Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ TITULAR DA EGRÉGIA DO TRABALHO DE GOIÂNIA – GO. ____ VARA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, com sede na Av. T-63 esquina c/ T-4, nº 984, 1º Andar, St. Bueno, Goiânia, onde funciona a PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 18ª REGIÃO, por intermédio do Procurador do Trabalho que esta subscreve, vem perante Vossa Excelência, com fulcro nos arts. 127 e 129, III, da Constituição Federal; 83, inciso III, da Lei Complementar nº 75/93; e 1º, inciso IV, da Lei nº 7.347/85, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA em face de GLADEMIR FONTANELLA (FONTANELLA MONTAGEM INDUSTRIAL), pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 00.526.550/0001-49, estabelecida na Rua Pedro Luiz Ribeiro, s/nº, Quadra 02, Lote 11, Jardim Bela Morada, Aparecida de Goiânia, CEP 74983-200, e da pessoa natural de GLADEMIR FONTANELLA, brasileiro, divorciado, empresário, portador da CI RG nº 1027415632 SSP/RS, inscrito no CPF sob o nº 277.159.490-00, o qual poderá ser notificado no endereço acima mencionado, pelos fundamentos de fato e de direito a seguir expostos: Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região I – Dos Fatos Em janeiro de 2010, foi instaurado na PRT da 18ª Região, o Inquérito Civil nº 000058.2010.18.000/4, tendo como investigado o primeiro requerido, a fim de investigar noticia de tráfico de seres humanos para trabalhar fora do território nacional. O mencionado Inquérito Civil foi instaurado por provocação da Excelentíssima Juíza do Trabalho Substituta da Sexta Vara do Trabalho de Goiânia, Dra. Rosana Rabello Padovani Messias, que determinou a remessa dos autos do Processo nº 0223700.65.2009.5.18.0006 à PRT da 18ª Região, para ciência e manifestação do MPT, tendo em vista os fatos noticiados nos depoimentos pessoais das partes e das testemunhas inquiridas (doc. 01). Verificou-se no referido processo, que o reclamante Valdir Rodrigues Ramalho foi contratado pelo primeiro requerido para trabalhar como soldador/montador/encanador, na montagem industrial de uma empresa situada na Angola, África, sob a supervisão, subordinação e responsabilidade do segundo réu, sem registro e sem garantia dos direitos trabalhistas (doc. 02). Verificou-se, ainda, que diante das provas produzidas nos autos da referida ação trabalhista, a Sexta Vara do Trabalho de Goiânia reconheceu o vínculo empregatício do reclamante com o primeiro requerido, julgando parcialmente procedentes os pedidos iniciais, além de decretar a desconsideração da pessoa jurídica da primeira ré, determinando que os bens pessoais do segundo requerido respondessem pela condenação, e a expedição de ofício à Polícia Federal, para apuração da arregimentação de trabalhadores para laborarem na Angola, decisão que transitou em julgado sem irresignação das partes (doc. 02). Durante a investigação conduzida no Inquérito Civil nº 000058.2010.18.000/4, este órgão colheu o depoimento do segundo requerido, bem como de trabalhadores por ele contratados para trabalhar na empresa REFRIANGO, situada em Viana, Angola, os quais são transcritos a seguir: Depoimento do segundo requerido (doc. 03): Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região “Que é proprietário da firma individual GLADEMIR FONTANELLA, que tem como nome de fantasia FONTANELLA MONTAGEM INDUSTRIAL; Que teve empregados registrados na referida empresa apenas uma vez, quando trabalhou na montagem da fábrica de automóveis Hyundai, em Anápolis; Que o depoente trabalha com montagem industrial, especificamente para a indústria de bebidas; Que, entretanto, o depoente presta serviços como pessoa física, pois sua empresa está inativa há cerca de quatro a cinco anos; Que não emite notas fiscais de prestação de serviços, assinando apenas recibos de pagamento de autônomo (RPA); Que o depoente não possui empregados para auxiliá-lo, trabalhando sozinho, ou com ajuda de seus dois filhos, que já são adultos; Que o depoente também presta serviços para a empresa REFRIANGO, localizada em Viana, na Angola; Que a referida empresa dedica-se à fabricação de bebidas; Que o depoente presta serviços à referida empresa há cerca de três anos; Que nesse período, o depoente foi para Angola cerca de duas a três vezes por ano, lá permanecendo por no máximo três meses, cada vez; Que o depoente convida pessoas conhecidas aqui no Brasil para trabalhar na Angola, na empresa acima referida; Que o depoente é o responsável por coordenar os serviços dos brasileiros que viajam com ele para a Angola; Que o depoente recebe da REFRIANGO, U$ 5.000,00 (cinco mil dólares) por mês, quando trabalha para a mencionada empresa; Que os demais trabalhadores brasileiros, convidados pelo depoente, recebem U$ 2.300,00 (dois mil e trezentos dólares) por mês; Que a REFRIANGO paga todas as despesas relativas ao visto, às passagens, à hospedagem e à alimentação na Angola; Que o salário pago aos trabalhadores brasileiros é livre de qualquer despesa; Que no período de outubro a dezembro de 2010, havia 18 brasileiros trabalhando na REFRIANGO, em Angola; Que o depoente, no entanto, intermediou a viagem/emprego de apenas 10 desses 18 trabalhadores, sendo que os demais foram intermediados por outra pessoa, cujo nome não sabe informar; Que o próprio depoente não trabalhou em Angola no período de outubro a dezembro de 2010, pois foi impossibilitado por problemas pessoais; Que nesta situação, o depoente não recebe nenhuma quantia, seja da REFRIANGO, seja dos trabalhadores por ele intermediados; Que a agência de turismo responsável pela retirada do visto e pela viagem dos trabalhadores brasileiros para a Angola é a RBC TOUR, situada na Cidade do Rio de Janeiro, que tem filial em Luanda, Capital da Angola; Que a RBC TOUR é contratada diretamente pela REFRIANGO para retirar os vistos e pela viagem dos trabalhadores brasileiros; Que os trabalhadores