Ministério Público da União
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ TITULAR DA EGRÉGIA
DO TRABALHO DE GOIÂNIA – GO.
____
VARA
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, com sede na
Av. T-63 esquina c/ T-4, nº 984, 1º Andar, St. Bueno,
Goiânia, onde funciona a PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO
DA 18ª REGIÃO, por intermédio do Procurador do Trabalho que
esta subscreve, vem perante Vossa Excelência, com fulcro
nos arts. 127 e 129, III, da Constituição Federal; 83,
inciso III, da Lei Complementar nº 75/93; e 1º, inciso IV,
da Lei nº 7.347/85, propor
AÇÃO
CIVIL
PÚBLICA
COM
PEDIDO
DE
TUTELA
ANTECIPADA
em face de GLADEMIR FONTANELLA (FONTANELLA
MONTAGEM INDUSTRIAL), pessoa jurídica de direito privado,
inscrita no CNPJ sob o nº 00.526.550/0001-49, estabelecida
na Rua Pedro Luiz Ribeiro, s/nº, Quadra 02, Lote 11, Jardim
Bela Morada, Aparecida de Goiânia, CEP 74983-200, e da
pessoa
natural
de
GLADEMIR
FONTANELLA,
brasileiro,
divorciado, empresário, portador da CI RG nº 1027415632
SSP/RS, inscrito no CPF sob o nº 277.159.490-00, o qual
poderá ser notificado no endereço acima mencionado, pelos
fundamentos de fato e de direito a seguir expostos:
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I – Dos Fatos
Em janeiro de 2010, foi instaurado na PRT da
18ª Região, o Inquérito Civil nº 000058.2010.18.000/4,
tendo como investigado o primeiro requerido, a fim de
investigar noticia de tráfico de seres humanos para
trabalhar fora do território nacional.
O mencionado Inquérito Civil foi instaurado por
provocação da Excelentíssima Juíza do Trabalho Substituta
da Sexta Vara do Trabalho de Goiânia, Dra. Rosana Rabello
Padovani Messias, que determinou a remessa dos autos do
Processo nº 0223700.65.2009.5.18.0006 à PRT da 18ª Região,
para ciência e manifestação do MPT, tendo em vista os fatos
noticiados nos depoimentos pessoais das partes e das
testemunhas inquiridas (doc. 01).
Verificou-se no referido processo, que o
reclamante Valdir Rodrigues Ramalho foi contratado pelo
primeiro
requerido
para
trabalhar
como
soldador/montador/encanador, na montagem industrial de uma
empresa situada na Angola, África, sob a supervisão,
subordinação e responsabilidade do segundo réu, sem
registro e sem garantia dos direitos trabalhistas (doc.
02).
Verificou-se, ainda, que diante das provas
produzidas nos autos da referida ação trabalhista, a Sexta
Vara
do
Trabalho
de
Goiânia
reconheceu
o
vínculo
empregatício do reclamante com o primeiro requerido,
julgando parcialmente procedentes os pedidos iniciais, além
de decretar a desconsideração da pessoa jurídica da
primeira ré, determinando que os bens pessoais do segundo
requerido respondessem pela condenação, e a expedição de
ofício à Polícia Federal, para apuração da arregimentação
de trabalhadores para laborarem na Angola, decisão que
transitou em julgado sem irresignação das partes (doc. 02).
Durante a investigação conduzida no Inquérito
Civil nº
000058.2010.18.000/4, este
órgão colheu
o
depoimento do segundo requerido, bem como de trabalhadores
por ele contratados para trabalhar na empresa REFRIANGO,
situada em Viana, Angola, os quais são transcritos a
seguir:
Depoimento do segundo requerido (doc. 03):
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“Que é proprietário da firma individual GLADEMIR
FONTANELLA, que tem como nome de fantasia FONTANELLA
MONTAGEM INDUSTRIAL; Que teve empregados registrados na
referida empresa apenas uma vez, quando trabalhou na
montagem da fábrica de automóveis Hyundai, em Anápolis;
Que o depoente trabalha com montagem industrial,
especificamente para a indústria de bebidas; Que,
entretanto, o depoente presta serviços como pessoa
física, pois sua empresa está inativa há cerca de quatro
a cinco anos; Que não emite notas fiscais de prestação
de serviços, assinando apenas recibos de pagamento de
autônomo (RPA); Que o depoente não possui empregados
para auxiliá-lo, trabalhando sozinho, ou com ajuda de
seus dois filhos, que já são adultos; Que o depoente
também presta serviços para a empresa REFRIANGO,
localizada em Viana, na Angola; Que a referida empresa
dedica-se à fabricação de bebidas; Que o depoente presta
serviços à referida empresa há cerca de três anos; Que
nesse período, o depoente foi para Angola cerca de duas
a três vezes por ano, lá permanecendo por no máximo três
meses, cada vez; Que o depoente convida pessoas
conhecidas aqui no Brasil para trabalhar na Angola, na
empresa acima referida; Que o depoente é o responsável
por coordenar os serviços dos brasileiros que viajam com
ele para a Angola; Que o depoente recebe da REFRIANGO,
U$ 5.000,00 (cinco mil dólares) por mês, quando trabalha
para a mencionada empresa; Que os demais trabalhadores
brasileiros,
convidados
pelo
depoente,
recebem
U$
2.300,00 (dois mil e trezentos dólares) por mês; Que a
REFRIANGO paga todas as despesas relativas ao visto, às
passagens, à hospedagem e à alimentação na Angola; Que o
salário pago aos trabalhadores brasileiros é livre de
qualquer despesa; Que no período de outubro a dezembro
de 2010, havia 18 brasileiros trabalhando na REFRIANGO,
em Angola; Que o depoente, no entanto, intermediou a
viagem/emprego de apenas 10 desses 18 trabalhadores,
sendo que os demais foram intermediados por outra
pessoa, cujo nome não sabe informar; Que o próprio
depoente não trabalhou em Angola no período de outubro a
dezembro de 2010, pois foi impossibilitado por problemas
pessoais; Que nesta situação, o depoente não recebe
nenhuma
quantia,
seja
da
REFRIANGO,
seja
dos
trabalhadores por ele intermediados; Que a agência de
turismo responsável pela retirada do visto e pela viagem
dos trabalhadores brasileiros para a Angola é a RBC
TOUR, situada na Cidade do Rio de Janeiro, que tem
filial em Luanda, Capital da Angola; Que a RBC TOUR é
contratada diretamente pela REFRIANGO para retirar os
vistos e pela viagem dos trabalhadores brasileiros; Que
os trabalhadores intermediados pelo depoente e o próprio
depoente retiram visto de turismo da Angola, o que lhes
dão direito de permanecer naquele País por, no máximo
três meses; Que como o visto de trabalho é complicado e
demorado, levando até um ano para ser emitido, os
trabalhadores optam pelo visto de turismo; Que o grupo
de 18 trabalhadores acima referido já retornou ao
Brasil; Que os trabalhadores que integravam o referido
grupo moram em Goiânia, em Brasília, em Senador Canedo e
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em Goianira; Que o depoente não sabe informar o nome
completo dos referidos trabalhadores; Que na realidade,
são os trabalhadores quem ligam para o depoente,
suplicando para que ele arrume emprego para os mesmos na
Angola, uma vez que naquele País eles ganham muito mais
