12367 PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRT DA 12ª REGIÃO 2ª VARA DO TRABALHO DE SÃO JOSÉ - SC AUTOS DO PROCESSO RT 04138-2009-032-12-00-3 SENTENÇA – FOLHA 7 atualização. O valor da verba acima deferida será corrigido monetariamente e agregado de juros moratórios previstos na Lei 8.177/91, a partir da publicação da presente decisão (Enunciado nº 8 do e. TRT da 12ª Região). DA CONCLUSÃO: ANTE O EXPOSTO, decido, nos termos da fundamentação, que passa a integrar o presente dispositivo como se nele estivesse transcrita, rejeitar as preliminares arguidas e, no mérito, julgar PROCEDENTES, EM PARTE, os pedidos deduzidos na ação trabalhista proposta por SINDICATO DOS EMPREGADOS EM ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS DE FLORIANÓPOLIS/SC E REGIÃO contra BANCO DO BRASIL S/A (sucessor do Banco do Estado de Santa Catarina S/A), para declarar nula a cláusula de renúncia à estabilidade contida no termo de opção ao regulamento do Banco do Brasil, tanto para migrações já efetuadas como futuras, e CONDENAR o reclamado a pagar ao substituídos atingidos a seguinte verba: indenização por assédio moral coletivo, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), para cada substituído, bem como a pagar honorários assistenciais, os quais reverterão em favor do(s) advogado(s) habilitado(s) nos autos. Custas, pelo reclamado, de R$ 600.000, 00 fixadas com base no valor provisório atribuído à condenação de R$ 30.000.000,00. Intime-se a União (art. 832, § 5º, da CLT). Cumpra-se após o prazo de 48 horas do trânsito em julgado. Aplica-se, ao caso dos autos, o art. 475-J do CPC, ante o disposto no art. 769 da CLT, sujeitando-se o devedor ao pagamento de multa de 10%, no caso de inadimplemento. Sentença proferida com atraso, em razão do excesso de serviço. Publique-se. Intimem-se as partes. Nada Mais. JULIETA ELIZABETH CORREIA DE MALFUSSI Juíza do Trabalho