intermediados pelo depoente e o próprio depoente retiram visto de turismo da Angola, o que lhes dão direito de permanecer naquele País por, no máximo três meses; Que como o visto de trabalho é complicado e demorado, levando até um ano para ser emitido, os trabalhadores optam pelo visto de turismo; Que o grupo de 18 trabalhadores acima referido já retornou ao Brasil; Que os trabalhadores que integravam o referido grupo moram em Goiânia, em Brasília, em Senador Canedo e Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região em Goianira; Que o depoente não sabe informar o nome completo dos referidos trabalhadores; Que na realidade, são os trabalhadores quem ligam para o depoente, suplicando para que ele arrume emprego para os mesmos na Angola, uma vez que naquele País eles ganham muito mais do que no Brasil; Que o primeiro requisito que o depoente analisa para que um trabalhador brasileiro se habilite para trabalhar na REFRIANGO é a qualificação profissional; Que, portanto, quando um trabalhador procura o depoente, solicitando emprego na Angola, o depoente analisa se ele tem qualificação para o serviço e, em caso positivo, o depoente liga para a REFRIANGO e recomenda a contratação daquele trabalhador; Que a REFRIANGO, então, efetua os trâmites burocráticos para a viagem do trabalhador brasileiro para a Angola; Que o interesse do depoente na intermediação de trabalhadores para a REFRIANGO consiste no fato de que havendo trabalhadores brasileiros naquela empresa, o depoente será contratado para liderar os trabalhos da equipe de brasileiros [...] Que os trabalhadores intermediados pelo depoente moram dentro de um condomínio de trabalhadores estrangeiros que existe dentro da REFRIANGO; Que todas as refeições são tomadas dentro da empresa; Que os trabalhadores não têm qualquer gasto com alimentação ou moradia quando estão na Angola; Que no referido condomínio há empregados de vários Países, como Alemanha, Espanha, EUA, Portugal, Itália etc.” Depoimento do Sr. VALDIR RODRIGUES RAMALHO, ouvido como testemunha compromissada na forma da lei (doc. 04): “Que conheceu o senhor GLADEMIR FONTANELLA em Goiânia, onde trabalhou na montagem industrial com o mesmo; Que o senhor GLADEMIR convidou o depoente para trabalhar com ele na Angola, na montagem industrial da empresa REFRIANGO; Que o senhor GLADEMIR informou ao depoente que a empresa REFRIANGO pagaria por sua passagem de ida e volta para a Angola, bem como pelas despesas de passaporte e emissão de visto; Que o investigado ainda informou ao depoente que ele ficaria hospedado em um alojamento de boa qualidade situado dentro das dependências da REFRIANGO, onde também faria as suas refeições; Que o investigado prometeu ao depoente que este receberia U$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos dólares americanos) por mês, livre de qualquer despesa; Que o investigado prometeu ao depoente que ele trabalharia na montagem industrial, de segunda a sextafeira, 8 (oito) horas por dia; Que foi prometido, ainda, assistência integral à saúde; Que o depoente, atraído principalmente pela boa remuneração, atendeu ao convite do senhor GLADEMIR, indo para Angola, a fim de trabalhar na REFRIANGO; Que viajou para a Angola, pela primeira vez, em outubro de 2008; Que voltou para o Brasil três vezes no período de um ano e dois meses; Que trabalhava três meses e vinha ao Brasil, onde ficava dez dias, uma vez que seu visto de estada naquele país era de três meses; Que não sabe informar quem pagou por suas Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região passagens aéreas para a Angola; Que, entretanto, o depoente não pagou pelas passagens, nem pelas despesas de passaporte e emissão de vistos, salvo pela emissão do visto referente ao último período trabalhado na Angola; Que cada vez que voltava ao Brasil, era necessário retirar um novo visto de turista para ingresso naquele país; Que os vistos emitidos eram de turistas; Que a agência de turismo que cuidava da emissão dos vistos e dos bilhetes aéreos era a RBC TUR, que ficava no Rio de Janeiro; Que pagou para a referida empresa pela emissão do último visto para a Angola; Que nos dois primeiros meses trabalhados na REFRIANGO, o depoente ficou alojado em uma casa da empresa, dentro de suas próprias dependências; Que a casa possuía três quartos e alojava sete empregados ao todo; Que a casa não apresentava boas condições, sendo construída de painéis térmicos, que esquentava bastante, mas havia ar condicionado; Que posteriormente, foi transferido para uma casa na Cidade de Viana, onde a fábrica era instalada, que apresentava condições ainda piores que a primeira; Que essa casa não tinha qualquer tipo de saneamento básico, além de estar situada em uma vila construída por chineses e que era extremamente perigosa; Que a casa possuia três quartos e alojava seis empregados; Que na casa não havia energia elétrica, sendo a energia oriunda de um gerador a diesel, que era fornecido pela empresa; Que no início não havia água encanada na casa, problema que só foi resolvido depois que os próprios moradores colocaram tonéis de água e encanamento; Que havia instalação sanitária na casa, bem como chuveiro de água quente; Que não havia segurança na casa; Que o depoente já foi assaltado na referida vila; Que almoçava e jantava na empresa, mas não gostava da comida; Que na maior parte do tempo, trabalhava de segunda a domingo, sem descanso semanal; Que começava a trabalhar às 07h e muitas vezes laborava até às 20 ou 21h, embora já tenha trabalhado até as 2h da manhã do dia seguinte; Que na realidade, não tinha hora certa para encerrar a jornada, pois tinha que trabalhar até encerrar a tarefa passada pelo investigado; Que trabalhava sem qualquer tipo de equipamento de proteção individual; Que o depoente não sofreu acidente de trabalho, mas seu cunhado, senhor GENERLON QUEIROZ DE BARROS, quebrou o braço, ao cair de uma altura de