do que no Brasil; Que o primeiro requisito que o
depoente analisa para que um trabalhador brasileiro se
habilite para trabalhar na REFRIANGO é a qualificação
profissional; Que, portanto, quando um trabalhador
procura o depoente, solicitando emprego na Angola, o
depoente analisa se ele tem qualificação para o serviço
e, em caso positivo, o depoente liga para a REFRIANGO e
recomenda a contratação daquele trabalhador; Que a
REFRIANGO, então, efetua os trâmites burocráticos para a
viagem do trabalhador brasileiro para a Angola; Que o
interesse do depoente na intermediação de trabalhadores
para a REFRIANGO consiste no fato de que havendo
trabalhadores brasileiros naquela empresa, o depoente
será contratado para liderar os trabalhos da equipe de
brasileiros [...] Que os trabalhadores intermediados
pelo
depoente
moram
dentro
de
um
condomínio
de
trabalhadores
estrangeiros
que
existe
dentro
da
REFRIANGO; Que todas as refeições são tomadas dentro da
empresa; Que os trabalhadores não têm qualquer gasto com
alimentação ou moradia quando estão na Angola; Que no
referido condomínio há empregados de vários Países, como
Alemanha, Espanha, EUA, Portugal, Itália etc.”
Depoimento do Sr. VALDIR RODRIGUES RAMALHO,
ouvido como testemunha compromissada na forma da lei (doc.
04):
“Que conheceu o senhor GLADEMIR FONTANELLA em Goiânia,
onde trabalhou na montagem industrial com o mesmo; Que o
senhor GLADEMIR convidou o depoente para trabalhar com
ele na Angola, na montagem industrial da empresa
REFRIANGO; Que o senhor GLADEMIR informou ao depoente
que a empresa REFRIANGO pagaria por sua passagem de ida
e volta para a Angola, bem como pelas despesas de
passaporte e emissão de visto; Que o investigado ainda
informou ao depoente que ele ficaria hospedado em um
alojamento
de
boa
qualidade
situado
dentro
das
dependências da REFRIANGO, onde também faria as suas
refeições; Que o investigado prometeu ao depoente que
este receberia U$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos
dólares americanos) por mês, livre de qualquer despesa;
Que
o
investigado
prometeu
ao
depoente
que
ele
trabalharia na montagem industrial, de segunda a sextafeira, 8 (oito) horas por dia; Que foi prometido, ainda,
assistência integral à saúde; Que o depoente, atraído
principalmente pela boa remuneração, atendeu ao convite
do senhor GLADEMIR, indo para Angola, a fim de trabalhar
na REFRIANGO; Que viajou para a Angola, pela primeira
vez, em outubro de 2008; Que voltou para o Brasil três
vezes no período de um ano e dois meses; Que trabalhava
três meses e vinha ao Brasil, onde ficava dez dias, uma
vez que seu visto de estada naquele país era de três
meses; Que não sabe informar quem pagou por suas
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passagens aéreas para a Angola; Que, entretanto, o
depoente não pagou pelas passagens, nem pelas despesas
de passaporte e emissão de vistos, salvo pela emissão do
visto referente ao último período trabalhado na Angola;
Que cada vez que voltava ao Brasil, era necessário
retirar um novo visto de turista para ingresso naquele
país; Que os vistos emitidos eram de turistas; Que a
agência de turismo que cuidava da emissão dos vistos e
dos bilhetes aéreos era a RBC TUR, que ficava no Rio de
Janeiro; Que pagou para a referida empresa pela emissão
do último visto para a Angola; Que nos dois primeiros
meses trabalhados na REFRIANGO, o depoente ficou alojado
em uma casa da empresa, dentro de suas próprias
dependências; Que a casa possuía três quartos e alojava
sete empregados ao todo; Que a casa não apresentava boas
condições, sendo construída de painéis térmicos, que
esquentava bastante, mas havia ar condicionado; Que
posteriormente, foi transferido para uma casa na Cidade
de Viana, onde a fábrica era instalada, que apresentava
condições ainda piores que a primeira; Que essa casa não
tinha qualquer tipo de saneamento básico, além de estar
situada em uma vila construída por chineses e que era
extremamente perigosa; Que a casa possuia três quartos e
alojava seis empregados; Que na casa não havia energia
elétrica, sendo a energia oriunda de um gerador a
diesel, que era fornecido pela empresa; Que no início
não havia água encanada na casa, problema que só foi
resolvido depois que os próprios moradores colocaram
tonéis de água e encanamento; Que havia instalação
sanitária na casa, bem como chuveiro de água quente; Que
não havia segurança na casa; Que o depoente já foi
assaltado na referida vila; Que almoçava e jantava na
empresa, mas não gostava da comida; Que na maior parte
do tempo, trabalhava de segunda a domingo, sem descanso
semanal; Que começava a trabalhar às 07h e muitas vezes
laborava até às 20 ou 21h, embora já tenha trabalhado
até as 2h da manhã do dia seguinte; Que na realidade,
não tinha hora certa para encerrar a jornada, pois tinha
que trabalhar até encerrar a tarefa passada pelo
investigado; Que trabalhava sem qualquer tipo de
equipamento de proteção individual; Que o depoente não
sofreu acidente de trabalho, mas seu cunhado, senhor
GENERLON QUEIROZ DE BARROS, quebrou o braço, ao cair de
uma altura de cinco metros, pois trabalhava em altura
sem cinto de segurança; Que o senhor GENERLON permaneceu
na Angola por mais de um mês, sem trabalhar e sem
assistência, seja do investigado ou da REFRIANGO; Que
após o referido período, ele voltou ao Brasil, onde
também não teve assistência por parte do investigado;
Que no período em que ficou parado, o senhor GENERLON
não recebeu salário da REFRIANGO nem do investigado; Que
o investigado reduziu o salário do depoente para U$
2.300,00 (dois mil e trezentos dólares americanos) nos
dois últimos meses; Que os demais empregados, salvo o
encarregado do investigado, também tiveram a mesma
redução salarial; Que o depoente recusou-se a continuar
trabalhando para o investigado na Angola, em razão da
redução salarial; Que no período em que trabalhou para o
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investigado, na Angola, o senhor GLADEMIR levou em torno
de quinze a vinte trabalhadores brasileiros para
trabalhar na REFRIANGO; Que o investigado ganhava da
REFRIANGO um salário fixo, cujo valor não sabe informar,
além de U$ 1.500,00 (um mil e quinhentos dólares
americanos) por cada trabalhador por ele levado para
aquele país; Que na avaliação do depoente, algumas
coisas prometidas pelo investigado não foram cumpridas,
como a assistência à saúde, que não houve; Que a jornada
de trabalho normal, pois trabalhava praticamente sem
descanso semanal e com excesso diário; a qualidade dos
alojamentos, que não eram bons; as despesas de emissão
de visto, que o depoente teve que pagar em relação ao
último período e o salário, que foi reduzido nos dois
últimos meses”.