cinco metros, pois trabalhava em altura sem cinto de segurança; Que o senhor GENERLON permaneceu na Angola por mais de um mês, sem trabalhar e sem assistência, seja do investigado ou da REFRIANGO; Que após o referido período, ele voltou ao Brasil, onde também não teve assistência por parte do investigado; Que no período em que ficou parado, o senhor GENERLON não recebeu salário da REFRIANGO nem do investigado; Que o investigado reduziu o salário do depoente para U$ 2.300,00 (dois mil e trezentos dólares americanos) nos dois últimos meses; Que os demais empregados, salvo o encarregado do investigado, também tiveram a mesma redução salarial; Que o depoente recusou-se a continuar trabalhando para o investigado na Angola, em razão da redução salarial; Que no período em que trabalhou para o Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região investigado, na Angola, o senhor GLADEMIR levou em torno de quinze a vinte trabalhadores brasileiros para trabalhar na REFRIANGO; Que o investigado ganhava da REFRIANGO um salário fixo, cujo valor não sabe informar, além de U$ 1.500,00 (um mil e quinhentos dólares americanos) por cada trabalhador por ele levado para aquele país; Que na avaliação do depoente, algumas coisas prometidas pelo investigado não foram cumpridas, como a assistência à saúde, que não houve; Que a jornada de trabalho normal, pois trabalhava praticamente sem descanso semanal e com excesso diário; a qualidade dos alojamentos, que não eram bons; as despesas de emissão de visto, que o depoente teve que pagar em relação ao último período e o salário, que foi reduzido nos dois últimos meses”. Depoimento do Sr. JUNIOR CESAR DA SILVA, ouvido como testemunha compromissada na forma da lei (doc. 05): “Que o investigado convidou o depoente para trabalhar na montagem industrial da empresa REFRIANGO, na Angola; Que o senhor GLADEMIR prometeu ao depoente salário de U$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos dólares americanos) por mês, livre de qualquer despesa; Que o senhor GLADEMIR ainda prometeu que as depesas (sic) de emissão de visto e de passagem seriam custeadas pela REFRIANGO; Que o investigado ainda informou ao depoente que ele ficaria hospedado em um alojamento de boa qualidade situado dentro das dependências da REFRIANGO, onde também faria as suas refeições; Que o investigado informou ao depoente que ele trabalharia na montagem industrial, de segunda a domingo, 8 (oito) a 12 (doze) horas por dia e que as horas extras seriam pagas a parte do valor acima referido, que remunerava 220 horas mensais; Que em razão da boa remuneração prometida, o depoente aceitou trabalhar na Angola; Que viajou para aquele país em outubro de 2008, lá permanecendo por três meses; Que não pagou pela passagem aérea, nem pela emissão de visto; Que ficou alojado em uma casa da REFRIANGO, situada dentro de suas instalações; Que a casa tinha três quartos e abrigava oito trabalhadores; Que a casa apresentava boas condições, tendo luz elétrica, água encanada, chuveiro de água quente, televisão e mobiliário; Que comia no refeitório da empresa, café da manhã, almoço e jantar, que eram de boa qualidade; Que trabalhava todos os dias, das 08 até 19/21h; Que recebia em torno de U$ 5.000,00 a U$ 5.500,00 por mês, pois fazia muitas horas extras; Que não pagava pelo alojamento, nem pelas refeições; Que recebia os seguintes equipamentos de proteção individual: avental, luva, máscara de solda, óculos de proteção e protetor auricular; Que como o visto do depoente era de turismo, teve que retornar ao Brasil após três meses de permanência na Angola; Que não viajou mais para a Angola, pois não houve mais interesse do investigado em levar o depoente; Que chegou a ligar duas vezes para o senhor GLADEMIR, mas ele não deu uma resposta conclusiva ao depoente; Que gostou da experiência de ter trabalhado Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região na Angola, tendo o investigado cumprido tudo o que foi prometido ao depoente; Que na época em que trabalhou na Angola, o senhor GLADEMIR possuia (sic) doze empregados trabalhando na REFRIANGO, mas essa empresa contratava empregados brasileiros através de outras pessoas; Que não teve CTPS assinada, nem foi firmado contrato de trabalho, seja com o investigado, seja com a REFRIANGO; Que não teve qualquer direito trabalhista, salvo o salário e o pagamento das horas extras; Que como o visto dos trabalhadores intermediados pelo investigado era de turista, estes tinham que se esconder das autoridades de imigração da Angola, quando eles vistoriavam a REFRIANGO; Que o depoente teve que se esconder da imigração algumas vezes, tendo se escondido no forro do teto e no alojamento”. Pelo que se verifica dos depoimentos acima transcritos, o segundo requerido, através da firma individual por ele constituída (primeira ré), arregimenta trabalhadores principalmente na cidade de Goianira, GO, para trabalhar na montagem industrial da REFRIANGO, em Viana, Angola, sob sua supervisão e comando, sem assegurar aos trabalhadores, no entanto, os direitos sociais garantidos pela legislação brasileira. A referida conclusão também pode ser extraída da prova produzida nos autos do Processo nº 0223700.65.2009.5.18.0006, como se verifica dos seguintes depoimentos (doc. 02): Depoimento pessoal do reclamante VALDIR RODRIGUES RAMALHO: "que foi contratado para trabalhar em Angola, numa empresa de refrigerante; que o depoente deveria fazer serviços de montagem e soldagem em tubulações; que não existe mão-de-obra qualificada em Angola; que a primeira vez que foi para Angola foi 07.09.2008 tendo retornado, definitivamente, em 03.10.2009; que nesse período permanecia três meses em Angola e retornava ao Brasil, permanecendo de 25 a 30 dias; que recebia U$ 2.500,00, por mês trabalhado, sendo que quando retornava ao Brasil não era pago nenhum salário; que quer romper o vínculo uma vez que seu salário