Depoimento do Sr. JUNIOR CESAR DA SILVA, ouvido
como testemunha compromissada na forma da lei (doc. 05):
“Que o investigado convidou o depoente para trabalhar na
montagem industrial da empresa REFRIANGO, na Angola; Que
o senhor GLADEMIR prometeu ao depoente salário de U$
2.500,00 (dois mil e quinhentos dólares americanos) por
mês, livre de qualquer despesa; Que o senhor GLADEMIR
ainda prometeu que as depesas (sic) de emissão de visto
e de passagem seriam custeadas pela REFRIANGO; Que o
investigado ainda informou ao depoente que ele ficaria
hospedado em um alojamento de boa qualidade situado
dentro das dependências da REFRIANGO, onde também faria
as suas refeições; Que o investigado informou ao
depoente que ele trabalharia na montagem industrial, de
segunda a domingo, 8 (oito) a 12 (doze) horas por dia e
que as horas extras seriam pagas a parte do valor acima
referido, que remunerava 220 horas mensais; Que em razão
da boa remuneração prometida, o depoente aceitou
trabalhar na Angola; Que viajou para aquele país em
outubro de 2008, lá permanecendo por três meses; Que não
pagou pela passagem aérea, nem pela emissão de visto;
Que ficou alojado em uma casa da REFRIANGO, situada
dentro de suas instalações; Que a casa tinha três
quartos e abrigava oito trabalhadores; Que a casa
apresentava boas condições, tendo luz elétrica, água
encanada,
chuveiro
de
água
quente,
televisão
e
mobiliário; Que comia no refeitório da empresa, café da
manhã, almoço e jantar, que eram de boa qualidade; Que
trabalhava todos os dias, das 08 até 19/21h; Que recebia
em torno de U$ 5.000,00 a U$ 5.500,00 por mês, pois
fazia
muitas
horas
extras;
Que
não
pagava
pelo
alojamento,
nem
pelas
refeições;
Que
recebia
os
seguintes equipamentos de proteção individual: avental,
luva, máscara de solda, óculos de proteção e protetor
auricular; Que como o visto do depoente era de turismo,
teve que retornar ao Brasil após três meses de
permanência na Angola; Que não viajou mais para a
Angola, pois não houve mais interesse do investigado em
levar o depoente; Que chegou a ligar duas vezes para o
senhor GLADEMIR, mas ele não deu uma resposta conclusiva
ao depoente; Que gostou da experiência de ter trabalhado
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na Angola, tendo o investigado cumprido tudo o que foi
prometido ao depoente; Que na época em que trabalhou na
Angola, o senhor GLADEMIR possuia (sic) doze empregados
trabalhando na REFRIANGO, mas essa empresa contratava
empregados brasileiros através de outras pessoas; Que
não teve CTPS assinada, nem foi firmado contrato de
trabalho, seja com o investigado, seja com a REFRIANGO;
Que não teve qualquer direito trabalhista, salvo o
salário e o pagamento das horas extras; Que como o visto
dos trabalhadores intermediados pelo investigado era de
turista, estes tinham que se esconder das autoridades de
imigração
da
Angola,
quando
eles
vistoriavam
a
REFRIANGO; Que o depoente teve que se esconder da
imigração algumas vezes, tendo se escondido no forro do
teto e no alojamento”.
Pelo que se verifica dos depoimentos acima
transcritos, o
segundo requerido,
através da
firma
individual por ele constituída (primeira ré), arregimenta
trabalhadores principalmente na cidade de Goianira, GO,
para trabalhar na montagem industrial da REFRIANGO, em
Viana, Angola, sob sua supervisão e comando, sem assegurar
aos trabalhadores,
no entanto,
os direitos
sociais
garantidos pela legislação brasileira.
A referida conclusão também pode ser extraída
da
prova
produzida
nos
autos
do
Processo
nº
0223700.65.2009.5.18.0006, como se verifica dos seguintes
depoimentos (doc. 02):
Depoimento
pessoal
do
reclamante
VALDIR
RODRIGUES RAMALHO:
"que foi contratado para trabalhar em Angola, numa
empresa de refrigerante; que o depoente deveria fazer
serviços de montagem e soldagem em tubulações; que não
existe mão-de-obra qualificada em Angola; que a primeira
vez que foi para Angola foi 07.09.2008 tendo retornado,
definitivamente,
em
03.10.2009;
que
nesse
período
permanecia três meses em Angola e retornava ao Brasil,
permanecendo de 25 a 30 dias; que recebia U$ 2.500,00,
por mês trabalhado, sendo que quando retornava ao Brasil
não era pago nenhum salário; que quer romper o vínculo
uma vez que seu salário foi reduzido para U$ 2.200,00;
que no último período em que permaneceu o salário era de
U$ 2.500,00, entretanto não recebeu o último mês
trabalhado. Perguntas do advogado da reclamada: que quem
tirava o visto era a RBC TOUR, entretanto quem
providenciava toda a documentação era o Sr. Clademir
Fontanella; que o depoente recebia apenas o e.mail do
Sr. Clademir informando os dados da viagem; que a
hospedagem era paga pelo Sr. Clademir; que quem dava
ordens era o Sr. Clademir, assim como a hospedagem era
arcada pelo mesmo; que no período em que permanecia no
Brasil as comunicações eram por e.mail e telefone; que o
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Sr. Clademir também ia em Goianira; que na época que o
depoente prestou serviços ao reclamado havia uma obra,
nesse Estado que estava finzalizando (sic); que o
depoente não trabalhou nessa obra".
Depoimento
pessoal
do
reclamado
(segundo
requerido):
"que o depoente tem uma empresa de montagem industrial;
que o depoente não tem escritório; que o depoente não
tem nenhuma montagem no Estado de Goiás; que o depoente
não tem empregados; que o depoente é um prestador de
serviços autônomo em Angola; que o depoente trabalha de
forma igual que o reclamante; que todas as despesas são
arcadas pela empresa em que prestam serviços; que o
reclamante viaja para Angola há quatro/cinco anos, sendo
que o depoente viaja há um ano; que o depoente apenas
convidou o reclamante; que nesta empresa existem
diversos brasileiros; que não sabe dizer se o reclamante
já
havia
prestado
serviços
para
a
empresa
de
refrigerantes. Perguntas da advogada do reclamante: que
o depoente já convidou outras pessoas para trabalharem
nesta empresa em outras oportunidades; que o depoente
sempre presta serviços para a mesma empresa; que os
trabalhadores autônomos é quem entravam em contato com o
depoente para saber quando voltariam e se voltariam; que
a empresa sediada em Angola tinha endereço e telefone de
todos os prestadores, sendo que o dono da empresa já foi
empregador do reclamante; que a empresa se comunica
diretamente com o depoente por este ser o contato das
pessoas que são convidadas para trabalhar na empresa;
que há 04 pessoas que foram convidadas pela empresa de
refrigerantes a permanecer definitivamente em Angola;
que a empresa pagava o valor total da remuneração para o
depoente que repassava aos 'trabalhadores autônomos' ".
Depoimento
da
primeira
reclamante, Sr. JUNIO CESAR DA SILVA:
testemunha
do
"que o Sr. Glademir arregimenta pessoas para ir
trabalhar em Angola; que o depoente já foi um vez; que o
depoente trabalhou na fábrica de refrigerantes; que a
empresa onde prestavam serviços não manteve contato
direto com nenhum dos trabalhadores, não pegando
endereço ou telefone; que o reclamado não fazia o
serviço
braçal,
sendo
que
apenas
coordenava
os
trabalhos; que todos os contatos e despesas de viagem e
transferência foram 'por conta do Sr. Glademir'.
Perguntas da procuradora do reclamante: que o depoente
recebia U$ 2.500,00, sendo que acha que todos tinham o
mesmo patamar remuneratório; que na cidade de Goianira o
reclamado
é
conhecido
como
a
pessoa
que
leva
trabalhadores para Angola; que a empresa não pagava
diretamente ao depoente; que o depoente deveria cumprir
horário em Angola assim como foi chamado à atenção, pelo
reclamado, quando não compareceu em um dia para
trabalhar; que era o Sr. Glademir quem dava ordens ao
depoente; Perguntas do advogado do reclamado: que o
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depoente ficou em Angola de outubro de 2008 a janeiro de
2009; que o depoente apenas pegou o bilhete no aeroporto
e pegou o avião, não tendo reparado o que estava escrito
no bilhete; que não sabe informar se o reclamante já foi
para Angola outras vezes".
Depoimento da segunda testemunha do reclamante,
Sr. GENERLON QUEIROZ DE BARROS, ouvido como informante, por
ser cunhado do autor:
"que o reclamante já foi para Angola, em período
anterior, à prestação de trabalho com o reclamado; que o
reclamado é conhecido em Goianira como arregimentador de
mão-de-obra para laborar em Angola; que o depoente foi
para Angola em outubro de 2008; que o reclamado, neste
período, só dava ordens não executando serviços braçais;
que não manteve contato direto com a tomadora, quer seja
em relação ao pagamento de salário ou recebimento de
ordens; que todo o relacionamento era por meio do
reclamado; que o reclamado é quem cuidou de todo o
trâmite para se dirigir ao exterior; que recebeu e.mail
da Fontanella, no que tange ao embarque. Perguntas do
procurador do reclamado: que não verificou se constava o
nome da empresa de refrigerante nas passagens; que
haviam diversos alojamentos na empresa; que o depoente
ficou no alojamento da Fontanella; que existiam outras
empresas iguais a Fontanella acampadas na empresa de
refrigerante; que as refeições eram fornecidas pela
empresa tomadora; que todos os acampados, de todas as
empresas, almoçavam no mesmo local; que o depoente
retornou dia 30 de dezembro; que o depoente retornou
mais cedo pois machucou-se, sendo que só recebeu o valor
dos dias trabalhados; que os acampamentos da tomadora
são separados por cada prestador, constando apenas a
delimitação; que no período em que o depoente trabalhou
havia 03 casas da Fontanella; que também havia uma
empresa portuguesa acampada, chamada a BIBENTO, e uma
italiana, chamada SIDEL; que a SIDEL fazia montagem de
maquinário próprio e a BIBENTO fazia o mesmo trabalho
que a Fontanella; que desconhece se a BIBENTO fazia
montagem de equipamentos, sendo que viu os trabalhadores
fazendo o mesmo serviço que a Fontanella".
Depoimento da
DORIVAN LOPES DOS SANTOS:
testemunha
do
reclamado,
Sr.