foi reduzido para U$ 2.200,00; que no último período em que permaneceu o salário era de U$ 2.500,00, entretanto não recebeu o último mês trabalhado. Perguntas do advogado da reclamada: que quem tirava o visto era a RBC TOUR, entretanto quem providenciava toda a documentação era o Sr. Clademir Fontanella; que o depoente recebia apenas o e.mail do Sr. Clademir informando os dados da viagem; que a hospedagem era paga pelo Sr. Clademir; que quem dava ordens era o Sr. Clademir, assim como a hospedagem era arcada pelo mesmo; que no período em que permanecia no Brasil as comunicações eram por e.mail e telefone; que o Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região Sr. Clademir também ia em Goianira; que na época que o depoente prestou serviços ao reclamado havia uma obra, nesse Estado que estava finzalizando (sic); que o depoente não trabalhou nessa obra". Depoimento pessoal do reclamado (segundo requerido): "que o depoente tem uma empresa de montagem industrial; que o depoente não tem escritório; que o depoente não tem nenhuma montagem no Estado de Goiás; que o depoente não tem empregados; que o depoente é um prestador de serviços autônomo em Angola; que o depoente trabalha de forma igual que o reclamante; que todas as despesas são arcadas pela empresa em que prestam serviços; que o reclamante viaja para Angola há quatro/cinco anos, sendo que o depoente viaja há um ano; que o depoente apenas convidou o reclamante; que nesta empresa existem diversos brasileiros; que não sabe dizer se o reclamante já havia prestado serviços para a empresa de refrigerantes. Perguntas da advogada do reclamante: que o depoente já convidou outras pessoas para trabalharem nesta empresa em outras oportunidades; que o depoente sempre presta serviços para a mesma empresa; que os trabalhadores autônomos é quem entravam em contato com o depoente para saber quando voltariam e se voltariam; que a empresa sediada em Angola tinha endereço e telefone de todos os prestadores, sendo que o dono da empresa já foi empregador do reclamante; que a empresa se comunica diretamente com o depoente por este ser o contato das pessoas que são convidadas para trabalhar na empresa; que há 04 pessoas que foram convidadas pela empresa de refrigerantes a permanecer definitivamente em Angola; que a empresa pagava o valor total da remuneração para o depoente que repassava aos 'trabalhadores autônomos' ". Depoimento da primeira reclamante, Sr. JUNIO CESAR DA SILVA: testemunha do "que o Sr. Glademir arregimenta pessoas para ir trabalhar em Angola; que o depoente já foi um vez; que o depoente trabalhou na fábrica de refrigerantes; que a empresa onde prestavam serviços não manteve contato direto com nenhum dos trabalhadores, não pegando endereço ou telefone; que o reclamado não fazia o serviço braçal, sendo que apenas coordenava os trabalhos; que todos os contatos e despesas de viagem e transferência foram 'por conta do Sr. Glademir'. Perguntas da procuradora do reclamante: que o depoente recebia U$ 2.500,00, sendo que acha que todos tinham o mesmo patamar remuneratório; que na cidade de Goianira o reclamado é conhecido como a pessoa que leva trabalhadores para Angola; que a empresa não pagava diretamente ao depoente; que o depoente deveria cumprir horário em Angola assim como foi chamado à atenção, pelo reclamado, quando não compareceu em um dia para trabalhar; que era o Sr. Glademir quem dava ordens ao depoente; Perguntas do advogado do reclamado: que o Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região depoente ficou em Angola de outubro de 2008 a janeiro de 2009; que o depoente apenas pegou o bilhete no aeroporto e pegou o avião, não tendo reparado o que estava escrito no bilhete; que não sabe informar se o reclamante já foi para Angola outras vezes". Depoimento da segunda testemunha do reclamante, Sr. GENERLON QUEIROZ DE BARROS, ouvido como informante, por ser cunhado do autor: "que o reclamante já foi para Angola, em período anterior, à prestação de trabalho com o reclamado; que o reclamado é conhecido em Goianira como arregimentador de mão-de-obra para laborar em Angola; que o depoente foi para Angola em outubro de 2008; que o reclamado, neste período, só dava ordens não executando serviços braçais; que não manteve contato direto com a tomadora, quer seja em relação ao pagamento de salário ou recebimento de ordens; que todo o relacionamento era por meio do reclamado; que o reclamado é quem cuidou de todo o trâmite para se dirigir ao exterior; que recebeu e.mail da Fontanella, no que tange ao embarque. Perguntas do procurador do reclamado: que não verificou se constava o nome da empresa de refrigerante nas passagens; que haviam diversos alojamentos na empresa; que o depoente ficou no alojamento da Fontanella; que existiam outras empresas iguais a Fontanella acampadas na empresa de refrigerante; que as refeições eram fornecidas pela empresa tomadora; que todos os acampados, de todas as empresas, almoçavam no mesmo local; que o depoente retornou dia 30 de dezembro; que o depoente retornou mais cedo pois machucou-se, sendo que só recebeu o valor dos dias trabalhados; que os acampamentos da tomadora são separados por cada prestador, constando apenas a delimitação; que no período em que o depoente trabalhou havia 03 casas da Fontanella; que também havia uma empresa portuguesa acampada, chamada a BIBENTO, e uma italiana, chamada SIDEL; que a SIDEL fazia montagem de maquinário próprio e a BIBENTO fazia o mesmo trabalho que a Fontanella; que desconhece se a BIBENTO fazia montagem de equipamentos, sendo que viu os trabalhadores fazendo o mesmo serviço que a Fontanella". Depoimento da DORIVAN LOPES DOS SANTOS: testemunha do reclamado, Sr. "que foi convidado pelo reclamado para trabalhar em Angola; que quem dá ordens para os trabalhadores é a empresa tomadora; que é o reclamado quem recebe da empresa e repassa para os trabalhadores; que