"que foi convidado pelo reclamado para trabalhar em
Angola; que quem dá ordens para os trabalhadores é a
empresa tomadora; que é o reclamado quem recebe da
empresa e repassa para os trabalhadores; que existiam
outras empresas prestadoras de serviços que ficavam em
casas
destinadas
pela
empresa
tomadora
aos
trabalhadores; que a empresa BIBENTO fazia o mesmo
serviço da Fontanella; que o depoente recebe U$ 3.200,00
por mês; que os outros trabalhadores recebiam U$
2.500,00, sendo que ao ser questionado do motivo do
valor superior, o depoente, após titubear, respondeu que
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recebia valor superior por ser o encarregado; que quando
o Sr. Glademir estava na empresa as ordens eram passadas
pelo mesmo aos trabalhadores, sendo que seguia-se as
determinações da tomadora; que quando o Sr. Glademir não
estava presente a empresa passava as ordens diretamente
ao depoente, que repassava aos trabalhadores. Registro
que o depoente informou que esse repasse tratava-se de
mero recado; que houve oportunidades que o Sr. Glademir
não foi para Angola, sendo que permaneceu no Brasil; que
a documentação do visto foi mandada para a RBC TOUR, por
indicação do reclamado; que a documentação recebida da
RBC constava o nome da empresa tomadora REFRIANGO; que
quando o Sr. Glademir estava presente o depoente
informou 'que o pessoal passava a ordens direto para
ele'. Perguntas do procurador do reclamado: que o
pessoal da REFRIANGO liga para o Sr. Glademir que entra
em contato com os trabalhadores; que permanecem no
Brasil de 20 a 60 dias, tendo liberdade para fazer o que
quiserem; que em Angola têm folga no período da tarde no
sábado e no domingo; que o depoente retornou depois que
o reclamante; que o reclamante recebeu o último mês
trabalhado. Pergunta indeferida: Se no desempenho do
trabalho recebiam comandos e ordens da tomadora. A
pergunta resta indeferida pois a testemunha já explicou
como se dava o repasse das ordens. Protestos. Que depois
que cumprissem o horário com a REFRIANGO poderiam
trabalhar em outra empresa. Perguntas da procuradora do
reclamante: que o reclamado fazia serviço braçal; que o
pagamento era feito na presença de todos".
Verifica-se,
por
outro
lado,
que
os
trabalhadores
intermediados
pelos
requeridos,
para
trabalhar na Angola, não possuem autorização consular
daquele País para laborar na nação africana, pois eles
obtêm visto de turista, fato confessado pelo segundo
requerido (doc. 03), o que faz de tais trabalhadores
imigrantes
ilegais,
que
precisam
se
esconder
das
autoridades de imigração da Angola, conforme informado pela
testemunha JUNIOR CESAR DA SILVA (doc. 05), tornando tal
trabalho uma aventura perigosa e ilegal.
No mesmo sentido, informou a RBC AGÊNCIA DE
VIAGENS E TURISMO LTDA. EPP, responsável pela retirada dos
vistos e emissão dos bilhetes de passagem dos trabalhadores
brasileiros arregimentados indiretamente pela REFRIANGO,
que tais trabalhadores retiram vistos ordinários no
Consulado da Angola, estabelecido no Rio de Janeiro,
relacionando 171 brasileiros, que viajaram para a Angola,
no período de 2008 a 2011, a fim de trabalharem na
REFRIANGO (doc. 06).
Conclui-se, portanto, que a arregimentação e a
intermediação de mão-de-obra promovidas pelos requeridos,
com participação efetiva da REFRIANGO, são ilegais, não
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apenas no aspecto trabalhista, uma vez que não são
assegurados aos obreiros os direitos sociais previstos no
ordenamento jurídico-positivo brasileiro, como também no
aspecto diplomático, pois os trabalhadores brasileiros
intermediados pelos requeridos não dispõem de visto de
trabalho da Angola, laborando, assim, na qualidade de
imigrantes ilegais no País africano.
Assim, tendo em vista a comprovação das
irregularidades acima mencionadas, e a impossibilidade de
resolver a questão extrajudicialmente, já que o segundo
requerido não reconhece nem mesmo a arregimentação dos
trabalhadores, não resta alternativa ao MPT senão bater às
portas do Judiciário, a fim de ser restaurada a ordem
jurídica lesada pela conduta dos requeridos.
II – Do Direito
Os documentos que instruem esta peça de
ingresso
comprovam,
inequivocamente,
que
a
empresa
REFRIANGO,
localizada
em
Viana,
Angola,
contrata
trabalhadores brasileiros, com frequência e em quantidade
considerável, para trabalhar em seu estabelecimento fabril,
contratação essa feita através de pessoas físicas e
jurídicas sediadas no território brasileiro, como ocorre
com os requeridos.
A respeito da contratação de trabalhadores
brasileiros para laborar no exterior, dispõem os arts. 12/
14 e 19/20, da Lei nº 7.064, de 06 de dezembro de 1982,
verbis:
“Art. 12 – A contratação de trabalhador, por empresa
estrangeira,
para
trabalhar
no
exterior
está
condicionada à prévia autorização do Ministério do
Trabalho.
Art. 13 – A autorização a que se refere o art. 12
somente poderá ser dada à empresa de cujo capital
participe, em pelo menos 5% (cinco por cento) pessoa
jurídica domiciliada no Brasil.
Art. 14 – Sem prejuízo da aplicação das leis do país da
prestação dos serviços, no que respeita a direitos,
vantagens e garantias trabalhistas e previdenciárias, a
empresa
estrangeira
assegurará
ao
trabalhador
os
direitos a ele conferidos neste Capítulo.
Art. 19 - A pessoa jurídica domiciliada no Brasil a que
alude o art. 13 será solidariamente responsável com a
empresa estrangeira por todas as obrigações decorrentes
da contratação do trabalhador.
Ministério Público da União
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região
Art. 20 - O aliciamento de trabalhador domiciliado no
Brasil, para trabalhar no exterior, fora do regime desta
Lei, configurará o crime previsto no art. 206 do Código
Penal Brasileiro”.
Verifica-se, portanto, que o direito positivo
brasileiro
estabelece
regras
para
que
uma
empresa
estrangeira contrate trabalhadores no território nacional,
regras que não vêm sendo obedecidas para a contratação de
empregados brasileiros pela REFRIANGO, já que esta empresa
angolana utiliza arregimentadores como testas-de-ferro,
para recrutar e fornecer mão-de-obra especializada para
trabalhar em seu parque fabril.
Note-se que a Lei nº 7.064/82 condiciona a
contratação de trabalhadores domiciliados no Brasil por
empresa estrangeira, para trabalhar no exterior, à prévia
autorização do Ministério do Trabalho e Emprego (art. 12),
preconizando que essa autorização somente será concedida à
empresa estrangeira de cujo capital social participe, em
pelo
menos
5%
(cinco
por
cento),
pessoa
jurídica
domiciliada no Brasil (art. 13), que será solidariamente
responsável com aquela por todas as obrigações decorrentes
da contratação do trabalhador nacional (art. 19).
Está provado, entretanto, que nada disso ocorre
no caso dos autos, pois os trabalhadores brasileiros são
atraídos por salários mais altos do que os praticados no
mercado nacional
e aliciados
pelos requeridos
para
trabalharem na REFRIANGO, localizada na Angola, sem as
garantias legais e constitucionais brasileiras, em total
afronta ao disposto no Capítulo III da Lei nº 7.064/82, que
confere ao trabalhador recrutado no Brasil para trabalhar
no exterior, sem prejuízo da aplicação das leis do país da
prestação dos serviços, os direitos, vantagens e garantias
trabalhistas e previdenciárias previstas pela referida lei
e pelas normas brasileiras (art. 14 c/c art. 3º, I e II).
Com efeito, os documentos que instruem essa
ação civil pública comprovam que o segundo requerido
recruta brasileiros para trabalhar na fábrica de bebidas
REFRIANGO, sob sua supervisão e direção, não garantindo aos
trabalhadores os direitos sociais previstos na legislação
brasileira, sendo o segundo requerido titular de uma firma
individual
(primeira
ré),
que
não
tem
escritório,
empregados nem obras no Brasil, servindo apenas para a
consecução de seu propósito fraudulento.
Ministério Público da União
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Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região
Os trabalhadores aliciados pelos requeridos e
levados para a Angola não têm CTPS assinada; não firmam
contratos individuais de trabalho escrito, como exige o
art. 4º da Lei nº 7.064/82; não têm a proteção
previdenciária conferida pela legislação brasileira; não
têm seguro de vida e acidentes pessoais cobrindo o período
a partir do embarque para o exterior até o retorno ao
Brasil, como exige o art. 21 da Lei nº 7.064/82; não
dispõem de serviços gratuitos e adequados de assistência
médica e social, como exige o art. 22 da Lei nº 7.064/82;
enfim, não gozam de quaisquer direitos e garantias da
legislação
pátria,
encontrando-se
completamente
desamparados.
Tanto é verdade, que o trabalhador GENERLON
QUEIROZ DE BARROS, recrutado pelos requeridos e levado para
trabalhar na REFRIANGO, quebrou o braço, ao cair de uma
altura de cinco metros, pois trabalhava em altura sem cinto
de segurança, permanecendo na Angola por mais de um mês,
sem trabalhar, sem assistência médica e sem remuneração,
seja do investigado ou da REFRIANGO (vide depoimento da
testemunha VALDIR RODRIGUES RAMALHO - doc. 04 e do próprio
GENERLON QUEIROZ DE BARROS – doc. 2).
A propósito da situação de trabalhadores
contratados ou transferidos para prestar serviços no
exterior, preconizam os arts. 2º e 3º da Lei nº 7.064/82:
Art. 2º - Para
transferido:
os
efeitos
desta
Lei,
considera-se
[...]
II
o
empregado
cedido
à
empresa
sediada
no
estrangeiro, para trabalhar no exterior, desde que
mantido
o
vínculo
trabalhista
com
o
empregador
brasileiro;
III - o empregado contratado por empresa sediada
Brasil para trabalhar a seu serviço no exterior.
no
Art. 3º - A empresa responsável pelo contrato de
trabalho
do
empregado
transferido
assegurar-lhe-á,
independentemente da observância da legislação do local
da execução dos serviços:
I - os direitos previstos nesta Lei;
II - a aplicação da legislação brasileira de proteção ao
trabalho, naquilo que não for incompatível com o
disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a
legislação territorial, no conjunto de normas e em
relação a cada matéria”.
Ministério Público da União
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Procuradoria Regional do Trabalho da 18ª Região
Assim, sob qualquer ângulo que se analise a
questão, conclui-se que a mencionada lei tem plena
aplicação no caso dos autos, uma vez que os requeridos
recrutam trabalhadores no Brasil, para laborarem a seu
serviço, na Angola, a fim de atender à necessidade da
empresa REFRIANGO, sem, contudo, garantir-lhes os direitos
trabalhistas previstos na Constituição Federal, na CLT e na
legislação esparsa, ou tampouco os direitos previstos na
Lei nº 7.064/82.
A sentença proferida pela Exma. Juíza do
Trabalho Rosana Rabello Padovani Messias, nos autos da Ação
Trabalhista nº 0223700.65.2009.5.18.0006, proposta por
Valdir Rodrigues Ramalho em face dos requeridos, sintetiza,
com precisão, a situação ilícita trazida a lume nesta ação
civil pública, ao preconizar que:
“Os grifos acrescidos as declarações das testemunhas e
do informante revelam que os trabalhadores são levados
para Angola sem nenhum direito trabalhista assegurado.
Tanto é que o informante machucou-se e
Brasil sem nenhuma garantia ou auxílio
lesão.
retornou ao
posterior à
Constata-se, ainda, que os trabalhadores permanecem
parados cerca de dois meses no Brasil sem salário ou
qualquer garantia de emprego.
Note-se ademais, que a empresa Refriango mantém diversos
acampamentos com trabalhadores de outras nacionalidades
a fim de atender os próprios interesses econômicos.
A realidade do mundo globalizado precariza as condições
de trabalho e isto é um fato.
Fato, ainda, que a mão de obra nacional é barata.
Por
óbvio
que,
trabalhadores
que
são
mau
(sic)
remunerados sentem-se tentados a se aventurar num país
estranho do que permanecer no país e perceber a metade
do que receberiam.
O nome conhecido desta situação
decorrente da necessidade econômica.