existiam outras empresas prestadoras de serviços que ficavam em casas destinadas pela empresa tomadora aos trabalhadores; que a empresa BIBENTO fazia o mesmo serviço da Fontanella; que o depoente recebe U$ 3.200,00 por mês; que os outros trabalhadores recebiam U$ 2.500,00, sendo que ao ser questionado do motivo do valor superior, o depoente, após titubear, respondeu que Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região recebia valor superior por ser o encarregado; que quando o Sr. Glademir estava na empresa as ordens eram passadas pelo mesmo aos trabalhadores, sendo que seguia-se as determinações da tomadora; que quando o Sr. Glademir não estava presente a empresa passava as ordens diretamente ao depoente, que repassava aos trabalhadores. Registro que o depoente informou que esse repasse tratava-se de mero recado; que houve oportunidades que o Sr. Glademir não foi para Angola, sendo que permaneceu no Brasil; que a documentação do visto foi mandada para a RBC TOUR, por indicação do reclamado; que a documentação recebida da RBC constava o nome da empresa tomadora REFRIANGO; que quando o Sr. Glademir estava presente o depoente informou 'que o pessoal passava a ordens direto para ele'. Perguntas do procurador do reclamado: que o pessoal da REFRIANGO liga para o Sr. Glademir que entra em contato com os trabalhadores; que permanecem no Brasil de 20 a 60 dias, tendo liberdade para fazer o que quiserem; que em Angola têm folga no período da tarde no sábado e no domingo; que o depoente retornou depois que o reclamante; que o reclamante recebeu o último mês trabalhado. Pergunta indeferida: Se no desempenho do trabalho recebiam comandos e ordens da tomadora. A pergunta resta indeferida pois a testemunha já explicou como se dava o repasse das ordens. Protestos. Que depois que cumprissem o horário com a REFRIANGO poderiam trabalhar em outra empresa. Perguntas da procuradora do reclamante: que o reclamado fazia serviço braçal; que o pagamento era feito na presença de todos". Verifica-se, por outro lado, que os trabalhadores intermediados pelos requeridos, para trabalhar na Angola, não possuem autorização consular daquele País para laborar na nação africana, pois eles obtêm visto de turista, fato confessado pelo segundo requerido (doc. 03), o que faz de tais trabalhadores imigrantes ilegais, que precisam se esconder das autoridades de imigração da Angola, conforme informado pela testemunha JUNIOR CESAR DA SILVA (doc. 05), tornando tal trabalho uma aventura perigosa e ilegal. No mesmo sentido, informou a RBC AGÊNCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA. EPP, responsável pela retirada dos vistos e emissão dos bilhetes de passagem dos trabalhadores brasileiros arregimentados indiretamente pela REFRIANGO, que tais trabalhadores retiram vistos ordinários no Consulado da Angola, estabelecido no Rio de Janeiro, relacionando 171 brasileiros, que viajaram para a Angola, no período de 2008 a 2011, a fim de trabalharem na REFRIANGO (doc. 06). Conclui-se, portanto, que a arregimentação e a intermediação de mão-de-obra promovidas pelos requeridos, com participação efetiva da REFRIANGO, são ilegais, não Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região apenas no aspecto trabalhista, uma vez que não são assegurados aos obreiros os direitos sociais previstos no ordenamento jurídico-positivo brasileiro, como também no aspecto diplomático, pois os trabalhadores brasileiros intermediados pelos requeridos não dispõem de visto de trabalho da Angola, laborando, assim, na qualidade de imigrantes ilegais no País africano. Assim, tendo em vista a comprovação das irregularidades acima mencionadas, e a impossibilidade de resolver a questão extrajudicialmente, já que o segundo requerido não reconhece nem mesmo a arregimentação dos trabalhadores, não resta alternativa ao MPT senão bater às portas do Judiciário, a fim de ser restaurada a ordem jurídica lesada pela conduta dos requeridos. II – Do Direito Os documentos que instruem esta peça de ingresso comprovam, inequivocamente, que a empresa REFRIANGO, localizada em Viana, Angola, contrata trabalhadores brasileiros, com frequência e em quantidade considerável, para trabalhar em seu estabelecimento fabril, contratação essa feita através de pessoas físicas e jurídicas sediadas no território brasileiro, como ocorre com os requeridos. A respeito da contratação de trabalhadores brasileiros para laborar no exterior, dispõem os arts. 12/ 14 e 19/20, da Lei nº 7.064, de 06 de dezembro de 1982, verbis: “Art. 12 – A contratação de trabalhador, por empresa estrangeira, para trabalhar no exterior está condicionada à prévia autorização do Ministério do Trabalho. Art. 13 – A autorização a que se refere o art. 12 somente poderá ser dada à empresa de cujo capital participe, em pelo menos 5% (cinco por cento) pessoa jurídica domiciliada no Brasil. Art. 14 – Sem prejuízo da aplicação das leis do país da prestação dos serviços, no que respeita a direitos, vantagens e garantias trabalhistas e previdenciárias, a empresa estrangeira assegurará ao trabalhador os direitos a ele conferidos neste Capítulo. Art. 19 - A pessoa jurídica domiciliada no Brasil a que alude o art. 13 será solidariamente responsável com a empresa estrangeira por todas as obrigações decorrentes da contratação do trabalhador. Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região Art. 20 - O aliciamento de trabalhador domiciliado no Brasil, para trabalhar no exterior, fora do regime desta Lei, configurará o crime previsto no art. 206 do Código Penal Brasileiro”. Verifica-se, portanto, que o direito positivo brasileiro estabelece regras para que uma empresa estrangeira contrate trabalhadores no território nacional, regras que não vêm sendo obedecidas para a contratação de empregados brasileiros pela REFRIANGO, já que esta empresa angolana utiliza arregimentadores como testas-de-ferro, para recrutar e fornecer mão-de-obra especializada para trabalhar em seu parque fabril. Note-se que a Lei nº 7.064/82 condiciona a contratação de trabalhadores domiciliados no Brasil por empresa estrangeira, para trabalhar no exterior, à prévia autorização do Ministério do Trabalho e Emprego (art. 12), preconizando que essa autorização somente será concedida à empresa estrangeira de cujo capital social participe, em pelo menos 5% (cinco por cento), pessoa jurídica domiciliada no Brasil (art. 13), que será solidariamente responsável com aquela por todas as obrigações decorrentes da contratação do trabalhador nacional (art. 19). Está provado, entretanto, que nada disso ocorre no caso dos autos, pois os trabalhadores brasileiros são atraídos por salários mais altos do que os praticados no mercado nacional e aliciados pelos requeridos para trabalharem na REFRIANGO, localizada na Angola, sem as garantias legais e constitucionais brasileiras, em total afronta ao disposto no Capítulo III da Lei nº 7.064/82, que confere ao trabalhador recrutado no Brasil para trabalhar no exterior, sem prejuízo da aplicação das leis do país da prestação dos serviços, os direitos, vantagens e garantias trabalhistas e previdenciárias previstas pela referida lei e pelas normas brasileiras (art. 14 c/c art. 3º, I e II). Com efeito, os documentos que instruem essa ação civil pública comprovam que o segundo requerido recruta brasileiros para trabalhar na fábrica de bebidas REFRIANGO, sob sua supervisão e direção, não garantindo aos trabalhadores os direitos sociais previstos na legislação brasileira, sendo o segundo requerido titular de uma firma individual (primeira ré), que não tem escritório, empregados nem obras no Brasil, servindo apenas para a consecução de seu propósito fraudulento. Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região Os trabalhadores aliciados pelos requeridos e levados para a Angola não têm CTPS assinada; não firmam contratos individuais de trabalho escrito, como exige o art. 4º da Lei nº 7.064/82; não têm a proteção previdenciária conferida pela legislação brasileira; não têm seguro de vida e acidentes pessoais cobrindo o período a partir do embarque para o exterior até o retorno ao Brasil, como exige o art. 21 da Lei nº 7.064/82; não dispõem de serviços gratuitos e adequados de assistência médica e social, como exige o art. 22 da Lei nº 7.064/82; enfim, não gozam de quaisquer direitos e garantias da legislação pátria, encontrando-se completamente desamparados. Tanto é verdade, que o trabalhador GENERLON QUEIROZ DE BARROS, recrutado pelos requeridos e levado para trabalhar na REFRIANGO, quebrou o braço, ao cair de uma altura de cinco metros, pois trabalhava em altura sem cinto de segurança, permanecendo na Angola por mais de um mês, sem trabalhar, sem assistência médica e sem remuneração, seja do investigado ou da REFRIANGO (vide depoimento da testemunha VALDIR RODRIGUES RAMALHO - doc. 04 e do próprio GENERLON QUEIROZ DE BARROS – doc. 2). A propósito da situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior, preconizam os arts. 2º e 3º da Lei nº 7.064/82: Art. 2º - Para transferido: os efeitos desta Lei, considera-se [...] II o empregado cedido à empresa sediada no estrangeiro, para trabalhar no exterior, desde que mantido o vínculo trabalhista com o empregador brasileiro; III - o empregado contratado por empresa sediada Brasil para trabalhar a seu serviço no exterior. no Art. 3º - A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços: I - os direitos previstos nesta Lei; II - a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em relação a cada matéria”. Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região Assim, sob qualquer ângulo que se analise a questão, conclui-se que a mencionada lei tem plena aplicação no caso dos autos, uma vez que os requeridos recrutam trabalhadores no Brasil, para laborarem a seu serviço, na Angola, a fim de atender à necessidade da empresa REFRIANGO, sem, contudo, garantir-lhes os direitos trabalhistas previstos na Constituição Federal, na CLT e na legislação esparsa, ou tampouco os direitos previstos na Lei nº 7.064/82. A sentença proferida pela Exma. Juíza do Trabalho Rosana Rabello Padovani Messias, nos autos da Ação Trabalhista nº 0223700.65.2009.5.18.0006, proposta por Valdir Rodrigues Ramalho em face dos requeridos, sintetiza, com precisão, a situação ilícita trazida a lume nesta ação civil pública, ao preconizar que: “Os grifos acrescidos as declarações das testemunhas e do informante revelam que os trabalhadores são levados para Angola sem nenhum direito trabalhista assegurado. Tanto é que o informante machucou-se e Brasil sem nenhuma garantia ou auxílio lesão. retornou ao posterior à Constata-se, ainda, que os trabalhadores permanecem parados cerca de dois meses no Brasil sem salário ou qualquer garantia de emprego. Note-se ademais, que a empresa Refriango mantém diversos acampamentos com trabalhadores de outras nacionalidades a fim de atender os próprios interesses econômicos. A realidade do mundo globalizado precariza as condições de trabalho e isto é um fato. Fato, ainda, que a mão de obra nacional é barata. Por óbvio que, trabalhadores que são mau (sic) remunerados sentem-se tentados a se aventurar num país estranho do que permanecer no país e perceber a metade do que receberiam. O nome conhecido desta situação decorrente da necessidade econômica. é vulnerabilidade Junte-se estas duas situações: mão de obra barata dependência econômica que nasce o tráfico de pessoas. e Peço licença para transcrever definição que consta no site do Movimento contra o Tráfico de Pessoas, endereço eletrônico ‘www.traficodepessoas.org.br’: Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região ‘Tráfico de Pessoas é causa e consequência de violação de direitos humanos. É uma ofensa aos direitos humanos porque explora a pessoa humana, degrada a sua dignidade, limita sua liberdade de ir e vir. É ainda consequência do desrespeito aos direitos humanos porque o tráfico de pessoas é fruto da desigualdade socioeconômico, da falta de educação, de poucas perspectivas de emprego e de realização pessoal, de serviços de saúde precários e da luta diária da sobrevivência.’ O reclamado, por meio da pessoa jurídica, conduz trabalhadores para o exterior, utilizando-se de um falso contrato de prestação de serviço a fim de mascarar o trabalho subordinado. Referidos trabalhadores são enviados ao exterior qualquer garantia, tanto que sofrem acidentes respaldo e ficam com os salários retidos. sem sem A CLT serve como uma rede proteção ao trabalhador a fim de assegurar as garantias mínimas ao cidadão. Na hipótese dos autos, o trabalhador é literalmente colocado num avião para desempenhar serviço ligado a atividade fim do reclamado em empresa situada em Angola, sem qualquer garantia trabalhista. Troca-se o caminhão do boía fria pelo avião, mas a forma de trabalho é a mesma, não existe nenhuma rede de proteção ao empregado. Note-se, ainda, que se torna muito conveniente aos interesses empresariais a contratação de empregado sem o pagamento de impostos, restando violadas normas de ordem fiscal e previdenciária. Restou demonstrado pela oitiva da testemunha indicada pelo reclamado que o reclamante recebia ordens da empresa, havendo, inclusive, uma estrutura hierarquizada, tanto que, a testemunha era o encarregado, fazendo as vezes do empregador. O pagamento mensal ao autor resta confessado, inclusive em relação aos custos para manutenção e envio dos trabalhadores que corriam por risco do reclamado. Irrelevante para esta demanda quem efetivamente arque com as despesas, na medida que, a partir do momento que os trabalhadores são aliciados e atuam na dinâmica empresarial do reclamado emerge o contrato de trabalho. Hoje, face ao avanço tecnológico e dada a complexidade das relações humanas deve-se analisar a subordinação sob o ponto de vista estrutural e objetivo. A subordinação decorre da inserção do empregado na dinâmica empresarial do empregador, seja ele uma Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região empresa, civil. um hospital, uma clínica ou uma sociedade O binômio ordem/subordinação resta superado pelo binômio da colaboração/dependência, sendo que a expressão subordinação deve ser analisada sob o aspecto objetivo, qual seja, o modo de realização da prestação de trabalho e a inserção da pessoa no contexto empresarial. Feitas essas considerações, emprego entre as partes”. reconheço o vínculo de A par das irregularidades trabalhistas, cabe ainda destacar outra ilicitude grave praticada pelos requeridos com intervenção direta da empresa angolana REFRIANGO, consubstanciada na promoção da imigração ilegal de brasileiros para a Angola. Com efeito, como já ressaltado anteriormente, restou provado que os trabalhadores intermediados pelos requeridos, para trabalhar na Angola, não possuem autorização consular daquele país para laborar na nação africana, pois eles obtêm visto de turista, fato confessado pelo segundo requerido (doc. 03), o que faz de tais trabalhadores imigrantes ilegais, que precisam se esconder das autoridades de imigração da Angola, conforme informado pela testemunha JUNIOR CESAR DA SILVA (doc. 05), tornando tal trabalho uma aventura perigosa e ilegal. No mesmo sentido, informou a RBC AGÊNCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA. EPP, responsável pela retirada dos vistos e emissão dos bilhetes de passagem dos trabalhadores brasileiros arregimentados indiretamente pela REFRIANGO, que tais trabalhadores retiram vistos ordinários no Consulado da Angola, estabelecido no Rio de Janeiro (doc. 06). Conclui-se, portanto, que a arregimentação e a intermediação de mão-de-obra promovidas pelos requeridos, com participação efetiva da REFRIANGO, são ilegais, não apenas no aspecto trabalhista, uma vez que não são assegurados aos obreiros os direitos sociais previstos no ordenamento jurídico-positivo brasileiro, como também no aspecto diplomático, pois os trabalhadores brasileiros intermediados pelos requeridos não dispõem de visto de trabalho da Angola, laborando, assim, na qualidade de imigrantes ilegais no País africano. Tal situação coloca os brasileiros à margem da legalidade, totalmente desamparados enquanto trabalham trabalhadores deixando-lhes e residem na Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região Angola, estando sujeitos até mesmo à prisão e deportação pelas autoridades de imigração daquele país. Assim, sob todos os ângulos, verifica-se que o recrutamento de trabalhadores brasileiros levado a cabo pelos requeridos não pode ser tolerado pelo estado brasileiro, merecendo uma resposta pronta e eficaz por parte do Judiciário Trabalhista. III – Do pedido de antecipação de tutela Segundo o disposto no art. 19 da Lei nº 7.347/85, aplica-se à ação civil pública as regras do Código de Processo Civil naquilo que não contrariem as suas disposições. O CPC, por sua vez, prevê em seus arts. 273 e 461 o instituto da antecipação de tutela, que é perfeitamente compatível com o sistema da ação civil pública. Convém recordar que muito antes da reforma processual de 1.994, determinada pela Lei nº 8.952/94, que instituiu a antecipação de tutela, a Lei nº 7.347/85 já previa, em seus arts. 4º e 12, a impropriamente chamada tutela cautelar satisfativa, de natureza híbrida, pois a par de seu caráter instrumental, permitia o adiantamento da tutela nas obrigações de fazer e não fazer. Vale dizer, em sede de cautelar, já previa a possibilidade de se obter um provimento de conteúdo executivo, exatamente como ocorre na tutela antecipada do provimento jurisdicional de mérito. Como se não bastasse, o art. 84, § 3º, da Lei nº 8.078/90, aplicável à ação civil pública por força do disposto no seu art. 90 e no art. 21 da Lei nº 7.347/85, prevê que sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu. Assim, tem-se que a tutela antecipada do provimento jurisdicional de mérito é perfeitamente cabível nas ações coletivas previstas no CDC e na LACP. Verifica-se, contudo, que a norma estatuída no art. 84, § 3º, do CDC (que tem a mesma redação do art. 461, § 3º, do CPC), ao contrário do que preconiza o art. 273 daquele Codex, autoriza o magistrado a antecipar a tutela de mérito liminar e provisoriamente, sempre que presentes a Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região relevância do de ineficácia concessão da portanto, que fundamento da demanda e o justificado receio do provimento final (requisitos necessários à medida cautelar), sendo bem menos rigorosa, a norma do art. 273 do CPC. Assim, por se tratar de defesa de interesses metaindividuais, a antecipação da tutela jurisdicional de mérito na ação civil pública deve seguir os parâmetros delineados no art. 83, § 3º, do CDC e art. 461, § 3º, do CPC e não aqueles preconizados pelo art. 273 deste último diploma, tudo de forma a conferir maior efetividade na entrega da prestação jurisdicional coletiva. Desta forma, passa-se a discorrer sobre os pressupostos específicos para a concessão da tutela antecipada no caso dos autos. Relevância do fundamento da demanda. O material probatório acostado aos autos demonstra a gravidade da conduta dos requeridos e os efeitos nocivos que dela decorrem para a ordem jurídica trabalhista, pela flagrante ofensa perpetrada aos direitos sociais dos trabalhadores, que são levados a trabalhar no exterior sem a garantia dos direitos constitucionais e legais brasileiros e à margem das leis de imigração. A situação é tão grave que, segundo o disposto no art. 20 da Lei nº 7.064/82, o aliciamento de trabalhador domiciliado no Brasil, para trabalhar no exterior, fora do regime da referida lei, como ocorre no caso dos autos, configura o crime previsto no art. 206 do Código Penal Brasileiro, que trata do delito de aliciamento de trabalhadores para trabalhar no estrangeiro, punível com detenção de um a três anos e multa. Os fatos noticiados e comprovados, portanto, exigem do Poder Judiciário uma atitude célere e eficiente para estancar o processo de aliciamento levado a efeito pelos requeridos, para atender ao interesse econômico da empresa REFRIANGO. Por outro lado, os depoimentos e documentos colhidos no curso do Inquérito Civil nº 000058.2010.18.000/4 e os depoimentos obtidos nos autos da Ação Trabalhista nº 0223700.65.2009.5.18.0006 constituem prova material suficiente dos fatos narrados, permitindo a perfeita visualização da fumaça do bom direito. Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região Justificado receio de ineficácia do provimento final. A continuidade da ação delituosa dos requeridos causa danos de difícil (ou impossível) reparação, na medida em que, com o passar do tempo, mais e mais trabalhadores brasileiros são arregimentados e levados, ilegalmente, para trabalhar na Angola. Assim, caso não seja concedida a tutela antecipada que ora se pleiteia, o provimento final que se busca na presente ação poderá ser totalmente ineficaz, pois até o trânsito em julgado da decisão condenatória que se busca, dezenas ou até centenas de trabalhadores domiciliados no Brasil podem ser vitimados pela ação delituosa dos requeridos. Presentes, pois, a relevância do fundamento da demanda e o justificado receio de ineficácia do provimento final, pressupostos indispensáveis à concessão da tutela antecipada. Destarte, requer o MPT, liminarmente ou após justificação prévia, a concessão de tutela antecipada para o fim de condenar os requeridos a absterem-se de atrair, convidar, recrutar, arregimentar ou aliciar trabalhadores para laborar no exterior, sobretudo na Angola, sem a garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários previstos na Constituição Federal, na CLT, na legislação esparsa brasileira e na Lei nº 7.064/82, e sem que os trabalhadores brasileiros disponham de visto de trabalho dos países onde se dará a prestação dos serviços, sob pena de pagamento de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por trabalhador prejudicado, a ser revertida ao Fundo de Amparo ao Trabalhador, criado pela Lei nº 7.998, de 11.01.90, em sintonia com o disposto no art. 13 da Lei nº 7.347/85. IV – Do pedido definitivo Por fim, considerando os documentos que acompanham a inicial, o Ministério Público, na defesa da ordem jurídica e dos interesses difusos e coletivos, requer EM CARÁTER DEFINITIVO, a manutenção dos efeitos da tutela antecipada, julgando-se procedente o pedido abaixo, para o fim de condenar os requeridos a absterem-se de atrair, convidar, recrutar, arregimentar ou aliciar trabalhadores Ministério Público da União MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região para laborar no exterior, sobretudo na Angola, sem a garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários previstos na Constituição Federal, na CLT, na legislação esparsa brasileira e na Lei nº 7.064/82, e sem que os trabalhadores brasileiros disponham de visto de trabalho dos países onde se dará a prestação dos serviços, sob pena de pagamento de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por trabalhador prejudicado, a ser revertida ao Fundo de Amparo ao Trabalhador, criado pela Lei nº 7.998, de 11.01.90, em sintonia com o disposto no art. 13 da Lei nº 7.347/85. Requer, outrossim, a citação dos requeridos para, querendo, contestem a presente ação, no prazo legal, ou sujeitem-se aos efeitos da revelia e confissão. Protesta-se pela produção de todas as provas admitidas em direito, em especial a juntada de documentos, perícias, depoimentos pessoal e testemunhal. Dá-se à causa (cinquenta mil reais). o valor de R$ Termos em que, Pede deferimento. Goiânia, 17 de fevereiro de 2.012. Marcello Ribeiro Silva Procurador do Trabalho 50.000,00