é
vulnerabilidade
Junte-se estas duas situações: mão de obra barata
dependência econômica que nasce o tráfico de pessoas.
e
Peço licença para transcrever definição que consta no
site do Movimento contra o Tráfico de Pessoas, endereço
eletrônico ‘www.traficodepessoas.org.br’:
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‘Tráfico de Pessoas é causa e consequência de violação
de direitos humanos. É uma ofensa aos direitos humanos
porque explora a pessoa humana, degrada a sua dignidade,
limita sua liberdade de ir e vir. É ainda consequência
do desrespeito aos direitos humanos porque o tráfico de
pessoas é fruto da desigualdade socioeconômico, da falta
de educação, de poucas perspectivas de emprego e de
realização pessoal, de serviços de saúde precários e da
luta diária da sobrevivência.’
O reclamado, por meio da pessoa jurídica, conduz
trabalhadores para o exterior, utilizando-se de um falso
contrato de prestação de serviço a fim de mascarar o
trabalho subordinado.
Referidos trabalhadores são enviados ao exterior
qualquer garantia, tanto que sofrem acidentes
respaldo e ficam com os salários retidos.
sem
sem
A CLT serve como uma rede proteção ao trabalhador a fim
de assegurar as garantias mínimas ao cidadão.
Na hipótese dos autos, o trabalhador é literalmente
colocado num avião para desempenhar serviço ligado a
atividade fim do reclamado em empresa situada em Angola,
sem qualquer garantia trabalhista.
Troca-se o caminhão do boía fria pelo avião, mas a forma
de trabalho é a mesma, não existe nenhuma rede de
proteção ao empregado.
Note-se, ainda, que se torna muito conveniente aos
interesses empresariais a contratação de empregado sem o
pagamento de impostos, restando violadas normas de ordem
fiscal e previdenciária.
Restou demonstrado pela oitiva da testemunha indicada
pelo reclamado que o reclamante recebia ordens da
empresa,
havendo,
inclusive,
uma
estrutura
hierarquizada,
tanto
que,
a
testemunha
era
o
encarregado, fazendo as vezes do empregador.
O pagamento mensal ao autor resta confessado, inclusive
em relação aos custos para manutenção e envio dos
trabalhadores que corriam por risco do reclamado.
Irrelevante para esta demanda quem efetivamente arque
com as despesas, na medida que, a partir do momento que
os trabalhadores são aliciados e atuam na dinâmica
empresarial do reclamado emerge o contrato de trabalho.
Hoje, face ao avanço tecnológico e dada a complexidade
das relações humanas deve-se analisar a subordinação sob
o ponto de vista estrutural e objetivo.
A subordinação decorre da inserção do empregado na
dinâmica empresarial do empregador, seja ele uma
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empresa,
civil.
um
hospital,
uma
clínica
ou
uma
sociedade
O binômio ordem/subordinação resta superado pelo binômio
da
colaboração/dependência,
sendo
que
a
expressão
subordinação deve ser analisada sob o aspecto objetivo,
qual seja, o modo de realização da prestação de trabalho
e a inserção da pessoa no contexto empresarial.
Feitas essas considerações,
emprego entre as partes”.
reconheço
o
vínculo
de
A par das irregularidades trabalhistas, cabe
ainda destacar outra ilicitude grave praticada pelos
requeridos com intervenção direta da empresa angolana
REFRIANGO, consubstanciada na promoção da imigração ilegal
de brasileiros para a Angola.
Com efeito, como já ressaltado anteriormente,
restou provado que os trabalhadores intermediados pelos
requeridos,
para
trabalhar
na
Angola,
não
possuem
autorização consular daquele país para laborar na nação
africana, pois eles obtêm visto de turista, fato confessado
pelo segundo requerido (doc. 03), o que faz de tais
trabalhadores imigrantes ilegais, que precisam se esconder
das autoridades de imigração da Angola, conforme informado
pela testemunha JUNIOR CESAR DA SILVA (doc. 05), tornando
tal trabalho uma aventura perigosa e ilegal.
No mesmo sentido, informou a RBC AGÊNCIA DE
VIAGENS E TURISMO LTDA. EPP, responsável pela retirada dos
vistos e emissão dos bilhetes de passagem dos trabalhadores
brasileiros arregimentados indiretamente pela REFRIANGO,
que tais trabalhadores retiram vistos ordinários no
Consulado da Angola, estabelecido no Rio de Janeiro (doc.
06).
Conclui-se, portanto, que a arregimentação e a
intermediação de mão-de-obra promovidas pelos requeridos,
com participação efetiva da REFRIANGO, são ilegais, não
apenas no aspecto trabalhista, uma vez que não são
assegurados aos obreiros os direitos sociais previstos no
ordenamento jurídico-positivo brasileiro, como também no
aspecto diplomático, pois os trabalhadores brasileiros
intermediados pelos requeridos não dispõem de visto de
trabalho da Angola, laborando, assim, na qualidade de
imigrantes ilegais no País africano.
Tal
situação
coloca
os
brasileiros
à
margem
da
legalidade,
totalmente desamparados enquanto trabalham
trabalhadores
deixando-lhes
e residem na
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Angola, estando sujeitos até mesmo à prisão e deportação
pelas autoridades de imigração daquele país.
Assim, sob todos os ângulos, verifica-se que o
recrutamento de trabalhadores brasileiros levado a cabo
pelos requeridos não pode ser tolerado pelo estado
brasileiro, merecendo uma resposta pronta e eficaz por
parte do Judiciário Trabalhista.
III – Do pedido de antecipação de tutela
Segundo o disposto no art. 19 da Lei nº
7.347/85, aplica-se à ação civil pública as regras do
Código de Processo Civil naquilo que não contrariem as suas
disposições.
O CPC, por sua vez, prevê em seus arts. 273 e
461 o
instituto da
antecipação de
tutela, que
é
perfeitamente compatível com o sistema da ação civil
pública.
Convém recordar que muito antes da reforma
processual de 1.994, determinada pela Lei nº 8.952/94, que
instituiu a antecipação de tutela, a Lei nº 7.347/85 já
previa, em seus arts. 4º e 12, a impropriamente chamada
tutela cautelar satisfativa, de natureza híbrida, pois a
par de seu caráter instrumental, permitia o adiantamento da
tutela nas obrigações de fazer e não fazer. Vale dizer, em
sede de cautelar, já previa a possibilidade de se obter um
provimento de conteúdo executivo, exatamente como ocorre na
tutela antecipada do provimento jurisdicional de mérito.
Como se não bastasse, o art. 84, § 3º, da Lei
nº 8.078/90, aplicável à ação civil pública por força do
disposto no seu art. 90 e no art. 21 da Lei nº 7.347/85,
prevê que sendo relevante o fundamento da demanda e
havendo justificado receio de ineficácia do provimento
final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou
após justificação prévia, citado o réu.
Assim, tem-se que a tutela antecipada do
provimento jurisdicional de mérito é perfeitamente cabível
nas ações coletivas previstas no CDC e na LACP.
Verifica-se, contudo, que a norma estatuída no
art. 84, § 3º, do CDC (que tem a mesma redação do art. 461,
§ 3º, do CPC), ao contrário do que preconiza o art. 273
daquele Codex, autoriza o magistrado a antecipar a tutela
de mérito liminar e provisoriamente, sempre que presentes a
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relevância do
de ineficácia
concessão da
portanto, que
fundamento da demanda e o justificado receio
do provimento final (requisitos necessários à
medida cautelar), sendo bem menos rigorosa,
a norma do art. 273 do CPC.
Assim, por se tratar de defesa de interesses
metaindividuais, a antecipação da tutela jurisdicional de
mérito na ação civil pública deve seguir os parâmetros
delineados no art. 83, § 3º, do CDC e art. 461, § 3º, do
CPC e não aqueles preconizados pelo art. 273 deste último
diploma, tudo de forma a conferir maior efetividade na
entrega da prestação jurisdicional coletiva.
Desta forma, passa-se a discorrer sobre os
pressupostos específicos para a concessão da tutela
antecipada no caso dos autos.
Relevância do fundamento da demanda.
O material probatório acostado aos autos
demonstra a gravidade da conduta dos requeridos e os
efeitos nocivos que dela decorrem para a ordem jurídica
trabalhista, pela flagrante ofensa perpetrada aos direitos
sociais dos trabalhadores, que são levados a trabalhar no
exterior sem a garantia dos direitos constitucionais e
legais brasileiros e à margem das leis de imigração.
A situação é tão grave que, segundo o disposto
no art. 20 da Lei nº 7.064/82, o aliciamento de trabalhador
domiciliado no Brasil, para trabalhar no exterior, fora do
regime da referida lei, como ocorre no caso dos autos,
configura o crime previsto no art. 206 do Código Penal
Brasileiro, que trata do delito de aliciamento de
trabalhadores para trabalhar no estrangeiro, punível com
detenção de um a três anos e multa.
Os fatos noticiados e comprovados, portanto,
exigem do Poder Judiciário uma atitude célere e eficiente
para estancar o processo de aliciamento levado a efeito
pelos requeridos, para atender ao interesse econômico da
empresa REFRIANGO.
Por outro lado, os depoimentos e documentos
colhidos
no
curso
do
Inquérito
Civil
nº
000058.2010.18.000/4 e os depoimentos obtidos nos autos da
Ação
Trabalhista
nº
0223700.65.2009.5.18.0006
constituem prova material suficiente dos fatos narrados,
permitindo a perfeita visualização da fumaça do bom
direito.
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Justificado receio de ineficácia do provimento
final.
A continuidade da ação delituosa dos requeridos
causa danos de difícil (ou impossível) reparação, na medida
em que, com o passar do tempo, mais e mais trabalhadores
brasileiros são arregimentados e levados, ilegalmente, para
trabalhar na Angola.
Assim, caso não seja concedida a tutela
antecipada que ora se pleiteia, o provimento final que se
busca na presente ação poderá ser totalmente ineficaz, pois
até o trânsito em julgado da decisão condenatória que se
busca,
dezenas
ou
até
centenas
de
trabalhadores
domiciliados no Brasil podem ser vitimados pela ação
delituosa dos requeridos.
Presentes, pois, a relevância do fundamento da
demanda e o justificado receio de ineficácia do provimento
final, pressupostos indispensáveis à concessão da tutela
antecipada.
Destarte, requer o MPT, liminarmente ou após
justificação prévia, a concessão de tutela antecipada para
o fim de condenar os requeridos a absterem-se de atrair,
convidar, recrutar, arregimentar ou aliciar trabalhadores
para laborar no exterior, sobretudo na Angola, sem a
garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários
previstos na Constituição Federal, na CLT, na legislação
esparsa brasileira e na Lei nº 7.064/82, e sem que os
trabalhadores brasileiros disponham de visto de trabalho
dos países onde se dará a prestação dos serviços, sob pena
de pagamento de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por
trabalhador prejudicado, a ser revertida ao Fundo de Amparo
ao Trabalhador, criado pela Lei nº 7.998, de 11.01.90, em
sintonia com o disposto no art. 13 da Lei nº 7.347/85.
IV – Do pedido definitivo
Por
fim,
considerando
os
documentos
que
acompanham a inicial, o Ministério Público, na defesa da
ordem jurídica e dos interesses difusos e coletivos, requer
EM CARÁTER DEFINITIVO, a manutenção dos efeitos da tutela
antecipada, julgando-se procedente o pedido abaixo, para o
fim de condenar os requeridos a absterem-se de atrair,
convidar, recrutar, arregimentar ou aliciar trabalhadores
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para laborar no exterior, sobretudo na Angola, sem a
garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários
previstos na Constituição Federal, na CLT, na legislação
esparsa brasileira e na Lei nº 7.064/82, e sem que os
trabalhadores brasileiros disponham de visto de trabalho
dos países onde se dará a prestação dos serviços, sob pena
de pagamento de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por
trabalhador prejudicado, a ser revertida ao Fundo de Amparo
ao Trabalhador, criado pela Lei nº 7.998, de 11.01.90, em
sintonia com o disposto no art. 13 da Lei nº 7.347/85.
Requer, outrossim, a citação dos requeridos
para, querendo, contestem a presente ação, no prazo legal,
ou sujeitem-se aos efeitos da revelia e confissão.
Protesta-se pela produção de todas as provas
admitidas em direito, em especial a juntada de documentos,
perícias, depoimentos pessoal e testemunhal.
Dá-se à causa
(cinquenta mil reais).
o
valor
de
R$
Termos em que,
Pede deferimento.
Goiânia, 17 de fevereiro de 2.012.
Marcello Ribeiro Silva
Procurador do Trabalho
50.000,00
Download

go. o ministério público do trabalho